Brasil precisa evitar “Batalha de Itaipu”
Geraldo Luís Lino e Lorenzo Carrasco
O governo brasileiro terá que se empenhar de forma preventiva e pró-ativa para desarmar uma perigosa bomba-relógio energética e diplomática que está se armando no vizinho Paraguai, cuja detonação poderá ter conseqüências ainda mais sérias do que o imbróglio petrolífero com a Bolívia de Evo Morales. Na raiz do problema está o preço pago pelo Brasil pela eletricidade gerada pela usina hidrelétrica binacional de Itaipu e não consumida pelo Paraguai, estabelecido no tratado assinado pelos dois países em 1973 e cujo reajuste tornou-se uma reivindicação nacional dos paraguaios, independentemente de classe social ou inclinação política. De forma previsível, o assunto está no centro da campanha para as eleições presidenciais de 20 de abril próximo, com todos os candidatos se comprometendo a cobrar, com maior ou menor ênfase, uma revisão ou flexibilização do Tratado de Itaipu para aumentar a receita da eletricidade paraguaia vendida ao Brasil.
O mais preocupante para o Brasil é o ex-bispo Fernando Lugo, candidato da Aliança Patriótica para a Mudança (APC, em espanhol), apoiado por uma coalizão de movimentos sociais, vinculado aos círculos da Teologia da Libertação e inspirado pelo "socialismo do século XXI" do venezuelano Hugo Chávez. Líder nas pesquisas de intenção de voto, Lugo tem reiterado com freqüência a intenção de pressionar fortemente o Brasil, podendo até mesmo recorrer a uma arbitragem internacional para forçar uma renegociação do tratado.
Já a ex-ministra da Educação Blanca Ovelar, do situacionista Partido Colorado, que disputa o segundo lugar nas pesquisas com o general da reserva Lino Oviedo, pretende criar uma comissão de especialistas para avaliar a situação e se posicionar frente ao Brasil. Embora a sua posição seja mais cautelosa, ela também não oculta as suas intenções.
Por sua vez, Oviedo, que disputa pelo Partido União Nacional de Cidadãos Éticos (UNACE) e encontra-se em segundo lugar nas pesquisas, pouco à frente de Ovelar, coloca menos ênfase em Itaipu e mais na proposta de integração energética do Mercosul. Com estreitos laços com o Brasil - o que tem motivado numerosas acusações de seus opositores -, é o favorito de Brasília, embora os setores mais radicais do PT e associados apóiem ostensivamente a candidatura de Lugo. Na entrevista ao Valor, Oviedo deu uma idéia do tipo de propostas que pretende fazer ao Brasil:
O BNDES tem muito dinheiro. [Nossa proposta] é fazermos a integração hidrelétrica entre Brasil, Argentina e Paraguai. A Argentina não tem dinheiro para concluir a usina de Yaciretá [binacional no rio Paraná]. E o Brasil poderia complementar os investimentos de Yaciretá, que hoje não é rentável. Já a usina de Corpus seria mais barata para construir porque está num cânion. Custaria cerca de US$ 4 bilhões. O Brasil financiaria, e a Argentina e o Paraguai pagariam em energia. O importante seria essa integração hidrelétrica entre os três países. Depois vamos discutir a revisão do Tratado de Itaipu. Eu não falo sobre preço agora. Se o povo me der autoridade, aí sim eu falarei disso. Minha proposta é diferente das dos outros candidatos.
Com Oviedo ou Ovelar na Presidência, o Brasil teria uma maior margem de manobra para encaminhar o problema, mas, se Lugo sair vencedor, podem-se esperar turbulências a curto prazo, em especial, devido à manifesta resistência do governo brasileiro a qualquer mudança nos termos do tratado durante a sua vigência, que encerra em 2023. Porém, mesmo os dois primeiros poderão ser pressionados pela opinião pública a assumir uma posição mais afirmativa sobre a questão, cujo enfrentamento irá requerer do Brasil uma atitude diferente do apego ao nominalismo jurídico e aos formalismos diplomáticos.
Por outro lado, o dilema paraguaio tem raízes internas, no enorme distanciamento entre os grupos dirigentes e a maioria da sociedade, que resulta no aparelhamento do Estado por interesses privados e no conseqüente desvio de parte da receita gerada pelas exportações de eletricidade das usinas binacionais, como acusa freqüentemente a oposição ao Partido Colorado, há seis décadas no poder. Nesse processo (de resto, endêmico em toda a Ibero-América), e não no "imperialismo brasileiro", devem ser buscadas, por exemplo, as causas da contradição entre o fato de o país exibir um dos mais altos índices per capita de geração elétrica de todo o mundo e um dos mais baixos de consumo efetivo de eletricidade por habitante da América do Sul. Por absurdo que pareça, as deficiências das linhas de transmissão internas têm provocado uma série de cortes de energia na capital Assunção e a biomassa - principalmente, lenha - ainda responde pela maior parte do consumo de energia primária.
De qualquer modo, o que se configura como uma potencial "Batalha de Itaipu" necessita ser antecipada com uma abordagem inovadora, trocando-se a habitual atitude "negócios como sempre" por uma estratégia de amplo espectro que contemple a utilização dos vastos recursos hidrelétricos paraguaios para:
1) basear um processo de industrialização e modernização econômica do país; e
2) constituir um dos núcleos de uma rede elétrica interligada para todo o Cone Sul, além da Bolívia e, possivelmente, o Peru.
Além de fomentar o desenvolvimento interno, tal agenda contribuiria significativamente para solucionar a maior parte dos problemas energéticos da região e, não menos, consolidar o cambaleante processo de integração regional.
O desenvolvimento paraguaio é do maior interesse estratégico para o Brasil, que será um dos seus principais beneficiários. Como sócio controlador de Itaipu, cabe-lhe, pois, a iniciativa de colocar na pauta uma proposta que atenderia a todos esses propósitos: em lugar de negociar aumentos de preços, ajudar o Paraguai a criar uma entidade semelhante ao BNDES, a qual funcionaria como o "motor" da modernização econômica do vizinho - o que, afinal, é a intenção declarada dos seus candidatos presidenciais.
O apoio poderia se dar de duas maneiras diretamente vinculadas à empresa binacional. A primeira seria a utilização de títulos da dívida paraguaia de Itaipu para capitalizar parcialmente o banco de fomento, trocando os títulos da Eletrobrás e do Tesouro Nacional por bônus de longo prazo específicos para tal finalidade (a dívida é da ordem de 9 bilhões de dólares, quase igual ao PIB de 2007 em dólares correntes). Em 2006, os bancos de investimentos Bear Stearns e Merrill Lynch (atualmente às voltas com o furacão financeiro global) propuseram uma troca do gênero - evidentemente, com finalidades especulativas -, a qual seria garantida pela energia gerada pela usina. Na ocasião, o governo brasileiro rejeitou a proposta, alegando razões de soberania, mas, na verdade, preocupado em não ver reduzidos os encargos pagos pela Itaipu Binacional à Eletrobrás e ao Tesouro Nacional, considerados vitais para as metas de superávit primário estabelecidas pela tecnocracia fazendária de Brasília.
Outra alternativa seria uma antecipação da receita da eletricidade paga pelo Brasil referente a um período de pelo menos dez anos, a qual seria utilizada integralmente para capitalizar o novo banco. Além de não alterar termos contratuais, tal opção não afetaria lucros contábeis de qualquer parte. Segundo dados da Itaipu Binacional, a usina rende anualmente ao Paraguai uma receita equivalente a cerca de 550 milhões de dólares, dos quais cerca de 300 milhões de dólares correspondem à cessão de energia e royalties. Como o orçamento fiscal do governo paraguaio em 2007 foi equivalente a 2,2 bilhões de dólares (segundo o CIA World Factbook), uma operação como a sugerida teria um impacto considerável para uma agenda de modernização.
Com a receita adicional proveniente da expansão de atividades produtivas ensejada pelo processo, o governo paraguaio não teria dificuldades para cumprir os seus compromissos financeiros (presumindo-se que os níveis mais elevados de educação e conscientização popular exigidos pela modernização econômica contribuam para reduzir os "buracos negros" da administração pública).
Assim, em lugar de recorrer ao BNDES em primeiro lugar, como sugeriu Oviedo, o Paraguai teria a sua própria instituição de fomento, uma "Caja para el Desarrollo", para cujos recursos não faltariam bons projetos de enormes efeitos multiplicadores. Para mencionar apenas alguns exemplos:
- a conclusão de Yaciretá, elevando o reservatório da usina da atual cota 76 m para 83 m, o que proporcionaria o aumento da potência nominal, dos atuais 2.000 MW para 3.200 MW;
- a construção da usina argentino-paraguaia de Corpus, no rio Paraná, com 2.800 MW de potência instalada;
- a ampliação da rede de transmissão interna e a sua interligação com a Argentina, o Brasil e a Bolívia (de grande relevância em face da anunciada intenção brasileira de construir três usinas com a Argentina, no rio Uruguai, e duas com a Bolívia);
- a reconstrução e ampliação da rede ferroviária nacional, hoje quase totalmente abandonada, e a sua interligação com as redes argentina e brasileira, esta última permitindo o acesso ao porto de Paranaguá, com a construção de uma segunda ponte (rodoferroviária) sobre o rio Paraná;
- um canal de navegação entre os rios Paraná e Paraguai, como alternativa à construção das dispendiosas eclusas de Itaipu, o qual possibilitaria a interligação das hidrovias Tietê-Paraná e Paraguai-Paraná.
A disponibilidade dessa infra-estrutura viabilizaria um processo de industrialização induzida, inclusive com a atração de empresas dos vizinhos mais prósperos, além de catalisar uma dinâmica desenvolvimentista que, por si só, facilitaria a captação de recursos complementares de instituições de fomento regionais, como o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), a Corporação Andina de Fomento (CAF), o novo Banco do Sul e até mesmo o BNDES.
Os obstáculos para esse tipo de solução para o problema não são financeiros, mas políticos.
Os acordos entre o Brasil e o Paraguai, que resultaram no projeto binacional, e o acordo tripartite de 1979, incluindo a Argentina, para acertar as cotas de Itaipu e Corpus, de modo a que as duas usinas não se prejudicassem mutuamente, foram importantes feitos de "engenharia diplomática", em um período no qual os antagonismos regionais ainda eram bastante sensíveis.
A construção de Itaipu aportou grandes avanços para todas as áreas da engenharia brasileira - civil, geotécnica, mecânica, elétrica etc. -, contribuindo sobremaneira para que ela pudesse atender aos numerosos projetos de infra-estrutura energética implementados nas décadas de 1970-80, que lhe conferiram estatura internacional.
Assim, é inadmissível que não se possam encontrar instrumentos de "engenharia" política e financeira capazes de transformar um problema em uma solução, que, de resto, é mais que necessária no contexto da crise sistêmica global e poderá apontar um dos caminhos de saída para os impasses criados pelos excessos da "financeirização" da economia.
Geraldo Luís Lino e Lorenzo Carrasco
O governo brasileiro terá que se empenhar de forma preventiva e pró-ativa para desarmar uma perigosa bomba-relógio energética e diplomática que está se armando no vizinho Paraguai, cuja detonação poderá ter conseqüências ainda mais sérias do que o imbróglio petrolífero com a Bolívia de Evo Morales. Na raiz do problema está o preço pago pelo Brasil pela eletricidade gerada pela usina hidrelétrica binacional de Itaipu e não consumida pelo Paraguai, estabelecido no tratado assinado pelos dois países em 1973 e cujo reajuste tornou-se uma reivindicação nacional dos paraguaios, independentemente de classe social ou inclinação política. De forma previsível, o assunto está no centro da campanha para as eleições presidenciais de 20 de abril próximo, com todos os candidatos se comprometendo a cobrar, com maior ou menor ênfase, uma revisão ou flexibilização do Tratado de Itaipu para aumentar a receita da eletricidade paraguaia vendida ao Brasil.
O mais preocupante para o Brasil é o ex-bispo Fernando Lugo, candidato da Aliança Patriótica para a Mudança (APC, em espanhol), apoiado por uma coalizão de movimentos sociais, vinculado aos círculos da Teologia da Libertação e inspirado pelo "socialismo do século XXI" do venezuelano Hugo Chávez. Líder nas pesquisas de intenção de voto, Lugo tem reiterado com freqüência a intenção de pressionar fortemente o Brasil, podendo até mesmo recorrer a uma arbitragem internacional para forçar uma renegociação do tratado.
Já a ex-ministra da Educação Blanca Ovelar, do situacionista Partido Colorado, que disputa o segundo lugar nas pesquisas com o general da reserva Lino Oviedo, pretende criar uma comissão de especialistas para avaliar a situação e se posicionar frente ao Brasil. Embora a sua posição seja mais cautelosa, ela também não oculta as suas intenções.
Por sua vez, Oviedo, que disputa pelo Partido União Nacional de Cidadãos Éticos (UNACE) e encontra-se em segundo lugar nas pesquisas, pouco à frente de Ovelar, coloca menos ênfase em Itaipu e mais na proposta de integração energética do Mercosul. Com estreitos laços com o Brasil - o que tem motivado numerosas acusações de seus opositores -, é o favorito de Brasília, embora os setores mais radicais do PT e associados apóiem ostensivamente a candidatura de Lugo. Na entrevista ao Valor, Oviedo deu uma idéia do tipo de propostas que pretende fazer ao Brasil:
O BNDES tem muito dinheiro. [Nossa proposta] é fazermos a integração hidrelétrica entre Brasil, Argentina e Paraguai. A Argentina não tem dinheiro para concluir a usina de Yaciretá [binacional no rio Paraná]. E o Brasil poderia complementar os investimentos de Yaciretá, que hoje não é rentável. Já a usina de Corpus seria mais barata para construir porque está num cânion. Custaria cerca de US$ 4 bilhões. O Brasil financiaria, e a Argentina e o Paraguai pagariam em energia. O importante seria essa integração hidrelétrica entre os três países. Depois vamos discutir a revisão do Tratado de Itaipu. Eu não falo sobre preço agora. Se o povo me der autoridade, aí sim eu falarei disso. Minha proposta é diferente das dos outros candidatos.
Com Oviedo ou Ovelar na Presidência, o Brasil teria uma maior margem de manobra para encaminhar o problema, mas, se Lugo sair vencedor, podem-se esperar turbulências a curto prazo, em especial, devido à manifesta resistência do governo brasileiro a qualquer mudança nos termos do tratado durante a sua vigência, que encerra em 2023. Porém, mesmo os dois primeiros poderão ser pressionados pela opinião pública a assumir uma posição mais afirmativa sobre a questão, cujo enfrentamento irá requerer do Brasil uma atitude diferente do apego ao nominalismo jurídico e aos formalismos diplomáticos.
Por outro lado, o dilema paraguaio tem raízes internas, no enorme distanciamento entre os grupos dirigentes e a maioria da sociedade, que resulta no aparelhamento do Estado por interesses privados e no conseqüente desvio de parte da receita gerada pelas exportações de eletricidade das usinas binacionais, como acusa freqüentemente a oposição ao Partido Colorado, há seis décadas no poder. Nesse processo (de resto, endêmico em toda a Ibero-América), e não no "imperialismo brasileiro", devem ser buscadas, por exemplo, as causas da contradição entre o fato de o país exibir um dos mais altos índices per capita de geração elétrica de todo o mundo e um dos mais baixos de consumo efetivo de eletricidade por habitante da América do Sul. Por absurdo que pareça, as deficiências das linhas de transmissão internas têm provocado uma série de cortes de energia na capital Assunção e a biomassa - principalmente, lenha - ainda responde pela maior parte do consumo de energia primária.
De qualquer modo, o que se configura como uma potencial "Batalha de Itaipu" necessita ser antecipada com uma abordagem inovadora, trocando-se a habitual atitude "negócios como sempre" por uma estratégia de amplo espectro que contemple a utilização dos vastos recursos hidrelétricos paraguaios para:
1) basear um processo de industrialização e modernização econômica do país; e
2) constituir um dos núcleos de uma rede elétrica interligada para todo o Cone Sul, além da Bolívia e, possivelmente, o Peru.
Além de fomentar o desenvolvimento interno, tal agenda contribuiria significativamente para solucionar a maior parte dos problemas energéticos da região e, não menos, consolidar o cambaleante processo de integração regional.
O desenvolvimento paraguaio é do maior interesse estratégico para o Brasil, que será um dos seus principais beneficiários. Como sócio controlador de Itaipu, cabe-lhe, pois, a iniciativa de colocar na pauta uma proposta que atenderia a todos esses propósitos: em lugar de negociar aumentos de preços, ajudar o Paraguai a criar uma entidade semelhante ao BNDES, a qual funcionaria como o "motor" da modernização econômica do vizinho - o que, afinal, é a intenção declarada dos seus candidatos presidenciais.
O apoio poderia se dar de duas maneiras diretamente vinculadas à empresa binacional. A primeira seria a utilização de títulos da dívida paraguaia de Itaipu para capitalizar parcialmente o banco de fomento, trocando os títulos da Eletrobrás e do Tesouro Nacional por bônus de longo prazo específicos para tal finalidade (a dívida é da ordem de 9 bilhões de dólares, quase igual ao PIB de 2007 em dólares correntes). Em 2006, os bancos de investimentos Bear Stearns e Merrill Lynch (atualmente às voltas com o furacão financeiro global) propuseram uma troca do gênero - evidentemente, com finalidades especulativas -, a qual seria garantida pela energia gerada pela usina. Na ocasião, o governo brasileiro rejeitou a proposta, alegando razões de soberania, mas, na verdade, preocupado em não ver reduzidos os encargos pagos pela Itaipu Binacional à Eletrobrás e ao Tesouro Nacional, considerados vitais para as metas de superávit primário estabelecidas pela tecnocracia fazendária de Brasília.
Outra alternativa seria uma antecipação da receita da eletricidade paga pelo Brasil referente a um período de pelo menos dez anos, a qual seria utilizada integralmente para capitalizar o novo banco. Além de não alterar termos contratuais, tal opção não afetaria lucros contábeis de qualquer parte. Segundo dados da Itaipu Binacional, a usina rende anualmente ao Paraguai uma receita equivalente a cerca de 550 milhões de dólares, dos quais cerca de 300 milhões de dólares correspondem à cessão de energia e royalties. Como o orçamento fiscal do governo paraguaio em 2007 foi equivalente a 2,2 bilhões de dólares (segundo o CIA World Factbook), uma operação como a sugerida teria um impacto considerável para uma agenda de modernização.
Com a receita adicional proveniente da expansão de atividades produtivas ensejada pelo processo, o governo paraguaio não teria dificuldades para cumprir os seus compromissos financeiros (presumindo-se que os níveis mais elevados de educação e conscientização popular exigidos pela modernização econômica contribuam para reduzir os "buracos negros" da administração pública).
Assim, em lugar de recorrer ao BNDES em primeiro lugar, como sugeriu Oviedo, o Paraguai teria a sua própria instituição de fomento, uma "Caja para el Desarrollo", para cujos recursos não faltariam bons projetos de enormes efeitos multiplicadores. Para mencionar apenas alguns exemplos:
- a conclusão de Yaciretá, elevando o reservatório da usina da atual cota 76 m para 83 m, o que proporcionaria o aumento da potência nominal, dos atuais 2.000 MW para 3.200 MW;
- a construção da usina argentino-paraguaia de Corpus, no rio Paraná, com 2.800 MW de potência instalada;
- a ampliação da rede de transmissão interna e a sua interligação com a Argentina, o Brasil e a Bolívia (de grande relevância em face da anunciada intenção brasileira de construir três usinas com a Argentina, no rio Uruguai, e duas com a Bolívia);
- a reconstrução e ampliação da rede ferroviária nacional, hoje quase totalmente abandonada, e a sua interligação com as redes argentina e brasileira, esta última permitindo o acesso ao porto de Paranaguá, com a construção de uma segunda ponte (rodoferroviária) sobre o rio Paraná;
- um canal de navegação entre os rios Paraná e Paraguai, como alternativa à construção das dispendiosas eclusas de Itaipu, o qual possibilitaria a interligação das hidrovias Tietê-Paraná e Paraguai-Paraná.
A disponibilidade dessa infra-estrutura viabilizaria um processo de industrialização induzida, inclusive com a atração de empresas dos vizinhos mais prósperos, além de catalisar uma dinâmica desenvolvimentista que, por si só, facilitaria a captação de recursos complementares de instituições de fomento regionais, como o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), a Corporação Andina de Fomento (CAF), o novo Banco do Sul e até mesmo o BNDES.
Os obstáculos para esse tipo de solução para o problema não são financeiros, mas políticos.
Os acordos entre o Brasil e o Paraguai, que resultaram no projeto binacional, e o acordo tripartite de 1979, incluindo a Argentina, para acertar as cotas de Itaipu e Corpus, de modo a que as duas usinas não se prejudicassem mutuamente, foram importantes feitos de "engenharia diplomática", em um período no qual os antagonismos regionais ainda eram bastante sensíveis.
A construção de Itaipu aportou grandes avanços para todas as áreas da engenharia brasileira - civil, geotécnica, mecânica, elétrica etc. -, contribuindo sobremaneira para que ela pudesse atender aos numerosos projetos de infra-estrutura energética implementados nas décadas de 1970-80, que lhe conferiram estatura internacional.
Assim, é inadmissível que não se possam encontrar instrumentos de "engenharia" política e financeira capazes de transformar um problema em uma solução, que, de resto, é mais que necessária no contexto da crise sistêmica global e poderá apontar um dos caminhos de saída para os impasses criados pelos excessos da "financeirização" da economia.
Portanto, o repto está com as lideranças do lado de cá do rio Paraná.
Leia mais detalhes em http://www.alerta.inf.br/
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