Na crise ou na prosperidade, na derrota ou na conquista, na depressão ou na euforia, vivemos a civilização do álcool e qualquer evento no cotidiano tende a ser motivo para a celebração da embriaguez. A propaganda em todos os veículos, incluindo o apelo ao testemunho pessoal de celebridades, é inclemente e competente na consolidação desta atitude. O "brameiro" é um cara, antes de tudo, alegre e está sempre acompanhado de belas mulheres e muita festa. É o imperativo do consumo do álcool, que tem sido apresentado como panacéia para debelar o mal estar geral desta civilização, suas demandas existenciais e passionais. Dramas que a mídia da bebida se habilita a resolver. E quem se atreve a duvidar? Na disseminação desse paradigma bacante e bacana, é fundamental esconder as reais implicações e seqüelas do consumo exacerbado, que acontece principalmente entre os jovens de 16 a 29 anos. E ignorar o fato grave da doença do alcoolismo que atinge 13% da população... A onda de violência que solapa muitas vidas entre os jovens está associada à droga, especialmente a mais badalada, liberada e difundida: o álcool. E pouco se fala nisso.O Brasil avançou na gestão do problema ao aplicar a tolerância zero de consumo de álcool para motoristas nas vias urbanas e federais. A Lei Seca, criada há seis meses, porém, já corre sério risco de virar letra morta. E, além disso, o país ainda não ordenou rigorosamente a veiculação da propaganda, inibido pela receita bilionária que a indústria do álcool recolhe aos cofres públicos. Acende uma vela no altar da proibição e presta culto à publicidade irresistível que trabalha eficazmente o desejo e o prazer que move as gerações mais jovens. Uma no cravo do castigo e outra na ferradura da receita. Na explicação oficial da autoridade federal do trânsito, as 435 mortes ocorridas nas festas de Natal e Ano Novo nas rodovias federais, foram causadas por imprudência dos motoristas e excesso de chuvas do respectivo período. O aumento de 13,3%, portanto, em relação a 2007, não foi formalmente atribuído ao consumo de álcool, embora os prontuários confirmem a presença média de 60% do álcool no registro de acidentes e 70% nas causas de eventos fatais. Famílias desestruturadas, trajetória profissional comprometida, perda de credibilidade e respeito nas relações pessoais, além de uma lista enorme de conseqüências para a saúde do organismo são alguns contrapontos perversos do consumo descontrolado do álcool, um modelo virtual de felicidade que é considerado um problema de saúde pública pelo Ministério da Saúde. Porta de entrada de outras drogas, o álcool é a droga preferida de 68% dos brasileiros e o país é o primeiro do mundo no consumo de destilados, o quinto maior produtor de cerveja do planeta e por aí vai. Na estatísticas de óbito, é a terceira causa mortis do país, e responde pelo prejuízo anual de R$ 65 bilhões na receita pública, considerando os gastos com saúde e previdência. A cruzada de enfrentamento do problema é, pois, desafiadora é inclui a participação de todos os atores sociais diretamente envolvidos, a começar pelo poder público, seu posicionamento transparente e coerentemente pautado no interesse maior da sociedade. Como compatibilizar a equação entre economia, tributos e o interesse efetivo da população? Qual o papel das entidades sociais, da escola, da mídia e das instituições que respaldam o ordenamento social neste empreendimento emergencial? Não se trata, obviamente, da proposição que abole o consumo, seria um desatino. Mais desatinado, porém, é "naturalizar" a civilização do álcool, fechando os olhos da intervenção para a barbárie embriagadora que tem disseminado a dor e ceifado tantas vidas cada dia mais.
Zoom-zoom
Guerra sem fim - Palestinos e israelenses continuam a alimentar a indústria da guerra e o fomento do ódio racial que parece não ter fim. Povos que são consangüíneos e que têm valores, história e crença capazes de promover a paz, mas sustentam a economia da guerra pra beneficiar interesses específicos, sombrios e indesculpáveis. Uma guerra que põe em cheque a universalidade e a eficácia da Organização das Nações Unidas, incapaz de gerenciar mais esta crise. E que nos deixa a todos impotentes e constrangidos.
Guerra no trânsito - as mortes nas estradas e as estatísticas de violência nas festividades de final de ano no Brasil e em Manaus trazem à tona algumas evidencias de demanda para uma intervenção pública mais eficaz. A Lei Seca precisa ser permanente e sorrateiramente aplicada e Prefeitura e Estado precisam compatibilizar as respectivas atribuições para equacionar a encrenca.
O papel das entidades - Parte integrante da gestão da sociedade, as entidades de classe da indústria, varejo, serviços e setor primário, deverão cada vez mais ocupar seu espaço no encaminhamento das questões do interesse público, principalmente com a onda de questionamento e descrédito que a classe política vem amealhando junto ao tecido social. É premente a necessidade de mobilização e profissionalização maior dessas associações e instituições representativas dos diversos segmentos sociais.
Meia passagem - O imbróglio formado pela relação obscura dos vereadores de Manaus com as empresas de transporte para solapar um direito líquido e certo dos estudantes à meia passagem é um retrato cruel do descrédito alcançado pela representação política da sociedade. E um imperativo de mobilização dos demais setores da sociedade para corrigir mais esta anomalia, denunciar suas incongruências e assegurar o interesse da coletividade.
Belmiro Vianez Filho é empresário e membro do Conselho Superior da Associação Comercial do Amazonas.
belmirofilho@belmiros.com.br
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