A Menina e a Boneca
Mãozinhas decididas, mas delicadamente desajeitadas. Ainda rechonchudas e cravadas de buraquinhos, com aquela pele esticada e brilhante refletindo vida ainda com muito por viver, a menina segura com força e ternura o brinquedo. Curiosa, leva à boca, analisa, aperta. Arranca-lhe partes, compara e compreende cada detalhe no seu conjunto com o todo, como se fosse uma autêntica autópsia de um médico da vida. Como se quisesse, ansiosa, seqüestrar os augúrios do próprio futuro naquelas vísceras expostas da boneca. Suga e acumula cada informação, percebe o mundo, transcende ao tempo, imagina, sonha, cria, supera limites e, por isso, se humaniza; e conhece... e conhece..., aprendendo cada vez mais do mundo e de si mesma, apenas brincando de boneca. Ah! que epopéia extraordinária! Que mistério fascinante! No “monta-desmonta” curioso, compulsivo e frenético, do caos à ordem, da ordem ao caos, feliz, a menina manipula o próprio destino, se supera e cresce. O brinquedo, assim, lhe permite sonhar e se fazer, lentamente, gente grande. No exato momento em que se imagina mãe, a magia se realiza e o botão começa a desabrochar, anunciando o nascimento grandioso de uma nova mulher. E a princesinha começa, brincando, a construção dialética da adulta dentro de si, numa metamorfose divina, impregnada da mais pura poesia, mas que poeta algum poderá expressar jamais em todo o seu esplendor. É o início fascinante vida de uma mulher, forjada pela criança. A partir daí, como numa tragédia grega, se sacrifica, cedendo dia-a-dia um pouquinho de si mesma para que a mulher floresça dentro de si. Mais ou menos como a anulação descomprometida da lagarta para que a borboleta surja com toda sua beleza e todo o seu fascínio. E contrariando o que se pensa e o que se diz, de certa forma, não são os adultos que se sacrificam pelas crianças, mas o contrário: são as crianças que vão se sumindo dentro dos adultos - e pelos adultos. Até que um dia... a menininha desaparece por completo dentro da mulher, deixando sua criação sempre com a sensação saudosa e agradecida de que um dia brincou de bonecas; e de que também deve se sacrificar por alguém. Ah! que saudade que sente de si mesma! Por isso, há um misterioso ar de consternação no fundo do olhar de todas as mulheres, mesmo em momentos alegres, como se tivessem perdido alguém muito importante. Mas a Natureza não as deixam esquecer jamais. É somente por esta razão que em todas elas há a convicção inabalável e sagrada do que significa o despojamento e a responsabilidade instintiva da maternidade. Esta é apenas agradecimento para consigo mesmas. Nada mais.
Mãozinhas decididas, mas delicadamente desajeitadas. Ainda rechonchudas e cravadas de buraquinhos, com aquela pele esticada e brilhante refletindo vida ainda com muito por viver, a menina segura com força e ternura o brinquedo. Curiosa, leva à boca, analisa, aperta. Arranca-lhe partes, compara e compreende cada detalhe no seu conjunto com o todo, como se fosse uma autêntica autópsia de um médico da vida. Como se quisesse, ansiosa, seqüestrar os augúrios do próprio futuro naquelas vísceras expostas da boneca. Suga e acumula cada informação, percebe o mundo, transcende ao tempo, imagina, sonha, cria, supera limites e, por isso, se humaniza; e conhece... e conhece..., aprendendo cada vez mais do mundo e de si mesma, apenas brincando de boneca. Ah! que epopéia extraordinária! Que mistério fascinante! No “monta-desmonta” curioso, compulsivo e frenético, do caos à ordem, da ordem ao caos, feliz, a menina manipula o próprio destino, se supera e cresce. O brinquedo, assim, lhe permite sonhar e se fazer, lentamente, gente grande. No exato momento em que se imagina mãe, a magia se realiza e o botão começa a desabrochar, anunciando o nascimento grandioso de uma nova mulher. E a princesinha começa, brincando, a construção dialética da adulta dentro de si, numa metamorfose divina, impregnada da mais pura poesia, mas que poeta algum poderá expressar jamais em todo o seu esplendor. É o início fascinante vida de uma mulher, forjada pela criança. A partir daí, como numa tragédia grega, se sacrifica, cedendo dia-a-dia um pouquinho de si mesma para que a mulher floresça dentro de si. Mais ou menos como a anulação descomprometida da lagarta para que a borboleta surja com toda sua beleza e todo o seu fascínio. E contrariando o que se pensa e o que se diz, de certa forma, não são os adultos que se sacrificam pelas crianças, mas o contrário: são as crianças que vão se sumindo dentro dos adultos - e pelos adultos. Até que um dia... a menininha desaparece por completo dentro da mulher, deixando sua criação sempre com a sensação saudosa e agradecida de que um dia brincou de bonecas; e de que também deve se sacrificar por alguém. Ah! que saudade que sente de si mesma! Por isso, há um misterioso ar de consternação no fundo do olhar de todas as mulheres, mesmo em momentos alegres, como se tivessem perdido alguém muito importante. Mas a Natureza não as deixam esquecer jamais. É somente por esta razão que em todas elas há a convicção inabalável e sagrada do que significa o despojamento e a responsabilidade instintiva da maternidade. Esta é apenas agradecimento para consigo mesmas. Nada mais.
Said Barbosa Dib
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