Uma crise anunciada
Há mais de um ano que esta crise da economia mundial é prevista e anunciada. Há 10 anos escrevi que o entusiasmo sobre o neoliberalismo era exagerado e que a derrocada do comunismo era um exemplo que lhe deveria servir de alerta. Mas por trás de todas estas notícias de desastres de bolsas e mercados existe um fato que não pode ser desprezado: a economia não é uma ciência exata e nem comporta dogmas. Assim como o comunismo ruiu por transformar-se em uma religião, o capitalismo, com mais flexibilidade para adaptar-se, não está isento de sofrer uma débâcle. Primeiro foi a certeza de que chegáramos ao fim da história, com a democracia liberal e o livre mercado. Logo começamos a desconfiar de que o mercado resolve muitas coisas, mas não resolve tudo. Por outro lado, todo o esforço do sistema capitalista é voltado para o lucro e os outros valores da sociedade, por vezes, são deixados de lado. E se o lucro é o objetivo, tudo pode ser feito para obtê-lo. O resultado é que, com a ausência do Estado regulador, chegamos ao cúmulo de verificar que o valor nominal da economia dos papéis é vinte vezes superior à economia real. O primeiro resultado foi o rompimento da bolha das companhias "ponto.com", que provocou um estrago grande e comeu muitas pequenas poupanças, principalmente dos menores investidores, desestruturados para compreender a lógica dos especuladores. Greenspan achava que, a partir dali, pouco a pouco a economia mundial reduziria a especulação de modo a chegarmos a uma situação mais segura, próxima da realidade econômica, isto é, do valor real. Tudo errado. O mercado é importante para permitir o exercício da liberdade econômica. Mas com a complexidade do mundo atual, e a novidade da globalização dos mercados financeiros, é necessário um novo modelo. O consenso mundial é que o de Bretton Woods está decrépito. Mas continuou a correr solto. A conseqüência é que as crises afetam a atividade da economia real e geram desconfiança no sistema. A instabilidade das taxas de câmbio leva à especulação e a práticas questionáveis. Se me pedissem uma definição para esta crise, é justamente a falta de regulação. O Estado falhou. E o mundo só aprende levando surras colossais. É preciso que o Estado seja mais forte para controlar a relação entre risco e lucro. Se não abrirmos os olhos, o caminho do capitalismo será o mesmo do comunismo: desmoronar-se por excesso de autoconfiança. Assim, a atual intervenção do governo americano na economia é a confissão de que o modelo ruiu. Não a vejo como providência equivocada, mas como a confirmação de que o livre mercado sem controle pode ser um suicídio para o capitalismo.
Há mais de um ano que esta crise da economia mundial é prevista e anunciada. Há 10 anos escrevi que o entusiasmo sobre o neoliberalismo era exagerado e que a derrocada do comunismo era um exemplo que lhe deveria servir de alerta. Mas por trás de todas estas notícias de desastres de bolsas e mercados existe um fato que não pode ser desprezado: a economia não é uma ciência exata e nem comporta dogmas. Assim como o comunismo ruiu por transformar-se em uma religião, o capitalismo, com mais flexibilidade para adaptar-se, não está isento de sofrer uma débâcle. Primeiro foi a certeza de que chegáramos ao fim da história, com a democracia liberal e o livre mercado. Logo começamos a desconfiar de que o mercado resolve muitas coisas, mas não resolve tudo. Por outro lado, todo o esforço do sistema capitalista é voltado para o lucro e os outros valores da sociedade, por vezes, são deixados de lado. E se o lucro é o objetivo, tudo pode ser feito para obtê-lo. O resultado é que, com a ausência do Estado regulador, chegamos ao cúmulo de verificar que o valor nominal da economia dos papéis é vinte vezes superior à economia real. O primeiro resultado foi o rompimento da bolha das companhias "ponto.com", que provocou um estrago grande e comeu muitas pequenas poupanças, principalmente dos menores investidores, desestruturados para compreender a lógica dos especuladores. Greenspan achava que, a partir dali, pouco a pouco a economia mundial reduziria a especulação de modo a chegarmos a uma situação mais segura, próxima da realidade econômica, isto é, do valor real. Tudo errado. O mercado é importante para permitir o exercício da liberdade econômica. Mas com a complexidade do mundo atual, e a novidade da globalização dos mercados financeiros, é necessário um novo modelo. O consenso mundial é que o de Bretton Woods está decrépito. Mas continuou a correr solto. A conseqüência é que as crises afetam a atividade da economia real e geram desconfiança no sistema. A instabilidade das taxas de câmbio leva à especulação e a práticas questionáveis. Se me pedissem uma definição para esta crise, é justamente a falta de regulação. O Estado falhou. E o mundo só aprende levando surras colossais. É preciso que o Estado seja mais forte para controlar a relação entre risco e lucro. Se não abrirmos os olhos, o caminho do capitalismo será o mesmo do comunismo: desmoronar-se por excesso de autoconfiança. Assim, a atual intervenção do governo americano na economia é a confissão de que o modelo ruiu. Não a vejo como providência equivocada, mas como a confirmação de que o livre mercado sem controle pode ser um suicídio para o capitalismo.
José Sarney é ex-presidente, senado do Amapá, acadêmico da Academia Brasileira de Letras e da Academia das Ciências de Lisboa e ilustre colaborador deste Blog.
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