Américo de Oliveira Costa
Dentro do jornalismo

Os próprios títulos genéricos das seções já sugerem essa continuidade, a “santa continuidad” de Eugênio D’Ors, de citação tão frequente nos seus livros. Ensaios literários, Cartas do Rio, Notas de História, Biblioteca, Actas Diurnas não são, evidentemente, rótulos para artigos isolados e ocasionais. Significarão, no tempo, uma após outra, as séries de suas colaborações em A República, já citada e no Diário de Natal.

Os assuntos preferidos? A terra comum, os seus homens e fastos, os seus atos e legendas, episódios literários ou artísticos. Em quase todas, caracterizava-se magnificamente aquela “poeira da História”, de Lemaître: sempre uma lição, um testemunho, uma evocação, uma presença, sensíveis na jornada coletiva, através dos tempos e das gerações. Reunidas, dariam material para vários volumes. Outros encargos poderá ter desempenhado, mesmo ocasionalmente, como homem de jornal: correspondente de agência estrangeira, repórter. Mas a crônica, o colunismo, a seção assinada, ou mesmo apenas identificada com as iniciais, abordando temas e coisas de sua predileção, ou correlacionados com os seus estudos, é que o distinguiu no exercício da profissão.
Numa dessas crônicas, uma Acta Diurna, aliás, se define, como uma profissão de fé, como uma pronúncia de votos sagrados, todo o alto e nobre labor intelectual de seu autor, irradiando-se além das fronteiras do jornal. Possui a intemporalidade das coisas marcadas com o selo do Espírito.
Foi publicada a 25 de setembro de 1943, em A República, e intitula-se O tonel das Danaides:

- Acabou vosso suplício. Largai essa penitência. O tonel está cheio.
As Danaides pararam, pela primeira vez, há milênios. Enxugaram a fronte, descendo as bilhas infatigáveis. E dizem confusas e desapontadas :
- Está cheio o tonel? Pois bem! Que havemos de fazer? Já estamos habituadas com o trabalho contínuo, mesmo inútil.
Não perguntem, pois amigos, por que escrevo sempre, com ou sem leitores, com ou sem compreensão, estímulo ou tolerância. Deixem-me com o meu barril sem fundos. A tarefa finda significaria o repouso incômodo, a displicência, a preguiça mortal. Por isso, mesmo sem ter ofendido Apolo, encho, obstinado e tranqüilo, a talha imperfeita, escondido num recanto de província. Quando não mais ouvirem o rumor da água agitada, não se dirá que Júpiter sucumbiu. Será que, para sempre, desfaleceu na Morte, o braço humilde do trabalhador...”
Capítulo do livro Viagem ao Universo de Câmara Cascudo, de Américo de Oliveira Costa.
Ler mais no “Memória Viva”...
Capítulo do livro Viagem ao Universo de Câmara Cascudo, de Américo de Oliveira Costa.
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