quinta-feira, 16 de abril de 2009

Carlos Lopes


Acaba confisco de R$ 15 bi da Petrobrás pelo superávit primário

Projeto de alteração da LDO reduz o superávit primário de 3,8% para 2,5% do Produto Interno Bruto. Os recursos, que estavam reservados para o pagamento de juros aos especuladores, poderão ser revertidos em mais investimentos

O governo decidiu enviar ao Congresso um projeto alterando a Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) deste ano, para diminuir o chamado “superávit primário” de 3,8% para 2,5% do Produto Interno Bruto (PIB). Ao mesmo tempo, resolveu reduzir a meta de “superávit primário” no Orçamento que será aprovado para o ano que vem.
A iniciativa é bastante importante. Em primeiro lugar, livra a Petrobrás de entregar aos bancos nada menos do que 0,5% do PIB, ou seja, cerca de R$ 15 bilhões, de uma suposta dívida com a qual a empresa nada tem a ver. O dinheiro que a Petrobrás era obrigada a entregar por conta do “superávit primário” tinha o objetivo de que o Tesouro pagasse aos que especulam com títulos públicos, favorecidos pelos juros do Banco Central. Nada tinha a ver com qualquer operação da companhia.
Em segundo lugar, livra o próprio governo central de imobilizar o equivalente a 0,75% do PIB, ou seja, quase R$ 23 bilhões, também para pagar juros aos bancos.
Em terceiro lugar, livra Estados e municípios de parte da sangria, pelo menos R$ 500 milhões, causada pelo “superávit primário” em suas finanças.
Em suma, é dinheiro do povo que pode retornar ao povo sob a forma de investimentos, de programas sociais, de atendimento, etc. Ao todo, cerca de R$ 38 bilhões que antes estavam destinados a juros para especuladores.
Ao contrário do que certos porta-vozes de bancos tentam passar em seus comentários na imprensa falada, escrita e televisada, o “superávit primário” não é um conceito econômico ou um elemento do Orçamento, ou, menos ainda, uma necessidade para o equilíbrio das contas públicas. Aliás, até 1999 não havia qualquer “superávit primário” no Brasil. Nesse ano, o governo Fernando Henrique, sob a égide do FMI, instituiu essa excrescência. Trata-se apenas de uma invenção para garantir que o pagamento de juros pelo Tesouro seja amarrado no próprio Orçamento, isto é, na distribuição que o Estado faz do dinheiro que o povo paga em impostos, dando prioridade, sempre, aos juros. A rigor, é apenas uma reserva para pagar juros. Assim, tudo o mais – investimentos, despesas sociais, custeio do atendimento ao povo, educação, saúde e, inclusive, empresas estatais, Estados e municípios – é submetido a um desconto, uma espécie de tributo que os bancos e especuladores embolsam às custas de toda a sociedade.
Quando o Brasil, por obra e graça do governo Fernando Henrique, ficou pendurado no FMI, a ameaça deste era não conceder empréstimos ao país, se ele não sangrasse seus recursos para formar essa reserva para os juros. Esta é a razão pela qual muitos argumentam que não há mais razão para que haja “superávit primário” no Brasil, uma vez que não estamos mais pendurados no FMI. Nas palavras do jornalista e economista José Paulo Kupfer, em excelente artigo, “as metas de superávit primário perderam toda a sua eventual razão de ser. O superávit primário é um entulho econômico dos tempos dos garrotes do FMI, imposto ao País como condição para novos empréstimos compensatórios” (cf. José Paulo Kupfer, “Basta de superávits primários”).
A decisão do governo, portanto, ainda que não acabe imediatamente com os “superávits primários”, aponta na direção certa. Uma vez tomada essa decisão, é mais fácil perceber como esse tributo feudal ou escravagista – pois não passa disso – tem servido para frear o nosso crescimento. Só a Petrobrás, nossa maior empresa, estava sendo depletada em R$ 15 bilhões, considerando o PIB de 2008.
Na entrevista coletiva em que anunciou a medida, o ministro Paulo Bernardo, do Planejamento, preferiu abordar o problema sob outra ótica: essencialmente, a de que seria uma medida para compensar a queda na arrecadação. Disse o ministro que “não é um dinheiro a mais, é simplesmente uma conta para fazer com que o nosso caixa se mantenha equilibrado”.
É importante a preocupação com o equilíbrio do caixa. Ninguém gostaria que o ministro do Planejamento fosse um perdulário, desperdiçando dinheiro público. Observaremos apenas que as Leis de Diretrizes Orçamentárias que seu Ministério enviou ao Congresso – tanto a de 2009 quanto a de 2010 – já previam crescimento para ambos os anos, mesmo com o superávit intocado. Liberar dinheiro que antes estava esterilizado – ou era drenado – sob a forma de “superávit primário”, servirá para impulsionar esse crescimento. Supomos que é isto o que o ministro da Fazenda, Guido Mantega, quis dizer quando afirmou, na mesma entrevista coletiva, que a medida faz parte da “política anti-cíclica” do governo. E, de qualquer forma, o que tem sido uma ameaça às contas públicas são, precisamente, os juros da dívida pública, portanto, o “superávit primário”. A necessidade de liberar agora uma parte dele para, nas palavras do ministro Paulo Bernardo, “equilibrar o caixa”, somente confirma esta asserção, aliás, óbvia.
Do “Hora do povo”

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