Serra ficou três anos sem limpar o Tietê. Mas, segundo a isenta “Veja”, o problema é uma “rara combinação de fatores atmosféricos”, além do povo, que mora no lugar errado, e a Dilma
A administração do Estado de São Paulo, como diz o governador, José Serra, tem por princípios inabaláveis a prioridade e o planejamento. Desde que Serra tomou posse, acabaram-se os tempos em que a esculhambação não tinha prioridade – nem planejamento. Há semanas a mídia vinha publicando que o governo paulista retirava 400 mil metros cúbicos de resíduos do Tietê a cada ano. O volume é totalmente insuficiente para livrar São Paulo do perigo de um transbordamento, porque o Tietê recebe mais de um milhão de metros cúbicos por ano de sedimentos. Porém, a situação, segundo o próprio governo estadual, é pior: comunicado da Secretaria Estadual de Saneamento e Energia (SSE) e do Departamento de Águas e Energia Elétrica (Daee) informa que: 1º) não foram 400 mil, mas 380 mil metros cúbicos que foram retirados em 2009; 2º) esse volume não foi retirado apenas do Tietê, mas “dos rios Tietê, Cabuçu de Cima, Tamanduateí e dos piscinões do ABC e Pirajuçara”. O problema é que somente o Tietê recebe 1,2 milhão de metros cúbicos de resíduos por ano.
Isso já seria um desastre. Só a estúpida “Veja” conseguiu colocar a culpa na natureza, atribuindo a devastação em São Paulo às chuvas intensas – e na ministra Dilma, que estaria explorando eleitoralmente a questão, enquanto Serra, o homem da prioridade e do planejamento, se recusa a fazer campanha. Logo Serra, que só faz uma coisa na vida: campanha. Se não faz mais, é porque está difícil apresentar bairros alagados e sem luz, gente desabrigada, ruas venezianas e esgotos flutuando na porta das casas como obras espetaculares da sua operosa administração. Evidente que choveu e continua chovendo muito. Serra não criou a chuva. Mas, exatamente por somente se preocupar com sua campanha, deixou o Estado ainda mais despreparado do que já estava para as chuvas, apesar de vários avisos anteriores da natureza - e de outros, como o INPE (ver matéria nesta página). Até mesmo os 380 mil ou 400 mil metros cúbicos de retiradas de resíduos, apesar de minúsculos para as necessidades, são duvidosos.
A repórter Conceição Lemes, em matéria no site “Viomundo”, do jornalista Luiz Carlos Azenha, conta a sua peregrinação para comprovar essa retirada. Alguns trechos:
“Uma primeira busca nos portais do Daee e da secretaria de Saneamento e Energia, nada a respeito. Entre dezembro de 2005, término da obra da calha [do Tietê], e outubro de 2008, início da vigência do contrato de desassoreamento, há um ‘buraco’. Um período sem explicações sobre limpeza do Tietê.
“O Viomundo questionou a assessoria de imprensa da secretaria de Energia e Saneamento (SSE) sobre a limpeza em 2006, 2007, 2008 e 2009. O motivo: a falta de dados oficiais mostrando que os 380 mil ou 400 mil metros cúbicos foram removidos nos três primeiros anos.
“‘A limpeza é feita sistematicamente todo ano’, diz por telefone a esta repórter o assessor de imprensa da SSE, Hugo Almeida. ‘Tem máquinas limpando o Tietê o ano inteiro.’
“A repórter insistiu. Enviou e-mail a Hugo Almeida e, por orientação dele, também a Gregory Melo (da assessoria de imprensa do Daee, órgão vinculado à SSE). Reenviou a mensagem mais três vezes. Nenhum dos dois retornou.
“A repórter reforçou por telefone a solicitação à assessoria de imprensa da SSE, já que, segundo ela, as informações seriam fornecidas pela SSE e não pelo Daee.
“A primeira ligação, na segunda-feira cedo, 21 de dezembro, Hugo Almeida atendeu:
- Estou indo atrás das informações para você, mas esses documentos são difíceis, faz muito tempo...
- É impossível instituições como as de vocês [Daee e SSE] não terem esses documentos à mão, arquivados ou no Diário Oficial do Estado... São comprovações atestando que esses serviços foram feitos...
“Seguiram-se outros telefonemas para o assessor de imprensa: ‘Ele não está’. ‘Está numa reunião’. ‘Volta mais tarde’. ‘Deu uma saidinha, mas volta’. ‘Acabou de sair’...
“Invariavelmente essas respostas eram precedidas pelo ‘Quem gostaria de falar? Vou verificar...’. Fazia-se breve silêncio. E aí vinha a negativa, manjadíssima, aliás.
“Na terça-feira, 22, como a mudez do outro lado era absoluta, esta repórter tentou logo cedo contato. Júnior, assistente da assessoria de imprensa, informou: ‘O Hugo não está, só volta no final da tarde’.
“A repórter ligou de novo, mas, propositalmente, deu um nome qualquer sem sobrenome.
“Adivinhem o que aconteceu? Hugo atendeu.
“Inicialmente, o assessor de imprensa da SSE/Daee tentou ser dono da verdade. Não deu certo. Acabou entregando os pontos:
- Não vou dispor das informações que você quer – disse e desligou”.
A repórter lembra que, depois de 2005, “foi somente no segundo semestre de 2008 que o governo do Estado de São Paulo resolveu licitar o desassoreamento de 400 mil metros cúbicos de sedimentos do Tietê”.
“Da barragem da Penha ao Cebolão, relembramos, são lançados anualmente no rio Tietê cerca de 1,2 milhão de metros cúbicos (1,2 milhão m³) de sedimentos. A partir daí o professor Julio [Cerqueira César Neto, especialista em Hidráulica e Saneamento] fez as contas:
· 1,2 milhão m³ (em 2006) + 1,2 milhão m³ (2007) + 1 milhão m³ (em 2008, janeiro a final de outubro) = 3,4 milhões de metros cúbicos.
· Portanto, até outubro de 2008, já havia depositado na calha do leito do Tietê um passivo de 3,4 milhões de metros cúbicos.
· Do final de 2008 a dezembro de 2009, segundo a secretária Dilma Pena, removeram-se 380 mil metros cúbicos. Ou seja, permaneceram no Tietê 820 mil metros cúbicos.
· Pois bem, somando os 3,4 milhões de metros cúbicos (não tirados de 2006 a final de 2008) com os 820 mil metros cúbicos (não removidos de 2008 /2009), o rio Tietê está com, pelo menos, 4,2 milhões de metros cúbicos de terra e lixo.
Conclusão 1: Atualmente, estima-se, o Tietê tem ao redor 4,2 milhões de metros de sedimentos depositados no seu leito na capital. É como se quase metade dos 9 milhões de metros cúbicos retirados durante a obra da calha tivesse sido jogada, de novo, dentro do rio.
Conclusão 2: Os 4,2 milhões de metros cúbicos dão uma altura de sedimentos de 4,2 metros. Supera de longe, portanto, os 2,5 metros de aprofundamento da calha.
Conclusão 3: O nível do Tietê voltou ao que era antes das obras da calha; R$ 1,7 bilhão praticamente jogado no lixo”.
O último valor é o dinheiro gasto com o alargamento e aprofundamento da calha do Tietê, atualizado pelo IGP-DI.
C.L. - Hora do Povo
A administração do Estado de São Paulo, como diz o governador, José Serra, tem por princípios inabaláveis a prioridade e o planejamento. Desde que Serra tomou posse, acabaram-se os tempos em que a esculhambação não tinha prioridade – nem planejamento. Há semanas a mídia vinha publicando que o governo paulista retirava 400 mil metros cúbicos de resíduos do Tietê a cada ano. O volume é totalmente insuficiente para livrar São Paulo do perigo de um transbordamento, porque o Tietê recebe mais de um milhão de metros cúbicos por ano de sedimentos. Porém, a situação, segundo o próprio governo estadual, é pior: comunicado da Secretaria Estadual de Saneamento e Energia (SSE) e do Departamento de Águas e Energia Elétrica (Daee) informa que: 1º) não foram 400 mil, mas 380 mil metros cúbicos que foram retirados em 2009; 2º) esse volume não foi retirado apenas do Tietê, mas “dos rios Tietê, Cabuçu de Cima, Tamanduateí e dos piscinões do ABC e Pirajuçara”. O problema é que somente o Tietê recebe 1,2 milhão de metros cúbicos de resíduos por ano.
Isso já seria um desastre. Só a estúpida “Veja” conseguiu colocar a culpa na natureza, atribuindo a devastação em São Paulo às chuvas intensas – e na ministra Dilma, que estaria explorando eleitoralmente a questão, enquanto Serra, o homem da prioridade e do planejamento, se recusa a fazer campanha. Logo Serra, que só faz uma coisa na vida: campanha. Se não faz mais, é porque está difícil apresentar bairros alagados e sem luz, gente desabrigada, ruas venezianas e esgotos flutuando na porta das casas como obras espetaculares da sua operosa administração. Evidente que choveu e continua chovendo muito. Serra não criou a chuva. Mas, exatamente por somente se preocupar com sua campanha, deixou o Estado ainda mais despreparado do que já estava para as chuvas, apesar de vários avisos anteriores da natureza - e de outros, como o INPE (ver matéria nesta página). Até mesmo os 380 mil ou 400 mil metros cúbicos de retiradas de resíduos, apesar de minúsculos para as necessidades, são duvidosos.
A repórter Conceição Lemes, em matéria no site “Viomundo”, do jornalista Luiz Carlos Azenha, conta a sua peregrinação para comprovar essa retirada. Alguns trechos:
“Uma primeira busca nos portais do Daee e da secretaria de Saneamento e Energia, nada a respeito. Entre dezembro de 2005, término da obra da calha [do Tietê], e outubro de 2008, início da vigência do contrato de desassoreamento, há um ‘buraco’. Um período sem explicações sobre limpeza do Tietê.
“O Viomundo questionou a assessoria de imprensa da secretaria de Energia e Saneamento (SSE) sobre a limpeza em 2006, 2007, 2008 e 2009. O motivo: a falta de dados oficiais mostrando que os 380 mil ou 400 mil metros cúbicos foram removidos nos três primeiros anos.
“‘A limpeza é feita sistematicamente todo ano’, diz por telefone a esta repórter o assessor de imprensa da SSE, Hugo Almeida. ‘Tem máquinas limpando o Tietê o ano inteiro.’
“A repórter insistiu. Enviou e-mail a Hugo Almeida e, por orientação dele, também a Gregory Melo (da assessoria de imprensa do Daee, órgão vinculado à SSE). Reenviou a mensagem mais três vezes. Nenhum dos dois retornou.
“A repórter reforçou por telefone a solicitação à assessoria de imprensa da SSE, já que, segundo ela, as informações seriam fornecidas pela SSE e não pelo Daee.
“A primeira ligação, na segunda-feira cedo, 21 de dezembro, Hugo Almeida atendeu:
- Estou indo atrás das informações para você, mas esses documentos são difíceis, faz muito tempo...
- É impossível instituições como as de vocês [Daee e SSE] não terem esses documentos à mão, arquivados ou no Diário Oficial do Estado... São comprovações atestando que esses serviços foram feitos...
“Seguiram-se outros telefonemas para o assessor de imprensa: ‘Ele não está’. ‘Está numa reunião’. ‘Volta mais tarde’. ‘Deu uma saidinha, mas volta’. ‘Acabou de sair’...
“Invariavelmente essas respostas eram precedidas pelo ‘Quem gostaria de falar? Vou verificar...’. Fazia-se breve silêncio. E aí vinha a negativa, manjadíssima, aliás.
“Na terça-feira, 22, como a mudez do outro lado era absoluta, esta repórter tentou logo cedo contato. Júnior, assistente da assessoria de imprensa, informou: ‘O Hugo não está, só volta no final da tarde’.
“A repórter ligou de novo, mas, propositalmente, deu um nome qualquer sem sobrenome.
“Adivinhem o que aconteceu? Hugo atendeu.
“Inicialmente, o assessor de imprensa da SSE/Daee tentou ser dono da verdade. Não deu certo. Acabou entregando os pontos:
- Não vou dispor das informações que você quer – disse e desligou”.
A repórter lembra que, depois de 2005, “foi somente no segundo semestre de 2008 que o governo do Estado de São Paulo resolveu licitar o desassoreamento de 400 mil metros cúbicos de sedimentos do Tietê”.
“Da barragem da Penha ao Cebolão, relembramos, são lançados anualmente no rio Tietê cerca de 1,2 milhão de metros cúbicos (1,2 milhão m³) de sedimentos. A partir daí o professor Julio [Cerqueira César Neto, especialista em Hidráulica e Saneamento] fez as contas:
· 1,2 milhão m³ (em 2006) + 1,2 milhão m³ (2007) + 1 milhão m³ (em 2008, janeiro a final de outubro) = 3,4 milhões de metros cúbicos.
· Portanto, até outubro de 2008, já havia depositado na calha do leito do Tietê um passivo de 3,4 milhões de metros cúbicos.
· Do final de 2008 a dezembro de 2009, segundo a secretária Dilma Pena, removeram-se 380 mil metros cúbicos. Ou seja, permaneceram no Tietê 820 mil metros cúbicos.
· Pois bem, somando os 3,4 milhões de metros cúbicos (não tirados de 2006 a final de 2008) com os 820 mil metros cúbicos (não removidos de 2008 /2009), o rio Tietê está com, pelo menos, 4,2 milhões de metros cúbicos de terra e lixo.
Conclusão 1: Atualmente, estima-se, o Tietê tem ao redor 4,2 milhões de metros de sedimentos depositados no seu leito na capital. É como se quase metade dos 9 milhões de metros cúbicos retirados durante a obra da calha tivesse sido jogada, de novo, dentro do rio.
Conclusão 2: Os 4,2 milhões de metros cúbicos dão uma altura de sedimentos de 4,2 metros. Supera de longe, portanto, os 2,5 metros de aprofundamento da calha.
Conclusão 3: O nível do Tietê voltou ao que era antes das obras da calha; R$ 1,7 bilhão praticamente jogado no lixo”.
O último valor é o dinheiro gasto com o alargamento e aprofundamento da calha do Tietê, atualizado pelo IGP-DI.
C.L. - Hora do Povo
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