1º Caso: DNA
liberal
O artigo primeiro da lei 9.478 diz que:
“As políticas nacionais para o aproveitamento
racional das fontes de energia visarão aos seguintes objetivos:
I - preservar o interesse nacional;
II - promover o desenvolvimento, ampliar o mercado
de trabalho e valorizar os recursos energéticos;
III - proteger os interesses do consumidor quanto a
preço, qualidade e oferta dos
produtos;
IV - proteger o meio ambiente e promover a
conservação de energia;
V - garantir o fornecimento de derivados de
petróleo em todo o território nacional, nos termos do § 2º do art. 177 da
Constituição Federal;
VI - incrementar, em bases econômicas, a utilização
do gás natural;
VII - identificar as soluções mais adequadas para o
suprimento de energia elétrica nas
diversas regiões do país;
VIII - utilizar fontes alternativas de energia,
mediante o aproveitamento econômico dos insumos disponíveis e das tecnologias
aplicáveis;
IX - promover a livre concorrência;
X - atrair investimentos na produção de energia;
XI - ampliar a competitividade do País no mercado
internacional.”
Nestes onze objetivos da política energética
brasileira, nada é dito visando o cidadão
brasileiro ser beneficiado, enquanto o consumidor
tem seus interesses protegido. Ou
seja, para quem não consome, não há objetivo a
atingir! “Contribuir para a eliminação da miséria, a inclusão social e o
abastecimento de comunidades carentes” poderiam ser metas, mas não estão aí.
Contudo, “promover a livre concorrência” é um dos objetivos. Inclusive, notar
que a “livre concorrência” aqui não é adjetivada. Então, pode ser que uma
empresa nacional nascente tenha que competir com gigantes estrangeiros, cujo resultado
é previsível. “Atrair investimentos na produção de energia” é um objetivo em
qualquer condição. Se a atração ocorrer com grande perda para a sociedade
brasileira, ainda assim é um objetivo. Em um país em que prevaleciam estes
valores é que o monopólio estatal do petróleo foi extinto e os leilões
começaram. Aliás, a mesma lei 9.478, cujo artigo primeiro foi mostrado, é a que
criou a ANP, estabeleceu a entrega do território nacional em leilões para a
busca de petróleo, a entrega deste quando descoberto, alem de outros danos para
a sociedade. Os objetivos da política energética nacional e o restante da lei
9.478
precisam ser refeitos.
2º Caso:
Criação de insegurança jurídica com possibilidade de danos para a coisa pública
A referência deste caso será a 11ª rodada de
licitações de blocos do território nacional para exploração e produção de
petróleo e gás, que ocorreu em 14 de maio passado, promovida pela Agência
Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP). No entanto, a
crítica é válida para todas as rodadas já realizadas. O contrato de concessão a
ser assinado com a ANP pelas empresas ganhadoras das licitações, que compõem a
11ª rodada, é parte integrante do edital desta rodada. Os dois documentos podem
ser obtidos no site da ANP. No contrato, a expressão “Melhores Práticas da
Indústria do Petróleo” está em 19 locais do contrato, especificamente nos
itens: 1.3.21, 5.3, 5.9, 9.10.1, 10.3.1, 10.10 a , 11.2, 11.14, 12.7,
12.11, 14.10, 14.12.1, 14.12.2, 14.17, 18.6, 20.2 c, 20.2.1, 21.1 e 33.9. Por
exemplo, no item 14.10, é dito: “O Concessionário deverá planejar, preparar,
executar e controlar as Operações de maneira diligente, eficiente e apropriada,
de acordo com a Legislação Aplicável e com as Melhores Práticas da Indústria do
Petróleo, respeitando sempre as disposições deste Contrato e não praticando
qualquer ato que configure ou possa configurar infração da ordem econômica”. A
natural indagação, que brota, por esta expressão conter alto grau de
interpretação
subjetiva, é se a Chevron não teria agido, no
desastre do campo de Frade, segundo sua própria interpretação, dentro das
“Melhores Práticas da Indústria do Petróleo”? Esta expressão acolhe diferentes
entendimentos, cada um deles respaldado por uma
interpretação subjetiva. Contratos são assinados
para diminuir o grau de subjetividade das diversas obrigações e direitos dos
contratados. Um contrato bem redigido prevê ao máximo, dentre outros aspectos,
as situações futuras e estabelece linhas de atuação para cada diferente
situação, não permitindo que elas sejam, no futuro, sujeitas a diferentes compreensões
e interpretações. No item 1.3.28 do contrato, existe uma definição para as
“Melhores Práticas da Indústria do Petróleo”, que não diminui o grau de
subjetividade embutido na expressão. A definição é longa e sua parte inicial é:
“Melhores Práticas da Indústria do Petróleo são práticas e procedimentos
geralmente empregados na Indústria de Petróleo em todo o mundo, por Operadores
prudentes e diligentes, sob condições e circunstâncias semelhantes àquelas
experimentadas relativamente a aspecto ou aspectos relevantes das Operações,
visando principalmente à garantia de:
(a) aplicação das melhores técnicas e procedimentos
mundialmente vigentes nas atividades de Exploração e Produção;
(b)
conservação de recursos petrolíferos e gasíferos, o
que implica a utilização de métodos e processos adequados à maximização da
recuperação ...”.
Notar que foram utilizadas, neste trecho da
definição, as palavras “geralmente”, “prudentes”, “diligentes”, “semelhantes”,
“relevantes”, “melhores”, “vigentes” e “adequados”, cada uma delas contendo
subjetividade no seu bojo. Então, a dificuldade de compreensão precisa da
expressão continuou existindo. Assim, em cada um dos 19 locais, onde esta
expressão é utilizada, o concessionário e o concessor podem ter interpretações
diferentes do mesmo fato real. Nestes contratos, com a possibilidade de ter
sido intencional, há brechas para concessionários inescrupulosos poderem negar
a responsabilidade por eventuais atos danosos, que trouxerem prejuízos à coisa
pública.
(...)
Continua na próxima postagem...
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