E os outros? Onde estão os outros?
Por Carlos Lindenberg*
O Senado da República tem 81 Senadores. Alguns mais ladinos, outros menos, mas ninguém chega lá sem algum mérito, nem que seja apenas o da esperteza - sim, desculpem, mas neste país há ainda quem acha que esperteza é uma virtude. Pois bem. É evidente que, num grupo assim, alguns se limitam a fazer figuração. Votam determinados projetos, deixam de votar outros, frequentam algumas sessões, gazeteiam outras, e vão levando a vida. Outros dão duro, até onde é possível numa Casa de senhores vetustos - nem todos, nem todos -, mas o fato é que, destes 81, uns 20, se tantos, acabam assumindo posições de comando, se destacam, tornam-se líderes e, nessa condição, governam.
Pois bem. De todos, um foi escolhido como símbolo do que se chama hoje de Casa dos Horrores, de tanto que se tem falado nela e nos mal-feitos que têm sido encontrados lá ultimamente. José Sarney é o nome dele. Há três ou quatro meses, tudo o que o Senado tem de ruim parece ter sido criado, estimulado ou soprado pelo ex-presidente da República José Sarney. Há roubalheira no Senado? Há, alguém poderá responder. O culpado? José Sarney. Tem goteira no Senado? Tem, dirão outros. Pois a culpa é de José Sarney.
É bem verdade que, por conta daquelas virtudes citadas acima, Sarney foi duas vezes presidente do Senado e agora, novamente, preside a Casa. Isso pode significar que, de fato, o senador José Sarney tenha tomado parte, por ação ou omissão, numa boa parcela dessas coisas de que se fala do Senado. Até parece, para quem não conhece o funcionamento de uma Casa legislativa, quer no Senado ou na Câmara, que lá um deles acorda em determinado dia e se escolhe presidente da instituição. Como se ninguém votasse em ninguém, se a votação não fosse cercada de trocas, como se, por conseguinte, as decisões nessas Casas não fossem colegiadas. Até parece que Sarney tem sido presidente do Senado durante 14 ou 15 anos sem interrupção - como se isso fosse possível: no Senado, só dá Sarney, ninguém mais.
Ora, dizia um antigo jornalista mineiro, respeitem a plateia! Sarney pode ter feito várias estripulias ou que nome seja no Senado. Mas se fez, convenhamos, não as fez sozinho. Antes e depois dele vários senadores passaram pela presidência da Casa, de vários partidos, diga-se, e não há hipótese de que somente ele possa ter feito tudo isso de que o acusam. Cadê o vice-presidente? E o 1º secretário da Mesa, para ficar apenas nesses cargos? E os outros senadores, o que faziam lá? A começar pelo fato de mais de 50% deles terem feito de Sarney o presidente do Senado - ele não foi ungido por um raio de trovão nem por um átimo de luz.
Mais da metade dos senadores elegeram Sarney, pelo PMDB, elegendo ainda Marconi Perillo, do PSDB, como vice-presidente, e Heráclito Fortes, do Democratas, como 1º secretário. Foi essa composição, negociada com os partidos, que os elegeu para os cargos que hoje ocupam. Mas isso, hoje, não tem importância - o povo não tem memória mesmo, lembram-se? O culpado de tudo, desde hoje até os anos passados e, se for o caso, os que vierem, o culpado de tudo é um só: José Sarney.
Ora, é claro que Sarney deverá pagar pelo que fez ou deixou de fazer, pelas responsabilidades que tem como presidente do Senado. Mas que outros também paguem, na justa medida de suas responsabilidades também. O que não dá é essa personalização da crise em um único culpado, sem que ninguém mais responda pelos atos inaceitáveis praticados no Senado da República por senadores, servidores ou simplesmente frequentadores - sim, pasmem, há pessoas que ganham a vida no Senado recebendo dinheiro por assinatura recolhida em projetos de lei de suas excelências. Isso mesmo. Há 10 mil servidores na Casa, mas ainda há profissionais de fora que ganham a vida pegando assinaturas em projetos de colegas que irão a plenário.
Não brinquem com a opinião pública aqueles que usam o santo nome em proveito próprio e em honra de suas conveniências. Apurem tudo. Revirem a casa. Busquem outros culpados também se querem, de fato, lavar a honra do Senado, por onde andaram Ruy Barbosa e, recentemente, José Alencar. Sarney, sozinho, não faria um décimo do que se faz no Senado.
*Carlos Lindenberg é colunista do jornal "Hoje em Dia", de Belo Horizonte. Veja mais informações sobre o assunto clicando aqui.
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