"Pressão faz parte da democracia que ajudei a construir"
Por Said Barbosa Dib*
Sarney está feliz feito criança. E bastante disposto para 2010. Vem recebendo elogios importantes pelo andamento das reformas no Senado. Em recente entrevista ao “Estadão”, Lula, do alto dos seus 80% de aprovação, mais uma vez defendeu Sarney com convicção: “o Sarney foi um homem de uma postura muito digna em todo esse episódio. Das acusações que vocês (o jornal) fizeram contra o Sarney, nenhuma se sustenta juridicamente e o tempo vai provar”. O apoio não vem só dos aliados, como Lula e Dilma, mas também daqueles que, há bem pouco tempo, eram críticos contundentes. Colegas que chegaram a criticá-lo, como o senador Pedro Simon, e até jornalistas, como Ricardo Noblat, estão reconhecendo sua atuação na modernização da Casa. Depois que a Fundação Getúlio Vargas entregou as propostas de mudanças na instituição, cumprindo determinação de Sarney, Simon fez questão de felicitá-lo pelo trabalho até agora realizado. O senador gaúcho declarou: "Eu acho que V. Exª deve estar feliz, porque recebe o respeito da Casa". E reconheceu o grande esforço de Sarney no processo: “A imprensa coloca de uma maneira maldosa, que nós aqui terminamos em pizza. Mas o Senado, sob seu comando, enfrenta seus problemas e cumpre com o dever, ao contrário do que faz a Câmara Legislativa de Brasília, que entra em recesso quando recebe o pedido de impeachment do governador". No “Comitê de Imprensa”, da Agência Câmara, na semana passada, em debate sobre as relações do governo Lula com a mídia, os convidados do programa, os jornalistas Rudolfo Lago e Evandro Paranaguá, que também exerceram suas críticas ao presidente do Senado, fizeram questão de elogiar a postura democrática de Sarney. Destacaram as relações do Planalto com a imprensa na Nova República, as condições de trabalho dos jornalistas que faziam a cobertura do governo, a convivência do presidente com os repórteres e o caráter eminentemente democrático do ex-presidente. Sarney tem dito aos amigos que, depois do que aconteceu, o Senado está bem melhor. Acha que, por mais contraditório que possa parecer, a crise e todas as dificuldades enfrentadas, acabaram por lhe dar mais força para levar avante as mudanças necessárias. Mudanças que, faz questão de lembrar, já estavam em seu programa de ação em fevereiro de 2009, quando foi convocado pelo partido a concorrer à Presidência da Casa. E avalia que, apesar dos exageros, dos ataques pessoais e dos desgastes sofridos, “sem as pressões da mídia não teria conseguido avançar tanto”. Acha que o sacrifício valeu a pena. Lembrando seu tempo na Presidência da República, comentou: “Na época também sofri grande pressão, foi muito desgastante. Pressão faz parte da democracia que ajudei a construir. Ataques vinham de todos os lados. Tive que administrar, com sacrifício pessoal, todos os conflitos com muita paciência; tive que aquentar ataques a mim e a minha família, tive que suportar acusações falsas e intrigas. E justamente sobre “sacrifícios”, brincou, como sempre, lembrando o padre Antônio Vieira, que falando sobre o projeto divino que nos chega pelo grito dos necessitados e sacrificados, ensinava: "...não há lume de profecia mais certo no mundo que consultar as entranhas dos homens. E de todo homem? Não. Dos sacrificados. Se quereis profetizar o futuro, consultai as entranhas dos que se sacrificam e dos que se sacrificam para diminuir o sacrifício dos outros". Mas Sarney está animado não apenas pelas conquistas políticas e administrativas de sua gestão na Presidência da Casa. Como católico fervoroso, não esconde de ninguém a felicidade com que recebeu a homenagem da Nunciatura Apostólica da Santa Sé em Brasília, no início do ano, quando o núncio apostólico no Brasil, Dom Lorenzo Baldisseri, disse que "homenagear o senador José Sarney é percorrer, na sua eminente pessoa, um traço significativo de história contemporânea do Brasil." A verdade é que o conciliador José Sarney merece esta e outra homenagens. Recebe o reconhecimento da Cruz e da Espada, do lado espiritual e do político. É um homem público com virtudes indispensáveis para se enfrentar crises: a capacidade de inovação, a paciência, o senso de justiça e a persistência. Talvez por isso, Sarney retorne agora aos trabalhos do Senado com aquele sorriso de menino de quase oitenta anos, satisfeitíssimo com a vida e sempre extremamente educado e paciente com todos os funcionários.
Said Barbosa Dib é historiador e analista político em Brasília
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