terça-feira, 18 de março de 2014

Criméia: mais uma crise produzida artificialmente


O ministro russo de Relações Exteriores Sergey Lavrov disse que a crise Ucrânia/Crimeia foi "produzida artificialmente, por motivos puramente geoestratégicos".  Acertou.  É importante entender que não se trata de caso único, mas apenas de mais uma numa longa sequência de 'crises' ou deliberadamente infladas ou artificialmente criadas pelas potências ocidentais, para promover seus próprios interesses geoestratégicos. O secretário de Relações Exteriores da Grã-Bretanha William Hague disse que a Crimeia é (seria) a "maior crise na Europa no século 21". Mas não é a primeira vez que políticos ocidentais falaram em tons tão alarmistas em anos recentes. Há exatamente 15 anos, em março de 1999, foi a 'crise' do Kosovo - com líderes ocidentais a 'declarar' que, a menos que a OTAN empreendesse ação militar urgente, milhares de albaneses kosovares seriam mortos por forças sérvias, as quais, como estávamos sendo 'informados', estavam engajadas em brutal guerra de genocídio. Dia 23/3/1999, o primeiro-ministro britânico Tony Blair disse, na Câmara dos Comuns: "Temos de agir para salvar de uma catástrofe humanitária milhares de homens, mulheres e crianças inocentes, da morte, da barbárie e da limpeza étnica, praticadas por uma ditadura brutal."[1]  Também foi 'crise' artificialmente criada, porque o que acontecia no Kosovo era conflito de baixa intensidade entre forças iugoslavas e combatentes do Exército de Libertação do Kosovo [Kosovo Liberation Army, KLA] apoiados pelo ocidente. O serviço do KLA era atacar forças iugoslavas, provocar resposta violenta de Belgrado, que pudesse ser usada como pretexto para a intervenção pela OTAN que destruísse um país socialista independente que resistira contra a globalização. Era indispensável criar uma 'crise', para justificar a ação militar da OTAN. Quatro anos depois, foi a 'crise' das Armas de Destruição em Massa do Iraque. Era preciso fazer alguma coisa contra armas mortais de Saddam que nos 'ameaçariam' mortalmente, todos nós - disseram os líderes ocidentais. Não podíamos esperar, sequer, que os inspetores de armas da ONU concluíssem sua inspeção. "Se não agirmos agora, voltaremos ao que já aconteceu antes e, claro, a coisa toda recomeça e ele prossegue no desenvolvimento daquelas armas e são armas perigosas, particularmente se caírem em mãos de terroristas que nós sabemos que querem usar aquelas armas se puserem as mãos nelas" - disse Blair.[2] Dia 28/4/2003, quando ainda não se viam nem sinal de armas de destruição em massa de Saddam, Blair disse: "Antes de começarem a gritar sobre a ausência de Armas de Destruição em Massa, sugiro que esperem um pouco mais." Já se passaram 11 anos, e ainda estamos esperando. Na década passada, foi a 'crise' nuclear do Irã. Ouvimos repetidamente a elite ocidental a repetir que a República Islâmica estaria desenvolvendo armas nucleares que seriam clara ameaça não só contra o Oriente Médio, mas para o mundo inteiro. Dar conta da 'ameaça' nuclear iraniana seria a nossa mais urgente prioridade. Em janeiro de 2011, o secretário britânico de Defesa Liam Fox alertou que o Irã já teria armas nucleares ao final de 2012. Mas até 2013 já se foi, e o Irã ainda não tem as tais armas nucleares. Depois, foi a 'crise' da Líbia em 2011. Contaram-nos que forças do coronel Gaddafi estariam massacrando gente inocente e estavam a um passo de lançar ataque genocida contra civis em Benghazi. Mais uma vez, teríamos de lidar com mais essa 'crise' urgentíssima. "Simplesmente não podemos parar e deixar um ditador cujo povo o rejeitou matar o próprio povo indiscriminadamente"[3] - declarou o primeiro-ministro David Cameron, vivendo um dos seus grandes dias de Tony Blair. "Confrontados com essa repressão brutal e a crescente crise humanitária, ordenei que naves de guerra dirijam-se ao Mediterrâneo. Aliados europeus declararam-se dispostos a enviar recursos para deter a matança" - disse o presidente Barack Obama, dia 28/3/2011.[4] Como no caso da 'crise' no Kosovo e da 'crise' das armas de destruição em massa no Iraque, a resposta ocidental à 'crise' na Líbia foi também um ataque militar. Em agosto de 2013, mais uma 'crise' - o ocidente a declarar que o governo sírio teria usado armas químicas mortais contra o próprio povo. Mais uma vez a conversa foi que teríamos de agir com rapidez e firmeza para enfrentar mais aquela 'crise'. Só a diplomacia russa e a opinião pública nos países ocidentais conseguiram impedir um ataque militar, pelos EUA ou liderado pelos EUA, contra a Síria. E agora, em março de 2014, a nova 'crise' é a 'invasão' de Putin na Ucrânia e a ameaça que a Rússia faz contra uma Ucrânia independente e 'democrática', embora governada fascistas. E essa, não esquecer, é "a maior crise na Europa no século 21".  De fato, nenhum dos eventos acima foi realmente crise alguma - incluindo a Crimeia. Não havia genocídio no Kosovo. O Iraque jamais teve armas de destruição em massa. O Irã não tem programa algum de produção de armas atômicas: foram, todas essas, "Crises Manufaturadas" [Manufactured Crisis]", para usar o título do novo livro do jornalista-investigador Gareth Porter.[5] A forças de Gaddafi não estavam massacrando civis na Líbia - nem Gaddafi algum dia ameaçou massacrar civis em Benghazi. As forças líbias faziam lá exatamente o que forças iugoslavas faziam em 1999: combatiam uma guerra contra insurgentes inflados e pagos pelo ocidente. Na Síria, todas as provas - além da lógica mais elementar - sugerem que foram os rebeldes, não o governo sírio, que lançaram o ataque químico em Ghouta - para tentar conseguir um ataque de intervenção militar por exércitos ocidentais. E, claro, não há nem houve qualquer "invasão" russa na Ucrânia.  Mas - e aqui está o ponto mais importante - as respostas ocidentais a essas 'crises' criadas artificialmente, elas, sim, geraram crises reais. A 'crise' do Kosovo foi 'enfrentada' com 78 dias de bombardeio brutal na Iugoslávia, que destruiu toda a infraestrutura do país e deixou milhares de mortos e feridos; e, porque a OTAN usou bombas de urânio baixo-enriquecido, levou a um pico no número de casos de câncer. Os direitos humanos, sim, também foram gravemente feridos. "Em nenhum local [na Europa] há tal nível de medo entre tantas minorias, depois que foram atacadas simplesmente pelo que são" - lia-se no relatório sobre o Kosovo, distribuído pelo Minority Rights Group International em 2006. A 'crise' das armas de destruição em massa do Iraque levou à invasão ilegal, da qual o Iraque ainda não se recuperou, nem dá sinais de conseguir recuperar-se ainda por muito tempo - com mais de 1 milhão de mortos e o país assolado por violento conflito sectário. O ano passado foi o mais mortífero no Iraque desde 2008, com mais de 7 mil mortos. Em 2002-3 os neoconservadores não paravam de falar da 'crise' das armas de destruição em massa no Iraque e de como seria necessária ação urgente. Agora, que a crise é real no Iraque, estão calados. A 'crise' nuclear iraniana levou a sanções draconianas impostas ao país - o que levou o povo iraniano a ter de enfrentar dificuldades extremas - (como noticiado por Russia Today) e a aumento acentuado no preço do petróleo também para a Europa, exatamente algo de que não precisávamos em tempos de forte recessão. Milhões de pessoas sofreram desnecessariamente por causa de medidas tomadas para enfrentar uma 'crise' que, para começar, nunca existiu. A 'crise' líbia de 2011 levou a um assalto brutal, pela OTAN, contra o país, que provocou milhares de mortes; a agora a Líbia, como o Irã, é país destroçado, ainda afligido por vasto conflito. Também nesse caso, os que não paravam de falar sobre uma "crise humanitária" na Líbia em 2011 mantêm-se hoje estranhamente silenciosos. A 'crise' gerada por um ataque de armas químicas que jamais aconteceu quase levou à eclosão de grande guerra regional e, pode-se supor, teria levado a uma 3ª Guerra Mundial, mas, na sua obsessão por derrubar o governo Baathista, o ocidente e seus aliados regionais ainda apoiam os rebeldes violentos e, assim prolongam o sofrimento da guerra para milhões de sírios. Agora, outra vez estão em ação os inventores seriais de 'crises, dessa vez tentando convencer-nos de que um referendo na Crimeia e a possibilidade de que a Crimeia, cuja população é formada de quase 60% de russos étnicos, volte à Rússia, seria uma grave 'crise'. E mais uma vez os passos que nos propõem - sanções contra a Rússia - só levarão a mais crises e a crises mais graves que a 'crise' inventada: as sanções serão desastrosas para as economias ocidentais, especialmente para as economias europeias. Ao mesmo tempo em que as elites ocidentais esperam que percamos o sono por causa de crises artificialmente criadas, como a da Crimeia, as verdadeiras crises, as crises reais que afetam a vida de milhões de pessoas comuns no ocidente e por todo o mundo são ignoradas por aquelas mesmas elites. O aquecimento global. O número recorde de desemprego entre os jovens. A distância sempre crescente entre ricos e pobres. A queda rápida no padrão de vida das pessoas comuns em todo o ocidente. Essas são as crises que governos seriamente democráticos deveriam estar enfrentando. Em vez de enfrentá-las, a elite ocidental prefere inventar crises novas. A história recente ensina que sempre que governos ocidentais e a empresa-imprensa que sempre lhes é servil só fazem falar de uma 'crise' internacional e alertar que "algo tem de ser feito", o melhor a fazer é nada. Absolutamente nada.  Concentremo-nos em enfrentar as crises reais - a destruição do meio ambiente, o crescimento da pobreza, da desigualdade e do desemprego. E não nos deixemos enganar pelas 'crises' artificiais, em direção às quais as elites ocidentais tentam desviar nossa atenção. 





quinta-feira, 13 de março de 2014

Comissão da UNALE debate renegociação da dívida dos estados



A Comissão Especial sobre a Renegociação da Dívida dos Estados com a União se reuniu, na segunda-feira (10), na sede da Unale, em Brasília, para debater estratégias para mobilização nas Assembleias Legislativas brasileiras. O encontro contou com a palestra da Coordenadora Nacional da Auditoria Cidadã da Dívida, Maria Lúcia Fattorelli. O encontro foi comandado pelo presidente da Unale, deputado Sérgio Leite (PT/PE), que ressaltou a necessidade de mobilizar os parlamentares estaduais para acompanhar o debate no Senado Federal. “Enquanto não mobilizarmos todos os deputados para cobrar mudanças emergenciais ao Governo Federal não haverá melhorias reais”, afirmou o presidente Sérgio Leite, que parabenizou a iniciativa do parlamento mineiro e gaúcho, que vêm acompanhando de perto o debate. Segundo Maria Lúcia Fattorelli, o Projeto de Lei 238/13, que tem votação prevista ainda para este mês, ainda não contempla a verdadeira necessidade dos Estados. “Mesmo com a diminuição da taxa de juros, a cobrança de juros em cima de juros, como é feito atualmente, é inconstitucional e extorsiva, especialmente se comparada com os benefícios cedidos pelo BNDES a empresas privadas com juros fixos inferiores a 6% ao ano”, afirmou. Também participaram do encontro os deputados Raul Carrion (PCdoB/RS), Miki Breier (PSB/RS) e Conceição Vieira (PT/SE). A Comissão da Unale participa, nesta terça-feira (11), de audiência no Senado Federal para acompanhar a tramitação do PL.

Governo desvia R$ 256 bilhões de recursos públicos para os bancos

Foto: memoria.ebc.com.br

Apenas em janeiro, gastos com juros somaram R$ 30,4 bilhões

Por Valdo Albuquerque (Hora do Povo)

Em janeiro, o desperdício de recursos públicos com juros totalizou R$ 30,399 bilhões, cifra recorde para o mês. Em 12 meses, foram desviados para o cofre dos bancos nada menos que R$ 256,606 bilhões, o equivalente a 5,30% do Produto Interno Bruto (PIB), segundo números do Banco Central. Não se pode dizer que a equipe econômica não tenha caprichado em favorecer o setor rentista. Afinal, desde abril do ano passado os juros já foram elevados oito vezes, atingindo o patamar de 10,75% ao ano, no mês passado. Aliás, uma diretriz que vem de cima. Após as manifestações de junho de 2013, em um simulacro de satisfazer “as vozes das ruas”, em reunião com governadores e prefeitos, Dilma anunciou cinco pactos, que não foram avalizados por ninguém, dos quais o primeiro ponto era exatamente o de “Responsabilidade fiscal e controle da inflação”. E apenas este foi cumprido à risca. Todos sabem que a tal da “responsabilidade fiscal” – também pode ser “robustez fiscal”, “consolidação fiscal” etc. – nada mais é que o “belo primário” do ministro Mantega. Ou seja, o desvio de recursos orçamentários para garantir o pagamento dos juros estratosféricos, estabelecidos pelo próprio governo, para os bancos. O que por si só já era contraditório com os três últimos pontos (Saúde, Educação e Transporte). O segundo item era o “Plebiscito para formação de uma constituinte sobre reforma política”. Pois bem, no ano passado, o setor público gastou com juros a astronômica quantia de R$ 248,856 bilhões (5,18% do PIB), a maior de todos os tempos. Não foi à toa a declaração do presidente do Bradesco, Luis Carlos Trabuco, de que o setor financeiro “está confortável com Dilma”. Se os bancos estão confortáveis, o mesmo não se pode dizer da indústria, nem dos trabalhadores, que entregaram em 2010 a então candidata Dilma a “Agenda para o Desenvolvimento” – reapresentada para a já presidente, após a 7ª Marcha da Classe Trabalhadora - e até hoje não tiveram nenhuma reivindicação atendida. Já a indústria, assolada pelos juros mais altos do mundo, por um câmbio desequilibrado e pela desnacionalização galopante vive o pior dos mundos. Para encobrir o seu fracasso, o governo tem recorrido ao marketing puro e simples. Depois de ver o PIB levar sucessivos tombos, com a institucionalização do pibinho, o governo resolveu espalhar que a variação do PIB do Brasil no ano passado (2,3%) foi o terceiro maior do mundo. Não foi (v. matéria nesta página). O resultado pífio de 2013 se deveu em muito ao péssimo resultado da indústria (1,3%), que nem compensou a queda de mais de 2% de dois anos anteriores. O desempenho maior ficou por conta da agropecuária (7%). Um grande sucesso esse, de retroceder ao modelo agro-exportador de antes da Revolução de 30. Afinal, a desindustrialização, consequência da desnacionalização, está aí e o governo ao invés de combatê-la a estimula, com sua política de atração de investimento direto estrangeiro (IDE) e de capitais especulativos para cobrir o rombo das contas externas.

Mauro Santayanna: “A OTAN e as Matrioskas”

Do blog do jornalista

Toda nação tem seus símbolos. Um dos mais tradicionais símbolos russos, à altura de Dostoiévski, e de Pushkin, são as Matrioskas, as bonecas de madeira, delicadamente pintadas e torneadas, que, como as camadas de uma cebola, guardam, uma dentro da outra, a lembrança do infinito, e a certeza de que algo existe, sempre, dentro  de todas as coisas, como em um infinito jogo de espelhos e surpresas. Ao se meter no complicado xadrez geopolítico da Eurásia, que já dura mais de 2.000 anos, o “ocidente” esqueceu-se dos russos e de suas Matrioskas. Para enfrentar o desafio colocado pela interferência ocidental na Ucrânia, Putin conta com suas camadas, ou suas Matrioskas. A primeira camada, a maior e a mais óbvia, é o poder nuclear. A Rússia, com todos os seus problemas, é a segunda potência militar do planeta, e pode destruir, se quiser, as principais capitais do mundo, em uma questão de minutos. A segunda é o poder convencional. A Rússia dispõe, hoje, de um exército quatro vezes maior que o ucraniano, recentemente atualizado, contra as armas herdadas, pela Ucrânia, da antiga URSS, boa parte delas, devido à condição econômica do país, sem condições de operação. A terceira é o apoio chinês, a China sabe que o que ocorrer com a Rússia, hoje, poderá ocorrer com a própria China, no futuro, assim como da importância da Rússia, como última barreira entre o Ocidente e Pequim.  A quarta Matrioska é o poder energético. Moscou forneceu, no último ano, 30% das necessidades de energia européias, e pode paralisar, se quiser, no próximo inverno, não apenas a Ucrânia, como o resto do continente, se quiser. A quinta, é a financeira. Com 177 bilhões de superávit na balança comercial em 2013, os russos são um dos maiores credores, junto com os BRICS, dos EUA. Em caso extremo, poderiam colocar no mercado, de uma hora para outra, parte dos bilhões de dólares que detêm em bônus do tesouro norte-americano, gerando nova crise que tornaria extremamente complicada a frágil a situação do “ocidente”, que ainda sofre as consequências dos problemas que começaram – justamente nos EUA – em 2008. Finalmente, existe a questão étnica e histórica. Para consolidar sua presença nas antigas repúblicas soviéticas, Moscou criou enclaves russos nos países que, como a Ucrânia, se juntaram aos nazistas, para atacar a URSS na Segunda Guerra. Naquele momento, o nacionalismo ucraniano, fortemente influenciado pelo fascismo, não só recebeu de braços abertos, as tropas alemãs, quando da chegada dos nazistas, mas também participou, ao lado deles, de alguns dos  mais terríveis episódios do conflito. Derrotados pelo Exército Soviético, na derradeira Batalha de Berlim, em 1945, os alemães sabem, por experiência própria, como pode ser pesada a pata do urso russo, quando provocado. E como podem ser implacáveis - e inesperadas - as surpresas que se ocultam no interior das Matrioskas.

Mauro Santayana é jornalista autodidata brasileiro. Prêmio Esso de Reportagem de 1971, trabalhou, no Brasil e no exterior, para jornais e publicações como Diário de Minas, Binômio, Última Hora, Manchete, Folha de S. Paulo, Correio Brasiliense, Gazeta Mercantil e Jornal do Brasil, onde mantém uma coluna de comentários políticos.

Energia: risco de racionamento não é tão “baixíssimo” assim


O governo federal está empenhado em reduzir os temores sobre a necessidade de um eventual racionamento de eletricidade, que poderia ter impactos imprevisíveis sobre o cenário eleitoral que se avizinha. Entretanto, a situação do setor está longe de ser confortável e a mera retórica não será suficiente para se contrapor à realidade dos fatos. Até há poucas semanas, as autoridades setoriais esbanjavam otimismo, afirmando que o risco de desabastecimento era inexistente. A tranquilidade oficial foi duramente abalada pelo apagão que afetou 14 estados, no último dia 4 de fevereiro, cujas causas ainda não foram reveladas. Em meados de fevereiro, uma nota do Comitê de Monitoramento do Setor Elétrico (CMSE), formado por representantes do governo na área de energia, afirmava que o abastecimento do País este ano está assegurado, salvo se houver uma piora nos níveis dos reservatórios das usinas hidrelétricas nos próximos meses, probabilidade considerada “baixíssima”. Na sexta-feira 14, o secretário-executivo do Ministério de Minas e Energia, Márcio Zimmerman, reforçou o novo discurso. “Não existe zero quando você trata de probabilidade e nem nunca se projetou um sistema para ser zero”, disse ele (G1, 14/02/2014). Depois, foi a vez do diretor-geral do Operador Nacional do Sistema Elétrico (ONS), Hermes Chipp, dar o seu recado. Segundo ele, o risco de desabastecimento estará afastado se o nível dos reservatórios no Sudeste e Centro-Oeste se mantiver entre 43% e 45% em abril, quando se encerra o período chuvoso. “Esse é o nível adequado para chegarmos ao período seco”, afirmou (Valor Econômico, 19/02/2014). O diretor aproveitou para criticar as discussões públicas sobre os problemas do setor elétrico, com informações pouco claras e de difícil entendimento para os não especialistas: “Estou preocupado, porque essa coisa de energia está banalizada, hoje todo mundo ‘entende’. Já repararam? Hoje, qualquer um fala de energia.” Para quem procura análises tecnicamente fundamentadas, que não tratam a geração elétrica como um mero problema de mercado, o Ilumina-Instituto de Desenvolvimento Estratégico do Setor Elétrico é sempre uma boa referência. Vejamos, pois, o que dizem os seus renomados especialistas. Uma rápida avaliação, publicada em 19 de fevereiro, vai direto ao ponto:

“Uma conta rápida:
“1. Atualmente, os reservatórios do Sudeste e Centro-Oeste estão com 35%. Pela declaração do ONS, é preciso que essa proporção suba para 45% em abril. Um aumento de 10% em pouco mais que 30 dias.

“2. As usinas térmicas não conseguem atender mais que 20% do consumo.

“3. Vamos supor uma carga de 30 TWh (terawatts.hora) no Sudeste, até abril. Portanto, as térmicas ‘cuidam’ de 6 TWh e sobram 24 TWh para as hidráulicas.

“4. O armazenamento máximo na região é de 145 TWh e, portanto, precisamos de 10% deste valor, mais os 24 TWh da carga que sobra para as hidráulicas. Necessidade total de energia natural até abril: 24 + 14,5 = 38,5 TWh.

“Dando uma olhada no histórico recente, disponível no site do ONS, a média da energia natural para o mês de março é de 35 TWh, sendo que os anos de 2001, 2002, 2003, 2009, 2012 e 2013, estiveram abaixo da média. Em compensação, 2011 nos deu 60 TWh.


“Portanto, essa meta não é impossível, mas fica claro que seria preciso receber energia dos rios acima da média ou receber grande parcela de energia das outras regiões. Resumindo: risco de racionamento significativo (grifos nossos).

Adriano Benayon: “A oligarquia deseja a depressão”

Foto: outraspalavras.net

2. As potências hegemônicas, suas associadas e satélites seguem em depressão econômica, com aspectos mais perversos que os da  iniciada em 1930 e que só terminou, em 1943, nos EUA - com a mobilização de dezenas de milhões de combatentes na Segunda Guerra Mundial, mais os vultosos investimentos para produzir armas. Na Europa e na Ásia, a depressão foi substituída pela devastação.

3. A terrível Guerra de 1939 a 1945 não foi desencadeada para acabar com a depressão, pois sempre os móveis são obter mais poder, arruinar potências vistas como rivais e desviar o foco dos reais problemas sociais e econômicos.

4. Agora, desde a contra-revolução liberal dos anos 80, a financeirização e a concentração do poder econômico e da renda deram grandes saltos, enquanto decai o patrimônio e a renda real, no caso da grande maioria dos que trabalham e no da crescente  massa dos desempregados.

5. Essa iniquidade jamais poderia ser tolerada sob sistemas democráticos. Assim, quase nada resta do pouco de democracia, antes presente nos sistemas políticos representativos, hoje mera embalagem, com rótulo falso,  de um sistema tirânico, que investe massivamente em contracultura, desinformação e alienação, há mais de século.

6. Assim,  institucionalizou-se  a mentira, e a verdade é reprimida através de instrumentos totalitários, radicalizados desde os ataques 11.09.2001.

7.  O terrorismo de Estado dirige-se contra os cidadãos e é  usado para marquetar, como justas, agressões militares genocidas contra países alvos da geopolítica da oligarquia angloamericana: Afeganistão, Iraque, Somália e Líbia.

8. Além disso, EUA, Reino Unido, Israel e satélites têm intervindo em numerosos países com golpes e pretensas revoluções suscitadas por serviços secretos, mercenários e organizações terroristas. Síria e Ucrânia são alvos preferenciais dessas agressões, sem falar nas permanentes pressões e falsas acusações contra o Irã.

9. O prelúdio da Segunda Guerra Mundial, nos anos 30, também apresentou invasões e conflitos localizados, e a ascensão de regimes fascistas (Itália, Alemanha e Japão), além de na Espanha, após sangrenta guerra civil, de 1936 a 1939, com participação de forças militares estrangeiras.

10. No presente, a depressão econômica prossegue, bem como suas trágicas consequências sociais. A oligarquia financeira está cada vez mais concentrada e tem cada vez mais poder sobre os governos – à exceção dos demonizados, por não se submeterem -  pela mídia e pelas demais instituições formadoras de opinião.

11. A oligarquia não deseja acabar com a depressão -  tarefa fácil, se fosse decidida – e visa concentrar mais poder e tornar irreversível o controle totalitário sobre o Planeta, seus recursos e habitantes.  Isso envolve desumanizar os seres humanos, inclusive acabando com as sociedades nacionais.

12. As soluções para recuperar a economia podem ser entendidas por qualquer pessoa sensata, não bitolada por lugares comuns disseminados pelos economistas mais renomados (justamente por agradarem a oligarquia).

13. A depressão dos anos 30, explodiu com violência, notadamente na Alemanha, exaurida pelas reparações da 1ª Guerra Mundial. Ali o desemprego atingiu 6 milhões em março de 1932.

14. Economistas competentes, como Lautenbach, alto funcionário do ministério da economia, mostraram o caminho correto, apoiado pela federação das indústrias, semelhante ao plano de Woytinski, sustentado por sindicatos de trabalhadores.

15.  Em 1931, Lautenbach apresentou o memorandum “Possibilidades para reviver a atividade econômica, através do investimento e da expansão do crédito”. Afirmou:

“O curso para superar a emergência econômica e financeira não é limitar a atividade econômica, mas aumentá-la, porque o mercado não mais funciona nas condições de depressão e crise monetária mundial.”

 “Neste momento, temos situação paradoxal, na qual, apesar dos cortes extraordinários na produção, a procura ainda está defasada em relação à oferta. Assim, temos excedentes crônicos da produção, com os quais não sabemos lidar. Encontrar algum modo de transformar esses excedentes em valor real é o problema real e o mais urgente da política econômica.”

“Excedentes de bens físicos, capacidade não-utilizada dos equipamentos produtivos e força de trabalho não-aproveitada podem ser aplicados para satisfazer uma nova necessidade, a qual, do ponto de vista econômico, representa investimento de capital. Podemos conceber tarefas como obras públicas, ou obras realizadas com apoio público - que para a economia significariam aumento da riqueza nacional -  e que teriam de ser feitas de qualquer modo, quando se voltasse a ter condições normais (construção de estradas, expansão do sistema ferroviário, melhoramentos na infra-estrutura, etc.)”

“Com tal política de crédito e investimentos, será remediado o desequilíbrio entre a oferta e a procura no mercado interno, e toda a produção terá ganhado direção e objetivo. Se, todavia, deixarmos de instituir tal política, estaremos encaminhados para inevitável e continuado colapso e para a completa destruição da economia nacional, levando-nos a uma situação que nos forçará, para evitar uma catástrofe, a assumir dívidas de curto prazo meramente para fins de consumo; enquanto que hoje, está ainda em nosso poder obter esse crédito para fins produtivos e, assim, recolocar em equilíbrio tanto a economia como as finanças públicas.”

16. Woytinski recomendou explorar oportunidades de complementar as iniciativas das empresas privadas com a criação de empregos, através de investimentos públicos. Propôs, ainda, a liberação de fundos, via políticas de expansão monetária para a reconstrução da Europa.

17. Em janeiro de 1932 foi apresentado o plano de criação de empregos WTB (Woytinski, Tarnow e Baade) para criar 1 milhão de novos empregos, com investimentos financiados por créditos de longo prazo, a juros baixos, pela Reichskredit AG, descontáveis no Reichsbank.

18. A Confederação Geral dos Trabalhadores Alemães aprovou esse plano, recusado, entretanto, conforme o parecer dos “peritos economistas” Hilferding, Naphtali e Bauer, pelo Partido Social-Democrata..

19. Schäffer, secretário de Estado do ministério das Finanças, apoiou o plano de Lautenbach.  Moção similar partiu de  Wagemann,  chefe do Escritório Nacional de Estatísticas, que, em janeiro de 1932, publicou seu plano, que incluía emitir 3 bilhões de  reichsmarks para criar empregos.

20. Nada disso foi adiante, pois não interessava à oligarquia angloamericana. Esta armava a subida de Hitler ao poder, mesmo tendo os nazistas perdido 2 milhões de votos nas eleições de 6.11.1932.

21. Após essas eleições, o presidente, marechal Hindenburg, nomeou chanceler o chefe do Estado-Maior, general von Schleicher, que propunha por em execução as políticas recomendadas por Lautenbach, Woytinski e Schäffer, e apoiadas por entidades de classe patronais e  dos trabalhadores.

22. A oligarquia financeira tratou de evitar que von Schleicher sequer as iniciasse, minando-lhe  a sustentação política, enquanto conspirava na chantagem junto ao marechal-presidente para nomear Hitler, consumada em 30.01.1933.

23. O objetivo era a Segunda Guerra Mundial, pois Hitler anunciara no “Mein Kampf” seu desígnio de atacar a União Soviética. Finalidade: empregos e recuperação econômica só mediante a mobilização para a guerra, que destruiria mutuamente Alemanha e Rússia.

24. Hoje, o Estado é enfraquecido como agente de desenvolvimento econômico e social. Ele  serve, nos  países-sede da oligarquia, para erguer enormes arsenais de armas destrutivas e hipertrofiar órgãos de repressão, serviços secretos e  meios tecnológicos de desinformar.

25. Nos países periféricos, como o Brasil, o Estado, empobrecido pelo serviço da dívida e pelas privatizações, funciona para arrecadar recursos para a dívida e subsidiar empresas transnacionais.

26. Com a política econômica dominada pela oligarquia financeira, a concentração não cessa de crescer. No trabalho The Network of Global Corporate Control, publicado em 2011, os matemáticos suíços, Vitali, Glattfelder e Battiston, demonstraram a interligação das corporações econômicas e financeiras por laços diretos e indiretos de propriedade.

27. Com dados sobre 43.000 transnacionais (ETNs), chegaram a 1.300 maiores companhias com fortes elos entre si, núcleo refinado para um de só 737 companhias, que controlam 80% das 43.000. Mais  elaboração permitiu chegar a 147, detentoras da propriedade quase total sobre si mesmas, mais 40% das 43.000.

28. As 147 são basicamente controladas por somente 50, das quais 48 são financeiras. Apenas duas envolvem-se diretamente com a economia real (Walmart e China Petrochemical Group).

29. Susan George, do Transnational Institute, Amsterdam, conclui: “Nossos problemas originam-se do 0,1%, na verdade do 0,001%.” Mas essa fração não retrata a dimensão infinitesimal, em relação à população da Terra, da minoria que concentra o poder econômico, financeiro e político.

30. De fato, existe hierarquia entre os donos das companhias mais poderosas, e, entre esses, muito poucos exercem comando sobre bancos centrais, instituições financeiras multilaterais e mercados financeiros.

31. George aponta as interligações entre a finança e as corporações de petróleo e gás, e seus vínculos com a indústria automotiva, gastadora de combustíveis fósseis.

32. O poder dos concentradores financeiros manifesta-se, inclusive, pelo fato de o 1% do topo pagar percentual de tributos inferior ao de qualquer época desde os anos 20, apesar da enorme elevação de seus ganhos e de seu patrimônio nos últimos 35 anos.

33. Mais: dezenas de trilhões de dólares/euros das emissões dos bancos centrais e das receitas tributárias foram usados para salvar da bancarrota instituições financeiras cujos controladores e executivos haviam lucrado dezenas de trilhões com jogadas financeiras, em operações alavancadas, sobre tudo com o quatrilhão de derivativos criados a impulsos de chips, antes do colapso de 2007/2008.

34.  Pior: o dinheiro posto nos bancos é aplicado em novas especulações, criando novas bolhas, prestes a estourar. A conta fica para os cidadãos dos países endividados, inclusive dos EUA, e maior para os dos menos privilegiados que não podem emitir dólares.

35. No Brasil, recordista mundial de juros altos, só dois bancos, Itaú e Bradesco registraram R$ 28 bilhões de lucros em 2013.

Adriano Benayon é Doutor em Economia pela Universidade de Hamburgo e Advogado, OAB-DF nº 10.613, formado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro. Foi Professor da Universidade de Brasília e do Instituto Rio Branco, do Ministério das Relações Exteriores. Autor de “Globalização versus Desenvolvimento”abenayon.df@gmail.com

Adriano Benayon: "Ucrânia e Brasil"

Foto: www.abi.org.br 

Guerra e depressão

O móvel da oligarquia financeira para desencadear guerras em grande escala, bem como  conflitos localizados, é ganhar mais poder, subordinando países e regiões ao império e enfraquecendo os que poderiam conter essa expansão.

2. Na 1ª e 2ª Guerras Mundiais, respectivamente França versus Alemanha e  Alemanha versus Rússia (União Soviética), as potências angloamericanas só se engajaram com intensidade,  no final,  para ocupar espaços, estando aqueles contendores desgastados.

3. As duas grandes conflagrações eclodiram após longos períodos de depressão econômica e serviram como manobra de diversão em face das consequências sociais e políticas da depressão.

4. No Século XXI, os conflitos armados grandemente destrutivos estão tornando-se mais frequentes após o golpe preparatório: a implosão das Torres Gêmeas, em setembro de 2001. 
5. Os principais alvos têm sido países islâmicos, envolvendo a geopolítica da energia. Desde 2001 o Afeganistão está sob agressão. Em 2003, destruição e ocupação do Iraque. Ataques a Sudão, Somália e Iêmen.  Em 2011 a brutal agressão e intervenção da OTAN na Líbia. Durante todo o tempo, pressão e hostilização a Síria e Irã.

6. Em 2013, a agressão à Síria foi intensificada com a  invasão por mercenários e extremistas, grandemente armados, com  participação das monarquias petroleiras do Golfo Pérsico, lideradas pela Arábia Saudita, e colaboração da Turquia e de outros membros da OTAN.

7. Mas, na Síria, o governo conseguiu resistir, com seus recursos e disposição  e  com apoio militar e político da Rússia, inclusive no Conselho de Segurança da ONU.

Ucrânia

8. O êxito, até o momento, dessa resistência, levou a potência hegemônica retornar a ataques mais incisivos contra a ex-superpotência, que busca reconstruir-se.  Daí, o recente golpe de Estado na Ucrânia.

9.  Ademais, Putin fortaleceu os laços econômicos e políticos da Rússia com a China e países da Ásia Central, frustrando a estratégia angloamericana de manter divididas e vulneráveis as potências  capazes de alguma resistência a seu projeto de governo mundial absoluto.

10. Claro que os EUA nunca deixaram de reforçar o cerco à Rússia, desde a desmontagem da União Soviética, instalando bases de mísseis em ex-aliados de Moscou, com destaque para a Polônia. Teleguiaram a “revolução laranja” na Ucrânia, em 2004, mais um marco no enfraquecimento desse país de consideráveis dimensões e recursos naturais  e população em grande parte russa.

11. Ao verem contida a intervenção na Síria – e presenciar o Irã muito pouco abalado pelas sanções e incessantes hostilizações -  os EUA trataram de atingir o flanco da própria Rússia.

12. Instaram a União Europeia (UE), sua virtual satélite, a fazer ingressar nela a Ucrânia, visando a pô-la na OTAN, colocando bases militares contra a Rússia virtualmente dentro desta.

13. Entretanto, o presidente da Ucrânia, Yanukovych, constitucionalmente eleito,  não concordou em aderir à UE sem discutir as draconianas condições impostas: adotar as medidas econômicas do figurino do FMI:  cortar em metade o valor das pensões, suprimir benefícios sociais, demitir funcionários, privatizar mais patrimônio público em favor de plutocratas, tudo para pagar dívidas com bancos ocidentais.

14. Essas são as medidas às quais estão amarrados os  pífios  empréstimos que   UE e EUA acabam de conceder  após o golpe, desencadeado a partir de conversa telefônica entre a Subsecretária de Estado dos EUA, Victoria Nuland, e seu Embaixador na Ucrânia.

15. Utilizaram-se as redes sociais e outros meios de arrebanhar massas descontentes  e as levaram à praça Maidan,  ignorando elas que suas lastimáveis condições de vida  vão piorar muito após o golpe.

16. A polícia foi acusada de autora dos disparos feitos por gangs neonazistas e outras extremistas, como foi constatado pela chefe das relações exteriores da União Europeia e pelo ministro do exterior da Estonia, conforme conversação telefônica entre ambos, cuja autenticidade foi confirmada pelo ministro: http://rt.com/news/ashton-maidan-snipers-estonia-946/.  

17. Isso é evidentemente omitido pela grande mídia, que só publica o que interessa aos governos dos EUA, aliados e satélites, todos subordinados à alta finança e ao big business. 

18.  Ninguém  deveria desconhecer que ela mente, 24 horas por dia, e ainda mais  desde a destruição, por dentro, das Torres Gêmeas em Nova York, golpe a partir do qual os EUA institucionalizaram mais instrumentos totalitários de repressão.

19. Mas engana muita gente, mesmo após ter sido desmascarada inúmeras vezes, como quando se comprovou ter o Secretário de Estado de Bush, Colin Power, mentido descaradamente sobre a existência de armas de destruição de massa no Iraque, negada pelo próprio  observador das Nações Unidas.

20. É ao big business que agrada o golpe na Ucrânia, após já vir lucrando, antes dele, em negócios com os oligarcas corruptos atraídos para a órbita da oligarquia financeira, principalmente britânica.

21. De fato, anunciam-se novos acordos com as petroleiras angloamericanas (Chevron etc.) para extrair  xisto,  pelo processo altamente poluente fracking, bem como a cessão de terras ao agronegócio norte-americano, Monsanto à frente, com intenso uso dos letais transgênicos e agrotóxicos, nas grandes extensões férteis da Ucrânia.

22. O destino dos ucranianos, se confirmado o ingresso na UE, não diferirá do que assola a Grécia, e se abaterá também sobre os russos e outras nacionalidades que vivem em territórios cedidos à Ucrânia pelo bêbado Kruchev.

23. Putin está agindo com extrema cautela, tendo-se limitado a apoiar o parlamento da Crimeia em seu desejo de unir-se à Rússia, reforçando efetivos militares na península e no mar.

24. A  China manifestou-se solidária à Rússia, inclusive por estar investindo na Ucrânia,  como faz em todo lugar suscetível de exportar alimentos e outras matérias-primas.

25. A renda por habitante da Ucrânia equivale  a 1/3 da russa, que não é alta, e a Rússia já acolheu três milhões de ucranianos em seu território. O agravamento das condições sociais levará a maior êxodo para a Europa Ocidental, que já tem enorme desemprego.

Brasil

26. O processo aqui em curso tem semelhanças com o da Ucrânia: insatisfação com as condições de vida e com a corrupção;  ignorância das causas desses males.

27. Na nova ágora da internet e redes sociais, circulam versões absurdas como a de que o governo petista tem por objetivo implantar o comunismo.

28. Na realidade, esse governo, como seus predecessores, depende do big business transnacional, cujo domínio intensifica os problemas do País: concentração, desnacionalização e desindustrialização da economia; dependência tecnológica.

29. Difundiu-se muito no Brasil vídeo em que uma jovem ucraniana defende  liberdade e democracia no errado contexto das massas iludidas na Ucrânia pelos mobilizadores do golpe. Na realidade, uma peça produzida por empresa de marketing político, sob os auspícios da agência norte-americana  “National Endowment for Democracy”.

30. Este e outros braços do império acionaram as ONGs a seu serviço, a par dos nazistas, conforme a tradição da CIA, desde o final da 2ª Guerra Mundial.  O que se vê na Ucrânia são   homicídios, vandalismo e torturas, reiteradas agora com tiros sobre manifestantes pró-Rússia.

31. O objetivo da oligarquia financeira angloamericana no Brasil, até para prosseguir apropriando-se de seus recursos de toda ordem, é intensificar a desnacionalização e demais instrumentos para enfraquecê-lo.

32. Os meios de controle da informação - inclusive espionagem eletrônica, hacking - combinam-se com a corrupção de todo o sistema institucional. A presidente  é acuada para aumentar o ritmo das concessões.

33.  Estão presentes as consequências das falhas estruturais da economia brasileira, que venho, de há muito,  denunciando, as quais se poderão manifestar de forma aguda após julho, apesar de haver eleições em outubro.

34. A crise brasileira tem face interna -  física e financeira -  como o serviço da dívida: R$ 900 bilhões para 2014; e face externa: déficit nas transações correntes com o exterior acumulando US$ 188,1 bilhões em três anos (US$ 81,4 bilhões só em 2013).

35. Além disso, seus efeitos econômicos e sociais podem ser agravados pelas repercussões do colapso financeiro no Hemisfério Norte, próximo de ressurgir.

Adriano Benayon é Doutor em Economia pela Universidade de Hamburgo e Advogado, OAB-DF nº 10.613, formado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro. Foi Professor da Universidade de Brasília e do Instituto Rio Branco, do Ministério das Relações Exteriores. Autor de “Globalização versus Desenvolvimento”abenayon.df@gmail.com