17/10/2009 | |
Virgílio Freire : "É preciso reestatizar a Telefônica " consultor em telecomunicações por Hugo Cilo (IstoÉ Dinheiro) Ele não é petista, socialista, chavista ou adepto de qualquer outro "ismo" ligado à esquerda. Ao contrário, foi um dos principais executivos do Brasil em telecomunicações, no período pós-privatização. Esse é Virgílio Freire, um consultor de 64 anos, que já presidiu companhias como a Lucent, subsidiária da AT&T, e a Vésper, a empresa-espelho na região de São Paulo. Hoje, ele prega algo que soa quase como uma heresia: a reestatização do setor, em especial da Telefônica. E explica: "As empresas estão mais preocupadas com o lucro do que com a qualidade dos serviços." Ele ainda questiona o investimento de R$ 2 bilhões anunciado pela empresa na reformulação do Speedy. "Não estão comprando nenhum equipamento", afirma. DINHEIRO - Por que o sr. passou a defender a reestatização das telecomunicações? DINHEIRO - Seu alvo é a Telefônica, em São Paulo? DINHEIRO - Estatizar ao estilo do venezuelano Hugo Chávez? DINHEIRO - A regulação não é papel da Agência Nacional de Telecomunicações? DINHEIRO - Mas recentemente a Telefônica foi multada em quase R$ 2 bilhões e o Speedy teve sua venda proibida. Não foi uma resposta do governo? |
DINHEIRO - Logo depois da multa, a Telefônica entregou à Anatel um plano emergencial de melhoria dos serviços e lançou um programa de modernização de mais de R$ 2 bilhões. Isso não basta?
FREIRE - Esse plano de investimentos é, no mínimo, propaganda institucional. Não existe de fato. Desafio qualquer um a apresentar um pedido de compra de equipamentos feito pela Telefônica. A Associação de Engenharia de Telecomunicação entrou em contato com todos os fornecedores no País, todos mesmo, de componentes para telecomunicações para saber para onde estavam indo os investimentos de R$ 2 bilhões anunciados pela Telefônica. Consultaram Alcatel-Lucent, Motorola, Siemens, Nokia, Huawei e todas as outras. Para nossa surpresa, até hoje não existe nenhum pedido ou compra de equipamento. Então, podemos concluir que isso é uma falácia.
DINHEIRO - A Telefônica tem capital aberto e é fiscalizada aqui e na Espanha. Como é possível?
FREIRE - Bom, vamos fazer uma análise do balanço divulgado pela Telefônica no ano passado. Daí, cada um tira a conclusão que quiser. A empresa informou que investiu R$ 2,3 bilhões em 2008. Desse total, R$ 459 milhões foram para desenvolvimento de sistemas, que nada mais é do que atualização de softwares, um valor dez vezes maior do que um grande contrato de TI. Totalmente desproporcional. Também divulgaram investimento de R$ 471,8 milhões em aquisição de equipamentos de assinante. Ou seja, modem para internet e aparelhos telefônicos. O preço mais alto desses aparelhos é R$ 100. Se a gente dividir R$ 471,8 por R$ 100, chegamos à seguinte conclusão: a Telefônica comprou 4,7 milhões de aparelhos em 12 meses. Muito estranho, não? A empresa possui hoje 13 milhões de linhas.
DINHEIRO - O balanço foi auditado por uma consultoria independente.
FREIRE - Prefiro não comentar sobre a reputação da Ernst&Young.
DINHEIRO - Como o sr. avalia a telefonia celular? É melhor do que a fixa?
FREIRE - Não é monopolista, mas é muito ruim por falta de pulso firme da Anatel. As empresas estão mais preocupadas em remunerar os acionistas do que em investir de forma a prestar um serviço de qualidade à população.
DINHEIRO - A própria competição entre as empresas não equaciona esse problema?
FREIRE - Um aspecto interessante sobre esta excessiva competição na área de celulares é que, por incrível que pareça, as operadoras não estão bem de lucros. A razão é simples. Elas acham que market share é quanto do número de assinantes ou clientes cada uma tem. Na verdade, 80% de todos as linhas celulares no Brasil são pré-pagas, que geram por mês uma receita que não chega nem à metade do que gera um pós-pago. Elas se concentram em vender, vender, e os pré-pagos quase não fazem ligações. São usados para receber, e consequentemente, não geram receita.
DINHEIRO - A estratégia está errada?
FREIRE - É uma estratégia suicida. Se eu fosse presidente de uma operadora de celular, iria concentrar esforços em vender a quem gera receita, os pós-pagos. Iria criar novos serviços. Iria paparicar meu cliente
DINHEIRO - Isso custa caro.
FREIRE - Já notou como a publicidade de todas as operadoras de celular é igual? E, sem sentido, do tipo "vocês sem limites". Um slogan vazio. Se eu dirigisse uma operadora de celular, criaria um excelente atendimento ao cliente, sem terceirizar.
DINHEIRO - A terceirização é um problema?
FREIRE - Terceirizar qualquer função de contato com o cliente é suicídio. Você já notou que nenhuma empresa aérea terceiriza aeromoças?
DINHEIRO - A Telesp, onde o sr. já foi diretor, e a Vésper não tinham atendimento bom.
FREIRE - Muito melhor do que o atendimento de hoje. Foi com essa filosofia que criei a Vésper.
DINHEIRO - Então, por que a empresa não deu certo?
FREIRE - Porque os acionistas brigaram. A Bell Canadá, principal acionista, resolveu sair do Brasil e parar de investir na Vésper. Assim, cortou mais de US$ 2 bilhões de investimentos.
DINHEIRO - Na maioria dos países, o Estado não compete no setor de telefonia e as coisas funcionam bem. O que acontece lá?
FREIRE - Como se vê, não há como escapar do papel fiscalizador e protetor do consumidor que o Estado deve assumir. Na pátria do capitalismo, os Estados Unidos, tudo o que disse até agora é executado com competência pela Anatel deles, o Federal Communications Commision, que é todo ocupado por profissionais que têm anos de experiência. O FCC foi o modelo para a Anatel, mas nossa agência desde o início foi uma caricatura, não uma cópia benfeita.
DINHEIRO - Apesar das falhas, a Anatel tem tentado mudar. Concorda?
FREIRE - A agência não sabe trabalhar. Vou dar um exemplo simples de como a Anatel funciona de forma burra. A fim de promover a competição, a agência inventou uma coisa que existe em nenhum outro país do mundo. Inventou a discagem da operadora de longa distância a cada chamada. Isso nos força a discar 13 dígitos a cada chamada interurbana. Gastou-se uma fortuna para adaptar as centrais para isso, quando bastava ter copiado o que os Estados Unidos fazem. Lá, você faz assinatura com uma operadora de longa distância e pronto.
DINHEIRO - Isso pode ser mudado, não?
FREIRE - A Anatel não entende de satisfação do cliente. No caso dos Estados Unidos, a competição é até mais eficaz porque a operadora de longa distância que você contratou não quer perdê-lo
DINHEIRO - Afinal, qual a solução para o setor de telefonia no Brasil?
FREIRE - Caímos de novo na atuação do Estado, da Anatel, que deveria ter gente capaz de avaliar as operadoras por dentro.
DINHEIRO - Quem garante que a estatização será o fim dos problemas?
FREIRE - Não há garantias, mas é a alternativa mais sensata.
DINHEIRO - Sua ofensiva contra a Telefônica não prejudica seu futuro profissional?
FREIRE - Não me preocupo com isso. Hoje sou consultor de empresas internacionais de telefonia. Meu ganha-pão não está no Brasil. Por isso, tenho independência para falar.
Não é apenas a "Telefónica" que presta um péssimo serviço. A Oi, que está abarcando o país inteiro, também está apenas preocupada com o lucro em detrimento dos clientes. Veja o artigo que eu escrevi sobre o assunto: http://vivenciandoti.blogspot.com/2009/10/telerj-se-espalha-pelo-pais-usando.html
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