segunda-feira, 1 de setembro de 2008

Conjuntura Internacional

Confissões da plutocracia financeira internacional
Aumentam os prejuízos de bancos nos EUA e na Europa

Resgate dos títulos é a pior das dores de cabeça

Zurique - Os bancos norte-americanos e europeus confessam novos prejuízos, em decorrência da crise de crédito, e problematizam a situação de sua saúde econômica. Além de tudo isso, revela o jornal The Wall Street Journal, os bancos enfrentam mais um problema espinhoso: como resgatar os títulos pelos quais haviam tomado empréstimos de bilhões de dólares antes de a crise eclodir? No epicentro do problema estão papéis com taxas de juros variáveis, usados como garantia para um endividamento extenso dos bancos no ano de 2006. Grande parte destes papéis, com prazo de dois anos, devem ser resgatados impreterivelmente no próximo ano. Enquanto isso, os bancos lutam desesperadamente para reunir os recursos necessários, e como esta tarefa é praticamente impossível, eles serão obrigados a vender ativos patrimoniais. Simultaneamente, terão de competir entre si para atrair novos depósitos e aplicações com base nos quais emitirão novas e caríssimas debêntures empresariais, dando continuidade ao jogo.

Pressões neste mês
As pressões começarão a ficar visíveis a partir deste mês, quando vencerão US$ 95 bilhões em títulos com taxas de juros variáveis. A equipe do J.P. Morgan avalia que antes de 2009 terminar as instituições monetárias terão de pagar pelo menos US$ 787 bilhões para liquidarem papéis com taxas de juros variáveis e outras dívidas com vencimento a médio prazo. Trata-se de um volume de recursos 43% superior ao dos últimos 16 meses. E, ao que tudo indica, a crise de crédito, que já entrou em seu segundo ano, não deverá se encerrar tão cedo. No final deste ano, grandes bancos - como Merrill Lynch, Goldman Sachs e Morgan Stanley - terão de resgatar US$ 5 bilhões em papéis com taxas de juros variáveis. Agora, seu novo custo de endividamento será muito superior ao de 2006. Mas enquanto os bancos trocam cotoveladas na corrida pelos recursos necessários ao resgate de suas dívidas, as pressões crescem no mercado. "As instituições monetárias que buscarem empréstimos com prazos mais curtos deverão renovar seu endividamento com mais frequência, aumentando o risco de não conseguirem novos recursos quando os necessitarem", relembra o The Wall Street Journal.



Endividamento difícil
Os bancos enfrentam sérias dificuldades para tomarem novos empréstimos, e o mercado de papéis titulados permanece fechado. Os empréstimos interbancários também estão limitados. Sob estas condições, as instituições monetárias buscam socorro cada vez mais nos bancos centrais - Federal Reserve (Fed), Banco da Inglaterra e Banco Central Europeu (BCE). Aliás, muitos bancos montaram pacotes com empréstimos habitacionais e empresariais em forma de papéis de dívida, que serão usados especificamente como garantia para conseguirem financiamentos do Fed e do BCE. Contudo, surgem dúvidas quanto ao prazo que os bancos centrais estipularão para o resgate desses empréstimos, e também se os bancos europeus não estão abusando excessivamente das facilidades que lhes são proporcionadas. Finalmente, as instituições monetárias podem conseguir apoio localizando compradores dispostos a adquirirem suas novas debêntures, como no caso do Banco Santander, que conseguiu arrecadar 2 bilhões de euros com este método. Outros bancos provavelmente usarão seus depósitos.
Laura Britt
Sucursal da União Européia.

MERRILL LYNCH

Instituição de Cingapura aguarda aprovação dos EUA

Temasek aumentará participação acionária no Merrill Lynch

Bruxelas - O aumento de participação acionária da Temasek Holdings no capital do Merrill Lynch, de 9,4% para 14%, será concluída após a operação ser aprovada pelo órgão responsável pela defesa da concorrência dos EUA. Enquanto isso, as negociações para a venda do banco Dresdner estão em plena evolução entre a seguradora Allianz (proprietária) e os bancos interessados, o China Development Bank (CDB) e o Commertzbank. Um acordo paralelo entre o Commertzbank e a Allianz está sendo costurado e se prevê que desempenhará um papel importante para o equilíbrio do setor bancário alemão, quando o gigante Deutsche Bank deverá enfrentar o já forte Commertzbank. O mercado alemão sustenta que o Commertzbank assumirá a primazia, e circulam rumores de que o China Development Bank deverá aumentar sua proposta. Ho Ching, CEO da Tomasek Holdings (capitais estatais de Cingapura) declarou que investirá mais US$ 900 milhões - além dos US$ 5 bilhões iniciais - no Merrill Lynch. Desde o final de 2007, quando o Merrill Lynch confessou ter sofrido prejuízos pela primeira vez em sua história de 93 anos, ficou claro que o setor monetário das duas margens do Atlântico estão sedentos por novos capitais. É que o desempenho de bancos e empresas financeiras está de joelhos sob o peso de eliminações que somam mais de US$ 500 bilhões. Se diretoria da seguradora Allianz - que predomina no setor securitário europeu - optar pelo Commertzbank, os ativos patrimoniais do último subirão 1,1 trilhão de euros, ainda abaixo dos 2 trilhões de euros do Deutsche Bank.
Assim, o Commertzbank - segundo maior banco alemão - aumentará sua rede de agências para 1.900, contra as 1.000 do Deutsche Bank. Por outro lado, o China Development Bank - um dos maiores bancos da China - já penetrou profundamente no mercado bancário europeu, investindo 9,4 bilhões de euros além dos 6,6 bilhões de libras esterlinas que tinha desembolsado para adquirir 5% do capital acionário do banco britânico Barclays. O "calcanhar de Aquiles" do Dresdner Bank é seu subsidiário Dresdner Kleinwort Bank, que já confessou perdas de 3 bilhões de euros no segundo trimestre, em parte atribuídas ao prejuízo sofrido pelo Dresdner Bank no início de agosto.
Mary Stassinákis
Sucursal da União Européia.


TEMPESTADE

Boletim meteorológico do mercado

Evoluções da economia real no "olho do furacão"

Milão - Como se espera que 2009 será um ano de crescimento econômico menor para o mundo desenvolvido, com a Zona do Euro flertando com a recessão, o boletim meteorológico do mercado não sugere otimismo. Embora as conseqüências primárias da crise devam encontrar seu destino no próximo semestre, suas conseqüências secundárias sobre a economia real continuarão afetando as economias básicas negativamente.
Nos EUA, por exemplo, os preços reais dos imóveis já recuaram 24% em relação a 2006, e economistas conceituados prevêem que este mercado chegará ao fundo do poço em meados de 2009. Paralelamente, o desemprego e a poupança das famílias aumentam, enviando sinais negativos no front do consumo, e a queda de remuneração das taxas de juros de longo prazo parece confirmar que o mercado está mais preocupado com a evolução da economia nos próximos trimestres. Paralelamente, o agravamento da relação inflação/crescimento - a terrível estagflação - complica ainda mais o já pesadamente onerado quebra-cabeças do mercado. O temor de que o mundo está entrando em um período de inflação alta aumenta quase em paralelo ao medo de que o mundo está em um período de estagflação plena, como na década de 1970. Enquanto a inflação se dirige quase que exclusivamente aos alimentos e energia nos mercados desenvolvidos, com aumentos salariais em níveis médios, considera-se que o ponto chave das evoluções seja o grau de desaceleração da economia da China. Se o crescimento desacelera 9%, as pressões inflacionárias podem se moderar (através da contenção do preço das commodities), dizem os economistas europeus. Porque isto permitiria que alguns bancos centrais reduzissem suas taxas de juros, fortalecendo o crescimento. Até o final deste ano, espera-se redução de 0,25% a 0,50% da taxa de juros na Zona do Euro, e elevação de 0,25% a 0,50% nos EUA. Retomada da credibilidade do setor monetário, operações de aumento de capital social bem sucedidas, reduções de dividendos, recompra das próprias ações, limitação das expectativas de inflação, manutenção da tendência descendente para os preços do petróleo e das commodities, estabilização do mercado de casa própria e resistência dos desempenhos empresariais do setor não monetário são alguns dos parâmetros necessários exigidos para a recuperação essencial do mercado.

Lucros despencam
Um fator considerável, que pode influenciar o clima de investimentos, é a evolução dos desempenhos empresariais. Com base na experiência histórica dos períodos de queda, os desempenhos despencam em média 30%, e no mesmo período as bolsas de valores recuam em média 35%. Atualmente, a expectativa do mercado quanto aos desempenhos empresariais deste ano estão sendo revisadas para baixo, e os últimos dados da Thomson Financial mencionam ritmo de aumento de 2,8% para as empresas componentes do indicador mundial MSCI World. Mas o mercado mostra temer novas revisões descendentes, e por isso continua sofrendo. É bem provável que os mercados de ações iniciem uma evolução ascendente sustentável alguns meses antes dos desempenhos empresariais atingirem seu nível mais baixo, em torno de meados do ano que vem. Entretanto, até que a recuperação comece, o mercado diz que os preços oscilarão bastante. As revisões descendentes impedirão a alta, e valorizações menores impedirão a queda. Embora reste um tempo restrito para as ações recuperarem o terreno perdido do primeiro semestre, elas demonstram ter margens para uma evolução ascendente perto do final deste ano.
Maria Segre
Sucursal da União Européia.

CÁUCASO
Navios da Rússia e da Otan em formação de batalha

Ocidente atiça evolução perigosa da crise na região

Sevastopol (Mar Negro) - O termômetro da situação está fixo, e no vermelho, aqui no Mar Negro. Para isso contribuiu o fato de a Turquia ter autorizado que navios de guerra dos países da Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan) atravessassem os Estreitos de Dardanelos, para assim acessarem o Mar Negro. A medida colocou em imediato alerta máximo a poderosa frota naval russa da base de Sevastopol no Mar Negro, que começou a navegar em formação de batalha, sendo imitada pelos navios da Otan. Agora, as duas frotas navegam à curta distância uma da outra. Moscou informou que os dois navios de guerra norte-americanos que ancoraram em Vatumi, na Geórgia, na semana passada, não transportavam ajuda humanitária mas armas.
Segundo uma fonte da base naval russa aqui em Sevastopol, a contra-espionagem russa descobriu que os navios da Otan que acessaram o Mar Negro transportam mais de uma centena de mísseis que poderiam atingir o território da Rússia.

Poder naval russo
O Estado-Maior da frota naval russa do Mar Negro informou que mais de 10 navios de guerra de países da Otan estão no Mar Negro, e para as próximas horas são aguardados mais oito, que já atravessaram os Estreitos dos Dardanelos na Turquia. Em conseqüência, o almirantado russo ordenou que o gigantesco cruzador de batalha Moskva permanecesse no porto de Vatumi. À curta distância, outros navios de guerra russos patrulham a área, com o objetivo de evitar qualquer tentativa de ataque dos navios da Otan. Em declarações à imprensa, o comandante da base naval russa de Novorosisk, contra-almirante Serguei Meniailo, informou que navios de guerra russos estão na Abkhazia, controlando as águas territoriais e impedindo o transporte de armas. A propósito, os moradores da Abkhazia receberam os navios russos com flores, e agitando bandeiras da Rússia e da região autonomista. A Otan justificou a presença dos navios de guerra de alguns países-membros com a alegação de que estão realizando "exercícios de rotina que serão concluídos no dia 10 deste mês"!
Georges Pezmatzoglu
Enviado especial.

NOVO CENÁRIO

Bush, o incômodo parceiro do Ocidente

Gestão de oito anos corroeu o conceito dos EUA no mundo

Varsóvia - A Rússia é uma ameaça para os EUA e o Ocidente ou é um parceiro que não podemos ignorar? A pergunta é bastante retórica, mas concentra a crise provocada pela soberba aloprada do presidente da Geórgia, Mikhail Saakashvili, que na madrugada de 08 de agosto resolveu atacar a então semi-autônoma Ossétia do Sul. Desde o primeiro momento, os EUA excluíram a eventualidade de uma intervenção militar de socorro ao soberbo aliado, revelando duas novas situações:
- Que a Rússia recuperou o controle pleno sobre a região do Cáucaso. A crise mostrou, além de outras evoluções, a dimensão do desgaste causado pelo papel internacional dos EUA e, em seu conceito, a gestão presidencial de oito anos de Bush.
- Que os EUA, a Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan) e, por extensão, a União Européia (UE), cedo ou tarde serão obrigados a reavaliarem suas respectivas posições no mundo, a filosofia de suas políticas externas e também a escala hierárquica de seus interesses.
A Rússia deve ter o mesmo, naturalmente, mas ela já se antecipou a todos os demais. Dentro de um novo mundo que começou há surgir com países como China, Índia e Brasil, os quais contribuem impressionantemente para a economia mundial, o regime internacional de império único que os EUA conformaram a partir da década de 1990 não resiste.

A Geórgia, comprovou-se, é o catalisador de sua queda.

Esta mudança não acontecerá rapidamente. A pesada obra estará sobre as costas do novo presidente dos EUA e, na prática, será impossível que ele se ocupe desta questão antes de 2010, pois as prioridades são a economia, o Afeganistão e o Iraque, três graves feridas abertas para os EUA. Supõe-se que a nova liderança norte-americana reexaminará as possibilidades dos EUA com base em critérios não da década de 1950, mas da realidade do Século XXI. O tempo não trabalha a favor de Washington, e seus aliados não estão dispostos a esperar muito. As garantias que a Casa Branca oferece aos países da periferia russa e as instalações de escudos (?) antimísseis em alguns deles talvez sejam oportunidades para autoridades norte-americanas fracassadas e de visão curta pronunciarem discursos verborrágicos e incendiários, mas na realidade acrescentam novos pesos e novas dificuldades às relações internacionais dos EUA. Ao mesmo tempo, conservam e tencionam a gravidade das relações com Moscou, o que amplia a divisão com seus aliados na Europa. O que a Europa quer é aquilo que o ministro de Relações Exteriores da Alemanha destacou: um "diálogo com a Rússia", desde que as forças russas recuem para as posições definidas pelo Acordo Sarkozy. O objetivo dos europeus deve ser bem amplo, não excluir a política de colaboração, garantir a segurança para europeus e russos e contribuir para a consolidação da confiança, que está abalada mas não de forma inapelável. "Equilíbrio e não extremismos", destacou o ministro alemão, e seu colega italiano formulou ponto de vista análogo ao pedir "uma nova feição de relações da União Européia com a Rússia", criticando indiretamente todos aqueles que "se aprazem a ouvir o som dos tambores de guerra". Esta é pauta da Reunião de Cúpula de Chefes de Estado e de Governo dos 27 Países-Membros da União Européia, que apavorados com a demonstração de força da Rússia se reuniram em Bruxelas, em busca de uma saída para a crise, jurando em voz alta que não pretendem impor sanções à Rússia. Pudera... Existe esta possibilidade? O governo russo, através de seu ministro de Relações Exteriores, respondeu positivamente, e não só na Europa. "Nossas relações - escreveu Labrov em artigo publicado no Wall Street Journal - poderão se desenvolver, mas apenas na base da mutualidade. Foi isto que faltou nos últimos 16 anos (...) A realidade geopolítica que enfrentamos finalmente obrigará que colaboremos".
Alex Corsini
Sucursal da União Européia.

Estas matérias são do jornal Monitor Mercantil

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