terça-feira, 20 de maio de 2008

Machado de Assis




O Sr. Machado de Assis passa atualmente pelo mestre incomparável do romance nacional. (…) Mas é preciso romper o enfado que me causa este romântico em desmantelo, despi-lo à luz meridiana da crítica. Esse pequeno representante do pensamento retórico e velho no Brasil é hoje o mais pernicioso enganador, que vai perventendo a mocidade. Essa sereia matreira deve ser abandonada.
Está bem, pode ser que as polêmicas literárias já tenham sido mais elevadas. Mas não eram necessariamente mais lúcidas e inteligentes. E nem é preciso ler motivações sexuais reprimidas nessa história de “despi-lo à luz meridiana da crítica”.
Em 1885, três anos depois das espantosas narrativas curtas de “Papéis avulsos” – entre elas O alienista – e quatro após “Memórias póstumas de Brás Cubas”, talvez Machado de Assis já tivesse produzido o suficiente para ser considerado o maior escritor brasileiro da história. Mesmo que dali até sua morte, exatamente cem anos atrás, não fizesse o que fez. Mesmo que não existisse Capitu. Pois foi naquele ano que um dos mais renomados críticos brasileiros de todos os tempos, o sergipano Sílvio Romero, que não era um idiota, resolveu pregar em si mesmo um nariz de palhaço, pendurar no pescoço uma sineta de muar, colar nos fundilhos uma rabiola de papel por toda a posteridade:
O Sr. Machado simboliza hoje o nosso romantismo velho, caquético, opilado, sem idéias, sem vistas, lantejoulado de pequeninas frases, ensebadas fitas para efeito. Ele não tem um romance, não tem um volume de poesias que fizesse época, que assinalasse uma tendência. É um tipo morto antes do tempo na orientação nacional.
Motivação? Bom, a de sempre – provavelmente o fato de Machado ter escrito anos antes, a propósito de um livrinho de poemas, que Romero não levava jeito para versejador. O ataque de 1885 não chegou a virar uma polêmica clássica porque Machado, fiel ao seu estilo, deixou-o sem resposta. Responderam por ele. No fim da vida, Romero moderaria as críticas, mas era tarde. O nariz de palhaço, a sineta e a rabiola são irremovíveis.
Moral da história: antes de estraçalhar um desafeto literário, certifique-se de que ele não é o Machado de Assis.


Esta reflexão está em:
http://sergiorodrigues.ig.com.br/mais-polemica-machado-o-enganador


* Sérgio Rodrigues, jornalista e escritor, não necessariamente nessa ordem: saiba um pouco mais sobre o autor deste blog ››

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