sexta-feira, 12 de setembro de 2008


Chimpanzés e o bóson

O Superior Tribunal de Justiça julga um habeas corpus a que pediu vistas o ministro Herman Benjamin, a maior autoridade brasileira em direito ambiental, para conceder liberdade a Lili e Megh, dois chimpanzés que viajaram clandestinos do zoológico de Fortaleza para São Paulo, sem licença do Ibama. A discussão é se o direito de ir e vir deve ser só de humanos ou se se estende a animais.Os impetrantes argumentam com o "direito à vida" -e os bichos vivem. Há jurisprudência: o ministro Magri, nos anos 90, disse que "cachorro também é gente". Enfim, o abacaxi está nas boas mãos do ministro Herman.E nosso homem-macaco quer, com a ciência, descobrir a partícula fundamental do universo. Confesso que sempre tive uma fascinação pela física pura. Essa paixão me fez, como presidente, visitar o Fermilab, em Chicago, que tem 6,3 quilômetros de extensão, o maior acelerador de partículas existente àquele tempo no mundo. Fui recebido pelo professor Leon Lederman, Prêmio Nobel pela descoberta dos neutrinos, essas partículas desprovidas de massa, liberadas pela combustão nuclear do Sol, que atravessam tudo, nosso corpo, terra e aço, sem respeitar nada, e não deixam rastro.O Large Hadron Colider (LHC), agora inaugurado na Suíça, com 27 quilômetros, desbanca o Fermilab e passa a ser a tecnologia de ponta na busca da matéria primordial que formou o universo. Tudo consiste em fazer girar minúsculas partículas à velocidade da luz na esperança de, ao se chocarem, despedaçadas, poder o homem encontrar a menor de todas, o chamado bóson de Higgs.Fui ao Fermilab em companhia do eminente cientista brasileiro professor Santoro, do Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas, que, vendo minha curiosidade sobre partículas, me convencera a visitar a equipe brasileira que trabalhava em Chicago (agora ele está no projeto do Cern, na Suíça). Os cientistas do Fermilab ficaram muito admirados que um presidente brasileiro ali fosse. O professor Lederman recebeu-me e me mostrou aquela gigantesca máquina. Com extraordinário poder de síntese, explicou-me: "Presidente, nós, cientistas, somos crianças. Tudo isso que aqui está é uma caixa de brinquedo que nós quebramos para ver o que tem dentro. Depois quebramos outra e mais outra, em busca de saber o que está na última caixa, que nós ainda não encontramos".Na Europa, os humoristas brincam que o LHC pode provocar um buraco negro que destruirá a Terra. Outros dizem que a máquina não é tão potente, pode, no máximo, destruir a Suíça. E se isso acontecer? Eles respondem: vamos ter que levar o dinheiro para Jersey.


*José Sarney é ex-presidente da República, senador do Amapá e acadêmico da Academia Brasileira de Letras e da Academia de Ciências de Lisboa.
jose-sarney@uol.com.br

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