Ataques violentos contra imigrantes
Ann TALBOT
Traduzido por Alexandre Leite
Foram mortas pelo menos 32 pessoas em ataques violentos contra imigrantes na África do Sul. É referido que mais de 6000 pessoas procuraram abrigo em esquadras de polícia e igrejas.
Um homem foi queimado vivo e outros foram baleados, espancados e esfaqueados com machetes. Foram pilhadas e incendiadas lojas e habitações nas zonas operárias à volta de Joanesburgo, que é o centro financeiro da África do Sul. Os ataques começaram há uma semana nas townships [bairros criados no tempo da segregação racial que eram destinados apenas aos 'não-brancos'] de Alexandra, no norte de Joanesburgo, e de Diepsloot, a sudoeste da cidade. Daí espalhou-se para Zandspruit, Tembisa, Primrose, Reiger Park e Thokoza. A violência não chegou às primeiras páginas da imprensa estrangeira até ela se ter chegado até à zona de negócios, no centro da cidade, o que aconteceu no fim-de-semana. Aconteceram escaramuças junto à Igreja Central Metodista da Rua Pritchard, que se tornou casa para cerca de 1000 migrantes na sua maioria zimbabueanos.
Os líderes do ANC foram lestos a sacudir as culpas. Foram apontados dedos ao Partido Liberdade Inkatha (IFP). Muitas vítimas relataram ter sido atacadas por zulus. O secretário-geral do ANC, Gwede Mantashe, disse, “Se olharem para as... escaramuças, há lá estruturas do IFP.” Há algumas bases para acusar o IFP de fazer dos imigrantes bode expiatório. Já em 1994 o IFP ameaçou ter “acções físicas” se o governo não tomasse medidas para lidar com o assunto dos imigrantes indocumentados. Mas o líder do IFP, Mangosutho Buthelezi, era Ministro da Administração Interna. Desde essa altura tem havido ataques esporádicos a imigrantes, mas nada que se compare com a actual escala de violência. O governo abriu conversações com o IFP sobre a situação. Moeletsi Mbeki, irmão do Presidente Thabo Mbeki e diretor delegado do Instituto de Assuntos Internacionais da África do Sul, deitou as culpas da violência sobre o governo do ANC. Esta situação tem vindo a desenvolver-se nos últimos oito anos, disse Mbeki. Ele disse que tinha repetidamente alertado o governo de que o seu apoio ao regime de Mugabe no Zimbabwe levaria a um descalabro económico com severas consequências para a África do Sul. A violência, afirmou ele, foi o resultado de deixarem Mugabe destruir a economia do Zimbabwe e forçar a população a sair do país. Falando para a televisão Channel 4 News, ele disse que uma das faíscas que fez deflagrar a situação foi o facto de as camadas dominantes dentro do ANC “estarem a atirar-se ao pescoço umas das outras.” Os bairros pobres da África do Sul, disse Mbeki, eram “grandes panelas de pressão de pobreza e HIV/SIDA, por isso estão como lenha seca à espera de começarem a arder a qualquer momento e agora estão a entrar em chama.” As pessoas já não confiavam no governo para resolver os seus problemas, disse Mbeki. A facção Zuma do ANC foi rápida a capitalizar politicamente os ataques aos estrangeiros. Eles apelaram a eleições antecipadas. Jacob Zuma tornou-se líder do ANC no ano passado, mas entretanto Thabo Mbeki continua como presidente até Abril de 2009. O Tesoureiro-Geral do ANC, Matthews Phosa, disse que o problema era a existência de dois centros de poder dentro do ANC: “A realidade é que nós temos um presidente eleito no partido no poder, mas ele não é o presidente do país.” “Eu penso que a melhor opção – sem desculpas – seria eleições antecipadas”, acrescentou Phosa. “A situação não é saudável – estamos ainda a um ano das eleições e antecipando a sua data poderemos chegar a uma solução rápida, menos dolorosa e mais produtiva.” O Presidente Thabo Mbeki, afirmou ele, “perdeu a confiança do seu partido, em parte por causa da percepção de que ele se desligou das vontades da maioria.” Phosa comparou a situação ao período do final do apartheid quando o Presidente P. W. Botha sofreu um acidente vascular cerebral e abdicou da sua posição no Partido Nacional, mas continuou a dirigir o país. Emergiram então dois centros de poder à volta de F.W de Klerk e Botha. A responsabilidade governamental pela situação é, pelo menos, ainda mais directa do que concedem os seus críticos. Vários ministros têm consistentemente demonizado os imigrantes ilegais, e ao mesmo tempo tornando extremamente difícil a obtenção de um estatuto legal. Mesmo no meio desta violência, a polícia tem vindo a prender imigrantes ilegais. A associação Advogados pelos Direitos Humanos (LHR) relatou um caso em Olifantsfontein no qual 32 estrangeiros foram atacados e roubados. “Em resposta a este ataque, a polícia deteve as vítimas já que elas não tinham nenhuma documentação legal na África do Sul”, disse a LHR. A LHR disse que as vítimas foram depois conduzidas a um campo de deportação e viram ser-lhes negado o direito a apresentarem queixa. “Obviamente que os criminosos não se podem sentir encorajados a atacar estrangeiros porque eles sabem que muito provavelmente eles serão deportados antes de poderem ser testemunhas num julgamento.” A resposta governamental à violência tem sido a de enviar a polícia armada com balas de borracha para as ruas das zonas operárias. O Congresso de Sindicatos da África do Sul (COSATU), que apoiou Zuma na sua candidatura ao ANC, protestou contra a violência. O Secretário-Geral do COSATU, Zwelinzima Vavi, afirmou “Eu quero enviar esta mensagem: Não são os (exilados) zimbabueanos que causam os problemas (dos pobres da África do Sul).” Ele culpou o sistema capitalista. Os zimbabueanos pobres, disse Vavi, lutavam pelos mesmos recursos que os sul-africanos pobres, mas isso não era justificação para a xenofobia. O COSATU organizou uma manifestação à porta do parlamento em conjunto com o ANC e com o Partido Comunista da África do Sul para protestar contra a violência, contra a situação no Zimbabwe, contra os altos preços da alimentação. Teve fraca adesão. Alguns relatos na imprensa sugerem que apenas apareceram 100 pessoas. Este débil resultado reflecte a falta de credibilidade do COSATU depois de ter apoiado o governo nos últimos 14 anos. Vavi culpa o capitalismo pelas condições sociais enfrentadas pelos trabalhadores sul-africanos, mas ele apoiou consistentemente todas as medidas de mercado livre introduzidas pelo governo do ANC. O COSATU opõe-se à política de Thabo Mbeki para o Zimbabwe. Mas apoiou o partido da oposição no Zimbabwe, o Movimento pela Mudança Democrática, que pretende um regresso às políticas do Fundo Monetário Internacional. O FMI impôs Planos de Ajustamento Estruturais na maioria dos países africanos, forçando-os a adoptarem medidas que causaram muitíssimo desemprego e pobreza. Zuma, que tem o apoio do Partido Comunista da África do Sul e do COASTU, gosta de se apresentar como a “esquerda” em casa. Mas quando busca aopoio na Europa e na América, ele deixa claro que é a favor de medidas capitalista. Ele conquistou o apoio de magnatas de Wall Street e dos editores da revista Time, que o vêm como um homem para dirigir a classe trabalhadora sul-africana. A violência da semana passada poderá encorajar Zuma e os seus apoiantes a mobilizarem-se mais rapidamente contra Mbeki. Investidores estrangeiros estão cada vez mais nervosos. “A violência não é um bom sinal para os investidores”, disse Raoul Luttik, gestor de investimentos da ING Investment Management em Haia, Países Baixos. Os ataques a estrangeiros acentuaram as preocupações surgidas com a crise da indústria de fornecimento de electricidade que forçou algumas minas a encerrarem nos últimos meses. Há receios na indústria turísitica. Com a continuação da violência o rand começou a enfraquecer. Esta é uma situação insustentável. Em grande medida é resultado da crescente crise política dentro do ANC e só vai aprofundar essa crise.
http://www.wsws.org/articles/2008/may2008/safr-m21.shtml
Artigo original publicado a 21 de Maio de 2008
Este artigo é para português de Sobre a autora
Alexandre Leite é editor de http://investigandoonovoimperialismo.blogs.sapo.pt e membro de Tlaxcala, a rede de tradutores pela diversidade lingüística. Esta tradução pode ser reproduzida livremente na condição de que sua integridade seja respeitada, bem como a menção ao autor, aos tradutores, aos revisores e à fonte.
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