Steinbruch e Brumer entregaram mesmo a Vale a multinacionais
Ninguém escreveu tanto sobre a doação-privatização da Vale quanto este repórter. Vários artigos tiveram o mesmo título, que foi repetido, usado e republicado sem protesto: "Quanto vale a Vale?" Era um título obrigatório numa campanha que não era contra ninguém, tinha como único e exclusivo objetivo a defesa do interesse nacional, a preservação do patrimônio do cidadão brasileiro. Agora, que surgem rumores de entrega dessa mesma Vale a grupos sul-africanos, voltamos ao assunto.
Falam principalmente em duas coisas. 1 - Benjamin Steinbruch estaria negociando a venda de sua participação na Vale. E eventualmente passaria até mesmo o controle da empresa. 2 - Wilson Brumer, que foi presidente da Vale estatal e tentou de todas as maneiras ser o presidente da Vale "privatizada", estaria coordenando a entrega de tudo à Billiton (ou à Genkor) numa operação final. Acrescente-se: Brumer, que não foi escolhido presidente da Vale por Steinbruch, ficou ao lado dele. Agora, estaria definitivamente separado.
Brumer sempre foi ligado à Billiton, poderosa empresa da África do Sul. Mas não é homem de arriscar tudo numa jogada só. Por coincidência (ou "coincidência"?), a Genkor fez lançamento de papéis nos EUA. Valor desse lançamento: 1 bilhão e 500 milhões de dólares.
Pouco antes do lançamento desses papéis, se dizia nos EUA que a Genkor tinha dois objetivos, ou melhor, reforçar o caixa para duas coisas.
1 - Ficar com o controle da estatal venezuelana de alumínio e daí saltar para várias coisas.
2 - Pensar numa proposta para ficar com a Vale do Brasil. A Genkor não desmentiu nada.
Esse projeto da Genkor foi concebido e planejado para entrar em ação antes da eleição do presidente, coronel Chávez, na Venezuela. Este, muito antes, já se manifestara contra o projeto. Com sua eleição, a Genkor resolveu tirar o time de campo, a operação ficou complicada. Mas os dólares, 1 bilhão e 500 milhões, ficaram no caixa.
Não é de hoje que a Genkor pensa, trabalha ou sonha com a Vale do Rio Doce. Na época do leilão, tentaram participar, fizeram movimentos que significavam recados: estavam ou estariam abertos a conversas. Só se movimentavam subterrânea ou indiretamente por um motivo: respeito pelo tradicional adversário e rival, a Anglo-Americana.
Chegaram a fazer sondagens, tentaram alguma coisa mais concreta, mas sempre assustados com os movimentos da Anglo. Esta se associara à Votorantim, fizera uma superanálise do poder dos Ermirio de Moraes, pensava que já havia ganho tudo. Não ganhou coisa alguma, mas manteve, mesmo sem saber, a Genkor sem oportunidade. Se esta também tivesse feito análise mais correta, poderia ter obtido sucesso.
Agora a Genkor volta a agir, só que mais ativamente. Começou pelos funcionários. Já teria fechado acordo com eles. A Genkor não pretende comprar a parte deles e sim fazer um "contrato de gestão". Esses empregados já participam no Consócio Valepar. Para isso, o BNDES sairia do "acordo de controle". Essa é uma misteriosa e complicada troca de ações de controle por uma parcela de ações fora do controle. (Estas pertencem ao fundo dos
empregados. A troca seria na base de 1 por 1. Estranho. Pois o valor das "ações controladoras" é muito maior.)
Vejam a situação, complicadíssima, que vai exigir tormentosa operação de engenharia financeira e empresarial. Acompanhem.
O BNDES tinha cerca de 8% das ações de controle da Valepar. Os empregados, através da InvestVale, tinham 1% deste mesmo tipo de ações. Ao realizar a troca de seus 8% (de controle) por igual quantidade de ações dos empregados (fora do controle), estes últimos passaram a deter 9% de ações do controle, aumentando seu poder dentro da Valepar. Esta operação, onde não entrou dinheiro, já estaria consumada.
É estranho que um investidor saia da liquidez de "ações livres" para ficar com ações que vão participar (ou já estão participando) de um "acordo de controle" válido por 20 anos, onde as referidas ações ficam bloqueadas. Não podem portanto ser vendidas para satisfazer as necessidades previdenciárias dos sócios da InvestVale, sejam eles empregados ou ex-empregados da Vale.
A InvestVale tem um patrimônio de US$ 420 milhões e uma dívida de US$ 320 milhões.
Dispõe, ainda, em caixa, de US$ 100 milhões. (Todos esses números calculados por aproximação.)
O segundo passo, já em negociação, é a Genkor adquirir as ações da CSN, que tem 25% do consórcio Valepar (o controlador). As conversas avançam com Steinbruch fingindo que não interfere.
Outro alvo da Genkor é o Fundo Electron, que tem 18% da Valepar. Destes, 15% são do Bradesco (que ainda não exerceu o seu direito de conversão) e 3% são do Opportunity.
Patrimonialmente esses 18% têm valor próximo de US$ 700 milhões. A Genkor estaria negociando adquirir 50% das ações do Bradesco na Valepar (7,5%). E 100% das ações do Opportunity (3%). A Genkor está querendo adquirir 100% da participação da CSN na Valepar (25%).
Se as manobras casarem e se consumarem como parece (no momento apenas parece, mas as grandes operações acionárias no início apenas parecem, como aconteceu quando Howard Hughes fez a sua fabulosa operação de compra da TWA, por 798 milhões de dólares, há 35 anos, sem ter um tostão), teremos a Genkor assumindo o controle da Valepar.
Esse controle será assumido assim.
Por aquisição:
25% da CSN,
7,5% do Bradesco,
3% do Opportunity.
Por acordo:
8% dos empregados.
Total: 43,5%.
Não se sabe ainda o que pode ocorrer com a participação do Nations Bank na Valepar. Eles têm 7%. Incluído no negócio, a Genkor ficaria com 50,5%, controle total.
Assim, com essas operações perfeitamente viáveis, a Vale estará definitivamente transferida para o controle do capital estrangeiro, será multinacional dentro do Brasil. Como eu sempre disse que aconteceria. Steinbruch e Brumer não dão uma palavra. Praticam o fecundo exercício do silêncio.
O artigo acima foi publicado no dia 2 de junho de 1999. Agora esses grupos multinacionais citados anunciaram a conclusão da total doação-desnacionalização. Uma das duas maiores empresas brasileiras (a outra é a Petrobras) deixa de pertencer ao Brasil. Consegui RETARDAR a negociata-traição por 14 meses. Para impedi-la totalmente seria necessário mais do que um simples repórter.
PS - Esse artigo publicado pela Tribuna papel é repetido agora aqui. 10 anos vão se completar em junho. Não troquei nem o título. TRAIÇÃO inominável ao patrimônio nacional.
Impossível esquecer.
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