A urgência do nacionalismo econômico
Em meados de 2004, o banqueiro Daniel Dantas se envolveu no chamado escândalo Kroll-Opportunity, o qual foi objeto de uma edição especial do jornal Solidariedade Ibero-americana, publicada em agosto daquele ano. Por sua grande oportunidade (sem trocadilho), reproduzimos a seguir a Introdução da mesma, com um link para o texto completo em formato PDF. As revelações sobre a atuação da empresa de investigações Kroll Associates na disputa entre o Grupo Opportunity e a Telecom Italia pelo controle da Brasil Telecom, divulgadas pela imprensa em julho, representam evidências claras de que a política de privatizações dos serviços de utilidade pública, paradigma da chamada “globalização”, se enquadra no contexto de uma gigantesca onda de corrupção e operações ilegais que varreu o planeta no rastro do maremoto neoliberal das décadas de 1980-90. No caso brasileiro, tais operações - não raro, envolvidas com elementos do crime organizado - se beneficiaram largamente das políticas de desmonte forçado do Estado nacional adotadas a partir do Governo Fernando Collor de Mello.
Em especial, o caso Kroll-Oportunity ressalta não apenas o altamente discutível ambiente de interesses particulares em que ocorreu grande parte das privatizações brasileiras, mas também denota as conseqüências do irresponsável desmantelamento do aparelho de segurança do País, principalmente, os serviços de inteligência. Envolvida nele, encontra-se uma série de personagens que evidenciam a complexa teia transnacional de interesses que têm explorado a fundo as oportunidades oferecidas pela desconstrução “globalista” do Estado nacional – que uma ativa rede de propaganda midiática e acadêmica tem se empenhado em apresentar como se fosse uma ordem natural e inevitável. Como parte da mesma tendência desconstrucionista, várias funções do Estado foram parcialmente transferidas para organizações não-governamentais (ONGs), também freqüentemente vinculadas a interesses estrangeiros, especialmente nas áreas da política ambiental e indigenista (Fundo Mundial para a Natureza-WWF, Instituto Socioambiental-ISA entre outras.), combate à corrupção (Transparência Internacional) e até mesmo na segurança pública (Movimento Viva Rio e outras). Também com preocupante freqüência, os interesses representados nestas ONGs e em empresas como a Kroll Associates se entrelaçam, não apenas entre si, mas igualmente com as políticas de governos estrangeiros para o Brasil, que, em última análise, visam favorecer a atuação de suas próprias empresas no País. Esse processo de desmonte do Estado brasileiro se iniciou com as ações do chamado “Projeto Democracia”, no governo do recém-falecido presidente Ronald Reagan (1981-89), quando o então vice-presidente George Bush montou uma estrutura de governo paralelo financiada com operações ilícitas, como o tráfico de drogas, descoberta durante o escândalo Irã-Contras, do famigerado tenente-coronel Oliver North. Por outro lado, esta estrutura criminosa, montada sob o biombo da luta anticomunista, se intercalava com uma vasta rede de interesses corporativos, em grande medida vinculados ao chamado complexo industrial-militar (como o definia o presidente Dwight Eisenhower), que exercia - e ainda exerce - grande influência sobre a política exterior de Washington. Não por acaso, um intenso intercâmbio de quadros entre órgãos governamentais e empresas como a Halliburton, Grupo Carlyle e outras, tem sido uma marca registrada dos governos em Washington, especialmente os republicanos (Reagan, Bush pai e Bush filho). Outros setores particularmente impregnados por esse aparato foram o de energia e o de telecomunicações, nos quais empresas como a Enron, WorldCom e outras se tornaram paradigmáticas das práticas corporativas predatórias que se tornaram rotineiras entre o big business, nas últimas décadas. A marca registrada deste processo foi a conversão das empresas em máquinas de maximização de recursos financeiros, para alimentar o virtual cassino em que foi transformado o sistema financeiro e monetário mundial após a ruptura do chamado sistema de Bretton Woods, no início da década de 1970. Com isso, em lugar do interesse público, tais empresas passaram a orientar suas ações pelo questionável conceito do “valor do acionista” e pelo envolvimento de suas diretorias em esquemas cada vez mais afastados das práticas empresariais aceitas e, freqüentemente ilegais, que vieram à tona em megaescândalos como os da Enron, WorldCom, Parmalat e outros. Tal processo, que proporcionou a criação de diversas “bolhas” especulativas, entre elas a das chamadas “ações da Internet”, começou a ruir com a quebra do fundo de hedge LTCM, que foi seguido da moratória russa, no segundo semestre de 1998. (...) Em seus dois mandatos, Fernando Henrique Cardoso se empenhou ativamente em promover o que chamou “o fim da Era Vargas”, consolidando a “desconstrução” do Estado nacional e suas instituições, com a quase total privatização das empresas de economia mista brasileiras, a abertura indiscriminada e a brutal “financeirização” da economia (refletida na multiplicação da dívida pública por um fator de seis), o descaso com a segurança e a defesa nacionais e a entrega de importantes funções do Estado ao aparato das ONGs. Um dos grandes beneficiários de suas políticas, com a privatização do sistema de telefonia, foi, precisamente, o Grupo Opportunity, como veio à tona no episódio das “fitas do BNDES”. Não deixa de ser significativo que o Ministério Público esteja reabrindo o caso, responsabilizando quatro ex-presidentes do banco pelas irregularidades do processo. (...)
Esses e outros fatos deveriam ser suficientes para motivar, por parte dos setores patrióticos da sociedade brasileira, um decidido “basta” a essa deterioração da funcionalidade do Estado nacional, que ameaça seriamente o futuro imediato do País. (...)
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http://www.msia.org.br/ibero-am-rica-iberoam-rica/brasil/628.html
Fotos: Revista IstoÉ
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