As chapas de ferro-nióbio são o principal dos
produtos do nióbio nas exportações brasileiras, tendo totalizado US$ 4,8
bilhões, de 1996 a
2013. Somamos os dados, ano a ano, que estão na tabela do Ministério do
Desenvolvimento, Indústria e Comércio.
2. O mercado é fechado, estando concentrado
em poucas empresas importadoras e pouquíssimas empresas exportadoras. São
transações entre empresas dos mesmos grupos ou entre grupos associados. A CBMM,
de Araxá, que exporta 90% do total, vende o produto às suas próprias
subsidiárias no exterior.
3. O preço seria muito mais alto, se houvesse
mercados abertos ou algum tipo de concorrência, a não ser entre indústrias
utilizadoras do metal.
5. Encontrei na internet notícia recente, 6 de
setembro, da Bolsa de Metais de Bejing (Pekim) nestes termos: “Os
preços do nióbio metálico a 99,9% de pureza permanecem estáveis em 115 a 120 dólares por quilo,
na Comunidade de Estados Independentes.” [Rússia, Ucrânia e outros]
6. Guardei também uma cotação, de 22.01.2011, do
sítio eletrônico “chemicool/elements/niobium”, de nióbio puro (óxido de
nióbio), a US$ 18.00 por 100 g
= US$ 180.00 por quilo. Além disso, outra, do mesmo ano, em que a barra de
nióbio era cotada a US$ 315,70 por quilo.
7. Isso é mais de 10 vezes o preço oficial da
exportação brasileira desse insumo, i.é., US$ 30,00 por quilo, no último
ano. Já o preço oficial da chapa de ferro-nióbio é menor ainda (R$
25,00), mesmo porque não se refere propriamente ao nióbio
incorporado às chapas de ferro-nióbio, nas quais o conteúdo de nióbio é
diminuto, embora suficiente para lhes dar qualidade muitíssimo acima das outras
ligas metálicas.
8. Para ter uma idéia, o preço oficial das
exportações das chapas de ferro-silício e ferro-manganês, têm estado em US$
1,77 e US$ 2,25, respectivamente. Dez vezes inferiores aos do ferro-nióbio.
9. Embora o óxido de nióbio tenha muito valor no
exterior, mormente transformado, após o processo de redução, ele é de pouca
significação nas exportações oficiais brasileiras. O valor oficial de
suas vendas ao exterior quase dobrou de 2009 para 2010, mas não é expressivo:
foi para US$ 44 milhões, com preço médio de US$ 30,00, para quase 1.500
toneladas.
10. Esse preço de um produto processado em pouco
supera o do minério bruto, que vem associado ao tântalo e ao vanádio. As
exportações oficiais desse minério chegaram, em 2012, a quase US$ 50
milhões, com valor unitário de US$ 24,00.
11. Note-se que as mineradoras instaladas no
Brasil, a CBMM e a Anglo-American, têm, com as chapas de ferro-nióbio, receita
36 vezes maior que a obtida com o minério bruto e 41 vezes maior que a obtida
com o óxido de nióbio, mesmo contando-se só suas provavelmente
subfaturadas exportações.
12. Devem isso à iniciativa do professor Bautista
Vidal, titular, nos anos 70, da Secretaria de Tecnologia Industrial. Ele
mobilizou técnicos para criar o processo de incorporar o óxido às ligas
metálicas, através do Departamento de Engenharia de Materiais - da Escola de
Engenharia de Lorena- USP.
13. As exportações oficiais das chapas de
ferro-nióbio certamente não chegam a US$ 6 bilhões, desde que começaram, nos
anos 80, até hoje. Pois, em 1996, o volume ainda era diminuto, e os
preços, muito baixos. De então até 2013, conforme a Tabela do MDIC, foram US$
4,8 bilhões.
14. Causa, pois surpresa esta notícia da
Agência Bloomberg, dos EUA, publicada em 03/03/2013, no Valor Econômico:
“Família mais rica do Brasil fez US$ 13 bilhões com o sonho do nióbio”.
15. Nela foi reportado: “Ela [a CBMM, Companhia Brasileira de Metalurgia e Mineração] vale pelo menos US$ 13
bilhões, baseado na venda da família de uma parte de 30% para um grupo de
produtores de aço asiático por US$ 3,9 bilhões em 2011” .
16. O dado mais notável da notícia da
Bloomberg/Valor Econômico é este: “... os herdeiros de Moreira Salles, a
família mais rica do Brasil, seus quatro filhos, Fernando, Pedro, João e
Walter, controlam uma fortuna combinada de US$ 27 bilhões, segundo o ‘Bloomberg
Billionaires Index’ ”.
17. Levando em conta que o outro patrimônio mais
importante do grupo Moreira Salles era o UNIBANCO, um banco que, há alguns
anos, entrou em dificuldades e foi absorvido pelo Itaú, parece nebuloso
como foi possível acumular US$ 27 bilhões, com os lucros decorrentes fundamentalmente
das exportações de nióbio, valoradas conforme as cifras oficiais.
18. De fato, os lucros disso para a CBMM não
poderiam passar muito de US$ 1 bilhão, diante destes fatos: 1) faturamento
de $ 6 bilhões; 2) mesmo que os lucros tivessem sido sempre 50% do
faturamento, não passariam de US$ 3 bilhões; 3) até 2007, a CBMM só tinha 50%
das ações, além de que a tecnologia e o provável controle serem da Molybdenum
Corp; dos EUA, do grupo Rockefeller; 4) desde 2011, há grupos siderúrgicos
asiáticos com 30% de participação na CBMM; 5) a CODEMIG (estatal de Minas
Gerais) tem 25% de participação nos “lucros operacionais” da CBMM; 6) 10% das
exportações oficiais provêm da Anglo-American.
19. Com cerca de US$ 1 bilhão de lucros acumulados,
e mais os US$ 3,9 bilhões da venda de 30% do capital da CBMM, admitindo
que tenham ido inteiramente para o grupo Moreira Salles, ainda se fica muito
longe dos US$ 27 bilhões referidos na notícia mencionada.
20. Fica, pois, demonstrado que o Brasil está longe
de ter, em seu proveito, as receitas reais ou, no mínimo, as receitas reais
possíveis, da extração de seu subsolo de um metal tão precioso e estratégico
como o nióbio.
22. Seria a base para garantir o interesse do País
nessa área. Entretanto, o Estado tornou-se demissionário: praticamente tudo é
objeto de concessões. No caso da principal reserva de nióbio, a União a cedeu
ao Estado de Minas. Este, depois de mais de trinta anos de concessão à CBMM,
renovou-a, em 2003, por mais 30 anos, sem licitação.
23. Cabe indagar por que as coisas são assim? Creio
que vêm de longe e se foram agravando. Aí pelos anos 50, alguns líderes ainda
tentavam consolidar a consciência dos interesses nacionais, e o País fazia
progressos para o desenvolvimento. Nisso, o País sofreu intervenções, como a
conspiração que derrubou Vargas em 1954. Logo após esse golpe, foram dados
privilégios às empresas transnacionais, cujos carteis foram esmagando, em
crescente quantidade, promissoras indústrias nacionais.
24. Isso acentuou-se sob JK, com a mesma política
de atração de capitais estrangeiros, a qual fez implantar o cartel da indústria
automobilística. Esse, até hoje, produz déficits externos e ainda se ceva de
isenções fiscais e subsídios da União, dos Estados e dos Municípios.
25. Ora, a desnacionalização implica
inviabilizar o desenvolvimento tecnológico e faz que o apoio governamental à
ciência e a tecnologia seja, na maior parte, desperdiçado, pois as
tecnologias só se desenvolvem em empresas atuantes no mercado. E dele as
nacionais têm hoje poucos nichos. A consequência é a
desindustrialização, entendida não só como regressão à produção primária, mas
também como confinamento da indústria a produções de baixo valor agregado.
26. Os capitais estrangeiros tornaram-se dominantes
inclusive na informação, nas comunicações e na política. As políticas passaram
a ser desenhadas no seu interesse. Entre os inumeráveis exemplos, está a lei
Kandir, que isenta a exportação, inclusive de produtos primários, de IPI, ICMS
e contribuições sociais. Primeiro lei complementar, ela ganhou mais status em
2003: através de EC, foi incorporada à Constituição.
27. Então, a sociedade fica sem forças para reagir,
já que os empresários industriais nacionais foram dizimados, e os que restam
são acuados por políticas adversas. Tampouco os trabalhadores estão bem
organizados para defenderem o País, o que seria a própria defesa deles.
28. Tivesse o País evoluído nos últimos 59 anos, a
economia ter-se-ia diversificado para patamares crescentes de intensidade
tecnológica, e, como no quartzo para os chips e a eletrônica avançada, o
nióbio estaria sendo utilizado, em grande escala, nos bens de altíssimo valor
agregado.
29. Nesse caso, não estaríamos falando das perdas
atuais com subpreços. Nem precisaríamos lembrar que nosso percentual da oferta
do nióbio é muito maior que a de todos os membros da OPEP, juntos, no
tocante ao petróleo. Poderíamos criar a Bolsa do Nióbio e defender seus preços.
30. E ganharíamos centenas de vezes mais ao
fabricarmos bens de elevada tecnologia, competitivos, livres dos carteis e de
grupos concentradores.
31. Esse padrão de desenvolvimento e de consciência
dos interesses nacionais, por parte das lideranças políticas, faria
conhecer o real valor do nióbio e de outros recursos naturais, e, assim,
eles não seriam alienados por praticamente nada. O Brasil teria também ganhado
poder suficiente para defender seu povo e seus bens.
[Notas: 1) a CBMM pertence à holding financeira,
Brasil Warrants, originalmente Brazilian Warrants, adquirida em Londres, a qual
seria controlada pela família Moreira Salles; 2) documentos oficiais
classificam como de seu interesse estratégico dos EUA as reservas de nióbio
situadas em Araxá (MG), concedidas à CMBB e Catalão (GO), à mineradora
britânica Anglo-American.]
Adriano Benayon é Doutor em Economia pela Universidade de Hamburgo e Advogado, OAB-DF nº 10.613, formado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro. Foi Professor da Universidade de Brasília e do Instituto Rio Branco, do Ministério das Relações Exteriores. Autor de “Globalização versus Desenvolvimento”. abenayon.df@gmail.com
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