O noticiário alvissareiro dando conta que os salários dos trabalhadores de menor renda subiram quatro vezes mais na comparação com os ocupados de renda mais alta, segundo estudo do IPEA, Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada, foi neutralizado com os tiros da insensatez e do revanchismo disparados na direção do jornal Diário do Amazonas no fim de semana que passou. Numa quadra de turbulência política e definição dos acertos eleitorais, corremos o risco de descuidar da relevância desses dois fatos, aparentemente dissonantes e eticamente contraditórios. O primeiro mostra o resultado de um trabalho e de escolhas acertadas que identifica na redução das desigualdades o caminho mais seguro para a redução da violência, da marginalidade e dos conflitos de classe num mundo tão injusto e desigual. De que adianta ser o país que mais cria milionários se somos aquele com maior delinqüência? O segundo – os tiros no prédio Diário - tem a ver com o retrocesso, com o arbítrio e o obscurantismo que nos custou tanto combater. Uma conquista da qual não podemos abrir mão, em qualquer cenário ou opção de ordenamento social. Um avança e outro nos joga para o atraso.
O IPEA, uma instituição historicamente relegada a menor importância na agenda republicana, tem fotografado com realismo a paisagem constrangedora das desigualdades do país e apontado caminhos – tímidos, a bem da verdade – de superação desta anomalia social. Neste último trabalho, a radiografia positiva, que retrata algumas medidas de enfrentamento do problema, mostra que os 10% com menor renda registraram aumento de 21,96% nos salários entre 2003 e 2007, passando de R$ 169,22 mensais para R$ 206,38, em média. Já os 10% com maior renda registraram ganhos de 4,91%, passando de salário médio de R$ 4.625,74 em 2003 para R$ 4.853,03, no mesmo intervalo. Trocando em miúdos, no período assinalado, é possível afirmar que houve uma redução de 7% no índice global de pobreza. Para dar seqüência a essa redução, o próprio IPEA sugere, como já apontamos dias atrás, uma transferência dos tributos chamados indiretos, embutidos nos bens de consumo, para a cobrança direta, como o Imposto de Renda, cujas faixas tributadas sairiam das duas atuais (15% e 27,5%) para 12, com cobrança progressiva. Assim, ficariam isentos contribuintes com rendimentos de até R$ 1.257,12. A partir de dessa faixa, o primeiro grupo - com renda de até R$ 2.000 -, pagaria 5%. Progressivamente, a alíquota de 27,5% seria aplicada a rendimentos mensais entre R$ 6.500 mil a R$ 8.000. A última faixa, de renda mensal acima de R$ 50 mil, pagaria 60%. O nome disso é justiça tributária e social, pois compensaria a exclusão da cobrança do Cofins, uma forma eficaz de baratear o consumo e, conseqüentemente, reduzir a pobreza. Segundo o próprio IPEA, a eliminação do COFINS reduz a desigualdade três vezes mais que o Bolsa-Família. É só avançar, portanto.
E é por isso que não dá para aceitar o retrocesso se ao país como um todo não resta outra escolha que não a de avançar e avançar. Por isso toda a sociedade se levantou contra a agressão gratuita e marota em cima da instituição Diário do Amazonas e o que ela tem representado como veiculo de informação, esclarecimento e sobretudo de opinião. Esta semana o presidente Lula -resguardada a proporção da euforia - comparou o período de conquistas vivido atualmente pelo país aos Anos Dourados do período JK, meio século atrás, em que uma onda de euforia e realizações enfiou o país nas vertentes da iluminismo que todos definimos como Modernidade. Não podemos permitir, portanto, que as balas disparadas contra o Diário nos empurre a todos de volta à Idade das Trevas, ao obscurantismo do Regime Militar, marcado vergonhosamente com o cerceamento das liberdades democráticas. Avanços, sim, repressão nunca mais!
Zoom-zoom
Dona Ruth Cardoso – Faleceu na noite desta terça-feira, a ex-primeira dama do governo FHC, a antropóloga Ruth Cardoso, uma referência de rigor, seriedade e comprometimento na produção acadêmica e na promoção humana e social. Seu programa Comunidade Solidária é uma das propostas mais consistentes e coerentes de envolvimento dos múltiplos atores sociais no enfrentamento da exclusão e da pobreza estrutural. Infelizmente não encontrou eco devido no próprio governo tucano.
Baile de Máscaras – Como nos velhos tempos dos bailes dos mascarados, a barganha política nas vésperas das convenções - que vão definir as alianças em disputa - se alimenta do mundo do faz-de-conta e das aparências enganosas. Desafetos de ontem se tornam aliados de hoje com juras de fidelidade para um amanhã em que nenhuma das partes envolvidas põe a menor fé. E tudo isso, sem qualquer constrangimento, nas barbas cada dia mais indiferentes do cidadão.
Bolsa-Família – Animado com os avanços de seu projeto de redução da pobreza, o presidente Lula não deu ouças para o FMI - que recomendou nesta semana a todo o continente o congelamento e/ou redução dos salários - e tascou um reajuste de 8% já a partir do próximo mês de julho no Bolsa-Família. Oxalá, sua atenção para as propostas do IPEA permitam que os avanços se tornem mais sólidos e coerentes a cada dia.
Juventude transviada – O noticiário da semana trouxe abundantes relatos de envolvimento de jovens nos descaminhos sombrios da marginalidade. Fraude no vestibular, assalto a bancos, baderna à luz do dia, porte de armas, consumo e tráfico de drogas... são algumas das lamentáveis escolhas assumidas por crescentes segmentos da juventude. Ausência de novas utopias, paradigmas e referências no seio familiar, o amparo da espiritualidade, a indiferença com as mazelas humanas e a falta de alternativas de entretenimento sadio, esporte e lazer...provavelmente sejam essas algumas das razões do preocupante fenômeno. É imperativo investigar!
(*) Belmiro é empresário e membro do Conselho Superior da Associação Comercial do Amazonas.
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