quinta-feira, 5 de junho de 2008


Entulho eco-xiita da ‘era Marina’ é parcialmente removido
Nilder Costa

Sobrou para o novo ministro do Meio Ambiente Carlos Minc anunciar a remoção parcial de um dos entulhos eco-xiitas herdados da ‘era Marina’, a discricionária portaria 96/2008, que proíbe a concessão de crédito oficial para todos os municípios do Acre, Amazonas, Pará, Rondônia e Roraima e outros 106 do Maranhão, Mato Grosso e Tocantins, colhidos que foram pela fúria punitiva da ex-ministra que os culpou indiscriminadamente pelo aumento do desmatamento na ‘Amazônia’. Um exemplo emblemático dessa perversa associação feita entre a Amazônia Legal, uma criação jurídica, com o bioma de mesmo nome, é o município mato-grossense de Diamantino, localizado a mais de mil quilômetros ao sul do início do bioma mas que foi incluído no bloqueio punitivo. Como em Diamantino existem importantes fábricas de alimentos da Bertin, Perdigão e Sadia que dependem diretamente da produção de grãos e da pecuária, sem o crédito agrícola para os produtores elas iriam fechar. Pela portaria, a partir de 1º de julho, o crédito agrícola oficial só pode ser concedido aos produtores que apresentarem Certificado de Cadastro do Imóvel Rural (CCIR), declaração de que inexistem embargos em áreas desmatadas ilegalmente, e licença, certificado, certidão ou documento similar de regularidade ambiental.Uma clara demonstração da irresponsabilidade de Marina e caterva de colocar a floresta na frente das pessoas que lá vivem e produzem foi a constatação feita pelo ministro do Desenvolvimento Agrário, Guilherme Cassel, que o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), responsável pela emissão da papelada, não tem condições de atender ninguém dentro do prazo. Numa reunião realizada há 15 dias com o presidente Lula, Cassel disse que somente no prazo de cinco anos o Incra teria condições de atender à demanda.Feitas as contas, como a fúria punitiva ambientalista poderia causar uma quebra em torno de 15% na produção de grãos do País – mais de 20 milhões de toneladas -, o presidente Lula não teve outra alternativa senão ordenar uma revisão da famigerada portaria do Ministério de Meio Ambiente. Com a revisão, ficam de fora propriedades instaladas numa área de 155 mil km2 na fronteira do bioma Amazônia e que, mesmo correspondente a cerca de 4% do território atingido pela portaria, é onde estão grandes produtores de alimentos que haviam sido penalizados.Parece que os ventos do bom senso – ou da percepção que a condução dos assuntos amazônicos estão mudando no Brasil – chegaram até a alguns redutos ambientalistas em atividade por aqui, a julgar-se pelas recentes declarações de Daniel Nepstad, conhecido pesquisador da ONG americana Woods Hole Research Center e da sua filial brasileira, o IPAM. Em uma surpreendente entrevista concedida ao venerado Financial Times, de Londres, onde é apresentado como ‘um dos maiores especialistas sobre a floresta tropical’, Nepstad afirmou que o uso de novas imagens do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais) pelo governo para fundamentar medidas de combate ao desmatamento é ‘errado’ e pode provocar uma ‘nova onda de anarquia’. Nepstad disse ao jornal que as imagens são imprecisas e só deveriam servir como base para a verificação in loco do desmatamento em si. “Definir medidas do governo com base em dados tão incertos é simplesmente errado”, declarou ele. Segundo o FT, o governo vê a pressão sobre os fazendeiros como essencial para combater o desmatamento, mas para Nepstad, ela pode produzir o efeito contrário: “Houve uma batalha infeliz entre o governo e o setor dos fazendeiros desde a liberação dos dados do fim de 2007”, disse o pesquisador, se referindo ao anúncio de que o desmatamento tinha voltado a crescer depois de anos em declínio. De fato, Nepstad defende a proposta de lei a ser votada pelo Congresso – à qual o governo se opõe - que diminui a área da famosa reserva legal na Amazônia de 80% para 50%: “Se houver benefícios econômicos claros para aqueles que cumprirem a determinação no nível de 50%, o resultado poderia ser um declínio no desmatamento”.Imposta pela realidade, espera-se que a revisão da mencionada portaria fortaleça as correntes, dentro e fora do Governo, que exigiram o fim da ‘era Marina’ para que se possa empreender a necessária mudança de paradigmas no desenvolvimento socioeconômico da Amazônia onde o ‘meio ambiente’ é um fundamento a ser diligentemente observado, mas não o seu princípio ordenador.

Notas:
[1]Cerrado vai sair de aperto no crédito, Folha de São Paulo, 28/05/2008
[2]Measures to slow Amazon deforestation 'just wrong', Financial Times, 27/05/2008

Esta matéria está no Alerta em Rede

Nenhum comentário:

Postar um comentário