terça-feira, 3 de abril de 2012

Adriano Benayon

O cartório dos bancos 

O ininterrupto crescimento dos lucros dos bancos constitui um seriado da categoria horror. Recapitulando: em junho de 2011, publiquei o artigo “Os lucros dos bancos crescem sem parar”, onde se lê: “Nos oito anos de FHC, a média anual de crescimento real dos lucros dos bancos foi 11%, acumulando 230% em oito anos. De 2003 a 2007, ela foi 12%, acumulando 176% em 5 anos. De 2003 a 2010 os lucros dos cinco maiores bancos - Itaú, Banco do Brasil, Bradesco, Santander e Caixa Econômica Federal - elevaram-se de R$ 11,1 bilhões para R$ 46,2 bilhões,  em sete anos. Elevação sustentada, à média de 17,7% ao ano, ou seja, 313%. Em termos reais (correção pelo IPCA): 12,1 % aa., acumulando 222%.”

2. Em artigo de março de 2010, “Brincando à Beira do Abismo”, salientei a concentração no setor, já enorme em 2009:“Apenas cinco bancos (Itaú, Banco do Brasil, Bradesco, Santander e  Caixa Econômica) somam lucro de R$ 37,3 bilhões, superando o lucro total dos 31 bancos computados em 2007.”

3. Em 2011, os lucros desses cinco bancos alcançaram R$ 51 bilhões: Itaú: 14,6; Banco do Brasil 12,1: Bradesco: 11; Santander: 7,8; CEF: 5,2 bilhões.

4.  Esse é só o “lucro líquido”. No cálculo deste as empresas usam técnicas contábeis para deduzirem muita coisa do lucro real, aproveitando permissões  e brechas da legislação tributária. O imposto de renda só incide sobre aquele. Ademais, a alíquota do imposto é 15%, enquanto as pessoas físicas que ganham acima de R$ 3.750 mensais, estão sujeitas à de 27,5%.

5. Há anos, assinalo que os bancos gozam de vantagens mais que cartoriais: a garantia de lucros monopolistas para seu cartel, uma vez que, juntamente com as grandes corporações transnacionais, controlam o Estado.

6. Talvez por isso, não abusaram dos derivativos, os detonadores do colapso financeiro mundial, que levou os governos dos EUA e europeus a socorrer grandes bancos com dezenas de trilhões de dólares e de euros.

7. A União Federal propicia aos bancos em operação no Brasil aplicarem em títulos da dívida pública, para si próprios, o dinheiro dos depositantes, auferindo os juros reais mais altos do mundo, há quase vinte anos. E o ganho não vem só das taxas, mas também da dimensão do mercado desses títulos, cujo crescimento se deu principalmente pela capitalização dos juros.

8. O estoque da dívida pública mobiliária interna atingiu, em fevereiro último, R$ 1,760 trilhão, sem contar os títulos em poder do Banco Central, os quais já somavam R$ 749 bilhões no final de novembro de 2011. Também notável é o curtíssimo prazo médio desses títulos (menos de quatro meses), o que implica rolagem quadrimestral da ordem de R$ 600 bilhões.

9. Além disso, as outras aplicações rendem aos bancos taxas de juros que são múltiplos da SELIC, usada nos títulos públicos, com margens fantásticas, como em empréstimos a empresas e a indivíduos e, ainda maiores, nos cartões de crédito, tudo isso favorecido pelo Banco Central. Este, ademais, admite tarifas por serviços bancários tão elevadas, que lhes custeiam todos os custos administrativos.  

10. Desse modo, o crédito à economia produtiva fica mais por conta dos bancos públicos, à frente deles o BNDES, seguido de Banco do Brasil, CEF e o Nossa Caixa, estadual, que sobreviveu à razzia das privatizações. Mas o BNDES financia sobre tudo transnacionais e outras grandes empresas, e os bancos comerciais públicos atuam, cada vez mais, de maneira semelhante à de seus congêneres privados.

11. A mais escandalosa das privatizações, a do BANESPA, assumido pelo estrangeiro SANTANDER, foi comentada extensamente no artigo “Os lucros dos bancos crescem sem parar”, junho de 2011. Com a eliminação do BANESPA, dotado de grande rede de agências, especialmente no interior de São Paulo, o desenvolvimento desse Estado e do País foram grandemente  prejudicados.

12. Um banco comercial é uma concessão incrível, que lhe enseja criar moeda, fazendo empréstimos, só com lançamentos nos computadores, em múltiplos dos depósitos, deduzidos os compulsórios junto ao Banco Central. Ainda assim, dado que têm lucros altíssimos garantidos pelo mercado dos títulos públicos, evitam os riscos dos empréstimos ao setor privado.

13. Apesar disso, o crédito a empresas e a pessoas físicas cresceu muito desde 2003, quando equivalia a 26% do PIB. No final de 2011 foi a 49,1%, sendo 31,5% o estendido por bancos comerciais (16,3% em 2003). O BNDES responde pelo grosso dos 17,6% restantes.

14. Especialmente apreciável foi a expansão do crédito imobiliário, ajudada, a partir de 2005, por mudanças na lei que facilitaram a  tomada dos imóveis pelos bancos em caso de inadimplência do mutuário. O professor de finanças da USP de Ribeirão Preto, Alberto B. Matias aponta a espantosa concentração nesse setor: “Em 1994, tínhamos 16 grandes bancos privados de varejo. Sobraram dois.”

15. Há também, em relação com os fatores comentados no artigo do último mês, “Brasil Privatizado”, o risco de bolha imobiliária, após a vertiginosa alta dos preços dos imóveis. Segundo o Banco Central, o endividamento das famílias com o sistema financeiro alcançou, em novembro, 42,51% da renda acumulada nos 12 meses anteriores.

16. Por fim, não contentes com os mercados cativos que já têm, inclusive seguros e resseguros, os concentradores financeiros fizeram a presidente da República pôr no Congresso, o fundo de previdência complementar dos servidores públicos (FUNPRESP), mais uma etapa da privatização da previdência, colocando as aposentadorias e pensões à mercê do cassino das bolsas de valores.

Adriano Benayon é Doutor em Economia pela Universidade de Hamburgo e Advogado, OAB-DF nº 10.613, formado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro. Foi Professor da Universidade de Brasília e do Instituto Rio Branco, do Ministério das Relações Exteriores. Autor de “Globalização versus Desenvolvimento”.
abenayon@brturbo.com.br


 

Nenhum comentário:

Postar um comentário