segunda-feira, 31 de outubro de 2011

Fernando César Mesquita

O papel de Sarney

Se existe alguém com um rico histórico de contribuições à consolidação dos valores democráticos é o senador José Sarney. No registro de sua vida não há atos que o desabonem, e desafio que provem o contrário. Inverdades são publicadas e os esclarecimentos ignorados, como se a liberdade de imprensa valesse apenas para quem ataca e condena sem provas. Trabalhei em seu governo e continuo ao seu lado no Senado. Por desinformação, tentam manchar-lhe a honra e desqualificá-lo. Lembram as orquestrações nazistas, quando multidões erguiam o braço na saudação ao Führer que as concitava com palavras de ordem de morte aos judeus, aos ciganos e aos comunistas, embriagadas pelo fanatismo instrumentado por Goebbels. Assim acontece hoje com pessoas de boa-fé manipuladas por gente odienta que, em passeatas e shows de rock, repete slogans banais. Quem pesquisar a história do Brasil dos últimos 50 anos constatará que a vida de Sarney foi marcada pela preocupação com as liberdades públicas, a cidadania e a modernização do Estado. Foi um dos criadores da "Bossa Nova da UDN" - grupo de deputados inconformados com o conservadorismo do partido - e integrou a Frente Parlamentar Nacionalista. No Senado dos anos 70, foi precursor na defesa do meio ambiente e mais tarde se empenharia na realização da Rio 92. Em dezembro de 1978 relatou a Emenda Constitucional nº 11, que revogou todos os atos institucionais e complementares impostos pelos militares. Acompanhei-o na formação da Frente Liberal, que resultou na eleição de Tancredo Neves, cujos compromissos Sarney respeitou na montagem de seu governo. Legalizou todos os partidos políticos, assegurou a liberdade sindical, acabou com a censura prévia, foram realizadas as primeiras eleições diretas para prefeito das capitais em 20 anos. Na política externa, reaproximou o Brasil da China e da então URSS e reatou relações diplomáticas com Cuba. Estreitou o diálogo com a Argentina, criou o Mercosul e foi firme diante dos EUA na defesa do interesse nacional. Sarney convocou a Assembleia Nacional Constituinte, que produziu uma Carta garantindo amplos direitos sociais e incorporando os princípios de democracia direta. Seu governo inovou em todos os setores. Criou-se o Conselho Nacional dos Direitos da Mulher; o Ministério da Reforma Agrária; instituiu-se o Sistema Unificado e Descentralizado de Saúde, o SUDS, que universalizou o atendimento médico. A questão ambiental foi levada a sério com a criação do Ibama; foi dele a Lei de Incentivo à Cultura, atual Lei Rouanet; instituiu o vale-transporte que beneficia milhares de trabalhadores; fez o Programa do Leite, que atendia 7,6 milhões de crianças por dia; pela igualdade racial defendeu sanções contra a África do Sul e criou a Fundação Palmares. Foi o primeiro parlamentar a propor uma política de cotas para negros. Na área econômica e financeira, surgiu a Secretaria do Tesouro Nacional; foi extinta a conta-movimento do Banco Central no Banco do Brasil, unificado o Orçamento Geral da União e criado o Siafi. Foi dele a ideia do seguro-desemprego e de proteção da moradia do trabalhador contra penhora. Também o projeto de lei que garantiu aos portadores de HIV acesso gratuito a medicamentos. Sarney abriu o Senado ao País com a rádio e TV Senado ao vivo. Toda a atividade parlamentar está on-line na internet, como também a administração da Casa. O senador convocou juristas para reformar os Códigos Civil, Penal, de Processo Civil e de Defesa do Consumidor, além das reformas política e eleitoral em tramitação no Congresso. Erros administrativos do Senado foram reparados por proposta de Sarney, que encomendou à FGV uma auditoria na Casa. Omissões e falhas de servidores foram apuradas, e os culpados, punidos. A reforma do funcionamento do Senado será concluída até o fim do ano. Sarney tem defeitos como todo ser humano, mas os serviços prestados ao País o fazem credor do respeito dos seus compatriotas. É injusto e imperdoável o linchamento moral que fazem de sua biografia.

Fernando César Mesquita é jornalista e secretário de Comunicação Social do Senado. Foi porta voz da Presidência da República no governo Sarney. Foi presidente do IBAMA e governador de Fernando de Noronha em 1987. Fernando César coordenou toda a implantação do sistema de comunicação do Senado, em destaque a TV Senado, veículo que foi referência para a criação de outras tevês públicas. Recentemente comandou o planejamento estratégico da SECS.

sexta-feira, 28 de outubro de 2011

Adriano Benayon


Dar direção aos movimentos

Crescem os protestos contra as intoleráveis injustiças sofridas pelos povos em grande parte deste mundo. Na Espanha, na Itália, na Grécia e em Portugal surgem grandes manifestações, desencadeadas pelo brutal aumento dos sacrifícios exigidos dos já sacrificados, pelo Fundo Monetário Internacional e pelo Banco Central Europeu, a fim de beneficiar bancos europeus e estadunidenses. [1]
Experiência semelhante foi suportada, muitas vezes, por países latino-americanos. Entre eles o Brasil, que está menos distante do que imagina de mais uma crise nas contas externas, acompanhada de agravamento das já degradadas condições de vida da maioria de sua população.
Merecem atenção também as manifestações de resistência civil nos EUA e Reino Unido (Inglaterra), sedes da oligarquia financeira que comanda a tirania mundial. Especialmente, o “Ocupemos Wall Street” aponta para o alvo correto: os grandes bancos internacionais, cujos controladores e associados dominam não só as finanças, mas também o petróleo, os armamentos, a grande mídia, a  indústria químico-farmacêutica etc.
Em suma: os concentradores do poder econômico-financeiro exercem absolutismo político cada vez maior, mandando nos governos “democráticos” eleitos pelo dinheiro e pela mídia. Esses não passam de gerentes da “democracia” e do cinismo que dá esse nome à tirania e que chama de liberdade a opressão, e de defesa de direitos humanos o genocídio cometido contra nações com armas de destruição de massa.
Se, em muitos países há alguma consciência da fonte do problema, no Brasil o povo parece anestesiado pelo ópio da TV enganadora.  Os governistas pintam tudo de cor de rosa, como se não houvesse razão para manifestações contrárias ao status quo, enquanto oposicionistas, ainda mais submissos ao império, tentam capitalizar o élan dos indignados com a corrupção.
Os promotores das marchas “contra a corrupção” não entendem ou fingem não entender que -  embora ela seja praticada por políticos e por muitos do serviço público - a mega-corrupção começa no setor privado,  especialmente nas transnacionais sediadas no exterior, grandes beneficiárias das políticas públicas implantadas no País desde 1954.
A partir de então e crescentemente, tornou-se legal.  e não identificada como corrupção, a mega-corrupção que entrega o mercado brasileiro à exploração de cartéis e oligopólios e que desnacionalizou o setor produtivo privado, além de privatizar a quase totalidade das empresas e bancos estatais e de pôr o que restou do setor público ao inteiro serviço das grandes empresas, principalmente estrangeiras.
O Brasil só faz figura de potência emergente para quem gosta de se iludir. A pobreza da grande maioria e também o atraso relativo do País resultam do modelo de dependência financeira e tecnológica. Ele não foi implantado por equívoco, mas de caso pensado: foi desenhado para isso, sob a influência e a pressão das potências imperiais que intervieram em 1954, 1961, 1964 e organizaram, entre 1982 e 1988, a pretensa volta ao “regime democrático”
A concentração da economia nas mãos das transnacionais só poderia dar no que deu: recorrentes crises nas contas externas, que geraram a dívida externa. Quando esta e seus juros se avolumaram, a ponto de levar à inadimplência forçada e ao consequente freiamento de sua expansão (final dos anos 70, início dos 80), despontou, em perene crescimento, a dívida pública interna.
Esta constitui enorme fardo, que inviabiliza o desenvolvimento do País, reduzindo a níveis ridículos os investimentos da União Federal e dos Estados. Aquela assumiu as dívidas destes e lhes exige juros tão absurdos como os que ela própria paga ao sistema financeiro.
Formou-se assim o esquema de quádrupla sugação dos brasileiros: a primeira, pagar impostos altíssimos e mal distribuídos: os pobres (mais de 83% da população) entregam mais de 30% do que ganham; os de renda média (menos de 15% da população) têm carga tributária acima de 50%, e as grandes empresas, bancos e outros investidores, além de poder evadir impostos, só são tributados nos ganhos financeiros em, no máximo, 15%.
A segunda sangria é as pessoas gastarem elevadas quantias com serviços que deveriam ser públicos, gratuitos ou módicos, nas áreas de saúde, educação etc., além de sofrerem  prejuízos com  saneamento e transportes inadequados e com energia injustificadamente cara,  devido às privatizações e à falta de investimentos públicos na infra-estrutura que ainda lhe cabe prover.
Os pobres e a classe média são mal atendidas ou nem o são, porque não têm como pagar clínicas, hospitais e escolas privadas, de qualidade, de resto, questionável e favorecidas pelo mercado com que o Estado lhes presenteia ao não proporcionar esses serviços à sociedade.
A terceira sugação são os juros escorchantes, múltiplos da taxa SELIC dos títulos públicos, de longe a mais alta do mundo, com 5,5% aa., corrigida a inflação. Chegam a cerca de 240% aa. no cartão de crédito, 180% no cheque especial e a 90% em empréstimos a pequenas empresas.
A quarta é adquirir bens e serviços a preços muitíssimo mais altos que os praticados em países mais dotados de indústrias intensivas de tecnologia, e mesmo que na Argentina, México e outros latino-americanos.
Exemplo gritante é a indústria automobilística transnacional favorecida com subsídios escandalosos desde o golpe de 1954, aumentados por JK. Isso prossegue, até hoje, com empréstimos do BNDES a juros baixos e n outras benesses prestadas às transnacionais em geral.
De fato, elas se cevam também com incríveis subsídios à exportação, desde o final dos anos 60 (Delfim Neto), - isentadas de gravames em suas superfaturadas importações – bem como com a isenção do ICMS na exportação, presenteada pela Lei Kandir/Collor. Cresceram no Brasil com capital formado no próprio mercado brasileiro e com dinheiro público.
Este ano, em oito meses, só as montadoras de veículos transferiram ao exterior mais de US$ 4 bilhões em lucros registrados, o que não inclui os ganhos com o subfaturamento de exportações e o superfaturamento de importações, nem os serviços superfaturados ou fictícios pagos às matrizes.
Agora, e mais uma vez, as montadoras estrangeiras foram agraciadas com proteção à “indústria nacional”, mediante elevações do IPI para veículos importados, alegadamente para evitar a “invasão” de carros chineses e coreanos. As montadoras aqui instaladas estão livres do IPI majorado, utilizando 65% de componentes produzidos no MERCOSUL.  A reserva de mercado, que não existe para a indústria nacional, mesmo porque acabaram com ela, tornou-se política governamental para favorecer os “investimentos diretos estrangeiros - IDES”.
Os IDEs estão na raiz dos problemas, inclusive o da dívida interna, cujos juros são a expressão maior da submissão do País à escravização financeira, em nível injustificável conforme os parâmetros que  balizam as taxas em todo o mundo. Por isso, a dívida adveio da capitalização de juros,  estando os bancos e os aplicadores financeiros entre os grandes beneficiários do modelo econômico e político que inviabiliza o Brasil como nação.
Para concluir: sem liderança capaz de compreender as grandes sugações e de identificar os causadores delas, não há como fazer que qualquer movimento popular leve às transformações que se impõem, por mais que ganhe ímpeto em função das insuportáveis condições de vida do povo.
[1]  Em Barcelona, 15.10.2011, 250 mil pessoas, segundo os organizadores, participaram de marcha encabeçada por cartaz onde se lia "Da indignação à acão. As nossas vidas ou os lucros deles.” Em Sevilha: 50 mil pessoas, com gritos de “Chamam-lhe democracia, mas não é”; “A solução: banqueiros na prisão”.
Adriano Benayon do Amaral é diplomata de carreira, Consultor Legislativo da Câmara dos Deputados e, depois, do Senado Federal, na Área de Economia, aprovado em 1º lugar em ambos concursos. Doutor em Economia pela Universidade de Hamburgo e Advogado, OAB-DF nº 10.613, formado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro. Foi Professor da Universidade de Brasília e do Instituto Rio Branco, do Ministério das Relações Exteriores. Autor de “Globalização versus Desenvolvimento”.benayon@terra.com.br

segunda-feira, 24 de outubro de 2011

José Sarney

"A burrice e a política"

Quando eu era presidente da República, em momentos difíceis, me aconselhavam a dar um “murro na mesa”. Eu respondia com paciência que havia dois perigos nessa atitude: ou quebrar a mesa ou quebrar a minha mão. Fui visitar Jânio Quadros quando estava muito doente, com grande dificuldade de levantar-se. Ao me saudar, sem perder aquela teatralidade que marcava seus gestos me disse: “Jô!, Jô! Jô!, não é Sarney. Nunca vi tanta tolerância e paciência”. Mas políticos encontramos de todos os tipos. Uns são bons, outros são maus. Mas não devemos julgar os políticos somente por estes, numa generalização deformada. Em geral, os maus políticos começam pela burrice e a burrice embota. Talvez este seja o menor defeito de um mau político. Este não depende do caráter nem de qualquer formação moral. Podemos dizer ser um defeito físico de nascença, assim como um pescoço torto. São burros e pronto! E não há nenhum milagre que cure a burrice. Eu sempre brinco que Jesus fez todos os milagres: fez cego ver, morto ressuscitar, aleijado andar, mas em nenhuma passagem do Evangelho há uma de que Cristo tenha transformado um burro em inteligente. Piores são os defeitos do ódio, da inveja, da maldade, da indignidade, da mentira, da desonestidade e o maior de todos, aquele que Santo Agostinho dizia ser o mais abjeto: a traição. E foi um poeta, Valéry, não foi um santo nem um político, que disse ser a mais repugnante das atividades humanas, a política “porque lida com a ingratidão”. Shakespeare, na tragédia de Macbeth, tem uma passagem em que ele diz “que a ingratidão é uma fúria com o coração de pedra”. Já Sartre com sua irreverência reagia com revolta dizendo que “quem mexe com política está sempre com a mão na m…”. Porque estas reflexões? É assistir o injusto debate de alguns idiotas sobre uma das maiores obras de amor e benemerência ao Maranhão que eu fiz: doar ao povo do Maranhão um patrimônio, que os outros presidentes venderam, do meu valioso arquivo de mais de um milhão de documentos, três mil peças de museu de obras de arte e uma biblioteca de mais de 30.000 livros, muitos raríssimos que acumulei ao longo de minha vida. E o fiz com grandeza, amor e desprendimento. Mais de cem mil pessoas, com presença registrada no livro de visitas, passaram na Fundação José Sarney, ponto de turismo e estudo da História do Brasil. Vejo nessa reação, reunidos, todos aqueles defeitos que movem o ódio político: a inveja, a burrice e a ingratidão.

José Sarney foi governador, deputado e senador pelo Maranhão, presidente da República, senador do Amapá por três mandatos consecutivos, presidente do Senado Federal por três vezes. Tudo isso, sempre eleito. São 55 anos de vida pública. É também acadêmico da Academia Brasileira de Letras (desde 1981) e da Academia das Ciências de Lisboa
jose-sarney@uol.com.br

“Dividocracia”: as dívidas odiosas começam a ser questinadas?

(Grécia, 2011, 74 min. -Direção: Katerina Kitidi e Aris Hatzistefanou)



Este documentário expõe a crueldade que move o neoliberalismo em seu afã por ganhar cada vez mais às custas do sacrifício de todos os demais setores da população. Ele também deixa claro que, com a decidida mobilização das maiorias populares, o monstruoso aparato financeiro pode ser derrotado. Vemos como as políticas econômicas neoliberais impostas pelos agentes financeiros da UE levam à bancarrota os países de sua periferia e os deixam maniatados às decisões das grandes corporações financeiras extranacionais. O interesse primordial é sempre a defesa dos ganhos dos grandes grupos financeiros dos países mais fortes, principalmente da Alemanha, em detrimento das maiorias populares dos países de segunda linha como Grécia e Irlanda.


O filme também nos mostra que é possível enfrentar com êxito às pressões dos aparelhos a serviço do capital financeiro mundial (FMI, Banco Mundial, etc.) quando os governantes do país ameaçado têm suficiente dignidade para colocar em primeiro lugar a satisfação das necessidades de seu povo, e não a obsessão por lucros dos magnatas financeiros. É o caso do Equador dirigido por Rafael Correa.


Este documentário expõe a crueldade que move o neoliberalismo em seu afã por favorecer cada vez mais os conglomerados financeiros às custas do sacrifício de todos os demais setores da população. Ele também deixa claro que, com a decidida mobilização das maiorias populares, o monstruoso aparato financeiro pode ser derrotado


Site Oficial: http://www.debtocracy.gr/
Download:
Torrent
Legendas pt-br 


Ou assista diretamente em parte única aqui


Agradecimentos à Juliana Mendes Svete, João Costa, Celestino Cele, Cristiane Adiala e Jair de Souza pela sugestão e links.

sábado, 22 de outubro de 2011

Não deixe de assistir ao filme "The American Dream" - O Sonho Americano (2011)



(EUA, 2011, 30 min. - Direção:Tad Lumpkin e Harold Uhl)

"Tudo que o homem não conhece não existe para ele. Por isso o mundo tem, para cada um, o tamanho que abrange o seu conhecimento."
(Carlos Bernardo González Pecotche)

Você sabe como o dinheiro é criado? Ou como funciona a banca? Por que disparam os preços da habitação e, em seguida, caem? Você realmente sabe o que o Federal Reserve System e como ele afeta você todos os dias? Você será desafiado a investigar algumas instituições muito arraigadas e poderosas naquele país. Apesar de ser uma animação que se utiliza da piada e da irreverência, aborda um dos assuntos mais sérios da Economia Global: os donos do dinheiro. Fatos que foram escondidos da população mundial durante gerações e gerações e que, agora, com o advento da Internet, estão sendo pouco a pouco revelados. Descubra quem são os Rothschilds, como eles conseguiram enganar toda a Inglaterra, obrigando-a posteriormente a adotar o sistema monetário do débito; surpreenda-se em saber que o FED americano (semelhante à Casa da Moeda) não é uma instituição pública, mas sim um banco privado e o que ele custa aos contribuintes norte-americanos. 



Para mais profundidade no assunto, veja também os documentários "The Money Masters" e "Money as Debt".

Site Oficial
Video original: http://www.youtube.com/watch?v=ZPWH5TlbloU

Said Barbosa Dib

Bernardo Cabral: uma referência para os homens de bem

José Bernardo Cabral. Grande ser humano, grande brasileiro, grande político, grande jurista, grande amigo. Foi sempre destaque. Um dos mais importantes personagens da História recente do país. Em breve lançará biografia. Parece que o título será "Cicatrizes orgulhosas do dever cumprido". É muita experiência acumulada. Tem muito que contar, pois foi presidente da OAB, na delicada época do atentado que matou a funcionária Lyda Monteiro. Tancredo Neves o queria como ministro, acabou relator-geral da Constituinte e ministro da Justiça de Collor. Bernardo Cabral participou de diferentes e importantes fases da vida nacional: ditadura, redemocratização, reordenamento constitucional do país. Foi sempre o primeiro em tudo que se propunha fazer. Estudou no Colégio Estadual do Amazonas, onde foi primeiro lugar de sua turma. Formou-se em ciências contábeis e foi, também, primeiro lugar em sua turma. Bacharel em direito pela Universidade do Amazonas, foi o mais jovem de sua turma e, mais uma vez, primeiro lugar. Começou a advogar com apenas 22 anos. Com 23 foi delegado de Roubos e Furtos da Secretaria de Segurança Pública do Amazonas; com 24 anos foi promotor de Justiça; com 25, chefe de Administração do Departamento de Assistência e Previdência Social (DAPS) e secretário de Segurança Pública do Amazonas. Foi, também, secretário do Interior e Justiça do Amazonas com 26 anos, chefe da Casa Civil do governo do Amazonas com 27 anos, deputado estadual no Amazonas com 30 anos, conselheiro da Ordem dos Advogados do Brasil - Seção do Amazonas - com 32 anos. Foi professor da Faculdade de Direito do Distrito Federal com 36 anos, quando também foi deputado federal pelo Amazonas. Em 12 de Fevereiro 1968, em plena ditadura, como líder do MDB, Bernardo Cabral fez discurso histórico acusando, com um conhecimento de causa impressionante, as investidas do Instituto Hudson, dos EUA, sobre a Amazônia brasileira. Os amazonenses, aliás, não podem esquecer que foi ele um dos responsáveis pela prorrogação da Zona Franca de Manaus até 2013. O espaço é pequeno para dizer tudo que o homem fez. Seu currículo possui vários títulos, condecorações, trabalhos e livros publicados. Vamos esperar a biografia. Em tempos bicudos de falta de patriotismo e de culto aos heróis e personalidades virtuosas, tempos preocupantes em que os animais e plantas substituem os grandes vultos históricos na efígie de nossa moeda, apreciar uma biografia como a de Bernardo será muito gratificante. Quero ser o primeiro a comprar. 

Said Barbosa Dib é historiador e analista político em Brasília. E, claro!, amigo de Cabral. 

quinta-feira, 20 de outubro de 2011

Paulo Fona

Fale, governador, fale ou mande alguém falar. Ou: pegar o avião e viajar não é política de comunicação

Nos quatro anos em que estive na Comunicação Social, como Secretário de Estado e Porta-Voz, jamais deixei de responder aos questionamentos da imprensa local ou nacional sobre as denúncias que existiam contra o governo Joaquim Roriz, no período 2002/2006. Em algumas ocasiões pedia – por absoluta falta de tempo – que a matéria fosse publicada posteriormente para que pudéssemos saber quais as razões dos atos governamentais, seja de um administrador regional ou de um secretário ou mesmo de funcionário não graduado.
Isso ocorria naqueles casos em que o repórter ligava às 20 horas para ouvir o governo sobre uma denúncia que seria a manchete do jornal no dia seguinte. Ás vezes, era atendido, às vezes não. Fazia parte do jogo político e da relação de Poder entre governo e veículos de comunicação. Mesmo assim, por diversas vezes, ouvi e rebati a acusação de que o então governo "controlava" a mídia local, o que era desmentido diariamente pela plena liberdade que os veículos tinham de informar a população sobre eventuais "malfeitos", para usar uma expressão da moda.
O que espanta, nos dias de hoje, é como o atual Governo do Distrito Federal, petista, supostamente "democrático e aberto à sociedade" esconde o governador Agnelo Queiroz e também se esconde, se omite em dar as necessárias explicações sobre o processo que responde no Superior Tribunal de Justiça (STJ) sobre a chamada "Operação Shaolin". Isso, em tempos de twitter, facebook, smartphones e todo o tipo de I (pad, phone, pod)!
Desde a campanha eleitoral de 2010 existem as denúncias contra Agnelo Queiroz e o esquema montado em sua gestão no Ministério dos Esportes e desde então o então candidato deixou de dar explicações – na campanha eleitoral preferiu recorrer à justiça eleitoral para impedir a divulgação de depoimentos de dois envolvidos, que davam testemunho de como os recursos das ONGS eram desviados. Mas não adiantou. Como se costuma repetir, a Justiça tarda, mas não falha! As denúncias continuam sem explicação cabal contrária e criou-se no GDF uma política de comunicação em que a melhor saída é pegar um avião, sumir por uns dias e esperar que a mídia, a Justiça, e a sociedade esqueçam os fatos. Não resolve!

Paulo Fona foi Secretário de Comunicação e Porta Voz do GDF (2002/06) e do Governo do Estado do Rio Grande do Sul (2007/09) e Coordenador da Comunicação da campanha de Joaquim e Weslian Roriz em 2010.

terça-feira, 18 de outubro de 2011

Portugal quer Auditoria Cidadã da Dívida


Jornais e movimentos sociais de Portugal divulgaram as resoluções aprovadas na Assembleia Popular ocorrida em frente ao Parlamento em Lisboa, após um gigantesco ato público que contou com cerca de 100 mil pessoas dia 15 de outubro. Dentre as Resoluções aprovadas, a formação de uma Auditoria Cidadã da Dívida em Portugal. O Jornal Ionline mostra que os movimentos sociais já estão colocando em marcha esta auditoria, conforme diz uma das participantes:
“deveremos fazer um anúncio sobre isso nos próximos cinco dias e esperamos que antes do Natal já haja uma plataforma criada” para pôr em marcha a auditoria”.
Toda esta mobilização tem sua razão de ser. O Portal G1
mostra a lista interminável de medidas nefastas programadas pelo governo português, com o objetivo de permitir o pagamento de uma questionável dívida:
“Os cortes nos salários de aposentados, funcionários e trabalhadores de empresas públicas, o atraso da aposentadoria antecipada e a ampliação em meia hora da jornada de trabalho no setor privado são apenas algumas das reformas divulgadas até o momento. O primeiro-ministro luso, Pedro Passos Coelho, tornou público alguns destes cortes -que vão além dos pactuados em abril em troca do resgate financeiro- na quinta-feira em declaração televisiva, revelando aos portugueses detalhes das medidas. Segundo publicou a imprensa lusa nesta segunda-feira, o Executivo decidiu diminuir as deduções na declaração da renda por despesas em habitação, saúde e educação. Também estão previstas alterações na taxa do IVA, entre elas ao setor da restauração, que passaria do tipo tributário intermédio (13%) ao máximo (23%). Os produtos petrolíferos, as bebidas alcoólicas e o tabaco figuram igualmente entre os principais candidatos a serem penalizados com maiores impostos. Também não escapariam as redes de colégios e hospitais, que sofrerão uma revisão para 'racionalizar' o mapa atual, causando o fechamento - ou a privatização - de dezenas deles. O enésimo pacote de medidas de austeridade que Portugal apresenta desde que o país entrou na chamada 'crise da dívida soberana', em 2010, se choca agora com uma forte contestação social. (...) Passos Coelho insistiu que sua prioridade é garantir que Portugal cumpra com os compromissos adquiridos com a União Europeia (UE)e o Fundo Monetário Internacional (FMI) como contrapartida da ajuda financeira ao país, um empréstimo de 78 bilhões de euros para os próximos três anos.”
Contra este pacote sem precedentes, os portugueses programam grandes mobilizações, tais como uma greve geral, o que será feito também pelos gregos por 48 horas nesta semana, quando será votado mais um duro conjunto de medidas que atendem aos interesses dos rentistas internacionais, conforme mostra o Portal UOL.
Por sua vez, o governo brasileiro aprofunda esta situação, acenando com o aporte de mais recursos para o FMI, sob o argumento de que desta forma o Brasil poderia ter maior controle sobre as decisões do Fundo, conforme mostra o jornal Valor Econômico. Porém, recentemente o Brasil já colocou US$ 10 bilhões no FMI, e o resultado disso foi a crescente imposição de medidas nefastas aos países europeus.

Tribos da Amazônia exigem o direito de mineração

Carlos Newton - Tribuna da Imprensa

É o primeiro passo rumo à independência política, econômica e administrativa.

Demorou, mas acabou acontecendo, como era mais do que previsível. As tribos indígenas da chamada Amazônia Legal, que detêm cerca de 25% do território brasileiro de reserva ambiental onde é proibida atividade econômica, estão mobilizados para defender a mineração nessas áreas de preservação. E não se trata de um movimento brasileiro, mas de caráter internacional.
Representantes de etnias do Brasil, da Colômbia, do Canadá e do Alasca preparam uma “carta declaratória” aos governos brasileiro e colombiano, reivindicando os direitos indígenas à terra e o apoio à mineração.
“Solicitamos ao Estado brasileiro a aprovação da regulamentação sobre mineração em territórios indígenas, porque entendemos que a atividade legalmente constituída contribui com a erradicação da pobreza”, diz o documento ao qual a Folha de S. Paulo teve acesso.
A mineração em terras indígenas é debatida desde a Constituição de 1988, que permitiu a atividade nessas áreas, caso regulamentado. O projeto de lei nº 1.610, que trata dessa regulamentação, está em tramitação no Congresso desde 1996.
Mas este é apenas o primeiro passo. Quando se fala em tribos indígenas, na verdade está se tratando de um movimento internacional muito poderoso, integrado pelas mais de 100 mil ONGs nacionais e estrangeiras que atuam na Amazônia. A reivindicação da extração mineral é apenas a ponta do iceberg. Os índios querem mais, muito mais.
Com a progressiva ocupação da Amazônia, a partir do período colonial as tribos foram se afastando, subindo os afluentes do Rio Amazonas, para ficarem o mais longe possível dos colonizadores. Resultado: por questões geológicas, as terras mais altas que hoje as tribos ocupam são justamente onde estão localizadas as mais ricas jazidas minerais da região.
As tribos na verdade estão exigindo que o Brasil reconheça e obedeça os termos da Declaração Universal dos Direitos dos Povos Indígenas. O Brasil em 2007 assinou esse tratado da ONU, que reconhece a independência administrativa, política, econômica e cultural das chamadas nações indígenas, mas depois se arrependeu e não quer cumprir as determinações do documento.
Se o governo brasileiro já estivesse cumprindo os termos do tratado, as tribos nem precisariam estar reivindicando o direito de mineração em suas respectivas reservas, porque seriam países independentes, onde nem mesmo as Forças Armadas brasileiras teriam o direito de entrar, segundo os incisivos termos da Declaração Universal dos Direitos dos Povos Indígenas, que está disponível a todos na internet, mas poucos se interessam em ler.
O tratado foi assinado pelo Brasil no governo Lula, quando Celso Amorim era ministro das Relações Exteriores. O fato de o Brasil ter aceitado sem ressalvas o acordo internacional, que foi rejeitado por vários países, como Estados Unidos, Nova Zelândia, Austrália, Rússia e Argentina, é um dos motivos do baixo prestígio de Celso Amorim junto à cúpula das Forças Armadas.

domingo, 16 de outubro de 2011

Ao mestre com carinho e respeito


Ele jamais se omitiu. Sua palavra vigorosa, suas verdades, suas denúncias, suas campanhas, incomodam e intranqüilizam maus brasileiros até hoje. Sempre pensou mais na coletividade. Combateu todos os governos. Nunca pleiteou nada pessoal. Foi cassado. Sem dúvida seria deputado federal, senador, governador e Presidente da República. Dedicou-se então ao jornalismo por inteiro. Ao lado e na frente do bom combate, das boas e legítimas causas nacionais. Sua pena firme e fulgurante visa os interesses do Brasil. Durante mais de 50 anos, façanha dos verdadeiros guerreiros, escreveu coluna diária e ainda fazia artigos. Lançou no jornalismo grandes profissionais. Criou revistas, editou colunas, trabalhou com dezenas de outros mestres. Conhece todos os assuntos. Escreve bem sobre todos eles. Profundo conhecedor também de esportes. Cobriu de perto muitas copas do mundo. Seus textos correm escolas e universidades. Sempre gostou de conversar, trocar idéias, debater, com os jovens. Sua vasta obra precisa virar livros. Encanta gerações. Tem leitores e admiradores em todos os setores de atividade. Frouxos, burros e hipócritas impediam sua presença na televisão. Suas verdades incomodam poderosos e oportunistas. Foi e é amigo de políticos e homens públicos importantes e famosos. Mas nunca pediu nada a eles. Recebia muita gente no gabinete. Um deles, jovem determinado e idealista, comunicou-lhe em primeira mão que seria candidato a Presidente da República. Foi mesmo e venceu a tudo e a todos. Só perdeu, mas adiante, para o devastador jogo sujo politico e parceiros da banda podre da imprensa e do empresariado. Corja atuante até hoje. Meu personagem dizia o que muitos dizem hoje, com banca de descobridores do ar: "Jornalismo não é relações públicas". É o brasileiro mais preso e confinado. Ia e logo voltava. O tempo trouxe-lhe adversidades familiares. Encarou todas elas com galhardia e fé, a exemplo do que fizera quando penalizaram o leitor, a imprensa, o bom senso e a democracia, com censores na redação e depois destruindo o jornal com bombas. Ama a família, tem adoração pelos netos, tem imensas saudades do filhão talentoso e querido. Sofre pelo irmão, também penalizado pelo dedo implacável das leis de Deus. Desde a década de 70 escrevo sob seu comando. Artigos assinados e artigos cruelmente cortados pelos censores, alguns publicados apenas com meu nome. Com o espaço em branco. Ou seja, o jornal saia quase todo em branco, mutilado. Outro grande veículo igualmente penalizado pela burrice da repressão colocava versos ou receitas nos espaços vetados. Ele preferia deixar em branco, para mostrar, enfatizar, aos leitores, a brutalidade da censura. Tenho ainda muito a dizer sobre ele. Faria com prazer. Deixo apenas estas linhas, como depoimento pessoal a um homem por quem tenho o maior carinho e amizade. Fico emocionado quando falo ou escrevo sobre ele. Estou com ele em todas as horas e circunstãncias. Assim, peço uma salva de palmas a este gigante Hélio Fernandes, que hoje(amanhã, 17) faz 90 anos de idade. Forte abraço e um beijo para você. Que Deus lhe dê forças.

Vicente Limongi Netto

sábado, 15 de outubro de 2011

Robério Braga

Manaus e o Leite de Colônia

Corria o ano de 1920. Manaus era ainda uma pequena cidade recolhida, sofrendo os desgastes da debâclé da economia da borracha. O centro comercial procurava reagir, sem conseguir acreditar o que se passava. Numa farmácia de esquina de rua era criado um produto que teria fama nacional: o Leite de Colônia. Como muitos outros apaixonados pela Amazônia, Carlos Guilherme Gordon Studart, nascido em Fortaleza (1862), depois de ter atuado na política do Ceará, notadamente na campanha da abolição da escravatura negra, veio para Manaus em 4 de junho de 1899, chegando no dia 12. De boa situação financeira aqui instalou uma Farmácia, a mesma que mantivera durante anos na terra de seu nascimento. Conseguiu instalar o estabelecimento na avenida Eduardo Ribeiro com a rua Municipal, depois Sete de Setembro, local privilegiado. Era um comércio promissor, com medicamentos de toda a sorte, “do que havia de mais moderno e acreditado”, conforme salientava a propaganda nos jornais. Sempre procurou intensificar suas ações comerciais e atuou na imprensa amazonense como proprietário e redator-chefe do jornal Comércio do Amazonas. Ficou por aqui até 1921, quando encerrou as suas atividades e seguiu para São Paulo. E foi neste curto espaço de tempo na capital amazonense que criou um produto inigualável. Teve vida longa, falecendo aos 103 anos de idade no Rio de Janeiro. Foi ele o criador do famoso Leite de Colônia com o qual conseguiu projeção comercial nacional. Produzido inicialmente no Laboratório da Farmácia Studart de Manaus, “com uma fórmula feliz e única no gênero desde o seu nascimento e depois plenamente consagrada”, como ele mesmo registrou depois. Na ocasião dos 25 anos de criação do produto ficou um registro singular, próprio da visão daqueles anos sobre o homem e o clima amazônicos, “ao organizar o Leite de Colônia, não havia visado nenhum interesse de lucro, mas apenas o de servir a uma grande multidão de pessoas que, numa região tropical como o Amazonas, sofria de afecções da pele. E foram essas pessoas que, fazendo a melhor propaganda do produto, estimularam a sua expansão por todo o país”, conforme o discurso de Arthur Studart que era farmacêutico, bacharel em direito, médico e industrial, filho do fundador da farmácia. Até hoje o Leite de Colônia faz sucesso nas prateleiras das drogarias e supermercados Brasil afora, conseguindo se manter em um mercado competitivo e sofisticado. Eta coisinha da boa, e que tem muitas serventias.

Robério Braga é secretário de cultura do Estado do Amazonas

Kátia Abreu

Um princípio do capitalismo

Na hora do lucro do banco, vale o mercado; na hora dos maus negócios, vale a socialização dos prejuízos

Capitalismo implica que os cidadãos e as empresas se responsabilizem por suas ações. Lucros e prejuízos são igualmente assumidos por aqueles que realizam seus empreendimentos, fazendo determinadas escolhas. Acontece que estamos, atualmente, vivenciando determinadas práticas capitalistas que se voltam contra o espírito do próprio capitalismo. O mercado financeiro tem sido uma amostra disso, com supostas alegações de que bancos não podem quebrar, apesar de maus negócios feitos, e, inclusive, altos executivos ganhando vultosos salários e dividendos. Na hora do lucro do banco, vale o mercado; na hora dos maus negócios, vale a socialização dos prejuízos.
Ressaltemos, nesse contexto, um exemplo nacional. Os bancos brasileiros, para justificarem o alto "spread" cobrado dos tomadores de empréstimos - que faz do Brasil, sétimo PIB do mundo, o segundo colocado em taxa de juros, só perdendo para Madagascar (129º PIB)-, usam do argumento de que seu valor elevado se deve aos inadimplentes. Ou seja, os que não pagam aos bancos, por uma razão ou outra, têm, de certa forma, o cálculo dos seus débitos transferidos para os que pagam, os adimplentes.
A situação é propriamente escandalosa, pois o banco se desresponsabiliza de um empréstimo malfeito e transfere essa responsabilidade para os que pagaram.
Se os bancos fizeram um mau negócio, deveriam se responsabilizar pelo prejuízo, não aumentando o juro dos que pagaram regularmente as suas contas. Em vez disso, o que acontece? Graças aos "spreads" cobrados, os bancos mantêm ou aumentam os seus lucros, pagando bônus régios aos seus dirigentes e acionistas. Há aqui um princípio de irresponsabilidade que causa dano aos próprios princípios do capitalismo.
Na verdade, o argumento utilizado para justificar os "spreads" é um argumento não capitalista, à medida que o capitalismo está assentado na liberdade de escolha e na responsabilização das ações, seja no âmbito individual, seja no âmbito empresarial.
É fato que o baixo volume de crédito disponível empurra para cima o "spread". Mas, para tornar o cenário ainda mais grave, esse reduzido volume é concentrado em poucas operações de grande porte - como fez o BNDES no governo passado. Tudo, sempre, direcionado para diminuir o risco das instituições bancárias na concessão de empréstimos.
Não surpreende, nesse sentido, que a imagem dos bancos seja tão ruim perante a opinião pública. Termina reforçando os preconceitos contra o capitalismo e contra os lucros como apropriação indevida. No caso em questão, trata-se, de fato, de uma apropriação indevida, e, para além dela, de um sério dano causado por empresas capitalistas ao próprio espírito do capitalismo. Capitalismo sem risco não é capitalismo propriamente dito. Do ponto de vista moral, cria-se, dessa maneira, uma casta de irresponsáveis, que não pagam do próprio bolso os prejuízos que sofrem. Se os bancos têm grande número de inadimplentes, o problema é deles - e não dos que assumem suas responsabilidades.
Façamos uma analogia para tornar o argumento ainda mais claro. O que acontece com um empresário, micro ou grande, que possui clientes inadimplentes? Ele deve arcar com o prejuízo, podendo, mesmo, ir à falência. Ele não pode transferir seu prejuízo aos seus clientes que pagam as contas em dia. Os produtores rurais também enfrentam o constante descasamento de preços de venda e custos de produção, sem nenhum tipo de seguro. Ou seja, o empresário, qualquer que seja o seu porte, urbano ou rural, arca com os riscos da sua atividade.
O mais surpreendente é que os governos não só aceitam os argumentos dos banqueiros e de seus executivos como ainda tomam decisões transferindo recursos dos contribuintes para salvar esses mesmos bancos cujos créditos podres ameaçam sua existência.
Os governantes, em nome do "bem público", extorquem do distinto público recursos que não lhes pertencem: os recursos dos contribuintes.

KÁTIA ABREU, 49, senadora (TO) e presidente da CNA (Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil), escreve aos sábados na Folha de S. Paulo, a cada 14 dias.

quinta-feira, 13 de outubro de 2011

Crise da Dívida: Grécia reage, Brasil se ajoelha cada vez mais

Por Auditoria Cidadã da Dívida



O Jornal Folha de São Paulo mostra que os servidores públicos gregos bloquearam hoje os ministérios, em protesto contra a demissão de 30 mil funcionários e o corte de salários e benefícios previdenciários. A Folha Online também mostra também mostra como o povo grego está pagando a dívida às custas da vida de muitos que não conseguem atendimento médico nos hospitais. Os cortes de gastos fizeram com que os orçamentos dos hospitais caíssem 40% entre 2007 e 2009, gerando escassez de profissionais e remédios. Alia-se a isto o grande aumento no desemprego, que faz as pessoas perderem seus planos de saúde, o que pressiona ainda mais o serviço público de saúde. Diz a notícia:
"Há sinais de que os resultados em termos da saúde das pessoas vêm piorando, especialmente nos setores vulneráveis da população", escrevem os especialistas. Entre 2007 e 2009, o número de gregos que qualificou seu estado de saúde como "ruim" ou "muito ruim" aumentou em 14%. O número de suicídios subiu 17% no mesmo período, e dados extra-oficiais de 2010 citados no Parlamento mencionam um aumento de 25% em relação a 2009. O ministro da Saúde relatou um aumento de 40% nos suicídios no primeiro semestre de 2011, comparado ao mesmo período de 2010. (...) "A violência também aumentou; os índices de homicídio e roubo quase dobraram entre 2007 e 2009."
Mas os rentistas não se importam com este verdadeiro genocídio, e enviam seus representantes – o FMI e a União Européia - para exigir mais cortes de gastos sociais da Grécia, como condição para a liberação de empréstimos que apenas servem para pagar a questionável dívida anterior. Notícia do jornal Estado de São Paulo
mostra que os “inspetores” destes organismos exigiram “mais ênfase nas reformas estruturais do setor público e da economia de forma mais ampla” e ainda disseram que “medidas adicionais devem ser necessárias para cumprir as metas de dívida em 2013 e 2014 e que o ímpeto de privatização e as reformas estruturais estão aquém do esperado.”
Enquanto isso, no Brasil, o governo
obedece às políticas do FMI, e corre para aprovar a prorrogação até 2015 da chamada “Desvinculação das Receitas da União” (DRU). Constante de várias Cartas de Intenção ao Fundo, este mecanismo permite ao governo utilizar como quiser 20% das receitas que deveriam ser aplicadas em importantes áreas sociais, como a saúde, assistência social e Previdência. Outra notícia do Estado de São Paulo mostra a declaração do Secretário-executivo do Ministério da Fazenda, Nelson Barbosa, de que a DRU é necessária para “viabilizar a queda da taxa de juros, o controle da inflação e a efetivação dessas taxas de crescimento”. Porém, o país pratica a DRU há mais de 15 anos e continua praticando os maiores juros do mundo, equivalentes a mais que o dobro da taxa aplicada pelo país segundo colocado.
Por sua vez, a Ministra do Planejamento, Miriam Belchior, chegou ao paradoxo de dizer que a DRU aumentaria os gastos sociais, dizendo que as vinculações orçamentárias (que são desfeitas pela DRU) “emperram gastos em investimento e seguridade social e "são camisa de força para ações necessárias para o país continuar crescendo." Porém, conforme reconhece
a própria Exposição de Motivos apresentada pelo governo, da proposta de prorrogação da DRU, este mecanismo é necessário para a “formação de poupança para promover a redução da dívida pública”, ou seja, o chamado “superávit primário”.
E
conforme mostra a ANFIP (Associação Nacional dos Auditores-fiscais da Receita Federal do Brasil), em 2010 a arrecadação de tributos da Seguridade Social - que atende as áreas da Saúde, Assistência e Previdência - foi R$ 58 bilhões superior às despesas destas importantes áreas sociais. Isto porque grande parte das receitas da Seguridade são redirecionadas para outros fins (principalmente o “superávit primário”) graças à DRU.


“Hora de abrir a caixa-preta da dívida interna brasileira”


O Jornal do Brasil traz o artigo “Hora de abrir a caixa-preta da dívida interna brasileira” (12/10), que repercute o Seminário Internacional “Alternativas de Enfrentamento à Crise”, realizado na semana passada. Diz o artigo:
“os palestrantes presentes deixaram bem claro: para evitar que a crise estrangeira se repita no Brasil no futuro, é preciso auditar a dívida interna do país. Na Europa, já há movimentos civis criando comitês de avaliação da dívida nos países mais prejudicados, como Grécia, Espanha e Portugal.”
Outros importantes veículos de comunicação também noticiaram o Seminário (
ver repercussão na imprensa), sendo que o Portal “Carta Maior” traz artigo (Crise da dívida na Europa ressuscita cobrança de auditoria no Brasil”) repercutindo a fala da Coordenadora da Auditoria Cidadã da Dívida, Maria Lucia Fattorelli:
“Para Maria Lucia, o Estado brasileiro não pode continuar destinando tanto dinheiro ao pagamento de juros da dívida, enquanto políticas sociais, como saúde e educação, ressentem-se da falta de verba. A entidade organizou nos últimos dias um seminário em Brasília, para discutir a crise global e o endividamento brasileiro, com a participação de delegações estrangeiras. Ao final do encontro, foi divulgada uma carta que “repudia a continuada violação” da Constituição e cobra uma auditoria “urgente”.
O Portal “New Internationalist” traz o artigo “
We are all Greeks” (“Somos todos gregos”), mostrando que movimentos sociais de vários países europeus articulam uma frente única contra a crise da dívida, sendo que uma estratégia chave neste sentido é a auditoria:

“The people’s ‘debt audit’ movement, started in Greece and Ireland, is gathering pace, with similar initiatives starting in France and Portugal. These ‘citizen auditors’ are investigating: Who took out the public debts? What was the money used for? And who is the money owed to?
‘People working in public bodies are coming to us, anonymously, with carrier bags full of information,’ said one of the movement’s founders, Georgos Mitralias.
The idea is to identify the debts that are illegitimate (or ‘odious’), in that they were improperly obtained or misused, and have them cancelled outright. Some would argue that might apply to most of the debt.”

Traduzindo:

O movimento popular pela Auditoria da Dívida, iniciado na Grécia e na Irlanda, está ganhando ritmo, com iniciativas semelhantes começando na França e Portugal. Estes "auditores cidadãos” estão investigando: Quem tomou as dívidas públicas? Para onde foi o dinheiro? E a quem o dinheiro é devido?
"Pessoas que trabalham em órgãos públicos estão vindo para nós, de forma anônima, com sacolas cheias de informações", disse um dos fundadores do movimento, Georgos Mitralias.
A idéia é identificar as dívidas que são ilegítimas (ou 'odiosas'), na medida em que foram indevidamente feitas ou usurpadas, e então cancelá-las. Alguns poderiam argumentar que isso pode se aplicar à maior parte da dívida”.
Neste sentido, vários e importantes meios de comunicação de Portugal
mostram que o movimento dos “indignados” defenderá, na manifestação mundial do dia 15, a bandeira da auditoria da dívida:
"Neste momento estamos a pagar algo que não sabemos de onde vem (...) nem a quem devemos", afirmou, numa entrevista à agência Lusa, Paula Gil, dirigente do Movimento Doze de Março (M12M), uma das quase 30 organizações que convocaram o desfile do próximo sábado na capital e noutras cidades do país.”

Veja também:

sexta-feira, 7 de outubro de 2011

Eixo Rio-São Paulo versus desenvolvimento sustentável do Norte?


Em tempos de debate sobre tablets, ZPEs e disputas com indústria paulista – e pensando na integridade da ZFM - amazônida Flávia Grosso pede exoneração da Suframa para se defender de calúnias

Leia o comunicado de Flávia Grosso:

Tive o privilégio e a honra de cumprir a missão que me foi dada de comandar a Superintendência da Zona Franca de Manaus – SUFRAMA – por oito anos e seis meses, ainda mais pelo fato de ser a primeira funcionária de carreira a assumir tal posto e tendo a certeza de que honrei a todos os meu colegas de trabalho ao agir dentro dos parâmetros de honestidade e eficiência que sempre nortearam minha conduta como servidora federal.

Sou amazonense. Nasci, cresci, constituí minha família e criei meus filhos no maior Estado de nossa Federação. Ingressei na SUFRAMA ainda nos idos de 1974 e sempre pautei toda minha carreira na honestidade, no respeito a subordinados e superiores hierárquicos, nos valores éticos e princípios cristãos.

Possuía razoável noção das dificuldades a serem enfrentadas e dos obstáculos que se imporiam, mas sabedora da capacidade da "Família SUFRAMA", a quem torno pública minha gratidão, entendi por enfrentar o desafio e, assim, colaborar ainda mais com o desenvolvimento da Zona Franca de Manaus e, via de consequência, de toda a região. Creio que a missão de gerar empregos e atrair novos investimentos foi cumprida a contento neste período e os números não permitem contestação: nunca o Polo Industrial de Manaus gerou tantos postos de trabalho, mais que o dobro do que se verificava quando assumimos.

Afirmo de maneira peremptória que sempre pautei a minha gestão no princípio da transparência, razão pela qual busquei atuar de forma preventiva e pontual ante qualquer indício de irregularidade, com abertura, inclusive, de procedimentos internos para averiguar os fatos.

Estar ciente de ter dado o meu melhor me conforta e me dá forças para não deixar que minha ilibada reputação seja destroçada por acusações tão fracas quanto um castelo de cartas. Não aceito e não deixarei que eu e minha família sejamos atacadas pelo infame. Toda tentativa de manchar meu nome se mostrará inócua e sairei ainda mais fortalecida para lutar contra as injustiças de que estou sendo vítima. Nenhum ato contra minha dignidade e de minha família será tolerado. Minha história de vida não permitiria isso.

Não posso permitir mais que inverdades sejam por outros utilizados “politiqueiramente” para denegrir e prejudicar o futuro do modelo Zona Franca de Manaus. Não faria isso antes, não farei agora, ainda mais quando a Zona Franca de Manaus atravessa momento de transição para rumos melhores e maiores. Não permitirei que aqueles que não têm compromisso com a visão de engrandecimento da geração de emprego e da qualidade de vida para todos aqueles que dependem da Zona Franca de Manaus continuem a prejudicá-la.

Assim, com o sentimento de gratidão e de dever cumprido, comunico que solicitei nesta sexta-feira, 07 de Outubro, minha exoneração do cargo de Superintendente da SUFRAMA, a fim de que possa, com a serenidade e paciência necessárias, me dedicar à defesa de minha reputação profissional e aos cuidados com a família, que tanto sofreu e sofre com estas injustiças.

Flávia Skrobot Barbosa Grosso

terça-feira, 4 de outubro de 2011

59% da população reprovam a política de juros da presidente Dilma

Os jornais noticiaram, dia 30, a pesquisa CNI/IBOPE sobre a popularidade da Presidente Dilma Rousseff. Apesar do viés positivo colocado pelos meios de imprensa, um fato pouco comentado é que a maior parte da população continua rejeitando importantes aspectos da política econômica e social: nada menos que 59% da população reprovam a política de juros, 55% reprovam a política de combate à inflação, 67% reprovam a política de saúde pública, 51% reprovam a política de educação, e 42% reprovam a política de combate ao desemprego. Isto mostra que, ao contrário do afirmado por muitos, a política econômica não é aprovada pela população brasileira, que também continua rejeitando fortemente a atual condução de políticas essenciais, como a saúde e educação. Estas áreas sociais carecem de mais recursos, mas que são consumidos pelas altas taxas de juros da dívida pública. Enquanto isso, os gastos com a dívida só aumentam. Notícia do jornal Correio Braziliense demonstra que em 2011 o país pagará o maior montante de juros da história: R$ 200 bilhões. Tal valor é subestimado, dado que é calculado com base na dívida “líquida”, e não na dívida “bruta”. Um instrumento utilizado para se retirar recursos da saúde e destiná-los para o pagamento da dívida é a Desvinculação das Receitas da União (DRU), criada pelo governo FHC e mantida por Lula. Agora, o governo Dilma quer prorrogar mais uma vez este instrumento até 2015, conforme mostra outra notícia do Correio Braziliense. A “oposição” (DEM e PSDB) se diz agora contra a DRU, embora a tenham criado. E a base aliada do governo (PT), que era contra o mecanismo na Era FHC, agora é a favor. Como resultado, mantém-se a velha política de priorização dos gastos com a dívida. Outra vítima é a Reforma Agrária: o Portal G1 informa que o próprio Presidente do INCRA culpa o contingenciamento (corte) de recursos do orçamento pela redução no número de assentamentos de famílias sem-terra.
Manifestantes reagem contra a sangria da Grécia
Os jornais do dia 27/09 (quinta-feira) noticiaram grandes manifestações em Atenas, contra mais uma medida exigida pelos rentistas: a elevação de impostos, para viabilizar o pagamento da dívida. Hoje o Parlamento aprovou a criação de um imposto sobre a propriedade de imóveis. A princípio, seria positivo, caso tal tributo tivesse progressividade, ou seja, tributasse os mais ricos. Porém, tomando-se como base as informações divulgadas na imprensa, a alíquota de tal imposto não será definida em função do valor do imóvel, mas em função da região onde esteja localizado. Ao que parece, o tributo máximo será de 10 euros anuais por metro quadrado, valor ínfimo para grandes milionários que morem, por exemplo, em grandes mansões de luxo, com valor de vários milhares de euros por m2. Na realidade, quem pagará essa conta, mais uma vez, será a classe média, enquanto o setor financeiro é que deveria ser pesadamente tributado. Além do mais, o novo tributo será cobrado na conta de luz, sendo que os que não pagarem terão a energia elétrica cortada, o que causou a ira da população, que foi às ruas e enfrentou a polícia. Esta medida se soma aos pesados cortes de gastos sociais e demissões de servidores. E foi adotada para tentar viabilizar a tomada de mais um empréstimo do FMI / União Européia, que permitirá o pagamento da dívida anterior, repleta de ilegitimidades. Este grande exemplo de luta do povo grego será mostrado no Brasil pela deputada do Parlamento da Grécia Sofia Sakorafa, que estará presente no Seminário Internacional “Alternativas de Enfrentamento à Crise”, a ser realizado em Brasília, de 5 a 7 de outubro de 2011. Sakorafa foi a única deputada a votar contra o pacote nefasto do FMI, imposto à Grécia no início da crise, no ano passado.