Aumento dos juros, restrição ao crédito, corte nos investimentos, subsídio cambial às importações, arrocho salarial e bilhões do Orçamento desviados para pagar juros aos bancos frearam o crescimento
O desastroso crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) de 2011, divulgado pelo IBGE na terça-feira, infelizmente, não é uma surpresa. Da mesma forma, o resultado negativo, em todas as comparações, da produção física industrial, publicado no dia seguinte (v. matéria nesta página).
Nossos leitores sabem que a partir de janeiro do ano passado, afirmamos, e demonstramos, diante de sucessivos retrocessos, que a política recessiva, de aumento dos juros, restrição ao crédito, corte nos investimentos e gastos públicos, subsídio cambial às importações, escancaramento ao parasitário dinheiro externo, arrocho sobre o salário mínimo e sobre o salário dos funcionários (e uma insidiosa campanha contra os aumentos salariais em geral), somente poderia conduzir ao que, agora, está exposto publicamente pelos números das “Contas Nacionais” do IBGE.
Depois da eclosão da crise nos países imperialistas, ao final de 2008, o Brasil, no governo do presidente Lula, ajustou a sua economia para que a crise não voltasse a afetá-lo. O mesmo fizeram a maior parte dos países do mundo. No entanto, a política econômica do sr. Mantega foi acabar com esse ajuste – nas suas palavras, a crise havia acabado, daí eram dispensáveis os estímulos, estabelecidos por Lula, à atividade econômica, isto é, os investimentos e financiamentos públicos, os gastos com custeio, o crédito farto para o consumidor e para as empresas, etc. Na terça-feira, ao falar que 2011 foi “um ano de ajuste”, o que Mantega expôs, exatamente, foi que seu “ajuste” era acabar com o ajuste de Lula. Mas não admitiu isso honestamente.
Não fomos os únicos que advertiram que isso não ia dar certo, até porque apenas tiramos as decorrências lógicas do que estava, e ainda está, acontecendo. Preferiríamos, certamente, que esse descaminho tivesse sido corrigido. Porém, o crescimento econômico não é um fenômeno da natureza, mas um resultado da ação humana – em uma palavra, de uma política. Como seria possível crescer decentemente com uma política de freio ao crescimento?
Assim, os míseros 2,7% de crescimento do PIB - quando, em 2010, crescemos 7,5% - são o espelho da política dos srs. Mantega e Tombini, de frear o crescimento em prol de alguns bancos, sobretudo estrangeiros, em detrimento do conjunto dos brasileiros.
Com essa política, em 2011, o setor público transferiu aos bancos, em juros, o equivalente a 5,72% do PIB (R$ 236,673 bilhões). Com juros imensamente maiores que os de outros países – e aumentados cinco vezes seguidas - montanhas de dólares oriundos das superemissões dos EUA e demais países centrais invadiram o país, e o câmbio se tornou, mais do que nunca, um dumping a favor das mercadorias importadas; a hipervalorização do real e desvalorização do dólar foi tão descomunal, barateando importações e encarecendo a produção interna, que o câmbio médio de 2011 foi apenas R$ 1,67 por dólar.
Ao mesmo tempo, os financiamentos do BNDES caíram 18% (no caso das indústrias, -19%).
A consequência é que, além da mediocridade do crescimento, atingido pelos juros e pelos importados subsidiados pelo câmbio, a taxa de investimento da economia, já muito baixa, caiu: 19,3% do PIB contra 19,5% em 2010. O sr. Mantega disse que “temos aumentado o investimento” - está se vendo.
Já o sr. Tombini, preferiu um truque: falar que “a Formação Bruta de Capital Fixo, uma boa medida do investimento, também seguiu em expansão”. A Formação Bruta de Capital Fixo (FBCF) - o gasto com máquinas, equipamentos e edificações para a produção – só tem significado quando comparada ao PIB para formar a taxa de investimento (FBCF/PIB). Senão, qualquer parafuso ou arruela, comprados para simples reposição, seria uma formidável “expansão” do investimento, já que é uma expansão da FBCF.
Tombini sabe disso – e sabe que a taxa de investimento caiu. No entanto, prefere enganar as pessoas que não sabem o que é FBCF e taxa de investimento. Mas nada pode eludir que o êxtase com “superávits primários” cavalares (um, cada vez maior, desvio de verba da Saúde, Educação, etc., para os bancos), levou a um rotundo fracasso. Como escreveu recentemente o governador Tarso Genro, do Rio Grande do Sul, “a extorsão permanente do nosso trabalho e do desenvolvimento industrial e comercial do país, continua sendo processada pela drenagem de riquezas através dos juros e serviços da dívida (…). A 'confiança' dos investidores no Brasil - refiro-me aos investidores da especulação financeira - é a confiança do 'senhor' sobre o 'escravo' ”.
Entre os “BRICS”, nenhum crescimento foi tão baixo quanto o do Brasil: China: +9,2%; Índia: +7,4%; e Rússia:+4,1%. Na América do Sul, o crescimento foi em torno de 6,5%. P. ex.: Peru (+6,9%); Argentina (+9,2%); Bolívia (+5%); Chile (+6,5%); Colômbia (+7,7%); Equador (+5,8%); Paraguai (+6,4%); Uruguai (+6%) - [dados das instituições oficiais de cada país]. Mesmo considerando toda a América Latina e Caribe, onde há países devastados pelos EUA, o crescimento médio foi 4,6% (FMI, idem).
Enquanto isso, o maior país, e maior economia, cresceu apenas 2,7%.
A nossa presidente, no último dia 6, atribuiu o resultado de 2011 ao “período adverso para a economia internacional, uma vez que não só os países desenvolvidos estão sofrendo pressões nas suas taxas de crescimento, mas também os países emergentes”.
Não podemos concordar – e não podemos porque a nossa presidente está equivocada. As taxas de crescimento dos países “emergentes” não “sofreram” com tais “pressões”, exceto os pouquíssimos que aceitaram se submeter a esse sofrimento. Por que o Brasil seria diferente dos outros países “emergentes”? Sobre esse tema, um documento que recentemente publicamos, a Resolução Política da última reunião do Diretório Nacional do Partido Pátria Livre (PPL), traz uma importante contribuição:
“... não custa nada lançar um olhar sobre o estado atual do mundo e ver que não há razão objetiva para o Brasil ter empacado. Não vamos falar de China e Índia (nossos parceiros no BRICS) que, não tendo tomado conhecimento da crise em 2008, 2009 e 2010, cresceram em 2011 a uma taxa de 9,2% a primeira e 7,4% a segunda. Vamos só apresentar uma singela relação de países de vários continentes com as respectivas taxas de crescimento no ano de 2011 (…). O equívoco de se atribuir um caráter necessariamente mundial à crise que corrói os centros imperialistas pode ser visto mais claramente quando se compara o crescimento de alguns países emergentes com os das maiores economias do '1º Mundo' ” (cf.www.horadopovo.com.br/2012/02Fev/3034-29-02-2012/P8/pag8a.htm).
Com efeito, os 38 países “emergentes” e os 112 países “em desenvolvimento” - portanto, 150 países ao todo – cresceram, em 2011, a uma média de 6,2% (cf. FMI, “World Economic Outlook Update”, Washington, jan/2012, pág. 2). Mas o Brasil, um dos principais “emergentes”, cresceu 3,5 pontos percentuais abaixo da média. Mesmo os países da África subsaariana tiveram, quase todos, um crescimento muito superior ao Brasil (cf. FMI, idem). Alguns exemplos, com suas taxas de crescimento em 2011:
Congo (+6,5%), República Centro Africana (+4,1%), Ruanda (+7%), Burundi (+4,2%), Quênia (+5,3%), Tanzânia (+6,1%), Uganda (6,4%), Djbouti (+4,8%), Eritréia (+8,2%), Etiópia (+7,5%), Benin (+3,8%), Burkina Faso (+4,9%), Camarões (+3,8%), Guiné Equatorial (+7,1%), Gabão (+5,6%), Gâmbia (+5,5%), Gana (+13,5%), Guiné (+4%), Guiné Bissau (+4,8%), Libéria (+6,9%), Mauritânia (+5,1%), Mali (+5,3%), Níger (+5,5%), Nigéria (+6,9%), Senegal (+4%), Serra Leoa (+5,1%), Zâmbia (+6,7%).
Se a crise dos países imperialistas não os afetou, por que afetaria o Brasil? Porque não foi a crise dos países imperialistas que causou a débàcle econômica dos 2,7%, mas a política econômica levada a cabo a partir de janeiro de 2011. É notável que conseguimos ficar atrás até do México (+4,1%), economia hoje altamente dependente dos EUA em crise.
Carlos Lopes é colunista do excelente jornal Hora do Povo
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