terça-feira, 21 de julho de 2009

Até o ombudsman da Folha admite campanha contra o Senado

CARLOS EDUARDO LINS DA SILVA

Como diminuir a lixação

O Legislativo produz mais do que crimes e fofocas, as duas únicas criações que parecem mobilizar a reportagem NA QUINTA-FEIRA , o jornal noticiou que o Senado havia aprovado em última instância projeto de lei que altera regras para a adoção de crianças. A mais recente menção da Folha ao assunto havia ocorrido em 21 de agosto de 2008. É como se dez meses atrás tivesse anunciado que Roberto Carlos faria um show no Maracanã e só voltasse ao tema na segunda para descrever o espetáculo. Ou tivesse dito na quinta que o Cruzeiro perdera a final da Libertadores sem ter tratado do campeonato nos 300 dias anteriores. Poucos discordarão de que a Lei Nacional de Adoção é um assunto relevante. Como a lei da gorjeta, a reforma eleitoral, a regulamentação dos mototáxis, as mudanças no processo de divórcio, só para citar algumas leis a respeito das quais o Congresso tomou decisões vitais recentemente e que foram apresentadas ao leitor como fatos consumados. As atividades de trabalho do Legislativo (nos seus três níveis) são cobertas pobremente pela Folha. E não é por falta de gente nem de papel. Boa quantidade de árvores caiu para produzir a montanha de páginas usadas para os mil e um escândalos da Câmara e do Senado só neste ano. É claro que denunciar malfeitorias com dinheiro público é uma das principais funções do jornalismo. Mas o Legislativo produz mais do que crimes e fofocas, suas duas únicas criações que parecem mobilizar a reportagem deste jornal. Mesmo nessas áreas, seu desempenho é fraco. As malversações em geral só aparecem quando algum político interessado em prejudicar adversários as joga no colo de um repórter. Durante anos o Senado teve mais de uma centena de diretores, cujos nomes e funções constavam de catálogos públicos. Mas só agora se tratou deles, por exemplo. E a cobertura insiste em focar pessoas, não instituições. É mais fácil responsabilizar indivíduos do que explicar processos. Mas tal simplificação é perniciosa para a cidadania e para a sociedade. O jornal precisa produzir e editar mais material do tipo que gerou o livro recomendado ao final desta coluna e menos do que tem sido o padrão do seu jornalismo político: textos previsíveis, redundantes, cifrados, superficiais, aborrecidos, moralistas e frequentemente a serviço conscientemente ou não de políticos ou individualmente ou em grupos. Em entrevista que vai ao ar amanhã e está indicada abaixo, o jornalista Gay Talese diz que uma providência imediata para melhorar a qualidade do seu jornal, o "New York Times", seria tirar de Washington a maioria dos jornalistas que compõem a sucursal na capital do país. Talvez nem seja preciso tanto aqui. Se os que estão em Brasília se dedicarem a informar o leitor sobre a tramitação de projetos de lei de importância, ajudando-o a engajar-se no debate público, o jornal será mais efetivo. Talvez então congressistas suspeitos deixem de se lixar para ele.

Nenhum comentário:

Postar um comentário