sexta-feira, 20 de junho de 2008

Cotidiano

Bagagens de mãos recolhidas em aeroportos: qual é o destino?

Desta vez o despertador não toca. Carlos Poeck Bendô pode acordar mais tarde, se levanta às 10 da manhã de domingo. Ele deve embarcar ainda hoje, no início da noite, para Porto Alegre (RS), onde vai participar de uma conferência entre empresários. Na bagagem, algumas roupas, produtos pessoais e material necessário à exposição que fará no evento. Às 18h50, Carlos chega ao aeroporto Internacional Juscelino Kubitschek, em Brasília, junto com o colega de trabalho Francisco Neto. Ambos dispensam a entrega de malas no check-in, pois só possuem bagagem de mãos. No balcão da companhia aérea são informados que devem se dirigir ao portão de embarque número 13. Carlos e Francisco se apressam, mas ao passar pelo raio-x, o detector de metais os obriga a parar. O motivo é o xampu, o creme de barbear, a pasta de dente e a loção pós-barba que carregam consigo. Os cincos agentes aeroportuários ali dispostos explicam que a legislação de vôos internacionais proíbe que passageiros levem na bagagem de mãos líquidos em frascos com mais de 100 milímetros, creme e aerossóis. Francisco Neto argumenta que está indo para Porto Alegre, portanto, um vôo nacional. Neste momento, então, são informados de que o vôo tem como destino final Rosário, na Argentina, e por isso segue os padrões internacionais. Eles protestam. Conseguem então levar dentro de uma sacola transparente a pasta de dente e o creme de barbear. Mas deixaram para trás o xampu em uma urna de armazenamento que já continha outros inúmeros pertences.“Nós sofremos constrangimentos, não fomos informados em nenhum momento de que o vôo era internacional. É horrível, uma situação constrangedora”, desabafa Carlos, que comprou sua passagem em uma agência de viagens. “O casal que vinha logo atrás também não sabia que o vôo era internacional. A mulher teve que deixar o perfume com os agentes”, conta Poeck Bendô. O caso de Carlos e Francisco não tem precedentes na Procuradoria de Proteção e Defesa do Consumidor do Distrito Federal (Procon-DF). Segundo o órgão, as reclamações mais usuais em aeroportos dizem respeito à questão de passagens, mais especificamente de vôos que foram cancelados e as companhias aéreas não deram o reembolso do dinheiro. Outras reclamações freqüentes são relacionadas aos atrasos de vôos e extravio de bagagens.
Trajetória do material recolhido

Os materiais recolhidos não são devolvidos aos donos, mas como no dia do embarque o aeroporto de Porto Alegre estava fechado devido ao mau tempo, Carlos e Francisco não chegaram a viajar e resgataram o xampu. “Abriram a urna e me falaram para pegar o que fosse meu. Eu poderia ter pegado outras coisas também se quisesse, já que nenhum material tinha registro de propriedade. Estavam cerca de 40 itens em duas urnas, entre perfumes, cremes, loções etc”, relata Francisco Neto. “Não há depósito para guardar os materiais, ainda que por pouco tempo”, acrescenta. O Contas Abertas (CA) resolveu apurar quem deveria ter comunicado aos passageiros que deviam adequar suas bagagens à legislação internacional. A reportagem do CA buscou também apurar o número de bagagens apreendidas nos aeroportos, o percentual de pessoas que, desavisadas, retornam para tentar reaver seus pertences e a destinação dos produtos recolhidos.A princípio, a Empresa Brasileira de Infra-estrutura Aeroportuária (Infraero) disse que não era da sua competência o destino e os números de bagagens apreendidas. Segundo a assessoria, a responsabilidade é da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac). A Anac, por sua vez, alegou que parte da competência seria sua, mas remeteu a responsabilidade para a Polícia Federal (PF). Já a PF diz que o assunto é de competência das companhias aéreas. As empresas aéreas então repassam a responsabilidade para a Receita Federal. Esta última afirma que a questão é de competência da Infraero.Desta forma, após a reportagem reiniciar o ciclo pela busca de informações, a Infraero e a Anac, por meio de suas assessorias de imprensa, informaram que quando um material não pode ser levado na bagagem de mãos, o passageiro pode solicitar o transporte na bagagem despachada, ou seja, a bagagem de porão das aeronaves. Mas caso o material seja apreendido, não há devolução ao passageiro. Imediatamente, os materiais líquidos ou pastosos são encaminhados para a Agência de Vigilância Sanitária (Anvisa). Já os materiais cortantes seguem para a Polícia Federal.A Polícia Federal nega receber objetos cortantes. Segundo a assessoria de imprensa da instituição, não há nenhuma razão para que sejam enviados para o órgão, já que não se trata de um item de crime. Se fossem armas de fogo, por exemplo, a assessoria diz que faria sentido o envio do material a PF. Sendo assim, de volta a Infraero, o órgão alegou que “objetos cortantes são, na verdade, destruídos pela Infraero”. Sobre o percentual de pessoas que retornam para reaver seus bens e o número de materiais recolhidos, a assessoria da Infraero informou que “varia de aeroporto para aeroporto”.A Anvisa também nega receber os materiais líquidos e pastosos das bagagens de mãos recolhidos nos aeroportos que, segundo a Infraero, seriam remetidos ao órgão. A Agência de Vigilância Sanitária, por meio de assessoria, disse desconhecer a chegada deste tipo de material.Companhias e agências devem ser autuadasÉ função das companhias aéreas e agências de viagens avisarem aos passageiros, no ato da compra do bilhete, que o embarque será em área internacional, de acordo com a Resolução da Anac nº 7 de 28 de fevereiro de 2007 (Clique aqui acessar o documento). Ainda de acordo com a Anac, caso seja constatada pela inspeção ou por reclamação do passageiro tal irregularidade – a falta de informação –, a empresa aérea será autuada por não cumprimento de legislação, prevista na Resolução Nº 25, de 25 de abril de 2008 (Veja esta e outras resoluções da Anac).A Gol Linhas Aéreas Inteligentes informa que a orientação aos passageiros sobre a regulamentação de bagagem de mãos para vôos internacionais está disponível em seu site na Internet e também em displays (telas) que ficam no balcão de check-in da companhia. A Varig também informa seus passageiros por meio do site e de placas instaladas nos balcões de check-in nos aeroportos onde opera. Ambas as empresas também disponibilizam a resolução da Anac na íntegra em seus sites. A companhia TAM, até o fechamento da matéria, não informou de que forma esclarece a legislação internacional de vôos a seus passageiros.
Matéria de Amanda Costa

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