quinta-feira, 30 de maio de 2013

Voto eletrônico: Hacker de 19 anos revela no Rio como fraudou eleição


Publicado em 11 de dezembro de 2012 no Viomundo

Por Apio Gomes, no portal do PDT, via Amilcar Brunazzo Filho

Um novo caminho para fraudar as eleições informatizadas brasileiras foi apresentado ontem (10/12) para as mais de 100 pessoas que lotaram durante três horas e meia o auditório da Sociedade de Engenheiros e Arquitetos do Rio de Janeiro (SEAERJ), na Rua do Russel n° 1, no decorrer do seminário “A urna eletrônica é confiável?”, promovido pelos institutos de estudos políticos das seções fluminense do Partido da República (PR), o Instituto Republicano; e do Partido Democrático Trabalhista (PDT), a Fundação Leonel Brizola-Alberto Pasqualini. Acompanhado por um especialista em transmissão de dados, Reinaldo Mendonça, e de um delegado de polícia, Alexandre Neto, um jovem hacker de 19 anos, identificado apenas como Rangel por questões de segurança, mostrou como — através de acesso ilegal e privilegiado à intranet da Justiça Eleitoral no Rio de Janeiro, sob a responsabilidade técnica da empresa Oi – interceptou os dados alimentadores do sistema de totalização e, após o retardo do envio desses dados aos computadores da Justiça Eleitoral, modificou resultados beneficiando candidatos em detrimento de outros – sem nada ser oficialmente detectado. “A gente entra na rede da Justiça Eleitoral quando os resultados estão sendo transmitidos para a totalização e depois que 50% dos dados já foram transmitidos, atuamos. Modificamos resultados  mesmo quando a totalização está prestes a ser fechada”, explicou Rangel, ao detalhar em linhas gerais como atuava para fraudar resultados. O depoimento do hacker – disposto a colaborar com as autoridades –  foi chocante até para os palestrantes convidados para o seminário, como a Dra. Maria Aparecida Cortiz, advogada que há dez anos representa o PDT no Tribunal Superior Eleitoral (TSE) para assuntos relacionados à urna eletrônica; o professor da Ciência da Computação da Universidade de Brasília, Pedro Antônio Dourado de Rezende, que estuda as fragilidades do voto eletrônico no Brasil, também há mais de dez anos; e o jornalista Osvaldo Maneschy, coordenador e organizador do livro Burla Eletrônica, escrito em 2002 ao término do primeiro seminário independente sobre o sistema eletrônico de votação em uso no país desde 1996. Rangel, que está vivendo sob proteção policial e já prestou depoimento na Polícia Federal, declarou aos presentes que não atuava sozinho: fazia parte de pequeno grupo que – através de acessos privilegiados à rede de dados da Oi – alterava votações antes que elas fossem oficialmente computadas pelo Tribunal Regional Eleitoral (TRE). A fraude, acrescentou, era feita em benefício de políticos com base eleitoral na Região dos Lagos – sendo um dos beneficiários diretos dela, ele o citou explicitamente, o atual presidente da Assembléia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (Alerj), o deputado Paulo Melo (PMDB). A deputada Clarissa Garotinho, que  também fazia parte da mesa, depois de dirigir algumas perguntas a Rangel  - afirmou que se informará mais sobre o assunto e não pretende deixar a denúncia de Rangel cair no vazio. Fernando Peregrino, coordenador do seminário, por sua vez, cobrou providências: “Um crime grave foi cometido nas eleições municipais deste ano, Rangel o está denunciando com todas as letras –  mas infelizmente até agora a Polícia Federal não tem dado a este caso a importância que ele merece porque  ele atinge a essência da própria democracia no Brasil, o voto dos brasileiros” – argumentou Peregrino. Por ordem de apresentação, falaram no seminário o presidente da FLB-AP, que fez um histórico do voto no Brasil desde a República Velha até os dias de hoje, passando pela tentativa de fraudar a eleição de Brizola no Rio de Janeiro em 1982 e a informatização total do processo, a partir do recadastramento eleitoral de 1986. A Dra. Maria Aparecida Cortiz, por sua vez, relatou as dificuldades para fiscalizar o processo eleitoral por conta das barreiras criadas pela própria Justiça Eleitoral; citando, em seguida, casos concretos de fraudes ocorridas em diversas partes do país – todos abafados pela Justiça Eleitoral. Detalhou fatos ocorridos em Londrina (PR), em Guadalupe (PI), na Bahia e no Maranhão, entre outros. Já o professor Pedro Rezende, especialista em Ciência da Computação, professor de criptografia da Universidade de Brasília (UnB), mostrou o trabalho permanente do TSE em “blindar” as urnas em uso no país, que na opinião deles são 100% seguras. Para Rezende, porém, elas são “ultrapassadas e inseguras”. Ele as comparou com sistemas de outros países, mais confiáveis,  especialmente as urnas eletrônicas de terceira geração usadas em algumas províncias argentinas, que além de imprimirem o voto, ainda registram digitalmente o mesmo voto em um chip embutido na cédula, criando uma dupla segurança. Encerrando a parte acadêmica do seminário, falou o professor Luiz Felipe, da Coppe da Universidade Federal do Rio de Janeiro, que em 1992, no segundo Governo Brizola, implantou a Internet no Rio de Janeiro junto com o próprio Fernando Peregrino, que, na época, presidia a Fundação de Amparo à Pesquisa do Rio de Janeiro (Faperj). Luis Felipe reforçou a idéia de que é necessário aperfeiçoar o sistema eleitoral brasileiro – hoje inseguro, na sua opinião. O relato de Rangel – precedido pela exposição do especialista em redes de dados, Reinaldo, que mostrou como ocorre a fraude dentro da intranet, que a Justiça Eleitoral garante ser segura e inexpugnável – foi o ponto alto do seminário. Peregrino informou que o seminário  será transformado em livro e tema de um documentário que com certeza dará origem a outros encontros sobre o mesmo assunto – ano que vem. Disse ainda estar disposto a levar a denuncia de Rangel as últimas conseqüências e já se considerava um militante pela transparência das eleições brasileiras: “Estamos aqui comprometidos com a trasnparência do sistema eletrônico de votação e com a democracia no Brasil”, concluiu. (OM)

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terça-feira, 28 de maio de 2013

Funcionalismo vai às ruas pelo reconhecimento da nulidade da Reforma da Previdência


Por Auditoria Cidadã da Dívida

Portal do SINTRAJUD (Sindicato dos Trabalhadores do Judiciário Federal no Estado de São Paulo) noticia que os servidores públicos farão ato público no dia 10 de abril de 2013, em São Paulo. Conforme mostra a notícia:

Aprovada quando funcionava aquele esquema de compra de votos, a Reforma impôs várias maldades ao funcionalismo como a quebra da paridade, taxação de inativos, aumento da idade mínima para obtenção de aposentadoria. Além disso, a reforma de Lula abriu caminho para a privatização da previdência do funcionalismo com o Funpresp, que entrou em vigor no ano passado.”


Estudantes da UnB formam Grupo de Estudos sobre a Dívida Pública

Em reunião dia 2 de abril de 2013, estudantes da Universidade de Brasília e a Coordenadora da Auditoria Cidadã da Dívida, Maria Lucia Fattorelli, iniciaram o Grupo de Estudos sobre a Dívida Pública, conforme mostra o Blog do Grupo:

“…encaminhamos uma vontade expressiva de nos aprofundar no debate sobre a Auditoria da Dívida Pública brasileira, sobre a possível formação de um Grupo de extensão universitária, vinculando pessoas da comunidade, seja em Escolas ou outros ambientes, ultrapassando o terreno universitário e nos aproximando com as pessoas de fora da UnB. Também pensamos em construir, com o tempo, uma matéria vinculada a algum Departamento, aonde a temática da Dívida fosse abordada.”

Governo já destinou R$ 325 bilhões para a dívida em 2013

Apesar do Orçamento para 2013 só ter sido sancionado ontem à noite, o governo federal já destinou, nos primeiros 3 meses do ano, R$ 325 bilhões para juros e amortizações da dívida, o que representa 59% dos recursos gastos até 1/4/2013. Estes dados se encontram no Dividômetro da Auditoria Cidadã da DívidaEsse privilégio é amparado pela Lei de Diretrizes Orçamentárias 2013, cujo artigo 50 (inciso I) prevê que “Se o Projeto de Lei Orçamentária de 2013 não for sancionado pelo Presidente da República até 31 de dezembro de 2012, a programação dele constante poderá ser executada para o atendimento de despesas com obrigações constitucionais ou legais da União relacionadas no Anexo V”. Neste Anexo V, na página 9, item 29, se encontra o “serviço da dívida”.
 A proposta do “Orçamento Impositivo”

Agência Câmara mostra que a Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados aprovou a admissibilidade de diversas Propostas de Emenda à Constituição (PEC) que estabelecem o chamado “Orçamento Impositivo”, ou seja, a obrigatoriedade de o Poder Executivo gastar todos os recursos reservados no orçamento para as áreas sociais. Agora, será criada uma Comissão Especial para analisar estas PECs, que depois ainda terão de ser votadas pelos Plenários da Câmara e Senado. Em princípio, tal aprovação seria um avanço, dado que atualmente, diversas áreas sociais sofrem com o “contingenciamento”, ou seja, o corte de recursos para viabilizar metas de “superávit primário” (reserva de recursos para o pagamento da questionável dívida pública). Porém, é preciso ressalvar que esta aprovação ocorreu devido a um pedido do Presidente da Câmara, Deputado Henrique Eduardo Alves (PMDB/RN), para que apenas as chamadas “emendas individuais” sejam impositivas. Tais emendas representam apenas 0,42% do valor total do orçamento de 2013, e atendem a demandas pontuais de parlamentares, em suas bases eleitorais.
Portanto, será preciso bastante mobilização da sociedade para que o orçamento impositivo seja efetivamente implementado.
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Caso queira receber este material em seu correio eletrônico, envie mensagem paraauditoriacidada@terra.com.br

Farsa do voto eletrônico


Por Marcelo Nogueira/Tribuna da Imprensa

Quando se diz que o Brasil é uma democracia, é bom lembrar que, para começo de conversa, no Brasil, desde 1996, não há votação válida, conforme demonstrou o Prof. Diego Aranha, da UnB (Universidade de Brasília) em seu relatório técnico sobre a segurança das urnas eletrônicas. Este relatório foi elaborado em 2012, a partir de edital do próprio TSE (Tribunal Superior Eleitoral). A equipe do Prof. Diego Aranha conseguiu fraudar o sistema das urnas eletrônicas, recuperando a lista de votação completa durante o tempo de análise da urna. Só isso já seria o suficiente para condenar esse tipo de votação, pois é justamente o segredo do voto que permite que os oprimidos se libertem de seus opressores, além de ser uma garantia constitucional (art. 14, CRFB/88) protegida em cláusula pétrea (art. 60, par.4º, II, CRFB/88). Mas, não é só. Absurdamente, foi descoberto que uma senha, importante para decodificar todo o registro de votos, era justamente a hora de inicio de operação da urna. Detalhe: a hora de início da operação vem impressa nos boletins de urna que são enviados aos partidos. Ou seja, a senha para descobrir quem votou em quem era uma informação pública. É o voto de cabresto na era digital. Esse relatório foi julgado por uma banca, conforme as regras do Edital do TSE, que concordou que houve sucesso na execução da fraude. Foi enviado um relatório ao TSE para aprimoramento e correção das irregularidades, que foi respondido de forma vaga, sem explicitar qualquer detalhe ou mesmo quais os procedimentos que foram adotados. Mas, mesmo que houvesse votação válida no Brasil, só isso não seria suficiente para podermos dizer que vivemos numa democracia. Mas isso é outro assunto.

Marcelo Nogueira é advogado no Rio de Janeiro, membro do Instituto Brasileiro de Direito Tributário

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quinta-feira, 16 de maio de 2013

Povo quer fim de leilão do petróleo, afirma carta de entidades a Dilma

CUT, FUP, Contag, Fisenge, MST e outras entidades e movimentos sociais pedem que Dilma cancele o leilão

Decididos a barrar o lei lão do petróleo, previsto para estas terça e quarta-feira (14 e 15 de maio), e contra a privatização do setor elétrico, entidades de trabalhadores e movimentos sociais brasileiros enviaram uma carta à presidente Dilma Rousseff, assinada por diversas entidades, pedindo a suspensão do processo conduzido pela Agência Nacional do Petróleo e Gás (ANP) e advertindo a presidenta que o caminho das privatizações, que atingiu o auge no período neoliberal de FHC, é um erro estratégico que trará graves prejuízos ao Brasil e não é solução para o país.

Segue a íntegra da carta com algumas das dezenas de entidades que apoiam a iniciativa.

Carta à presidenta Dilma

Excelentíssima Senhora

Dilma Vana Rousseff

Presidenta da República do Brasil.

Brasília, 10 de Maio de 2013.

Excelentíssima,

Nós, movimentos populares e sindicais abaixo assinados, vimos, por meio desta, solicitar o cancelamento dos leilões de petróleo, previstos para os dias 14 e 15 de maio de 2013, bem como o cancelamento do processo, que prevê a privatização das hidrelétricas, de Três Irmãos em São Paulo e Jaguara em Minas Gerais, além de várias outras usinas, que podem significar cerca de 5.500 MW médios. Estes leilões significarão a retomada das privatizações em um dos setores mais estratégicos ao povo brasileiro. Entregar o petróleo e as hidrelétricas, que fazem parte do patrimônio da União ao capital internacional, será um erro estratégico.

Lembramos que o povo brasileiro, com seu trabalho e suas lutas, construiu um grande setor de energia no Brasil. A luta do "PETRÓLEO É NOSSO", juntamente com a utilização dos nossos rios para a produção de energia elétrica nos propiciou, por muito tempo, que estas riquezas estivessem, em certa medida, sob controle nacional, uma vez que o controle estava garantido pelo Estado.

Foi, sem dúvida, no período dos governos de Collor e Fernando Henrique Cardoso, que este sistema foi sendo destruído e entregue ao capital internacional, sob o pretexto de que não servia mais para o nosso país. As melhores empresas públicas foram entregues para o controle das grandes corporações transnacionais, prejudicando nosso país e os trabalhadores.

Nessas ocasiões, os setores neoliberais se apropriaram do discurso falacioso da ineficiência do Estado, especialmente na gestão das empresas públicas, com o objetivo de iludir o povo brasileiro com falsas promessas e entregar o patrimônio público para o "mercado".

Esta história nós já conhecemos bem. Depois da privatização, a energia elétrica aumentou mais de 400% (muito acima da inflação), trabalhadores foram demitidos e recontratados com salários menores e em piores condições e a qualidade da energia elétrica piorou muito. Quedas de energia, explosão de bueiros e apagões são consequências da privatização.

No setor do petróleo a realidade é semelhante, FHC quebrou o monopólio estatal e vendeu parte da Petrobras, e só não fez pior, porque foram derrotados na eleição de 2002.

Não é a toa que todo este processo foi chamado de PRIVATARIA. Mais de 150 empresas públicas - das melhores - acabaram sendo entregues aos empresários, a preços irrisórios.

O povo brasileiro votou em Lula duas vezes e em Dilma no ano de 2010, ciente de que aquilo que foi feito nos governos anteriores não era bom para o Brasil. A esperança vencia o medo e exigia que as privatizações tivessem um basta.

A extraordinária descoberta de petróleo na área chamada pré-sal, as enormes reservas de água, nosso território e nossas riquezas naturais exuberantes e, fundamentalmente, a capacidade de trabalho dos trabalhadores brasileiros, acenam para a construção de um país com enormes potencialidades, com possibilidades de usar e bem distribuir estas riquezas. E é isto que vemos ameaçado nesse momento.

Se as riquezas são tantas e boas para o país, por que entregar para as grandes empresas transnacionais as riquezas do povo brasileiro?

São as empresas do Estado Brasileiro, entre elas a Eletrobrás e a Petrobrás, que impulsionam o setor de energia em nosso país. É o Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social-BNDES, quem financia as demandas do setor. São as empresas de pesquisa do Estado que fazem os estudos. São as empresas estatais, em especial, o Sistema Eletrobrás que está ofertando eletricidade a preços mais baratos. Então, por que não discutir com nosso povo, unir forças e buscar soluções para que, tanto o petróleo quanto a energia elétrica, fiquem nas mãos do Estado, com soberania nacional, distribuição de riquezas e controle popular?

É fundamental que todos nós tomemos posição neste momento tão importante para o destino da nação. Defendemos o cancelamento dos leilões, que irão privatizar o petróleo e as usinas hidrelétricas, que estão retornando para a União.

Não temos dúvida de que, se consultado, o povo brasileiro diria: Privatizar não é a Solução.

Certos de que seremos atendidos em nossas proposições, nos dispomos a discutir, mobilizar nosso povo, buscar a união de todos para que estas riquezas sejam do povo brasileiro e com controle do Estado. Nos colocamos à disposição para discutir com Vosso governo e com o povo brasileiro.

Sem mais, aguardamos resposta".

Entre as entidades que assinam a carta estão: Central Única dos Trabalhadores (CUT), Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (CONTAG), Federação Única dos Petroleiros (FUP), Federação Interestadual de Sindicato dos Engenheiros (FISENGE), Federação Nacional dos Urbanitários (FNU), Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST), Sindicato Unificado dos Trabalhadores de Minas Gerais (Sind-UTE MG), Central dos Movimentos Populares (CMP), Federação Estadual dos Metalúrgicos – CUT/MG, etc.

Jornal Hora do Povo

Adriano Benayon


Brasil leiloado

1. A 11ª rodada de licitações do petróleo é novo marco na descida do Brasil para a condição de país de escravos.

2. São 289 blocos, em 11 Estados. As estimativas indicam que os blocos totalizariam, de 40 a 54 bilhões de barris in situ. Aplicado o fator de 25%, prevê-se produção de 10 a 13,5 bilhões de barris.

3. Muitos técnicos julgam provável haver mais petróleo nesses 289 blocos, todos em áreas fora do pré-sal, nas quais as reservas provadas até hoje totalizam 14 bilhões de barris. 

4. A Agência Nacional (???) do Petróleo (ANP) declarou que nos blocos licitados deverão ser descobertos 19,1 bilhões de barris de petróleo e gás, que serão exportados. O valor, na cotação atual, é quase US$ 2 trilhões.

5. Conforme a Lei 9.478/1997, outro marco da escravidão, ficaremos com royalties de 10% desse montante. Na média, os países produtores de petróleo recebem das transnacionais 80%do valor das receitas.

6. Peritos, como Fernando Siqueira e Paulo Metri, vão ao ponto: “a pergunta óbvia é ‘quem definiu que a exportação desse petróleo é a melhor opção para o Brasil’?”

7. Com a concessão de 30 anos para a exploração, a ANP espera arrecadar R$ 1 bilhão (0,25% do valor dos blocos), quantia insuficiente para reformar um estádio para a Copa, lembra o químico Roldão Simas. 

9. Na maioria dos países exportadores, suas empresas não dispõem de tecnologia para produzir petróleo. Por isso, necessitam recorrer às petroleiras transnacionais para extrair o petróleo do subsolo.

10. Nesses países as economias são pouco industrializadas. Faltam terras agricultáveis e suficiente dotação de água. Portanto, precisam exportar petróleo para importar alimentos, bens de consumo, equipamentos, serviços etc. Não é o caso do Brasil, cujo interesse é preservar esse recurso estratégico, tendente à escassez.

11. As petroleiras transnacionais vão importar equipamentos, componentes, insumos e serviços técnicos. Vão superfaturar os preços dessas importações e subfaturar os da exportação, além de omitir as reais quantidades exportadas.

12. Ademais, remeterão lucros oficiais e disfarçados. Assim, no líquido, resultará pouca ou nenhuma melhora do saldo das transações correntes, cujo déficit no Brasil, em aceleração, já é dos mais altos do mundo, em decorrência principalmente da desindustrialização e da desnacionalização da economia.

13. Então para que doar um recurso valioso e estratégico, depauperando as reservas (mineral não dá duas safras), em troca de royalties de apenas 1/10 das receitas da exportação declarada pelas transnacionais.

14. Que motivos, pois, afora abissal incompetência e/ou extrema corrupção, fariam as “autoridades responsáveis”, presentear as empresas estrangeiras com 90% das receitas? Trata-se de negócio ou de negociata?

15. Ainda por cima, a Lei Kandir, outro marco da escravidão, isenta a exportação de minérios de ICMS, PIS/Cofins e CIDE, cuja arrecadação propiciaria 30% das receitas. 

16. Então, para que exportar petróleo bruto, com baixo valor agregado? E por que não investir no refino e na petroquímica, para o mercado interno e para exportação?

17. Não faltam recursos públicos para financiar investimentos da Petrobrás (que os está buscando no exterior: mais endividamento). Porém, além de não os prover, o governo federal a descapitaliza, forçando-a importar derivados e a vendê-los aqui por preço igual ao da produção interna, congelado, por alguns anos, para deter a inflação.

18. Assim, a política entreguista leva a Petrobrás a reduzir, em relação às rodadas anteriores, a proporção de blocos que vai adquirir. Desta vez, ela se está, em geral, associando às estrangeiras.

19. A ANP ignora deliberadamente o desastre causado pela transnacional estadunidense Chevron, em novembro de 2011 (poço de Campo do Frade, na Bacia de Campos). Ora, a própria ANP, reconheceu que o brutal vazamento de 3.700 barris de óleo poderia ter sido evitado, se a Chevron tivesse observado as regras de segurança.

20. Os impactos ambientais e sociais altamente danosos, ligados à exploração de petróleo, impeliram organizações da sociedade civil a requerer ao Judiciário a suspensão da 11ª Rodada.

21. A pressão da sociedade terá de ser forte, ir além das manifestações, haja vista o histórico do Judiciário, semelhante aos do Executivo e do Legislativo. E, se não se detiver a fúria entreguista, a ANP, esta fará, ainda este ano, leilão para a área do Pré-Sal, além da 12ª rodada para outras áreas.

22. Uma das muitas ações ajuizadas, em 1997, para anular o leilão de privatização da Vale do Rio Doce, teve ganho de causa, em 2005, na 2ª instância, havendo o Tribunal Regional Federal de Brasília declarado fraudulento o leilão e anulado a privatização. Mas o BRADESCO recorreu, e, até hoje, o processo segue engavetado no STJ.

23. De resto, os leilões são inconstitucionais, porquanto a Constituição de 1988 prescreve que o petróleo pertence à União, e não há norma explícita na CF quanto a concessões em matéria de petróleo.

24. Prejuízos adicionais para o País decorrem de as multinacionais usarem mão-de-obra terceirizada e padrões de emprego inferiores aos da Petrobrás. Isso implica ínfima geração de renda para brasileiros e maior risco de acidentes e mortes.

25. Fala-se de 47 empresas estrangeiras habilitadas para o leilão e de 17 brasileiras, na maioria, dirigidas por testas-de-ferro.

26. Assinala Fernando Siqueira: “Além do cartel internacional, vão participar dos leilões as estrangeiras da Associação dos Produtores Independentes do Petróleo, formada por 18 empresas. Destas 14 são multinacionais, inclusive a El Paso, uma das sete irmãs.

27. Paulo Metri: “As empresas estrangeiras não querem construir refinarias no Brasil para exportarem derivados. Querem declaradamente exportar petróleo in natura.”

28. Ele esclarece que os blocos marítimos se têm mostrado os mais produtivos e os que exigem mais investimentos, 80% dos quais são para as plataformas. 

29. Ainda Metri: “A 1ª rodada aconteceu em 1999 e, desde então, empresas estrangeiras arrematam blocos e nunca compram plataformas no Brasil. Tampouco encomendam desenvolvimento tecnológico aqui. Só quem compra plataforma e desenvolve tecnologia no Brasil é a Petrobras. A maior parte da geração de empregos se dá com a encomenda da plataforma. Quem aqui não compra, quase não gera emprego.

30. A Associação dos Engenheiros da Petrobrás (AEPET) esclarece que essa é a única empresa que maximiza a compra de materiais e equipamentos no País, propicia o desenvolvimento tecnológico e contrata técnicos brasileiros.

31. Ademais, segundo a AEPET, além de os blocos ora licitados terem sido descobertos pela Petrobrás, também o foram os do pré-sal.

32. Após o entreguismo monolítico do período FHC, em que, inclusive foi criada a ANP, e nela instalados diretoria e quadros técnicos, vinculados à oligarquia financeira anglo-americana, o geólogo Guilherme Estrela foi nomeado diretor de exploração da Petrobrás no governo Lula.

33. Então foram descobertos, de janeiro a agosto de 2003, 6 bilhões de barris dos 14 bilhões das reservas provadas atuais. Estrela reativou também o grupo de pesquisadores do pré-sal, e, em 2006, teve início a perfuração nessa província, com êxito em 2007, obtendo-se reserva de mais de 100 bilhões de barris.

34. Lula fizera aprovar a Lei 12351/2010 para capitalizar a Petrobrás através de cessão onerosa, através da qual a União cedeu um conjunto de blocos onde se esperava encontrar 5 bilhões de barris. A Petrobras pagou com títulos do Governo, e este comprou ações da Petrobrás com esses títulos.

35. A Petrobrás então descobriu o campo de Franco, com reservas de 6 a 9 bilhões de barris e o de Libra, onde há reserva de 15 bilhões de barris. Conforme a nova lei, a ANP pode contratar com a Petrobrás, sem licitação, a exploração das áreas consideradas estratégicas. 

36. Entretanto, intervindo, mais uma vez, contra o Brasil, a ANP retirou o campo de Libra da cessão onerosa à Petrobrás e quer leiloá-lo. Segundo Siqueira, a diretora da ANP, perguntada sobre as razões disso, não respondeu e diz que esse bloco será “o grande atrativo” do próximo leilão.

37. As potências imperiais, com suas fundações e instituições e com as locais, igualmente movidas a dinheiro, têm incutido na maioria dos brasileiros a mentalidade dos escravos, inclusive através da destruição dos valores, da educação e da cultura, enquanto os acostuma a tolerar condições cada vez mais degradantes de vida.

38. Isso ocorre de forma intensa e crescente, desde agosto de 1954. Assim, o desafio para quem deseja dignidade para si e para seus compatriotas, é desenraizar aquela mentalidade. Isso exige grandes e persistentes esforços, e tem de ser feito em menos tempo que os 40 anos passados por Moisés, no deserto, a transformar a mente de seus seguidores.

Adriano Benayon é Doutor em Economia pela Universidade de Hamburgo e Advogado, OAB-DF nº 10.613, formado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro. Foi Professor da Universidade de Brasília e do Instituto Rio Branco, do Ministério das Relações Exteriores. Autor de “Globalização versus Desenvolvimento”.

abenayon.df@gmail.com


terça-feira, 14 de maio de 2013

Mauro Santayana



O Petróleo é Nosso

A Petrobras desfigurou-se quando o governo dos tucanos paulistas e cariocas decidiu entregar a exploração do petróleo a empresas estrangeiras. Uma evidência da entrega: todos os países exportadores de petróleo cobram das empresas estrangeiras royalties, em média, de 80%: em petróleo. O Brasil, por decisão desses senhores, só cobra dez por cento do óleo extraído — e em dinheiro. Na realidade, essas empresas são donas de todo o petróleo produzido, cuja descoberta se deve à própria Petrobras.

Mais do que o petróleo, vindo do solo, a Petrobras extraiu da alma brasileira a sua orgulhosa consciência de povo. Essa consciência vinha sendo construída em difíceis passos políticos, confrontada com a cumplicidade das oligarquias coloniais com a Metrópole, na exploração do trabalho escravo e no saqueio sistemático da natureza, desde o século 17. É bom registrar que ela sempre se associou aos nossos recursos naturais, do pau-brasil ao ouro e a outros minerais.

A Independência, em 1822, serviu para o surgimento de grupos mais atilados, com ideais democráticos e republicanos, ainda que prevalecessem os interesses oligárquicos. A confluência do movimento abolicionista com a campanha republicana, a partir de 1870, acabaria com as duas instituições caducas, a escravatura e a monarquia. Mas, fora a pequena elite pensante das grandes cidades, não havia consciência de nação. No campo, os grandes fazendeiros viam o país como um território repartido entre eles, senhores das terras e dos que nelas trabalhavam e viviam.

Só na segunda década republicana houve quem associasse o desenvolvimento industrial ao bem-estar dos trabalhadores — mas esses visionários foram violentamente reprimidos pelos governos, a serviço das oligarquias e das empresas estrangeiras. Elas controlavam as incipientes manufaturas e o comércio exterior com a venda de nossos produtos primários – e a importação de bens de consumo, em sua maioria supérfluos.

A partir dos anos 20, começou a esboçar-se o que podemos entender como a assunção do Brasil, como ele é: uma nação de imigrantes, mestiça de mamelucos e cafuzos, de negros e brancos, de europeus nórdicos e meridionais — e de gente do Oriente Médio e da distante Ásia. Nesse sentido, apesar de seus críticos, a Semana de Arte Moderna, de 1922, teve a sua marcante influência. O Brasil desembarcou definitivamente da Europa com o atrevimento dos intelectuais, muitos deles brasileiros de primeira geração, que tornaram nobre o que antes se considerava vulgar.

Foi então que despimos as sobrecasacas, trocamos as ceroulas por cuecas, e as mulheres se livraram dos espartilhos para que suas formas desabrochassem sob a regência de uma sensualidade tropical. Nesses anos 20, em certos momentos sem uma orientação política e ideológica coerente, surgiram os partidos de esquerda e os movimentos de rebeldia militar com os tenentes, como a gesta heroica, mas prematura, da Coluna. Tudo isso conduziria à Aliança Liberal de 1930, empurrada, como sempre ocorre, pelo confronto de interesses políticos pessoais de personalidades fortes, associado ao conflito das forças econômicas regionais. 

É interessante notar que, nesses decênios iniciais do século 20, o petróleo já se situava no centro da disputa geopolítica das grandes potências — e desde a Primeira Guerra Mundial, com o desembarque inglês, comandado pelo coronel Lawrence, na Península Árabe. O livro de Essad Bey, A luta pelo petróleo, é a melhor fonte para entender as intrigas entre os estados e os milionários no esforço pelo controle das jazidas.

Em 1928, como narra Monteiro Lobato em seu livro sobre o assunto (O escândalo do petróleo), os soviéticos, preocupados em diminuir o elevado consumo de álcool entre seus soldados, propuseram ao Brasil trocar petróleo – do qual grande parte de seu território era, e continua, encharcado – por café brasileiro. Acreditavam que a nossa bebida contribuiria para aliviar o alcoolismo de suas tropas. Os Rockefeller, donos da Standard Oil e líderes das grandes petroleiras, impediram que fizéssemos o negócio.

Com Getulio, dentro das amarras do tempo, começamos a levar o problema a sério, com o Conselho Nacional do Petróleo, criado em 1938, e sob a chefia do general Horta Barbosa. Todas as atividades petrolíferas se encontravam sob o controle do Estado, que poderia conceder a exploração e o refino, dentro dos interesses nacionais. Enfim, em 1953, criou-se a Petrobras.

O lema da campanha popular, O petróleo é nosso, transcendia de seu enunciado. Não era só o petróleo que era nosso. Queríamos dizer que o Brasil, com o petróleo e tudo mais, pertencia-nos, como povo. Na medida em que a Petrobras se consolidou — mesmo sobre o cadáver de Getulio — entendemos que éramos um povo capaz de conduzir, soberanamente, o seu próprio destino.

Se não fosse essa consciência, adquirida nas lutas populares, Juscelino não teria sido eleito em 1955, e não teríamos dado o grande salto, dos cinqüenta anos em cinco, durante o seu qüinqüênio: construímos trechos de ferrovias, grandes eixos rodoviários e erigimos Brasília, porque a criação e os primeiros êxitos da Petrobras diziam-nos que éramos um povo tão capaz como qualquer outro, e poderíamos, com isso, construir definitivamente a nossa soberania.

No entanto, a partir do governo presidido por Fernando Henrique Cardoso, a Petrobras tem sido submetida a lenta, mas criminosa, desconstrução. O Estado vendeu, no exterior, as ações preferenciais da empresa, transferindo assim, em forma de dividendos, os esforços dos técnicos e trabalhadores brasileiros, que, com o seu êxito, ajudaram-nos a criar a consciência de nação soberana.

A Agência Nacional do Petróleo, ao que parece a isso autorizada pelo cimo do governo, decidiu colocar em leilão, hoje, e pelas regras que remontam a Fernando Henrique, centenas de lotes de exploração de petróleo na costa brasileira. Trata-se de áreas em que a Petrobras investiu centenas de milhões em pesquisa e que serão entregues, em sua maior parte, e ao que se prevê, a empresas estrangeiras.

Segundo cálculos da Associação dos Engenheiros da Petrobras, divulgados pelo seu ex-presidente Ricardo Maranhão, e pelo seu atual vice-presidente, Fernando Siqueira, o valor desses depósitos fósseis é superior a um trilhão e cem bilhões de reais. As entidades representativas dos trabalhadores da Petrobras estão sem recursos para custear as ações na Justiça, e a empresa não pode ou não quer tomar estas providências. É o caso de os donos do petróleo, ou seja, os cidadãos brasileiros, abrirem uma conta e contribuírem com o que cada um puder, para constituir um fundo de defesa do petróleo. De novo temos de ir às ruas para dizer que “o petróleo é nosso”. O lema da campanha pode ser, outra vez, O petróleo é nosso. 

Mauro Santayana é um jornalista autodidata brasileiro. Prêmio Esso de Reportagem de 1971. Trabalhou, no Brasil e no exterior, para jornais e publicações como Diário de Minas, Binômio, Última Hora, Manchete, Folha de S. Paulo, Correio Brasiliense, Gazeta Mercantil e Jornal do Brasil, onde mantém uma coluna de comentários políticos.

Petróleo: assista ao vivo à 11ª rodada de licitações


A 11ª Rodada de Licitações será realizada nos dias 14 e 15 de maio de 2013, no Hotel Royal Tulip, no Rio de Janeiro. O evento sesta sendo transmitido ao vivo pela Internet, a partir das 9h dde hoje, dia 14/5. Serão licitados 289 blocos, totalizando 155,8 mil km², distribuídos em 11 Bacias Sedimentares: Barreirinhas, Ceará, Espírito Santo, Foz do Amazonas, Pará-Maranhão, Parnaíba, Pernambuco-Paraíba, Potiguar, Recôncavo, Sergipe-Alagoas e Tucano. Dos 289 blocos, 166 estão localizados no mar, sendo 94 em águas profundas, 72 em águas rasas, e 123 em terra.

  • Veja outras informações sobre a 11ª Rodada de Licitações no site das Rodadas
Fontes: SCI/ANP/Diário do Amapá

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Sondagem revela jazida de petróleo em Macapá

Clique aqui para ver a transmissão ao vivo da 11ª Rodada (a partir das 9h do dia 14/5). Ou veja abaixo:


Fernando Alves de Oliveira

Sindicalismo e Política

Como um dos setores mais representativos da nacionalidade, o sindicalismo deveria ser um inesgotável manancial na forja de bravos e valorosos artífices, imbuídos da nobre missão da representação popular nos mais variados segmentos da vida política do País. Filosófica, doutrinária e institucionalmente falando, sindicalismo e política personificam a arte de representar e servir. Infelizmente, porém, não é o que observa nesta nossa indubitável república sindicalista de um decênio, recheada de pecaminosos episódios que depõe contra a moralidade pública. Historicamente, o período mais negro da vida republicana. Nossa estrutura democrática é sustentada por pilastras presumíveis e aparentemente firmes. Quando, no entanto, submetidas a uma radiografia mais profunda e apurada, constata-se que são suscetíveis a um devastador processo de corrosão, determinado por agentes que vão desde a manifesta ausência de espírito público, até imperdoáveis e irreprimíveis rastilhos de corrupção, que, com frequência assustadora, se multiplica em portentosa e irremovível praga. Ademais disso, o Estado brasileiro não consegue livrar-se do perfil parasitário, mercê de sua voluptuosa e incontida sanha de arrebanhar impostos, tributos, contribuições e ônus sem fim, num verdadeiro e consentido saque ao bolso do contribuinte. O custo Brasil é exorbitante. O custeio da máquina pública é simplesmente intolerável. Todos os políticos que até hoje conhecemos – e sem nenhuma exceção de doutrina partidária- fora do poder têm visão correta daquilo que está em desacordo e que necessita ser reparado. Quando candidatos, a retórica torna-se ainda mais precisa e formidável. Os discursos são ainda mais eloquentes. Suas plataformas eleitorais que preveem seus planos de governo, “se eleitos”, são de uma preciosidade ímpar. Irreparáveis. Mas assim que tomam posse... Ah, aí é outra história. Com raras e honrosas exceções, a regra predominante estriba-se na falação, desaguando na óbvia e fatal perpétua enganação. Em todos os níveis de mandato. No Executivo ou Legislativo. O que –a eles, é claro- de fato impera e importa é a preservação e a perenidade do poder. Nesse expediente surgem cada vez mais especialistas. Alguns, até revelando excepcional talento nato. Mas na hora da ação, pouquíssimos são os que correspondem ao voto sufragado por seus pobres mortais e enganados eleitores. Leia-se: todos nós. Esta é uma triste e lastimável realidade e que compete a todos nós o dever de desdobrar-nos ainda mais na busca de sua superação, se realmente desejarmos construir uma real e efetiva democracia, cujas ações não contemplem minorias, mas sim a coletividade como um todo, a exemplo do que identicamente deveria ocorrer nas entidades sindicais brasileiras, em consonância com as suas basilares premissas institucionais: as de representar e servir dignamente. A Nação exige dignidade e patriotismo dos seus homens públicos. Por seu incomensurável gigantismo, o Brasil se faz merecedor de representantes com ações voltadas às legítimas questões do efetivo interesse popular e não as de grupos ou grupelhos. Lastimavelmente, -e a exemplo do que ocorre na vida intestina dos sindicatos- os verdadeiros interesses da coletividade são invariavelmente procrastinados em detrimento de menores. O que se vê claramente é que ao tempo do avanço da corrupção, a impunidade se aprofunda, a insatisfação popular cresce e o sentimento de impotência de todos ante a mediocridade da classe política anã torna-se cada vez mais latente. Até quando é a grande questão a ser respondida. Pelos detentores do poder político e sindical. Ou pelas urnas de ambos.

Fernando Alves de Oliveira é Consultor sindical patronal, autônomo e independente, autor dos livros “S.O.S. SINDICALpt” e “O sindicalismo brasileiro clama por socorro”, editados pela LTr, além de dezenas de artigos (vide acervo em http://falvesoiveira.zip.net) e de palestra direcionada.

sexta-feira, 10 de maio de 2013

A crescente desnacionalização da indústria no Brasil. Entrevista com Adriano Benayon.

Em entrevista ao Clube de Engenharia, Adriano Benayon fala sobre a crescente desnacionalização da indústria brasileira


Adriano Benayon. 

O Portal da Engenharia publica, a seguir, entrevista exclusiva com o economista e diplomata Adriano Benayon, autor de Globalização versus Desenvolvimento, 2ª edição, da Editora Escrituras/SP. Benayon é consultor em finanças e em biomassa, Doutor em Economia pela Universidade de Hamburgo, bacharel em Direito, pela Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ, diplomata de carreira, com postos na Holanda, Paraguai, Bulgária, Alemanha, Estados Unidos e México, e delegado do Brasil em reuniões multilaterais nas áreas econômica tecnológica. Consultor Legislativo da Câmara dos Deputados e do Senado Federal na área de economia, professor da Universidade de Brasília (Empresas Multinacionais; Sistema Financeiro Internacional; Estado e Desenvolvimento no Brasil), Adriano Benayon tem muito a acrescentar ao movimento nacional que o Clube de Engenharia fez avançar ao lançar, em 2011, o manifesto em defesa da engenharia e da empresa brasileira de capital nacional. 

Clube de Engenharia - Qual processo socioeconômico nos trouxe até o atual quadro de alarmante desnacionalização? Em que diferimos do resto do mundo? Quais especificidades fazem o país ser vítima desse processo?

Adriano Benayon - Antes de resumir o processo da desnacionalização, falemos da anterior construção da indústria nacional.

Até a derrubada de Getúlio Vargas, em 1954, através de um golpe militar orientado pelos serviços secretos das potências hegemônicas (EUA e Reino Unido), o Brasil vinha formando, desde os primeiros decênios do século XX, expressiva industrialização, principalmente no Estado de São Paulo, com empresários nacionais, boa parte deles imigrantes e seus descendentes. Foi a fase em que a substituição de importações foi feita principalmente por empresas de capital nacional. Para isso houve uma combinação favorável de fatores: a) dificuldades na exportação do café, devidas à depressão mundial dos anos 30, com desvalorização de nossa moeda; b) os fabulosos recursos naturais do País, inclusive a excelente dotação de terras férteis, suscitando interação entre a demanda do campo e a dos centros urbanos com as novas indústrias, não limitada aos bens de consumo; c) a 2ª Guerra Mundial, quando exportações foram reativadas, mas houve menos oferta de produtos estrangeiros; d) o crescimento natural da população, incrementado pela entrada de mais imigrantes, em número mais baixo que o anterior à 1ª Guerra Mundial, mas, com gente, na média, melhor qualificada, ao aproximar-se a 2ª Guerra e durante ela; e) a criação, por Vargas, de serviços e empresas estatais de grande porte em áreas estratégicas, o controle do subsolo, os institutos de previdência etc. O potencial do País e sua promissora industrialização não eram do agrado das potências anglo-americanas, as quais, mal terminada a 2ª Guerra Mundial, promoveram a primeira derrubada de Vargas, em 29.10.1945, embora este já estivesse por sair, não sendo candidato às eleições de 03.12.1945. Eleito o Mal. Dutra, apenas pelo apoio de Vargas, que, assim derrotou o Brig. Eduardo Gomes, candidato de seus opositores, Dutra, ex-simpatizante dos regimes fascistas, aderiu aos desígnios do império anglo-americano, que usava o anticomunismo como instrumento para mais facilmente dominar o País. Ainda assim, a industrialização nacional, embora prejudicada, de 1946 a 1949, não foi de todo interrompida, uma vez que, em menos de um ano, a abertura comercial desbragada levou a enorme desequilíbrio nas contas externas, fazendo que a própria taxa de câmbio se encarregasse de propiciar alguma proteção à indústria local. Getúlio Vargas, em 1951, retorna à presidência, eleito pelo voto direto do povo, retoma e amplia medidas tomadas antes de 1945. Vem a criação da Petrobrás (no período anterior fora a Vale do Rio Doce e a Companhia Siderúrgica Nacional, a Fábrica Nacional de Motores), o projeto de fundação da Eletrobrás, o BNDES e um sem número de políticas pró-desenvolvimento preparadas por sua assessoria financeira, sob a direção de Rômulo de Almeida. Estava, portanto, bem encaminhada a plena e verdadeira industrialização do País, pois somente com predominância de capital nacional e desenvolvimento de tecnologia dentro das empresas nacionais é viável que ela dure e se desenvolva. Passo à desnacionalização. Ela começa com o que muitos pensam erroneamente ser a intensificação da industrialização, notadamente no quinquênio de JK (1956-1960) e nos mandatos de Médici e Geisel (os falsos milagres econômicos). Porém, isso foi uma industrialização inconveniente, porque dependente do exterior, financeira e tecnologicamente. Na realidade, ela conduziu o País para a desindustrialização, evidente desde os anos 90. Desde agosto de 1954, após a derrubada de Vargas, a desnacionalização foi promovida por governos egressos de golpes militares sob direção estrangeira, ou de eleições comandadas pela pecúnia, no quadro de instituições políticas adrede constituídas. Ela se deu por meio de cooptação e de corrupção e também por efeito da dependência cultural, formada pela mídia e por universidades. Foi reforçada pelo deslumbramento diante dos requintes da “civilização” dos países imperiais e da difusão das realizações destes, sem se cogitar que muito dessas “maravilhas” resultou do saqueio das periferias. O governo militar-udenista, de 1954/1955, instituiu vantagens absurdas em favor do capital estrangeiro, inauguradas com a Instrução 113 de 17.01.1955, da SUMOC (Superintendência da Moeda e do Crédito). Essa Instrução propiciou às multinacionais importar máquinas e equipamentos usados, sem cobertura cambial, registrando o valor a eles atribuído pela multinacional, como investimento estrangeiro direto, em moeda. Desse modo, os bens de capital entraram, no Brasil, mais que amortizados com as vendas em vários mercados, de dimensões, cada um dos quais, dezenas de vezes maior que o brasileiro. Em consequência, as promissoras indústrias de capital nacional, formadas na 1ª metade do Século XX, foram sendo dizimadas, impossível que era concorrer com grandes empresas transnacionais, ainda por cima, operando no Brasil com capital e tecnologia a custo zero. Assim, a Volkswagen apossou-se de mais de 50% do mercado de automóveis, com o Fusca, de tecnologia desenvolvida nos anos 30, produzido para o mercado europeu, vinte anos antes de o ser no Brasil. Ora, a amortização dos equipamentos ocorre em cerca de cinco anos. Tal é a desinformação reinante no País, que a maioria dos brasileiros associa JK ao desenvolvimento. Ele se proclamava desenvolvimentista, mandava tocar obras, mas não entendeu ou não quis entender como se chega ao desenvolvimento. JK não só manteve, mas ampliou os subsídios e facilidades para os investimentos diretos estrangeiros (IEDs). Eleito, antes de tomar posse, visitou diversos países em missão para atrair esses “investimentos”. Assim, o País posto nos trilhos do modelo dependente, continuado sob os governos militares, e acentuado pelo filo-norte-americano Castello Branco (1964-1966), ao dar a Roberto Campos a posição de czar da economia. Esse fez devastar grande número de empresas de capital nacional, restringindo gastos e investimentos públicos, limitando e encarecendo o crédito, para inviabilizar as indústrias e as outras empresas nacionais. A implantação da Fiat, nos anos 70, com recursos do governo de Minas e incentivos federais, é um dos exemplos escandalosos do modelo de dependência tecnológica, financeira e cultural prevalecente no Brasil. A “proeza” está sendo repetida, pois mais de 70% da nova fábrica da Fiat em Pernambuco é montada com dinheiro público. Como essa, n outras montadoras transnacionais têm sido implantadas em outros Estados com subsídios, incentivos e doações inimagináveis. O mesmo ocorre em outros setores. Tem havido devastadora guerra fiscal para atrair investimentos estrangeiros, na qual governadores e prefeitos oferecem a empresas transnacionais estrangeiras vantagens cada vez mais desmedidas, às custas dos contribuintes e da economia brasileira, as quais se somam aos subsídios fiscais federais e a financiamento subsidiado por bancos estatais, como o BNDES. Aí está a origem da desnacionalização, a qual resultou na desindustrialização e, em suma, no subdesenvolvimento. Essa é a confrangedora situação atual do País, sem indústrias próprias, sem tecnologia, nem marcas próprias, apanhando de dez a zero de países pequenos e antes paupérrimos, como a Coreia do Sul e Taiwan, sem falar na potência mundial em que se transformou a China.

Clube de Engenharia - Em que diferimos do resto do mundo? Quais as especificidades e as diferenças em relação a outros países.

Adriano Benayon - Elas ficam claras, comparando o que resumi da história econômica do Brasil, com o que aqueles países fizeram. Vamos situar isso no contexto histórico e político. Coreia do Sul e Taiwan estavam na linha de frente da guerra fria, que já havia estado mais que quente. Seus regimes eram fechados e militaristas, mas isso lhes possibilitou adotar as políticas públicas necessárias ao desenvolvimento. Quais? Fomentar empresas nacionais, suscitar a formação de grandes empresas e conglomerados de capital nacional, apoiados por estatais na infra-estrutura e por bancos estatais. No Brasil, ao contrário, as empresas transnacionais foram as favorecidas pela política econômica e são escandalosamente subsidiadas até hoje. A China, saqueada e ocupada militarmente, desde 1840, com a criminosa guerra do ópio, movida pelo império britânico, envolvida em guerras civis, instaurou, com a vitória da revolução em 1949, um regime comunista, com a economia quase totalmente estatizada, e restante vinculado ao poder público. Construiu, durante o período maoísta (1949-1976) importantes infra-estrutura e indústria e tornou-se potência militar e nuclear. Quando Deng modificou o curso e admitiu as transnacionais nas zonas costeiras e voltadas para a exportação, suscitou, ao mesmo tempo, a formação de poderosas empresas privadas de capital nacional. Além disso, a China é praticamente o único país do mundo que consegue levar vantagem com as transnacionais, aproveitando capital e principalmente tecnologia, que absorve. Isso porque seu regime político não decorre de eleições dependentes de dinheiro para as campanhas. Foi consequência do nacionalismo, decorrente da dura experiência de agressões imperiais sofridas e da herança maoísta, associado à cultura milenar taoísta e confucionista, em que o mérito é completamente valorizado na ascensão dos quadros econômicos e políticos. Desse modo, as transnacionais só foram admitidas sob condições estritas e, em função do regime político, insuscetíveis de serem contornadas. Entre elas, diretores chineses em paridade numérica e salarial com os enviados pela matriz da transnacional, e transferência de tecnologia (expressão no Brasil, esvaziada de sentido). Coreia e Taiwan copiaram o modelo japonês, inclusive opondo intermináveis dificuldades burocráticas para limitar a presença das transnacionais em seu setor produtivo. Obtiveram tecnologia estrangeira, capacitando seus nacionais a absorvê-la, o que só pode ser feito em empresas de capital nacional. Impossível nas subsidiárias das transnacionais. Que fizeram para isso? Contratos de transferência de tecnologia, principalmente com empresas europeias, pagando-lhes percentual sobre as vendas da produção local. Não cometeram, como o Brasil, o suicídio econômico de entregar o mercado interno (de resto muito mais promissor que o daqueles países) às transnacionais, através dos investimentos diretos estrangeiros. Ainda mais incrível que entregar o mercado (o trunfo para realizar contratos de transferência de tecnologia), foi subsidiar – e como! – a entrada desses “investimentos”, dos quais o Brasil não tinha a menor necessidade. Primeiro, as transnacionais usaram quase que só capital local, inclusive lucros de operações comerciais anteriores, e principalmente os subsídios governamentais. Segundo, havia no País capital mais que suficiente (além disso, ele pode ser criado por emissões do Tesouro e pelo sistema bancário). Comparem-se os recursos do Brasil em 1955 com os dos então miseráveis asiáticos. Os investimentos diretos estrangeiros (IEDs) são considerados remédio para “equilibrar” o Balanço de Pagamentos – BP, mas agravam enormemente a doença: o desequilíbrio do BP, decorrente dos próprios IEDs. Como? Devido às transferências de seus lucros oficiais ao exterior e ainda mais dos disfarçados, remetidos através de outras contas, com superfaturamento de importações e subfaturamento de exportações, pagamentos por serviços superfaturados e até fictícios (juros, comissões, assistência técnica, uso de marcas etc.). Os déficits nas transações correntes (TCs) com o exterior vêm-se avolumando. Somaram US$ 204,1 bilhões de 2008 a 2012 (US$ 54,2 bilhões só em 2012). Eles estão em aceleração: US$ 18 bilhões, ou seja, 83% a mais que no mesmo período de 2012. Num círculo vicioso, os déficits nas TCs, por sua vez, fazem acelerar ainda mais a desnacionalização, a qual, de novo, produz déficits nas TCs, e estas levam a mais endividamento. Desde os anos 90 - com Collor e FHC - a desnacionalização cresceu ainda mais através das privatizações, em que a União, em vez de receber, gastou centenas de bilhões de reais para entregar estatais de grande porte.  

Clube de Engenharia - Em 2012, 296 empresas nacionais foram compradas por grupos estrangeiros. Em 2011, foram 208 e, em 2010, 175 empresas. Ou seja, os números têm crescido e estamos batendo o nosso próprio recorde anualmente. Como frear esse processo? O senhor vê no governo a vontade política necessária para estancar o problema? O que podemos esperar, nos próximos anos? 

Adriano Benayon - Mais do mesmo, enquanto não se mudar o sistema político atual. Por que? O grande drama é que a desnacionalização gera no sistema político outro círculo vicioso, não menos sério que o causado na economia. Em outras palavras, controlando o grosso e o que há de mais poderoso na estrutura econômica e financeira do País, as transnacionais fazem prevalecer seus interesses na formulação das políticas governamentais, nas leis etc. Isso porque, no modelo político de molde ocidental, a pluralidade de partidos e as eleições periódicas não significam democracia, uma vez que a grande maioria dos eleitos depende de volumosos recursos financeiros e de acesso à grande mídia, especialmente à TV. Ora, a grande imprensa e outras fontes de formação de opinião estão, secularmente, a serviço de interesses que não são os nacionais. Quanto ao número de empresas brasileiras desnacionalizadas, foram 1.296, de 2004 a 2011, período em que as remessas oficiais de lucros ao exterior montaram a US$ 405 bilhões. Ora, as remessas de lucros disfarçados em outras contas foram um múltiplo disso. Adicionando as 296 de 2012, o total, desde 2004, vai para 1.586. É bom ter presente que a aquisição de empresas de capital nacional (desnacionalização em sentido restrito) é só uma parte dos “investimentos estrangeiros diretos (IEDs). A desnacionalização, em sentido lato, inclui também a criação de novas subsidiárias e a capitalização adicional nas já estabelecidas. Tudo isso implica controle da economia brasileira por empresas estrangeiras.

Clube de Engenharia - O Clube de Engenharia publicou, em 2011, manifesto pela defesa das empresas genuinamente nacionais. De acordo com o documento, seria necessária a restituição das proteções constitucionais à produção nacional, tendo como foco prioritário imediato três áreas, por serem consideradas estratégicas para o país: as indústrias de petróleo o gás, energia e defesa. Restituir as proteções legais e a diferenciação entre empresas brasileiras de capital nacional seria suficiente para reverter o quadro atual? Sob o ponto de vista da crescente desnacionalização, como estão essas três áreas estratégicas hoje no Brasil?

Adriano Benayon - Certamente é importante a iniciativa do Clube de Engenharia, que, desse modo, dá um passo na direção que o Brasil precisa tomar. A meu ver, é importante, mas não suficiente, uma Emenda à Constituição para restituir-lhe o capítulo da Ordem Econômica, inclusive com a distinção entre empresa de capital nacional e de capital estrangeiro, que foi extirpado do texto votado em 1988, por iniciativa do governo de FHC, executante do Consenso de Washington. É fundamental estabelecer a reserva de mercado para empresas de capital nacional em áreas estratégicas, como as três sugeridas pelo Clube de Engenharia. Não menos prioritário para todos os setores produtivos e financeiros, são regras, para serem cumpridas – e não regras desdentadas - que estabeleçam firmemente a concorrência. Para que haja elevação da renda, da qualidade da produção e desenvolvimento tecnológico, é indispensável acabar com o império sobre o mercado detido pelos oligopólios, principalmente liderados por transnacionais, muitos dos quais operam como carteis. Como realizar isso? Assegurar as reservas de mercado para empresas nacionais, financiando-as a longo prazo e a juros favorecidos, ajudando-as a investir na capacitação de seus engenheiros e técnicos para absorver e desenvolver tecnologias, praticando inclusive tecnologia reversa e fazendo contratos de transferência de tecnologia, sob adequada supervisão de órgãos estatais, como o INPI (que nunca foi dotado para exercer as funções que devia desempenhar). A propósito, é urgente para o Brasil revogar a Lei de Propriedade Industrial, adotada em conformidade com os acordos nessa área, firmados na OMC, e rever esses acordos, denunciando-os se necessário. Além da desnacionalização das empresas, os governos, principalmente a partir de Collor desnacionalizaram o próprio Estado brasileiro. Se os brasileiros, engenheiros ou não, querem ser alguma coisa na vida, esse estado de coisas tem de acabar. Em suma, só haverá desenvolvimento econômico e social, e bons empregos para engenheiros e para outros brasileiros, se a produção, em todos os setores, for realizada por empresas nacionais em regime de concorrência. Se não, continuaremos com os sobrepreços, como os que praticam as transnacionais, a ponto de, como é sabido, por exemplo, os carros custarem aqui mais que o dobro do que na média dos outros países, não obstante os subsídios, isenções fiscais, financiamentos generosos, terrenos dados, obras de infra-estrutura e outras vantagens que as montadoras estrangeiras recebem de graça. Qual é, pois, a função dos oligopólios? Produzir a custos baixos e subsidiados, vender a preços altos, administrados por eles mesmos, e mandar os ganhos para o exterior de várias maneiras. Exemplifiquei com os carros, mas vale para todos os setores de produção. Lógico que as empresas nacionais que surgirem ou se reconstituírem graças à nova política deverão ser fiscalizadas no cumprimento das normas de concorrência e impedidas de serem vendidas a empresas estrangeiras e mesmo a concorrentes nacionais, salvo se isso não implicar a formação de oligopólio. 

Clube de Engenharia - Que áreas podemos apontar como exemplos perfeitos do processo de acelerada desnacionalização no país? Quais são os casos mais emblemáticos?

Adriano Benayon - Já mencionei o caso notório do setor automotivo. Mas os abusos em outros bens de consumo durável e até em bens de produção são muito frequentes, tanto nos de origem mineral como agrícola. O absurdo estende-se aos transportes, em que o aeronáutico constitui um escândalo e uma vergonha. Ainda mais no País que, além de ter a EMBRAER - também desnacionalizada, no mínimo, em parte - é o do inventor do avião, o país que já teve companhias aéreas gigantes, presentes em todo o mundo, e está agora à mercê de um cartel de empresas estrangeiras de terceira categoria, até mesmo para os vôos internos. Que falar de outra vergonha, a dos transportes marítimos? E do caso de enormes estatais, como a Vale Rio Doce, que não se sabe quem controla, embora fundos previdenciários brasileiros tenham bancado a maior parte do valor pífio da privatização de um patrimônio absolutamente incalculável, estratégica e economicamente? O Brasil não controla sequer sua infra-estrutura, como a da hidroeletricidade, privatizada, em grande parte, para empresas estrangeiras e regulado de forma desastrosa, no esquema das Agências (mesmo caso da do petróleo e combustíveis, a ANP), criadas para ajudar os concessionários que deveriam ser regulados, e não, os consumidores e a economia do País. Ainda na energia, o setor sucro-alcooleiro está tendo acelerado processo de desnacionalização. Além disso, temos a agricultura e a pecuária submetidas a tradings internacionais. Toda a estrutura de produção desse setor, como a dos minerais, é determinada por interesses estrangeiros. Se não, as terras de produção agrícola não estariam sendo usadas em quase 50% só para a soja, nem a pecuária ocuparia mais de 1/3 das terras totais utilizadas. Pior ainda, os governos entreguistas e pusilânimes, tanto o federal, como a maioria dos estaduais permitiram, quando não apoiaram - em favor das notórias transnacionais, Monsanto, Syngenta, Bunge, Bayer etc. - a substituição das sementes tradicionais – indispensáveis para a segurança alimentar – por sementes transgênicas, prejudiciais à saúde dos que se alimentam com seus produtos, sem falar no veneno dos agrotóxicos associados a essas sementes (só elas resistem a eles). Ademais, o uso das transgênicas contamina as terras vizinhas, acabando com as tradicionais e exterminando as abelhas, necessárias à preservação da vida através da polinização. Certamente omiti muita coisa, inclusive os absurdos, desnecessários leilões do petróleo descoberto pela Petrobrás, para ser explorado por empresas estrangeiras, em troca de royalties risíveis, em percentual cinco vezes menor que o negociado pelo Xá do Irã com as petroleiras anglo-americanas, ainda nos anos 50. 

Clube de Engenharia - Na sua opinião, podemos traçar uma ligação direta entre desnacionalização e desindustrialização? Os dois processos estão ligados de alguma forma?

Adriano Benayon - Sim. Para começar, a desnacionalização causa o empobrecimento de um país. Primeiro, transferindo para o exterior os elevadíssimos ganhos dos oligopólios. Segundo, gerando, com isso, déficits de conta corrente, que têm que ser cobertos por empréstimos e outras formas de endividamento. As dívidas ganharam dinâmica própria, como se fossem bactérias em ambiente ácido, através da capitalização de juros, tarifas, comissões e taxas especiais, e o Estado gasta grande parte, se não a maior, de suas receitas com o serviço da dívida (no Brasil a externa desencadeou a dívida pública interna, a partir de 1980). Isso devido, inclusive, à influência da oligarquia financeira estrangeira nos governos e até na Constituinte, quando foi inserido no texto da Constituição, fraudulentamente, o dispositivo que privilegia o serviço da dívida no orçamento federal. Essa despesa, de 1988 ao presente, aproxima-se, em moeda atualizada, de 10 trilhões de reais. Assim, o Estado investiu pouco na infra-estrutura – e mal, diga-s de passagem - e nas indústrias de base, a qualidade da educação decaiu etc. O salário médio pouco cresceu, ficou estagnado, mormente em comparação com os países que experimentaram real desenvolvimento. Ora, os grupos industriais preferem investir na produção de bens de elevada qualidade e maior valor agregado nos países de renda elevada ou nos que se desenvolvem. Assim, crescentemente, os bens de maior valor agregado deixaram de ser produzidos no Brasil. Além disso, acabando com a proteção tarifária, desde a abertura comercial, sem contrapartida, decretada pelo devastador Collor, as transnacionais no Brasil, passaram a importar não só os bens finais de maior valor agregado, mas também os componentes e insumos de maior valor (de resto superfaturados, como sempre fizeram), contribuindo assim para o déficit na conta corrente com o exterior. Além disso, como as transnacionais não desenvolvem tecnologia no País, pois ganham mais usando a tecnologia já desenvolvida nos países de suas matrizes, há, entre outras, duas consequências:

1) a produção local nunca vai concorrer com a produção desses países, porque a tecnologia empregada nesta vai ser sempre mais avançada que a incorporada nas máquinas usadas, exportadas para o Brasil, além de que aqui os custos são superfaturados, para ganhar mais e transferir mais renda para a matriz:

2) os engenheiros e técnicos brasileiros ficam excluídos, na especialização internacional, dos empregos mais interessantes e melhor remunerados

Clube de Engenharia - Enquanto os EUA compram a General Motors, um dos símbolos do capitalismo, e a França mantém controle em diversas áreas, como a aviação, no Brasil, o assunto foi demonizado pela grande mídia. Qual a participação dela - a grande mídia - nesse processo como suporte ao lobby internacional, e como vencer a questão cultural?

Adriano Benayon - A grande mídia sempre combateu e difamou os que defenderam os interesses nacionais, além de ter sempre promovido as ideias, as políticas e os projetos da oligarquia financeira anglo-americana e das transnacionais. Ela já o fazia contra Getúlio Vargas, antes mesmo de findar o Estado Novo, em 1945. Há, além disso, uma espécie de admiração reverencial dos acadêmicos em geral, não só de economistas, os quais tendem a se orientar pelas doutrinas emanadas das universidades mais famosas do Atlântico Norte, estipendiadas por potentados da oligarquia financeira e grandes transnacionais. Deu-se também a descaracterização cultural, em muitos países, e de modo especialmente agudo e profundo no Brasil. Uma espécie de Blitzkrieg imperial, com ênfase na música, inclusive com a intensa difusão da antimúsica, aviltamento da indústria do entretenimento, através do cinema, do rádio e das TVs comerciais. A reforma MEC-USAID (supressão do latim e do francês nos currículos escolares) no início dos anos 70, com o ex-militar entreguista Jarbas Passarinho, firmante mais tarde, já no governo Collor, da portaria que fez demarcar imensa área indígena dita ‘ianomâmi”, no interesse da oligarquia financeira, sobretudo britânica, que controla a mineração. Em síntese, do mesmo modo que só uma completa revolução na política econômica seria capaz de pôr o Brasil no rumo do desenvolvimento, só uma revolução não menos total no campo da cultura viabilizaria aquela. A cultural não exigiria tantos recursos, nem os deveria economizar para formar comunicadores, historiadores e professores que reexumassem as boas realizações da cultura nacional e as renovassem. O investimento no campo fundamental e estratégico que é a cultura tem de fundar e desenvolver TVs públicas de alta qualidade, as educativas e as informativas e de entretenimento e cultura, com música de qualidade nacional e estrangeira. Também, boas escolas públicas, desde o nível primário ao superior. Uma tarefa gigantesca. Um exemplo: não seria mal retomar e adaptar aos tempos atuais os currículos e os métodos das escolas estaduais do Rio Grande do Sul e de Minas Gerais (entre outras) nos anos 20 do século passado, e do Colégio Pedro II (federal, de ensino médio, no Rio de Janeiro, antiga capital). Outra ideia: adaptar os currículos das escolas japonesas e chinesas, em que, desde os primeiros anos, há ênfase na formação dos valores éticos. Em suma, restaurar e renovar tudo que a Rede Globo e outras TVs comerciais têm destruído ao longo dos últimos 50 anos. Também oferecer algo totalmente diferente da revista VEJA aos leitores que buscam informação real e avaliações não distorcidas. 

Clube de Engenharia - Com os juros mais baixos da história, alta desoneração da folha de pagamento, isenção de impostos e financiamentos disponíveis, ainda assim, falta ousadia no empresariado nacional. Isso colabora com a desnacionalização? Como acordar os empresários e como isso pode colaborar para frear o processo?

Adriano Benayon - 1) os juros reais ainda são altíssimos no Brasil, e se estamos falando de competição, os de países industrializados concorrentes são muito mais baixos. 2) as desonerações fiscais, além de seletivas em favor de grupos concentradores e transnacionais, de pouco servem em face dos altos custos decorrentes de: a) infra-estrutura mal concebida, mal executada e em deterioração, além de operada por concessionários que oneram abusivamente os já de si as elevadas tarifas; b) custos de produção internos dos próprios oligopólios, inflados para transferir lucros disfarçados para o exterior como se fossem despesas. Como as transnacionais são favorecidas com a capitalização dos ganhos decorrente de sua posição oligopolista, melhor aquinhoadas por subsídios governamentais e têm acesso a crédito barato, isso retroalimenta a desnacionalização, ao tornar inviáveis as empresas nacionais que precisam de compradores menos depauperados pelos altíssimos impostos (enquanto o Estado desonera os concentradores) e pelos preços dos serviços públicos que deveriam ser módicos ou gratuitos, além dos preços dos produtos dos oligopólios que elevam artificialmente os custos, repassando-os aos consumidores. Tudo que tentei expor nas respostas anteriores mostra que o problema dos nossos empresários é ter, da parte do Estado, uma banda adequada para tocar a música que eles devem executar: responsabilidade, concorrência e bons resultados para quem tenha valor. O Estado deveria ajudá-los a crescer sob essas condições. Mas empresa é uma planta que só nasce num tipo de solo: o mercado. Um Estado imparcial daria condições iguais para quem quisesse entrar na competição pelos mercados. Poderia até fazer concursos, com provas e títulos, como o de ter tido empresa que mostrou competência, mas foi esmagada pela concentração econômica e pelas crises decorrentes desta. Claro que, se há timidez de empresários brasileiros é provavelmente porque se trata de espécie ameaçada, para não dizer em extinção. Mas espécie essencial para o desenvolvimento do País. Ele precisa também de estatais e tem de pôr no lixo o mandamento da oligarquia estrangeira de não estatizar coisa alguma. As estatais devem ser bem estruturadas para as atividades de porte muito grande, em que não há como ter muitas empresas em competição. Em suma, é preciso que o tripé seja: Estado; empresas estatais; empresas privadas nacionais. O tripé em que Geisel e outros acreditaram (Estado, multinacionais e empresas privadas nacionais) simplesmente ruiu, e, com sua queda, quem foi ao chão foi o Brasil, pois o Estado transformou-se em servidor das multinacionais, e o setor privado nacional praticamente desapareceu. Ficando, pois, só com a perna transnacional, cujos interesses estão no exterior, o tripé de Geisel deu no que deu.