terça-feira, 19 de maio de 2009

Entrevista

Roseana Sarney

"Problema de saúde não prejudica candidatura"

Às vésperas de nova cirurgia, a governadora do Maranhão diz que o maior desafio de Dilma Rousseff será fechar as alianças políticas
Por Sérgio Pardellas
TERCEIRO MANDATO De volta ao Palácio dos Leões, Roseana se licenciará no fim do mês para fazer a 21ª cirurgia

Será a 21ª cirurgia em 36 anos. No fim do mês, a governadora do Maranhão, Roseana Sarney (PMDB), 55 anos, enfrentará mais uma vez o bisturi para a retirada de um aneurisma cerebral, em um hospital de São Paulo. Ela espera retornar ao trabalho em 30 dias. Em sua carreira, a convivência com problemas de saúde tornou-se parte da rotina. "Sempre enfrentei a doença e a política", diz. Tão logo a ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, divulgou que irá se submeter ao tratamento de câncer, Roseana teve uma longa conversa com ela. "Dei força. Disse que enfrentasse com determinação." Na avaliação da governadora, o problema de saúde não será obstáculo para o projeto político da ministra. "Tive vários problemas, um deles, inclusive, na época da eleição de 1998. Problema de saúde não prejudica candidatura. Acredito que o povo brasileiro está muito amadurecido em relação a isso." Segundo a filha de um dos mais importantes nomes do PMDB, Dilma é uma pré-candidata à Presidência da República e o mais importante é ela se viabilizar, ou seja, costurar as alianças políticas.
Nesta entrevista à “ISTOÉ”, a governadora, que tomou posse depois de o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) cassar o ex-governador Jackson Lago (PDT), rebate as críticas feitas à sua família, acusada pela imprensa internacional de ser uma oligarquia. Roseana diz também como pretende resolver as mazelas do Estado - o penúltimo no Índice de Desenvolvimento Humano (perde apenas para Alagoas). Sete anos após deixar o Palácio dos Leões, Roseana assumiu um Maranhão em calamidade pública. Devido às fortes chuvas há quase um mês, 64 municípios decretaram estado de emergência, entre os quais a capital, São Luís. Há cidades inteiras, como Trizidela do Vale, debaixo d"água. O total de pessoas afetadas já chega a 168 mil. E os desabrigados somam 50 mil. "Terei que reconstruir o Maranhão", afirma.

ISTOÉ - A sra. deixou claro, logo que assumiu o governo do Maranhão, que quer se dissociar da imagem do seu pai, o presidente do Senado, senador José Sarney (PMDB-AP). Por quê?
Roseana Sarney - Tenho muito orgulho de ser filha de José Sarney, acho que o nome dele me ajudou bastante, a experiência também contribuiu muito, mas eu caminho com meus próprios pés e sempre foi assim. Isso que eu quis dizer. Sempre tive minhas posições independentemente de meu pai, e vai continuar sendo assim. O que acontece é que inventam coisas sobre a nossa família, falam em oligarquia, só que eu passei sete anos fora do governo. Foram seis anos de oposição. Agora, do jeito que falam, estou governando pelos outros. Demais, não acha?

ISTOÉ - Mas não é verdade que a família Sarney está há cinco décadas no poder? A revista britânica The Economist falou em semifeudalismo, depois de destacar o fato de o Maranhão ser um dos líderes do ranking brasileiro de subdesenvolvimento.
Roseana - Nunca me beneficiei dessa suposta oligarquia de que falam. Nem quando fui eleita ao governo do Estado pela primeira vez, em 1994, nem agora. E os que estão na minha oposição hoje governaram o Estado durante pelo menos 20 dos últimos 40 anos. Respondo por mim. Só governei o Maranhão por dois períodos (1995-2002) e agora.

ISTOÉ - Por que o Maranhão tem um dos piores indicadores sociais do País?
Roseana - Só posso responder pelo meu período. No meu período, posso provar que todos os indicadores sociais melhoraram.

ISTOÉ - A sra. está preparada para uma oposição ferrenha, já que o ex-governador (Jackson Lago), embora tenha tido o mandato cassado na Justiça, recebeu mais votos nas últimas eleições?
Roseana - A população compreendeu bem e tenho percebido esse sentimento nas ruas. Afinal, eu que fui prejudicada, eu que perdi dois anos e quatro meses de mandato. Na seara política, estamos tentando fazer uma união pelo Maranhão. Chamando todos os partidos e os prefeitos para discutir os problemas do nosso Estado, que estão sendo vistos a olho nu. De qualquer forma, já estou acostumada com oposição. Sou política, escolhi ser política e, pelo fato de ser mulher, ser do Nordeste e filha de José Sarney, sempre fui alvo de preconceito e falácia.

"Sou política, escolhi ser política e, pelo fato de ser mulher, ser do Nordeste e filha de José Sarney, sempre fui alvo de preconceito e falácia"

ISTOÉ - A sra. disse, logo após a sua posse, que encontrou problemas administrativos graves. O que apontaram as auditorias?
Roseana - A coligação do Jackson Lago gastou R$ 1 bilhão, em convênios, para se eleger. E gastou mais R$ 1 bilhão antes de sair. Só que não há uma obra no Estado. Há seis anos, não é feito nenhum programa de obras estruturantes no Maranhão. Agora, as auditorias apontaram coisas absurdas. Todo tipo de desvio. Por exemplo, na Casa Civil foram encontradas 290 linhas telefônicas com contas acima de R$ 200 mil por mês. Carros alugados a R$ 590 por dia. Foi um desgoverno completo.

ISTOÉ - O maior desafio da sra. então, ao assumir essa espécie de mandatotampão de 20 meses de governo, é corrigir o que chamou de desgoverno?
Roseana - Encontrei o Maranhão num estado de calamidade pública e administrativa. O maior desafio é governar com emergência nas duas áreas. Tanto administrativamente como para minorar os efeitos das enchentes. Fazer com que o Estado funcione. Hoje, o Maranhão está parado.

ISTOÉ - O que tem sido feito para minimizar as consequências das enchentes?
Roseana - Nesta primeira etapa estamos distribuindo as cestas básicas, colocando as pessoas nos acampamentos, nas escolas, nos ginásios e abrigos. Também mandamos equipes médicas para ficar de plantão nos municípios mais atingidos. E, nesse ponto, as pessoas estão assistidas. Trata-se de uma ação de emergência. Numa outra linha de ação, também estamos fazendo levantamento de tudo o que precisa ser reparado. São 12 mil casas, além de estradas municipais, estaduais e federais totalmente destruídas e pontes que precisam ser reconstruídas. É o que há de mais urgente. Na área da educação, estamos tentando equacionar a questão das crianças que estão sem aulas, e na de saúde atuando na prevenção para que os problemas maiores não venham no pós-enchente.

ISTOÉ - Quantas pessoas estão desabrigadas?
Roseana - São mais de 50 mil entre desalojados e desabrigados. Mas a solidariedade tem sido muito grande também. Tem muita gente na casa de parentes. Infelizmente, o que aconteceu foi uma chuva em demasia. Esse é um período de chuvas, mas, historicamente, chove no mês de abril entre 350 e 400 milímetros. Nesse mês choveu mais de 700 milímetros. O resultado é que há municípios inteiros debaixo d"água. As lavouras, sobretudo dos pequenos produtores, foram destruídas. E ainda ficamos 14 dias desabastecidos porque a principal estrada do Estado, a que liga São Luís a Teresina, foi simplesmente abaixo. Enfim, terei que reconstruir o Maranhão.


ISTOÉ - O que o governo estadual irá fazer para que, em 2010, durante novo período de chuvas fortes, sejam reduzidos os efeitos para a população?

Roseana - Vamos fazer um projeto para dotar o estado de infraestrutura. O presidente Lula colocou à disposição dos governadores um crédito no BNDES e vamos utilizá-lo para recuperar e melhorar nossas estradas. Em parceria com o Ministério da Integração Nacional, também vamos fazer um trabalho social que visa deslocar as pessoas, que hoje moram próximo aos leitos dos rios, para outros lugares mais seguros. Também podemos anistiar os pequenos produtores de alguns débitos que eles têm e fazer um projeto de recuperação da safra.

ISTOÉ - Está preparada para a cirurgia? Quando a sra. se licencia?
Roseana - É sempre um desafio. Vou enfrentar novamente. Já fiz 20 cirurgias, mas nunca desanimei. Não me considero uma pessoa doente nem fraca. Pelo contrário. Por conta desses desafios me considero até muito forte. Agora, vou operar do aneurisma. Devo sair entre os dias 20 e 30 de maio para fazer a cirurgia em São Paulo e minha ideia é voltar em 30 dias.

ISTOÉ - A sra. chegou a falar com a ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, sobre a doença dela? Que conselhos a sra. deu para ela?
Roseana - Dei força. Disse que ela enfrentasse com determinação. Depende de cada pessoa, mas a ministra Dilma é uma pessoa forte. Tenho rezado por ela e tenho certeza de que ela vai superar esse problema.
ISTOÉ - A sra., em algum momento, pensou em abandonar a política por causa dos seus problemas de saúde? Roseana - Nenhuma vez. Sempre enfrentei a doença e a política. Tive vários problemas, um deles, inclusive, na época da eleição de 1998. Passei quase 60 dias no hospital e nesse período fiz quatro cirurgias de pulmão, intestino e mama. Fiz ainda uma histerectomia completa (uma operação cirúrgica da área ginecológica que consiste na retirada do útero, ovário e das trompas). Quase morri nessa época. Mas voltei para fazer minha campanha. Mesmo com algumas restrições, voltei, fiz a campanha e ganhei no primeiro turno com 66% dos votos.

"Nunca me beneficiei dessa suposta oligarquia de que falam. No meu período, posso provar que todos os indicadores sociais melhoraram no Maranhão"


ISTOÉ - A sra. conhece o tratamento ao qual a ministra Dilma vai ser submetida?
Roseana - Nunca fiz uma sessão de quimioterapia. Passei por tratamentos diferentes e até tomei remédio quimioterápico. Mas tenho amigos que passaram pelo mesmo problema da ministra e acho que dá para enfrentar. Depende muito da cabeça de cada um. O negócio é a ministra não se entregar. Tem que ter determinação para superar. Você combate a doença de três maneiras: com os médicos, os remédios e com você mesma. Fora a fé. Tenho muita fé em Deus e entrego tudo nas mãos dele.

ISTOÉ - A sra. acha que a candidatura de Dilma à Presidência da República pode ser prejudicada pela doença? Roseana - Problema de saúde não prejudica candidatura. Acredito que o povo brasileiro está muito amadurecido em relação a isso e que a doença não vai prejudicar a ministra Dilma. É uma pré-candidatura. O importante é ela se viabilizar. Ela vai tentar costurar os acordos e tem o apoio do presidente Lula. Ficarei feliz se tivermos uma mulher candidata à Presidência da República.

ISTOÉ - Ainda há preconceito?
Roseana - Não há preconceito por problemas de saúde. Podem tentar explorar politicamente, mas isso ninguém sabe ainda.
Revista “IstoÉ”

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