quarta-feira, 29 de agosto de 2012

Pronunciamento de Collor desmascara mais uma vez Roberto Gurgel



Primeiro a discursar em Plenário nesta segunda-feira (27), o senador Fernando Collor (PTB-AL) voltou a dirigir críticas ao desempenho de Roberto Gurgel no cargo de procurador-geral da República. O senador acusou o chefe do Ministério Público da União de cometer diversos crimes e irregularidades: prevaricação, improbidade administrativa, crime de responsabilidade e chantagem. Segundo Collor, Roberto Gurgel prevaricou por ter demorado mais de dois anos para adotar qualquer medida em relação à operação Vegas, da Polícia Federal, anterior à operação Monte Carlo e também voltada às ações de Carlos Augusto Ramos, o Carlinhos Cachoeira. Para o senador, a falta de ação de Gurgel favoreceu a organização criminosa comandada por Cachoeira, que continuou em ação, e influenciou o resultado das eleições gerais de 2010 no estado de Goiás, nas quais Marconi Perillo (PSDB) foi reeleito governador.
- Conforme reconheceu, em depoimento na CPI no dia 12 de junho deste ano, o próprio governador Marconi Perillo, ao ser questionado exatamente sobre essa possibilidade. Ele disse: “Sim, se essa operação tivesse sido desvelada antes das eleições, o resultado em Goiás das eleições em 2010 teriam sido diferentes” – relatou Collor.
O parlamentar afirmou ser imperiosa a convocação de Gurgel para prestar depoimento à CPI do Cachoeira, para explicar “todos os fatos, atos e os não atos que estão vindo à luz e que dizem respeito à sua conduta como chefe maior do Ministério Público”. Collor informou ainda ter protocolado seis representações contra o procurador geral e contra a subprocuradora Cláudia Sampaio Marques, esposa de Gurgel. Segundo ela, disse Collor, a decisão de sobrestar o inquérito da operação Vegas teria sido tomada por ela e pelo procurador-geral em conjunto com o delegado da Polícia Federal Raul Alexandre Marques de Souza, responsável pela operação.
- É lamentável ter que afirmar isto da tribuna do Senado, mas a subprocuradora-geral da República, doutora Claudia Sampaio Marques, igualmente ao seu marido, mentiu quando fez essa afirmação – declarou o senador ao lembrar que o próprio delgado desmentiu essa afirmação em depoimento à CPI.
Collor afirmou que, depois de receber o inquérito da Vegas, a obrigação de Gurgel era a arquivar o processo ou pedir novas diligências ou apresentar denúncia à Justiça. Entretanto, disse o senador, o procurador não tomou nenhuma dessas atitudes em tempo hábil. Collor ainda acusou Gurgel de ter chegado a chantagear o então senador Demóstenes Torres (GO), que acabou cassado por envolvimento com as atividades de Cachoeira.


Revista Veja

Collor também afirmou que, em depoimento recente à CPI do Cachoeira, dois procuradores deixaram claro haver indícios do envolvimento de jornalistas da revista Veja com a organização criminosa de Cachoeira.
- Como atestaram os dois procuradores, essa organização criminosa, que atua ‘armada’ e é ‘altamente sofisticada, complexa e ousada’, vem atuando à margem da lei há mais de uma década e, vejam, coincidentemente, o mesmo período de convivência e troca de favores entre o jornalista da Veja, Policarpo Júnior, e o senhor Carlinhos Cachoeira, com o claro conhecimento do editor e presidente do Conselho Editorial da Editora Abril, Roberto Civita – afirmou.
O senador chegou a ler trechos de interceptação telefônica que comprovaria a troca de favores entre o jornalista Policarpo Júnior e Cachoeira. Collor defendeu a criação de duas novas CPIs para investigar essas suspeitas.
- Por tudo isso, tenho certeza: quando o senhor Roberto Gurgel Santos, sua esposa, Cláudia Sampaio Marques, o senhor Roberto Civita, o senhor Policarpo Júnior, além dos demais servidores da revista Veja, como o borrador Lauro Jardim e os rabiscadores Hugo Marques, Rodrigo Rangel e Gustavo Ribeiro, quando todos eles vierem depor na CPI e tiverem seus sigilos telefônicos e de mensagens quebrados, teremos, então, provas mais do que suficientes para, quem sabe até, criarmos novas CPIs: a CPI do Gurgel e a CPI da Veja – concluiu Collor.

Agência Senado

Leia o pronunciamento na íntegra, clicando aqui.

terça-feira, 28 de agosto de 2012

Desnacionalização da economia brasileira. Entrevista especial com Adriano Benayon


“Há uma quantidade de capital brasileiro no exterior muito maior do que o total investido anualmente no país pelo conjunto do capital nacional, inclusive o estatal, e o estrangeiro”, diz o economista.

O projeto desenvolvimentista em curso no país desde 1954, apoiado no ingresso de capital estrangeiro, intensificado no governo Juscelino Kubitschek e, posteriormente, na ditadura militar, levou a economia brasileira a um processo de desnacionalização. Na avaliação do economista Adriano Benayon, isso é consequência de uma política econômica “contrária aos interesses nacionais”, e que criou “imensos atrativos para o capital estrangeiro, alegando haver necessidade de poupança externa para complementar a nacional”. Segundo ele, a reestruturação do capitalismo brasileiro beneficia as empresas transnacionais, que “gozam do privilégio de ter custo de capital e de tecnologia praticamente zero no Brasil”.

Na entrevista a seguir, concedida por e-mail à IHU On-Line,Benayon enfatiza que a desnacionalização em curso nos últimos 60 anos levou à desindustrialização, e tem tornado a indústria “menos competitiva internacionalmente”. Na avaliação dele, se um país deseja ser competitivo e alcançar o progresso, “não deve de modo algum favorecer, em desfavor das locais, empresas de porte muitíssimo maior que essas e experientes tecnologicamente, através da produção e das vendas em mercados de alta renda e grande dimensão”. E reitera: “Só com firmas nacionais competindo no mercado é viável a acumulação de capital e de tecnologia no país”. Crítico do ingresso de capitais estrangeiros na economia nacional, o economista esclarece que “eles sempre foram desnecessários e continuam sendo. Além disso, são contraproducentes, porque acabam retirando muito mais capital do país do que o que fazem ingressar nele”. Adriano Benayon é formado em Direito, pela Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ, e doutor em Economia pela Universidade de Hamburgo, na Alemanha. Foi professor da Universidade de Brasília e do Instituto Rio Branco, do Ministério das Relações Exteriores. É autor de Globalização versus Desenvolvimento (São Paulo: Ed. Escrituras, 2005).

Confira a entrevista.

IHU On-Line – Percebe uma reestruturação do capital brasileiro e internacional? Quais são as razões?

Adriano Benayon – Certamente. Quanto ao Brasil, os capitais de maior vulto têm tido pouco espaço no país, dado que os setores da economia produtiva têm sido ocupados por transnacionais estrangeiras, favorecidas pela política econômica por subsídios de várias ordens, desde setembro de 1954, logo após o golpe de Estado que derrubou o presidente Getúlio Vargas.

Com isso, hoje o principal do grande capital brasileiro está nos bancos e nas empreiteiras, as quais trabalham também no exterior. Mesmo nos bancos há presença significativa do capital estrangeiro, desde o governoFernando Henrique Cardoso – FHC. O propósito deste, a serviço de interesses externos, foi apagar o que restava da Era Vargas. Assim, um dos cinco maiores bancos em atividade no Brasil é o Santander, vinculado ao grupo Alpha, da Inglaterra, através do Royal Bank of Scotland. Esse banco abocanhou o Banespa, o maior banco estadual do mundo, por cifra ridiculamente baixa em relação aos ativos do banco, e livre de passivos, pois a União, através do PROES, os sanou antes da privatização. E há outros bancos estrangeiros importantes, como o HSBC.

Capital externo

O expressivo montante dos ativos de brasileiros em refúgios fiscais no exterior (offshore tax-havens), de 562 bilhões de dólares, é indicativo da peculiar condição de um país onde nunca faltaram capitais, mas cuja política econômica – de forma contrária aos interesses nacionais – criou imensos atrativos para o capital estrangeiro, alegando haver necessidade de poupança externa para complementar a nacional. Ao contrário do que ocorre aqui com as transnacionais, o grosso dos capitais brasileiros no exterior não controla atividades produtivas.

Quanto ao capital internacional também caberia melhor o termo “desestruturação” do que reestruturação, porque a principal mudança foi, desde, pelo menos, 1980, a hipertrofia do capital financeiro e a perda de importância relativa do capital aplicado na produção real. Isso resultou da concentração. Esta leva a que as oportunidades de investimento na produção se tornem cada vez menores em relação à acumulação de capital resultante dos lucros oligopolistas.

Concentração de capital

A concentração do capital faz também com que cresça a concentração de renda. E foi a queda relativa do poder aquisitivo de 80% a 90% da população que fez minguar o investimento do capital na produção, já que só se investe se se prevê demanda. Isso tudo levou à extrema financeirização do capital, e essa é a principal mudança estrutural em âmbito mundial, à exceção de poucos, como a China.

A financeirização, por sua vez, levou ao primeiro surto do colapso financeiro, em 2007, e à depressão econômica nos EUA, Europa e Japão, entre outros. A concentração é a tendência normal na economia capitalista. Para atenuá-la, teriam de ter sido adotadas políticas públicas em favor da desconcentração. Entretanto, nos EUA, desde o início dos anos 1980, e especialmente dos anos 1990, não só não se fez qualquer coisa para deter a concentração como também foram revogadas as principais leis que regulavam os mercados financeiros.

Assim, juntou-se a avalanche de ganhos oligopolistas do grande capital, causadora de grande oferta de capitais, com a desregulamentação do setor financeiro, em que predominam operações alavancadas, i.e., realizadas sem estarem cobertas senão por uma pequena fração de seu valor. Tudo isso contribuiu para que, em 2007, os derivativos não contabilizados nos balanços dos bancos ultrapassassem a inacreditável soma de 600 trilhões de dólares.

Como novos derivativos têm sido criados, essa soma não foi significativamente reduzida com a liquidação forçada de talvez US$ 40 bilhões desses ativos, em todo o mundo, às custas dos contribuintes, mediante a intervenção dos bancos centrais e governos, na realidade governados pelos grandes bancos. Grande parte dos títulos podres foi vendida por seu valor nominal (quando não valem nem 15% deste), em incríveis negociatas. Em suma, o colapso financeiro mundial não mostra sinais de estar sendo debelado.

IHU On-Line – Desde que momento está ocorrendo o processo de desnacionalização da economia brasileira? Ela é uma tendência internacional ou acontece apenas em alguns países?

Adriano Benayon – Desde 1954. A globalização, que se estendeu muito desde o final da segunda guerra mundial, envolveu, em escala crescente, a aquisição de empresas em países que não os da transnacional adquirente, além dos investimentos diretos estrangeiros. A globalização aconteceu na maioria dos países com intensidades diferentes. Ela afeta de modo mais grave os países que não se haviam desenvolvido, nos quais ela asfixia o capital local e intensifica a concentração. Essas duas coisas tornam impossível o desenvolvimento econômico e social.

Implicações nos países não desenvolvidos

Mas os países não desenvolvidos reagiram de forma diversa à globalização: Coreia do Sul e Taiwan tinham de manter o comércio exterior aberto, mas evitaram, tanto quanto puderam, os investimentos diretos estrangeiros e conseguiram que as transnacionais não dominassem suas economias. O Brasil inicialmente manteve muitas barreiras ao comércio, mas onde deveria ter-se defendido não o fez. Não só se abriu aos investimentos diretos estrangeiros como lhes deu benefícios enormes. Então, a indústria da Coreia do Sul e a de Taiwan, mesmo partindo de base muito baixa em 1960, e sendo esses países carentes de recursos naturais, eles superam hoje em muito, qualitativamente, a indústria do Brasil e a da Argentina.

Eu explico em meu livro “Globalização versus Desenvolvimento” que o Estado na Coreia do Sul e em Taiwan, repetindo o Japão e o que fizeram todos os países que se desenvolveram, apoiou as empresas nacionais de todos os modos. No Brasil, as nacionais foram grandemente prejudicadas pela política econômica que, ao mesmo tempo, favoreceu as transnacionais.

Ora, isso contraria toda lógica: pois, se você quer competição e progresso, você não deve de modo algum favorecer, em desfavor das locais, empresas de porte muitíssimo maior e experientes tecnologicamente, através da produção e das vendas em mercados de alta renda e grande dimensão. Só com firmas nacionais competindo no mercado é viável a acumulação de capital e de tecnologia no país.

O resultado da política de “atração aos investimentos estrangeiros” é lastimável e está à vista de todos não só nas degradadas periferias das grandes cidades, mas também dentro delas. Esse resultado demonstra bem, mais de cinquenta anos depois, a falsidade do desenvolvimento sob Juscelino Kubitschek, e, cerca de 40 anos depois, a dos supostos milagres econômicos de alguns dos governos militares.

IHU On-Line – Quais são os setores econômicos nacionais mais atrativos para o capital internacional?

Adriano Benayon – Na realidade, todos, pois a coisa começou na indústria, depois estendeu-se aos serviços, como se vê hoje, na hotelaria, no turismo etc. e no agronegócio. Um dos mais rendosos é certamente o dos bancos.

IHU On-Line – Quais os riscos e implicações desse processo para o desenvolvimento da nação, e fortalecimento da economia? Quais são os setores econômicos brasileiros mais prejudicados por causa dessa política de investir em transnacionais?

Adriano Benayon – Os riscos são a iminente crise no Brasil, com a bolha de crédito já desenhada e demais gargalos decorrentes da infraestrutura econômica e social (saneamento, saúde, educação). Eu diria que danos imensos já ocorreram em grande escala. Diria também que o risco é de esses danos continuarem aumentando.

Na direção em que se está indo, o risco não é apenas o apontado pelo professor José Luís Oreiro, de o subdesenvolvimento tornar-se eterno em nosso país. É o risco é de este ser desagregado, deixando de existir como país.

IHU On-Line – Pode-se dizer que a desnacionalização tem contribuído para acentuar o processo de desindustrialização?

Adriano Benayon – Sem a menor dúvida. A desnacionalização levou à industrialização, e o setor industrial, cuja participação no PIB já andou aí pelos 35%, caiu para 15%. Essa é a queda quantitativa expressada nessa proporção.

Ela decorre de a indústria ter-se tornado menos competitiva internacionalmente, o que é facilitado pela política econômica, que abriu o mercado na indústria e isentou de impostos a exportação de produtos primários (Lei Kandir/Collor). Sem falar na taxa de câmbio, que se valorizou por causa da entrada de capital do exterior na compra de títulos públicos. Portanto, a dívida, consequência do modelo dependente, também contribui muito para a desindustrialização.

Também qualitativamente a queda é abissal, pois, com maior intensidade nos últimos 30 anos, produções da indústria e dos serviços de maior valor agregado e conteúdo tecnológico têm saído do Brasil, sendo agora realizadas no exterior.

Além disso tudo, a indústria se tornou menos competitiva em razão do que expus no recente artigo “O custo da desnacionalização”: em suma, os altos custos de produção, apesar do baixo custo real de produção. Como assim? Respondo: as transnacionais gozam do privilégio de ter custo de capital e de tecnologia praticamente zero no Brasil. Entretanto, em sua contabilidade superfaturam as importações de produtos finais e de insumos (o que cresceu com a abertura comercial) e subfaturam exportações. Ademais, pagam às matrizes por transferência – inexistente – de tecnologia e por outros supostos serviços. Daí preços altos, em contraste com custos baixos.

Também mostrei que a descapitalização do país, resultante do modelo, leva a baixo investimento público na infraestrutura econômica e na social, ademais de os investimentos serem mal direcionados, pois os governos têm preferido atender aos interesses dos fornecedores (muitos transnacionais) dos bens e serviços a cuidar dos interesses nacionais.

IHU On-Line – Por quais razões os grupos econômicos se tornaram mais robustos e sólidos do que o Estado? A globalização econômica, por si só, explica essa mudança? E por que os Estados incentivam a solidificação desses grupos transnacionais, especialmente o Estado brasileiro?

Adriano Benayon – Essas tendências existem há muitos séculos. A globalização, como a maioria das políticas, foi promovida sob a influência, para não dizer a comando, dos grupos econômicos sobre os governos. Isso no caso do Brasil foi muito extenso e profundo. Como disse no artigo citado, aí reside a maior – e menos conhecida – corrupção.

IHU On-Line – Diante da globalização econômica e da atuação internacional das empresas, qual a possibilidade de os países fazerem escolhas no sentido de fortalecer a economia nacional e diminuir a intervenção internacional? Quais os limites nesse sentido?

Adriano Benayon – Precisam de uma tomada de consciência, que vá incluindo mais pessoas, e pessoas determinadas a mudar o presente estado de coisas. A vontade humana, bem inspirada, pode levar a êxitos inacreditáveis. Os limites são os atuais sistemas políticos nas “democracias” de modelo ocidental, em que a pluralidade de partidos, eleições periódicas etc. passam por democracia, mas não o são. Está tudo manipulado através da massa de dinheiro nas eleições e do controle absoluto da grande mídia por parte dos concentradores.

IHU On-Line – Recentemente circulou na imprensa a informação de que 60% dos recursos do BNDES são destinados ao investimento das grandes empresas. O banco tem contribuído para esse processo de desnacionalização?

Adriano Benayon – Certamente.

IHU On-Line – Em artigo recente o senhor menciona que os investimentos diretos estrangeiros registrados no Brasil de 1947 a 2008 totalizaram mais de 222 bilhões de dólares, mas as rendas remetidas do Brasil para o exterior, entre 1995 e 2008, somam mais de 292 bilhões. O que estes dados sinalizam?

Adriano Benayon – Eles ilustram o resultado da estrutura econômica e social determinada pela desnacionalização. E essa é apenas uma das ilustrações de que o Brasil está manietado em seu desenvolvimento.

IHU On-Line – Diante de tantas fusões, é possível saber se ainda há bastante capital nacional no Brasil? Há mais capital “nacional” no exterior?

Adriano Benayon – Talvez o que há seja suficiente para multiplicar por dez o volume dos produtivos no país, hoje em nível baixíssimo, por ter sido o Brasil coagido a adotar o modelo dependente. Como mencionei, há uma quantidade de capital brasileiro no exterior muito maior do que o total investido anualmente no país pelo conjunto do capital nacional, inclusive o estatal, e o estrangeiro.

IHU On-Line – Por que o senhor não é favorável ao ingresso de capitais no país?

Adriano Benayon – Em primeiro lugar, eles sempre foram desnecessários e continuam sendo. Além disso, são contraproducentes, porque acabam retirando muito mais capital do país do que o que fazem ingressar nele. Se tivéssemos estrutura política como a da China, poderíamos receber capitais estrangeiros com vantagem para o país. Mas aqui é diferente: o sistema político, aberto à influência do dinheiro concentrado nas eleições, inviabiliza políticas favoráveis à sociedade.

Note-se que, quando as eleições puseram Vargas no governo, mesmo contra a grande mídia, inteira, que o denegria, o capital estrangeiro ainda não se tinha apropriado do grosso da economia. Além disso, havia mais trabalhadores assalariados em relação à população total. Getúlio venceu em São Paulo, onde estava o grosso da indústria, por maioria superior às vitórias tidas nos demais Estados. E em São Paulo estava o principal foco da oposição a ele, em classes mais abastadas.

Quando da “redemocratização” com a Constituição de 1946, o sistema de poder já se podia arriscar de novo ao processo das eleições pluripartidárias. Antes, não. Vargas vencera em 1950, e então houve intervenção através do golpe de Estado de 1954, dirigido, como o de 1964, pela oligarquia anglo-americana, cujos serviços secretos trabalharam, durante anos, para esses eventos.

IHU On-Line – Quais os desafios da economia brasileira diante da conjuntura atual, de crise internacional e do processo de desnacionalização? É possível reverter esse quadro?

Adriano Benayon – Sugeri algo nesse sentido, em resposta anterior. É possível reverter o quadro, desde que nos livremos das ilusões inculcadas nas mentes dos brasileiros ao longo de dezenas de anos.

IHU On-Line – Como o governo Dilma tem se posicionado diante desta desnacionalização?

Adriano Benayon – Parece não morrer de amores por ela, e tenta atenuar alguns de seus efeitos. Mas, no essencial, acomoda-se a ela.

IHU On-Line – Muitos economistas consideram o governo Dilma, do mesmo modo que o ex-governo Lula, neodesenvolvimentista. O senhor concorda? Que modelo de desenvolvimento o Estado projeta para o país?

Adriano Benayon – A meu ver, esses economistas não têm ideia clara do que seja desenvolvimento e julgam ter sido o governo de JK gerador de desenvolvimento. JK dizia-se desenvolvimentista. Pela mesma razão, esses economistas consideram que Dilma tenta se aproximar de algo parecido com as políticas de JK.

A semelhança é que JK manteve e ampliou os subsídios para as transnacionais estrangeiras ocuparem o mercado brasileiro e que Lula/Dilma manteve os desastres institucionais implantados por Collor e principalmente por FHC, como as privatizações, as concessões, as agências reguladoras, que servem às prestadoras dos serviços públicos privatizados, e não aos consumidores.

Lula, tal como FHC, pressionou o Congresso para aprovar emendas constitucionais das reformas tributária e previdenciária, a Desvinculação das Receitas União – DRU. Manteve também a Lei de “Responsabilidade Fiscal” e tudo mais que o sistema de poder mundial mandou instituir, na era de FHC, em favor dos banqueiros beneficiários dos absurdos juros da dívida pública, inviabilizando adicionalmente a capacidade de as empresas nacionais competirem nos mercados.

Lula e Dilma

Lula e Dilma não seriam tão monoliticamente defensores do capital estrangeiro, nem decididos anuladores das possibilidades de sobrevivência das empresas de capital nacional quanto o foi o “governo” de FHC. Mas principalmente Lula cedeu às pressões com facilidade. Dilma tenta elevar o baixíssimo quantum dos investimentos públicos, que prevalece desde o início da década perdida, dos anos 1980. Na realidade, a dos anos 1990 foi mais desastrosa, devido às privatizações e demais transformações institucionais voltadas para sufocar em definitivo o desenvolvimento do país. Mas Dilma não tem conseguido êxito. O absurdo serviço da dívida pública, a qual nunca foi auditada, consome dinheiro demais, e a redução da taxa Selic ainda não afetou significativamente essas despesas que aleijam a capacidade de o governo investir. O programa de investimentos públicos federais depende das parcerias público-privadas, um modelo incompatível com a política de um Estado capaz de comandar e orientar o processo de desenvolvimento. Os Estados estão manietados inclusive pelo serviço de suas dívidas para com a União. As estatais – que hoje são poucas – e com a Petrobrás prejudicada desde a era FHC e sem reversão tampouco disso – pouco investem em montante e em qualidade suficientes para impulsionar um desenvolvimento real. Este, de resto, depende também do setor privado, e o modelo dos últimos quase 60 anos o foi eliminando em favor das transnacionais.

(Por Patricia Fachin)

quinta-feira, 23 de agosto de 2012

A indústria da defesa está sendo desnacionalizada, diz Santayana


O jornalista Mauro Santayana denuncia, em artigo publicado em seu blog (http://www.maurosantayana.com) e em vários jornais, que a desnacionalização da indústria de defesa brasileira coloca em risco a capacidade do país de defender sua soberania. “Guerra quer dizer tecnologia. Desde o arco e a flecha — invenção que surgiu, segundo os antropólogos, com o neolítico — os países mais poderosos são aqueles na vanguarda da produção de armamentos. Preservar a paz é preparar-se para a guerra, conforme a constatação dos romanos. Quer pela nossa índole, quer por desídia, ou por confiança na sorte, o Brasil talvez seja, relativamente, o país mais indefeso do mundo”, alertou. No artigo (“O cerco do Ocidente à Indústria Brasileira de Defesa”), Santayana reconhece o esforço do ministro Celso Amorim para fortalecer a defesa nacional, mas chama atenção para a “morosidade” do processo e para a desnacionalização de nossas indústrias do setor. “O país procura investir na sua defesa, mas está muito moroso e comete um erro crasso, o de não produzir seus próprios armamentos e petrechos de combate. Estamos desnacionalizando o pouco de indústria bélica de que dispomos, com a entrada maciça de empresas estrangeiras (entre elas, e de forma agressiva, as de Israel) no parque industrial brasileiro, mediante a aquisição de firmas nacionais ou de sua associação com nossos empreendedores”.

Exemplo

“Não se pode admitir — como ocorre com a projetada fabricação de 2 mil blindados ligeiros Guarani pela Iveco, no município mineiro de Sete Lagoas — que apenas 60% das peças utilizadas sejam fabricadas no Brasil. Em caso de conflito, ou mera ameaça de confronto entre o Brasil e qualquer país da Otan (Europa e Estados Unidos), a produção desses tanques seria descontinuada e não teríamos como substituir o material perdido em combate. É de se recordar o exemplo da Argentina, que ficou literalmente a ver navios — nesse, caso, britânicos — na Guerra das Malvinas”, afirmou Santayana. E não para por aí a desnacionalização do setor de defesa. “A Aeroeletrônica, empresa brasileira que há mais de duas décadas se dedica ao projeto, desenvolvimento, fabricação, manutenção e suporte logístico de produtos eletrônicos para veículos aéreos, marítimos e terrestres é um exemplo. Ela, que forneceu sistemas de aviônica para o Tucano 27 e o Super Tucano, da Embraer, e para o caça ítalo-brasileiro AMX, foi adquirida, em 2001, pela Elbit, empresa israelense criada, em 1967, sob o estímulo do Ministério da Defesa de Israel”, denuncia.

Blindados

“A Ares – Aeroespacial e Defesa foi outra a ter o seu controle adquirido pela Elbit, no final de 2010, quando foi rebatizada como AEL Sistemas. Ela desenvolvia a Remax, uma estação de arma estabilizada servo-controlada, para metralhadoras, destinada a equipar os blindados Guarani dos quais falamos. Outros de seus produtos são os colimadores, indicadores visuais de rampa de aproximação, sistemas óticos de pontaria para tiro indireto de morteiros, sistemas de lançamento de torpedos, e foguetes de chaff, para defesa de navios”, prossegue o jornalista. Ele demonstra o grau de penetração de Israel na indústria de defesa nacional. “Com sua desnacionalização, o Remax, desenvolvido inicialmente por técnicos do CTEX, foi substituído pelo UT30BR, e o contrato para o equipamento dos blindados Guarani com essas torretas automatizadas de armamento, no valor de mais de R$ 400 milhões, foi repassado para os israelenses. Apenas três meses depois, em janeiro de 2011, Israel dava mais um passo na sua estratégia de penetração na indústria bélica brasileira, com a compra da Periscópio Equipamentos Optrônicos S.A, especializada na área de defesa e sinalização aeroportuária”, salienta. Santayana mostra-se revoltado com o “fato de que o retorno do baixo investimento feito por multinacionais estrangeiras para a compra dessas empresas, da ordem de algumas dezenas de milhões de reais, é líquido e certo”. “O lucro, várias vezes maior do que os investimentos, é assegurado por encomendas já contratadas pela Marinha, Exército e Força Aérea. Em muitos casos, nossas forças armadas já desenvolviam sistemas em parceria com estas empresas que estão sendo desnacionalizadas quando ainda estavam sob controle acionário local”, prossegue. “Empurrada pelas aquisições”, prossegue o jornalista, “a estratégia israelense no Brasil está indo de vento em popa. Em março de 2011, a AEL, controlada pela Elbit, criou com a Embraer uma nova empresa, a Harpia, que fabrica os Vants, veículos aéreos não tripulados para vigilância e ataque, do tipo utilizado pelos israelenses nos territórios palestinos e pelos norte-americanos no Paquistão e no Afeganistão”. “Outra empresa israelense, a IAL (Israel Aircraft Industries), fabricante do míssil Rafael, fornece os aviões-robôs do mesmo tipo (que os Vants) para o sistema de vigilância de fronteiras da Polícia Federal. Esses veículos telecomandados poderiam ser desenvolvidos no Brasil, onde já existem empresas incipientes formadas por universitários para atuar nesse segmento da tecnologia aérea”, denuncia.


Governos

Segundo o jornalista, a França também está fazendo aquisições estratégicas no Brasil. “Radares e helicópteros, e, agora, submarinos, são o campo de caça dos franceses, que completaram, em setembro de 2011, com o Grupo Thales, a aquisição, iniciada em 2006, de 100% do controle da brasileira Omnisys, empresa especializada no desenvolvimento e fabricação de radares de longo alcance, sediada em São José dos Campos”, alerta. Santayana destaca que “em alguns casos a fabricação de armamentos é feita — sem subterfúgios ou hipocrisia — por empresas diretamente controladas por governos estrangeiros. Esse é o caso da DNCS (Direction des Constructions Navales), que tem 75% de suas ações nas mãos do governo francês. Ela se “associou” à Odebrecht para construir, em Itajaí, no Rio de Janeiro, quatro submarinos da classe Scorpéne e mais o casco do futuro submarino nuclear brasileiro — encomendados pela bagatela de 7 bilhões de dólares”. “A Helibras, única fábrica latino-americana de helicópteros, é controlada, em mais de 75%, pela Eurocopter francesa. Esta, por sua vez, pertence em 100% à Eads, consórcio europeu que conta com a participação, direta e indireta, dos governos franceses, alemão e espanhol. Como muitos grupos de defesa multinacionais que funcionam no Brasil, a Helibras tem sido também irrigada com milionários contratos pelas Forças Armadas. É o caso da encomenda de 50 helicópteros pesados, destinados às três forças, apesar do conteúdo nacional de seus produtos ser baixo e de a maior parte dos lucros seguir todos os anos para a Europa”, adverte Santayana. “Os ingleses, naturalmente, não poderiam ficar de fora do processo da tomada de controle de nossas empresas de defesa e das encomendas do governo”, afirma. “A British Aeroespace, ou BAE Systems, acaba de fornecer três navios de patrulha oceânica para a Marinha, por quase R$ 400 milhões, em uma compra de ‘oportunidade’. Eles estavam antes destinadas a Trinidad e Tobago. No final de 2011, essa empresa também assinou contrato — depois do necessário nihil obstat do governo norte-americano — para modernizar um primeiro lote de 150 veículos blindados sobre lagartas, o M-113, utilizados em transporte de tropas, avaliados em 43 milhões de dólares. O valor pode aumentar proporcionalmente, caso o processo se estenda para toda a frota brasileira desse tipo de veículos, que chega a 350 blindados”.

Amazul

Ele aponta como positiva a criação da estatal para cuidar do submarino nuclear. “A criação da Amazul (Amazônia Azul Tecnologias e Defesa) para cuidar da produção do propulsor nuclear que irá equipar o futuro submarino nuclear brasileiro, também foi um passo fundamental para a independência do Brasil na área de defesa. Isso, embora já se organize a resistência de conhecidos grupos a fim de sabotar a empresa”. “A Amazul, estatal que não pode ser vendida a nenhum grupo estrangeiro, representará — se houver decisão política nesse sentido por parte do governo — um divisor de águas na política brasileira de defesa”, diz.

Capitulação

Santayana denuncia as associações de empresas brasileiras com empresas estrangeiras como estratégia de obtenção de tecnologia. Segundo ele, isso não garante nenhuma tecnologia e só piora a nossa vulnerabilidade. “Essas joint ventures, se vierem a ocorrer, para o fornecimento — sem garantia de 100% de conteúdo nacional e de 100% de controle brasileiro — de armamentos que levam décadas para ser desenvolvidos e produzidos, equivalerão à entrega e capitulação de nossa indústria bélica, agora e no futuro, à Europa e aos Estados Unidos. O governo Dilma Rousseff, por pressão, pressa ou ingenuidade, poderá vir a ser responsabilizado perante a História se prosseguir nesse caminho”, afirma. Ele conclui apontando numa outra direção, oposta à que esta sendo adotada. “É preciso romper o cerco ocidental à indústria brasileira de defesa. Estamos assinando acordos que equivalem a entregar a alma ao diabo. A nossa indústria bélica deve nos defender. O exemplo do que houve com a Argentina, no caso das Malvinas, basta”.

terça-feira, 14 de agosto de 2012

“Lei da Transparência” não vale para rentistas da dívida pública???




Por Auditoria Cidadã da Dívida

Governo Federal diz que não pode revelar o nome dos detentores de títulos da dívida pública, alegando “sigilo bancário”. Dia 26/7, a Secretaria do Tesouro Nacional (STN) se negou a responder requerimento de informações feito no âmbito da Nova “Lei de Acesso à Informação”, que solicitava o nome dos detentores de títulos da dívida pública. O governo alega o seguinte:

“Por força da Lei Complementar nº 105, de 10.Jan.2001 (Lei do Sigilo Bancário), a STN ou mesmo o MF não possuem acesso aos dados (nome/razão social, CPF/CNPJ) dos detentores de títulos públicos federais. Em decorrência da mencionada Lei do Sigilo bancário, o Sistema Especial de Liquidação e Custódia (SELIC), administrado pelo Banco Central do Brasil, possui uma estrutura de contas que permite tão somente segmentar os detentores por categorias, que são disponibilizadas mensalmente através do seguinte endereço: http://www.tesouro.gov.br/hp/relatorios_divida_publica.asp

Interessante observar que a tabela divulgada por tal endereço eletrônico exclui a dívida interna do Banco Central com o mercado financeiro (por meio das chamadas “Operações de Mercado Aberto”), que somava R$ 414 bilhões em junho, e está quase toda nas mãos dos bancos, conforme constatou a recente CPI da Dívida Pública na Câmara dos Deputados. Tais dados disponíveis na internet não permitem sabermos a distribuição dos grandes e pequenos investidores nos chamados Fundos de Investimentos, os quais sempre são citados por analistas conservadores como a prova de que a dívida interna beneficiaria a população brasileira como um todo. Ao contrário do informado pela STN, a Lei Complementar 105 não contém qualquer vedação à divulgação dos detentores dos títulos da dívida pública, uma vez que não se trata de operação bancária, mas sim de operação de crédito perante o setor público, que em última análise se refere a despesa arcada pela sociedade, que tem o direito, pela Lei da Transparência, de saber a quem está efetuando o pagamento dos juros e amortizações. Ademais, a informação sobre os detentores da dívida pública também não se enquadra na definição de informação sigilosa contida na Lei 12.527, art. 4º., inciso III, da qual consta o seguinte: “informação sigilosa: aquela submetida temporariamente à restrição de acesso público em razão de sua imprescindibilidade para a segurança da sociedade e do Estado”. Considerando que os detentores da dívida pública auferem rendimentos qualificados como de obrigação do setor público, tal informação se insere na obrigatoriedade constitucional – art.37 – relacionada ao Princípio da Publicidade. Ora, se não se pode divulgar quem são os detentores da dívida pública, então não se poderia também divulgar no “Portal da Transparência” do governo federal os nomes ou valores pagos pelo governo a fornecedores ou servidores públicos. Ora, qual a diferença entre estes últimos e os credores da dívida pública? Todos eles não recebem dinheiro público? Os credores da dívida estão acima da Lei? São “intocáveis”?


Confiram abaixo o inteiro teor do Requerimento de Informações e a Resposta do Tesouro Nacional.

Protocolo: 16853.006732/2012-54
Solicitante: Rodrigo Vieira de Ávila
Prazo de Atendimento: 06/08/2012 23:59:59
Tipo de resposta: Correspondência eletrônica (e-mail)
Descrição da solicitação: Requeiro as informações abaixo:

1. Nomes de todas as pessoas físicas e jurídicas detentoras de títulos da dívida interna pública federal (incluindo-se nesta as operações compromissadas pelo Banco Central e os chamados “Títulos Vinculados”), discriminando por categoria de credor (conforme detalhado abaixo), o valor dos títulos detidos por cada pessoa física ou jurídica, no dia 30 de junho de 2012, discriminando-se os detentores nacionais e estrangeiros de cada uma das categorias abaixo: a. Bancos b. Fundos de Investimento c. Fundos de Pensão ou Entidades de Previdência (Fechada e Aberta) d. Outras instituições Financeiras e. Pessoas Jurídicas Não Financeiras f. Pessoas Físicas g. Pessoas Físicas ou Jurídicas não residentes no Brasil h. Outros credores

2. Lista de todas as pessoas físicas e jurídicas credoras finais da dívida interna pública federal em títulos, assim constituídas, mediante fundos de investimento, operações compromissadas nos mercados primário e secundário, além de outras aplicações bancárias, discriminando por categoria de credor (conforme detalhado abaixo), o valor dos títulos detidos por cada pessoa física ou jurídica, no dia 30 de junho de 2012, discriminando-se os detentores nacionais e estrangeiros de cada uma das categorias abaixo: a. Bancos b. Fundos de Investimento c. Fundos de Pensão ou Entidades de Previdência (Fechada e Aberta) d. Outras instituições Financeiras e. Pessoas Jurídicas Não Financeiras f. Pessoas Físicas g. Pessoas Físicas ou Jurídicas não residentes no Brasil h. Outros credores. Se necessário, o Ministério da Fazenda pode solicitar auxílio à Comissão de Valores Mobiliários, vinculada a este Ministério, e que é responsável pela fiscalização dos Fundos de Investimento e outras aplicações bancárias.

Resposta

“Prezado Sr. Rodrigo Vieira de Ávila, em atenção ao requerimento formulado à Secretaria do Tesouro Nacional, cumpre-nos informar que: “Por força da Lei Complementar nº 105, de 10.Jan.2001 (Lei do Sigilo Bancário), a STN ou mesmo o MF não possuem acesso aos dados (nome/razão social, CPF/CNPJ) dos detentores de títulos públicos federais. Em decorrência da mencionada Lei do Sigilo bancário, o Sistema Especial de Liquidação e Custódia (SELIC), administrado pelo Banco Central do Brasil, possui uma estrutura de contas que permite tão somente segmentar os detentores por categorias, que são disponibilizadas mensalmente através do seguinte endereço: http://www.tesouro.gov.br/hp/relatorios_divida_publica.asp Acessando o endereço acima, o cidadão poderá escolher o relatório do mês desejado e verificar as informações no item 2.2 do Relatório. Desejando uma série histórica, basta consultar o Anexo 2.7 do item “Tabelas”, no mês de sua preferência.”Conforme o art. 19, do Decreto nº 7724/2012, o requerente poderá interpor recurso no prazo de 10 dias a contar da ciência da resposta, por meio do Sistema e-Sic (www.acessoainformacao/sistema) ou no Protocolo SIC do Ministério da Fazenda localizado no Edifício Órgãos Centrais – SAS Quadra 6, Bloco O – Brasília/DF. O recurso será encaminhado para a autoridade competente para o seu julgamento, no caso, ao Subsecretário da Dívida Pública do Tesouro Nacional.”


Adriano Benayon: "Mensalão e Corrupção"



Mensalão e Corrupção

Os principais jornais, revistas e TVs, sempre alinhados com os interesses imperiais,  dão grande destaque ao julgamento, no Supremo Tribunal Federal, do mensalão, levado adiante nas instâncias do Estado, porque atinge principalmente José Dirceu, um líder centralizador de poder, e tido por ser de esquerda.  Além disso, pode abalar a popularidade de Lula

2. Em todo o mundo, os oligarcas estrangeiros e seus agentes e laranjas locais tratam de minar quaisquer lideranças que aspirem a voos próprios e se tornem, assim, menos dependentes dos dinheiros daqueles.

3. O sistema de poder mundial trata de fazer alternar no Executivo partidos que cumpram suas determinações. No Brasil, conquanto tenha como agentes preferenciais o PSDB e aliados, a oligarquia anglo-americana -  para dar espaço a Lula – se valera, em 1994, das fraudes que alijaram Brizola do segundo turno.

4. E ela não fez virar a mesa, quando, em 2002, Lula derrotou o candidato de FHC,  desgastadíssimo pelos efeitos sobre a  população dos desastres causados pelo governo do PSDB.  Lula foi logo anunciando nomeações de agentes da oligarquia, como Meirelles para presidir o Banco Central, e Marina Silva, ministra do Meio-Ambiente.

5. Por outro lado, embora o PSDB não seja palatável para a maioria dos eleitores, a oligarquia conta com o tempo decorrido desde 2002 e com a amnésia ministrada pela grande mídia para fazer esquecer a devastação tucana.

6. E, para ajudar nisso, nada melhor que expor a responsabilidade do PT num grande esquema de corrupção, não porque o PT não esteja atendendo os interesses do poder mundial,  mas porque os concentradores preferem manter viva sua alternativa mais segura, o PSDB.

7. Ademais, a corrupção está entre os temas que têm suscitado maior preocupação ao povo brasileiro, e não apenas no seio da classe média, tradicionalmente moralista.

8. Alguns blogs independentes ou patrocinados pelo atual governo lembraram que os tucanos cometeram, nos oito anos de FHC, atos de corrupção causadores  de danos muito mais profundos para o País, e nisso esses blogs têm razão.

9. Falta, porém, razão aos que negam o mensalão. Mais relevante que isso: deixam de observar que a corrupção do mensalão comprou parlamentares de partidos menores, não para aprovar propostas favoráveis à sociedade brasileira, mas para aprovar emendas constitucionais e leis que deram continuidade à agenda do império, a do Consenso de Washington e do FMI.

10. Isso parece até contraditório, já que, para esse tipo de coisa, o PT poderia ter o apoio da “oposição”, PSDB, DEM, PPS e outros, fieis à agenda entreguista, embora houvesse a possibilidade de se oporem, como fez o PT, no período FHC, sabendo que ela seria adotada de qualquer modo.

11. Mais que isso: o PT julgou necessário garantir maioria estável no Congresso, ameaçada pela flutuação dos votos de grande parte dos parlamentares do PMDB e de outros partidos cujo apoio depende de cargos e vantagens.

12. De qualquer forma, o mensalão não passa de um caso da corrupção de varejo. Mas esse teve grande repercussão, ao contrário do mensalão tucano em Minas Gerais e da ainda mais grave compra de deputados para votarem a favor da emenda constitucional que permitiu a reeleição de FHC.

13. E que dizer dos casos de mega-corrupção tucana com as privatizações,  evasão de divisas no escândalo do BANESTADO etc.?

14. O que o povo brasileiro precisa saber, para agir em consequência, é que a corrupção no País é sistêmica. Que quer dizer isso? Que ela decorre da estrutura econômica, social e política existente.

15. E o que caracteriza essa estrutura? A concentração da propriedade dos meios de produção em mãos de grupos econômicos, hoje, basicamente estrangeiros ou desnacionalizados.

16. Provém desses grupos a corrupção ativa, os abusos do poder sobre o mercado, as fraudes em prejuízo dos consumidores e outras formas de corrupção. Corrompem não só políticos e agentes públicos, mas gente do setor privado dentro desses próprios grupos e em outras empresas.

17. Tudo isso resulta no empobrecimento da grande maioria dos brasileiros, apesar de o País ser extremamente rico em terras férteis, água, minérios preciosos e estratégicos.

18. Passa, em geral, despercebido que a corrupção no setor público parte, amiúde, do setor privado. Concorre para essa falta de percepção a atitude seletiva da grande mídia, a qual enfatiza a corrupção no âmbito do Estado. Embora aponte também casos com empresários no pólo ativo da corrupção, trata de acobertar grandes transnacionais e bancos.

19. O aspecto social da estrutura econômica mostra-se na concentração da renda, com 60% da população sem renda ou ganhando menos de dois salários mínimos. O quadro é tão deplorável, que os “especialistas” da Secretaria de Assuntos Estratégicos (SAE) da Presidência da República definem como de classe média as famílias com renda, por pessoa, entre R$ 291 e R$ 1.019 mensais.

20. Do outro lado, são colossais os ganhos das transnacionais e dos bancos, que comandam a economia e a política. As transferências das transnacionais ao exterior descapitalizam o País de forma aguda, inviabilizando que os ganhos do mercado sejam reinvestidos na economia produtiva. 

21. Até mesmo os brasileiros ricos, que têm muito menos poder e incluem servidores oficiais e extra-oficiais dos concentradores, já detinham, no final de 2010, recursos financeiros em paraísos fiscais no exterior de US$ 520  bilhões.

22. Claro está que os partidos políticos e os resultados das eleições são controlados pelos grupos concentradores, os quais determinam, ademais, o acesso das pessoas aos meios de comunicação e o que, através destes, se “informa” e desinforma aos cidadãos.

23. É de concluir, pois, que a estrutura política é incompatível com o Estado democrático de direito e decorre da estrutura econômica concentrada e desnacionalizada.

24. As normas democráticas da Constituição permaneceram letra morta, como a que limita os juros reais a 12% aa., enquanto as favoráveis aos concentradores são rigorosamente aplicadas e foram acrescidas das reformas de FHC, instituídas conforme as receitas do Consenso de Washington, FMI e  Banco Mundial e mantidas e prorrogadas nos governos petistas.

25. Deveria também ser conhecido de todos que a Constituição de 1988 foi fraudada para privilegiar o “serviço da dívida” no Orçamento Federal e realizar descomunal sangria, que já passa de R$ 7 trilhões, esvaziando do País os seus recursos.

26. Ninguém, entre os constituintes, reparou na fraude. Será? Se alguém notou, fingiu que não notou. Nem o  relator nem o presidente da Assembléia Constituinte, nem seus assessores, nem líder de partido algum.

27. O estelionato foi cometido através de requerimento de fusão de emendas  de redação aos atuais artigos 165/167, inserindo no 166 o dispositivo fraudulentamente acrescentado ao texto aprovado no primeiro turno, ao submetê-lo para aprovação em segundo turno.

28. Na página do requerimento em que o texto foi adulterado, está a rubrica de Nelson Jobim, agora nomeado por Sarney, presidente do Senado, para liderar o grupo de “notáveis” que elabora revisão do pacto federativo. Constituição cidadã? Não, demagogia! 

29. A concentração e a desnacionalização da economia intensificaram-se desde 1954, e, desde 1988, esse processo acelerou-se.  Daí vem a inviabilidade de ser praticado no País qualquer sistema de governo democrático.

30.  Está arraigada, nas universidades e nos demais meios de comunicação social a falsa ideia de que pluralismo de partidos, “liberdade” de imprensa e de informação e eleições periódicas são suficientes para caracterizar a democracia.

31. Que essas condições não garantem democracia alguma está sendo mais percebido nos países “desenvolvidos” abalados pelo colapso financeiro e pela depressão (recessão é eufemismo, mal fundamentado através da manipulação de dados estatísticos).

32. Naquelas “democracias”, como no Brasil, os partidos e as eleições são controlados pelos concentradores financeiros “privados”, os grandes bancos e transnacionais, que são de propriedade privada, mas exercem poder público.

33. Isso está na raiz dos colapsos econômicos e não só impediu de moderar a natural tendência à concentração do sistema capitalista, mas a agravou através da legislação e da política econômica.

34. Desde a crise de 2007, os concentradores privados ganharam recursos e vantagens governamentais da ordem de US$ 30 trilhões, enquanto as condições sociais se agravavam.

35. Portanto, é a oligarquia financeira que origina a corrupção sistêmica e dela se beneficia. Ademais as “formas democráticas” não evitaram sequer que fosse instituído nos EUA o Estado policial, principalmente a partir do golpe de 11 setembro de 2001.

36. Só os menos informados ignoram ter havido, nesse dia, um golpe da oligarquia para facilitar novas guerras e agressões imperiais e eliminar as garantias constitucionais, a pretexto de combater um terrorismo inexistente ou facilmente contível.

37. A “democracia” brasileira é calcada nesses modelos nada exemplares, e a iniquidade social é maior que nos países “desenvolvidos”. E, como se isso tudo não bastasse,  há, ainda,  a urna eletrônica sem a possibilidade de conferir o voto.

38. Mas como erguer um sistema realmente democrático, com maior espaço para a democracia direta e capaz de assegurar que a democracia representativa não mais seja a farsa que tem sido?

39. Como instituir sistema democrático sem transformação profunda na estrutura econômica e social? Ou será que teríamos de, antes, transformar as instituições políticas subordinadas aos concentradores da estrutura econômica?

40. Que fazer, então, diante do fato de que não há como sequer modificar superficialmente essas instituições enquanto elas estiverem de pé?


Adriano Benayon é Doutor em Economia pela Universidade de Hamburgo e Advogado, OAB-DF nº 10.613, formado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro. Foi Professor da Universidade de Brasília e do Instituto Rio Branco, do Ministério das Relações Exteriores. Autor de “Globalização versus Desenvolvimento”.
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