As políticas definidas para o Brasil são, há décadas, marcadas pelo que determina sua dívida pública. Ela é o argumento para que orçamentos sejam cortados, áreas sociais sejam penalizadas e legislações sejam mudadas.
Ao longo dos anos, ela passou por uma significativa mudança de perfil. Aos compromissos junto a bancos privados internacionais e instituições multilaterais, como o Fundo Monetário Internacional (FMI), juntou-se uma explosiva dívida “interna”, formada por títulos governamentais negociados semanalmente pelo Tesouro Nacional. Porém, essa mudança não alterou a principal característica do endividamento : o saque dos recursos públicos por especuladores nacionais e estrangeiros, que também podem livremente aplicar em títulos da dívida “interna”. Entre 1995 e 2009, a dívida interna cresceu 25 vezes, tendo subido de R$ 62 bilhões para R$ 1,6 TRILHÃO, enquanto a dívida externa aumentou 80%, de US$ 148 bilhões para US$ 267 bilhões. A soma destas duas dívidas (valor da soma em R$) representam nada menos que 80% do PIB brasileiro (tudo que o país produz em um ano), e sobre a maior parte delas incidem taxas de juros altíssimas, muito maiores que as pagas pelos países ricos.
Com as taxas de juros mais altas do mundo, o Brasil destina anualmente cerca de 30% do orçamento federal para o pagamento dos juros, encargos e amortizações desses compromissos. Caso consideremos também a chamada “rolagem”, ou seja, o pagamento de amortizações por meio da emissão de novos títulos, o percentual do orçamento comprometido com a dívida sobe para 50%. Isso implicou o comprometimento de cerca de R$ 282 bilhões em 2008 (mesmo sem computar a “rolagem”), destinados aos detentores dos papéis. É um dinheiro que não entra na esfera produtiva, não movimenta a economia, não gera riqueza ou desenvolvimento. Destina-se principalmente ao setor financeiro privado e grandes especuladores privilegiados, no Brasil e no exterior.
Os compromissos da dívida têm total prioridade sobre quaisquer outros. Enquanto a dívida leva metade do orçamento federal, a saúde, por exemplo, fica com menos de 5%, a educação com menos de 3% e a reforma agrária com menos de 0,3%. Assim, são constantes os cortes em serviços essenciais, como saúde, educação, segurança e transportes, entre outros, para garantir as metas de superávit primário, destinadas à garantia do pagamento dos títulos públicos. Estes são sempre intocáveis, mesmo em época de crise e queda na arrecadação, quando o governo suspende concursos públicos, ameaça não pagar sequer os reajustes já acordados com o funcionalismo público, e reduz fortemente as transferências a estados e municípios.
Em uma situação de crise aguda, quando o Estado mais precisa investir em garantias de emprego e renda para a população, manter tal política de juros e a prioridade aos especuladores representa algo nefasto para o país e para o povo brasileiro.
(...)
No Brasil, a auditoria da dívida está prevista na Constituição Federal, porém jamais foi realizada. A CPI da Dívida Pública, aprovada na Câmara dos Deputados em dezembro de 2008, é um passo importante para a realização desta auditoria, e representa instrumento democrático decisivo para que se discuta a política monetária, para que se questionem as prioridades na área econômica e para que a opinião pública possa reivindicar mudanças radicais nessa orientação, garantindo assim que os recursos do povo brasileiro retornem ao mesmo através dos necessários investimentos nas políticas públicas.
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