As redes sociais são mesmo a maior vitrine da
humanidade, nelas vemos sua rara inteligência e sua quase hegemônica banalidade. A
moda agora é "assinar" sobrenomes indígenas no Facebook. Qualquer
defesa de um modo de vida neolítico no Face é atestado de indigência mental. As
redes sociais são um dos maiores frutos da civilização ocidental. Não se
"extrai" Macintosh dos povos da floresta; ao contrário, os povos da
floresta querem desconto estatal para comprar Macintosh. E quem paga esses
descontos somos nós. Pintar-se como índios e postar no Face devia ser incluído
no DSM-IV, o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais. Desejo tudo de bom para nossos compatriotas
indígenas. Não acho que devemos nada a eles. A humanidade sempre operou por
contágio, contaminação e assimilação entre as culturas. Apenas hoje em dia
equivocados de todos os tipos afirmam o contrário como modo de afetação ética. Desejo
que eles arrumem trabalho, paguem impostos como nós e deixem de ser dependentes
do Estado. Sou contra parques temáticos culturais (reservas) que incentivam
dependência estatal e vícios típicos de quem só tem direitos e nenhum dever.
Adultos condenados a infância moral seguramente viram pessoas de mau-caráter
com o tempo. Recentemente, numa conversa profissional, surgiu a questão do
porquê o mundo hoje tenderia à banalidade e ao ridículo. A resposta me parece
simples: porque a banalidade e o ridículo foram dados a nós seres humanos em
grandes quantidades e, por isso, quando muitos de nós se juntam, a banalidade e
o ridículo se impõem como paisagem da alma. O ridículo é uma das caras da
democracia. O poeta russo Joseph Brodsky no seu ensaio "Discurso
Inaugural", parte da coletânea "Menos que Um" (Cia. das Letras;
esgotado), diz que os maus sentimentos são os mais comuns na humanidade; por
isso, quando a humanidade se reúne em bandos, a tendência é a de que os maus
sentimentos nos sufoquem. Eu digo a mesma coisa da banalidade e do ridículo. A
mediocridade só anda em bando. Este fenômeno dos "índios de Perdizes"
é um atestado dessa banalidade, desse ridículo e dessa mediocridade. Por isso,
apesar de as redes sociais servirem para muita coisa, entre elas coisas boas,
na maior parte do tempo elas são o espelho social do ridículo na sua forma mais
obscena. O que faz alguém colocar nomes indígenas no seu "sobrenome"
no Facebook? Carência afetiva? Carência cognitiva? Ausência de qualquer senso
do ridículo? Falta de sexo? Falta de dinheiro? Tédio com causas mais comuns
como ursinhos pandas e baleias da África? Saiu da moda o aquecimento global,
esta pseudo-óbvia ciência? Filosoficamente, a causa é descendente dos delírios
do Rousseau e seu bom selvagem. O Rousseau e o Marx atrasaram a humanidade em
mil anos. Mas, a favor do filósofo da vaidade, Rousseau, o homem que amava a
humanidade, mas detestava seus semelhantes (inclusive mulher e filhos que
abandonou para se preocupar em salvar o mundo enquanto vivia às custas das
marquesas), há o fato de que ele nunca disse que os aborígenes seriam esse bom
selvagem. O bom selvagem dele era um "conceito"? Um "mito",
sua releitura de Adão e Eva. Essas pessoas que andam colocando nomes de tribos
indígenas no seu "sobrenome" no Face acham que índios são lindos e
vítimas sociais. Eles querem se sentir do lado do bem. Melhor se fossem a uma
liquidação de algum shopping center brega qualquer comprar alguma máquina para
emagrecer, e assim, ocupar o tempo livre que têm. Elas não entendem que índios
são gente como todo mundo. Na Rio+20 ficou claro que alguns continuam pobres e
miseráveis enquanto outros conseguiram grandes negócios com europeus que, no
fundo, querem meter a mão na Amazônia e perceberam que muitos índios aceitariam
facilmente um "passaporte" da comunidade europeia em troca de grana.
Quanto mais iPad e Macintosh dentro desses parques temáticos culturais melhor
para falar mal da "opressão social". Minha proposta é a de que todos
que estão "assinando" nomes assim no Face doem seus iPhones para os
povos da floresta.
Luiz Felipe
Pondé, pernambucano, filósofo,
escritor e ensaísta, doutor pela USP, pós-doutorado em epistemologia pela
Universidade de Tel Aviv, professor da PUC-SP e da Faap, discute temas como
comportamento contemporâneo, religião, niilismo, ciência. Autor de vários
títulos, entre eles, "Contra um mundo melhor" (Ed. LeYa). Escreve às
segundas na versão impressa de "Ilustrada".
ponde.folha@uol.com.br
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