quinta-feira, 7 de outubro de 2010

Os índios e a "guerra dos elementos"

Nilder Costa

Alerta em Rede - O ostensivo bloqueio das autoridades chinesas para a exportação de metais de terras raras (MTR) para o Japão pode significar o início efetivo do que muitos analistas já denominam como a “guerra dos elementos”. A motivação oficial para o bloqueio foi a recente captura e prisão, por autoridades japonesas, do capitão de uma embarcação pesqueira chinesa que estava operando em águas disputadas pelos dois países. Semana passada, o capitão chinês foi libertado, mas o bloqueio comercial permaneceu. [1]
Em realidade, Pequim já havia anunciado, anteriormente, uma redução de 40% nas exportações desses minérios raros, pressionando os compradores estrangeiros a iniciar o processamento industrial de tais matérias-primas dentro da própria China. Os MTR, como se sabe, são essenciais para a fabricação de circuitos elétricos e eletrônicos modernos, catalisadores, ímãs e uma gama enorme de outros produtos de tecnologias de ponta.
De acordo com um relatório da British Geological Survey, apesar de possuir apenas 37% das reservas conhecidas de MTR, a China é responsável, na atualidade, por 97% da sua produção mundial, como mostram as figuras abaixo: [2]

Reservas mundiais de terras raras (Fonte: US Geological Survey, 2010)



Produção de minérios de terras raras (REO) Fonte: British Geological Survey, 2010


Se tal monopólio chinês vem se transformando em uma questão de grande preocupação estratégica, e não apenas para o Japão, esse quadro se agrava ainda mais ao se considerar que a China lidera a produção de outros minérios importantes, como mostra o quadro abaixo:

PrProdução mundial e principais produtores de minérios selecionados (Fonte: US Geological Survey, 2010)

Por outro lado, a China vem investindo pesadamente na aquisição de terras e reservas minerais em outros países, sobretudo na África. De fato, como este Alerta já reportou, o apetite fundiário chinês no Brasil suscitou, por parte do governo brasileiro, uma modificação na legislação pertinente. Trata-se de um primeiro passo importante, mas insuficiente devido à existência de fragilidades que vão muito além das fundiárias, notadamente nas despovoadas e pouco conhecidas regiões amazônicas onde são freqüentes o contrabando ilegal de minérios de terras raras, como a columbita-tantalita, principal fonte de nióbio e tântalo.
Em 2001, por exemplo, a Polícia Federal e o IBAMA apreenderam 7 toneladas de ametista e 300 quilos de columbita-tantalita retirados ilegalmente da reserva dos índios tucanos e baniuas, na fronteira do Brasil com a Colômbia, no Alto Rio Negro. O carregamento foi apreendido a bordo do barco de passageiros Tanaka, no porto de São Raimundo, em Manaus (AM). [3]
Os minérios foram extraídos por índios tucanos do rio Tiquié e a operação teria sido patrocinada pela ONG Cooperíndio (Cooperativa de Produção dos Índios do Rio Negro). Segundo o vice-presidente da entidade, Adi Nagel Júnior, cerca de 50 famílias indígenas participam da extração de minérios nos rios Içana e Tiquié, perto de São Miguel da Cachoeira (AM). As notas fiscais do carregamento estavam em nome de José Lopes Filho, supostamente, representante da Companhia Industrial Fluminense (CIF), de São João del Rei (MG). Esta empresa, fundada em 1912, foi comprada em 1979 pelo grupo Metallurg, dos EUA.
Uma análise em perspectiva histórica e geopolítica do panorama estratégico que se desenrola em torno da guerra perene por matérias-primas, sejam as tradicionais ou as novíssimas, mostra quão danosa aos interesses nacionais tem sido a política indígena no Brasil, onde desponta a paradigmática e absurda demarcação da reserva Raposa-Serra do Sol, em Roraima. Sabe-se que a prospecção mineral no país, ainda que meritória, é por demais incipiente especialmente em áreas onde se localizam as terras indígenas demarcadas ou a demarcar. Se tal política não for rapidamente revertida, não constituiria nenhum exagero afirmar que o Brasil corre um sério risco de constatar, em futuro não tão longínquo, que "chineses" negociam a exploração de riquezas minerais, até então desconhecidas, diretamente com "povos indígenas" que gozam de autonomia validada e assegurada por tratados internacionais.

Notas:
[1]Is this the start of the 'element wars'?, Short Sharp Science, 27/09/2010
[2]“Rare Earth Elements”, British Geological Survey, 2010
[3]Índios do Alto Rio Negro contrabandeiam minério estratégico, Alerta Científico e Ambiental, 10/04/2001

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