terça-feira, 14 de setembro de 2021

Manifestações de 7 de setembro: Bolsonaro errou na forma, não no conteúdo

Foto: Veja
De como e por que a forma de escolha de ministros do Supremo deveria ser mudada

Por Said Barbosa Dib, analista político em Brasília

Logo após sua aparente vitória política nas manifestações de 7 de setembro contra do STF, Bolsonaro teve que colocar o rabinho entre as pernas. Suas bravatas antidemocráticas foram deixadas de lado e o presidente passou a falar fino. Demonstrou ser politicamente frágil e desmoralizou-se. Teve que contar com a ajuda de um ex-presidente que saiu do governo respondendo vários inquéritos e com 84,5% de desaprovação. O capitão conseguiu desagradar até seus seguidores mais fiéis e radicais.

É óbvio que o presidente errou feio na forma vil e destrambelhada com que atacou o Supremo. No conteúdo, talvez não. Os excessos e erros jurídicos e os protagonismos político-ideológicos dos membros da instituição nas últimas décadas são óbvios (conferir entrevista de Ives Gandra Martins sobre o assunto, clicando aqui). Sem entrar na discussão sobre quais os pecados dos ministros do Supremo, fica a constatação de que é, sim, imperioso que haja mudanças na forma pela qual os membros da Suprema Corte são escolhidos. Pelo menos as trapalhadas de Bolsonaro tiveram este mérito. Ampliou o debate sobre a necessidade de reforma do Supremo.

Em maio de 2015, a Consultoria Legislativa do Senado produziu excelente estudo mostrando que o modelo de escolha para STF era imperfeito e dando sugestões importantes. No estudo, o consultor legislativo Roberto da Silva Ribeiro, da área de Direito Constitucional, compara os modelos de indicação às supremas cortes de diversos países ao do Brasil. Descreve os modelos alemão, espanhol, norte-americano, canadense, espanhol, francês, italiano e português, para concluir que o modelo brasileiro é “eminentemente político”, o que “pode acarretar em indesejável ligação entre o STF e o presidente da República, caso o Senado não exerça de forma efetiva a sabatina dos indicados”. Roberto da Silva Ribeiro lembrava que cortes constitucionais são também políticas, sendo que seus membros por vezes devem adotar posições políticas. Por isso, o processo de escolha dos membros das supremas cortes deve seguir também "princípios democráticos e republicanos", “não apenas técnicos”. Ele mostra que o modelo brasileiro é adaptação do adotado pelos Estados Unidos, mas que, no Brasil, o formato é chamado de “arcaico e potencialmente gerador de crises políticas”. “Argumenta-se pela existência de um excessivo personalismo na escolha, privativa do Presidente da República, além da ausência de participação efetiva dos demais Poderes nesse processo.”. O texto de Roberto também apresenta alternativas. Mostra relação de propostas de emenda à Constituição que já estão tramitando no Congresso e que, no entendimento do autor, “assegurariam a participação dos três Poderes no processo de escolha dos ministros do STF, além de estipular um mandato fixo para os membros do tribunal”. Para conferir o estudo, clique aqui.

Queria que alguém mais informado e esclarecido me esclarecesse o seguinte: se o atilado Bolsonaro tem realmente convicção dos erros e malfeitos do STF, se realmente crê que o STF como está é causa primeira das desgraças que assolam o País, qual o motivo de ainda não ter mandado uma PEC – Projeto de Emenda Constitucional – modificando radicalmente a forma de requisitos, escolha, indicação, sabatinação e posse dos ministros do STF? Os acordos recentes com o dito “Centrão” lhe dão votos suficientes para isso. É só liberar algumas emendinhas e cargos. Ao invés de se humilhar perante a opinião pública e o ministro Alexandre de Moraes, poderia se “vingar” enviando a PEC para análise do Congresso imediatamente. O Brasil agradeceria e ele recuperaria alguma honra perante seus seguidores. A discussão, votação e aprovação em cada Casa do Congresso Nacional se dá em dois turnos, em ambas as Casas, com o mínimo de três quintos dos votos dos membros de cada uma delas (art. 60, § 2º), isto é, 308 deputados e 49 senadores. Será que nenhum assessor do presidente lhe sugeriu esta alternativa? Fica a sugestão...