domingo, 1 de março de 2009

'Folha' desperdiça pauta para falar mal do sindicalismo

Ter uma boa pauta e fazer o dever de casa nem sempre produz uma boa matéria jornalística. Um exemplo é manchete da Folha de S.Paulo deste domingo (1º) – Crise revela despreparo de sindicatos. A matéria das jornalistas Fátima Fernandes e Claudia Rolli ouviu gente que entende de sindicalismo porém parece que não escutou o que têm a dizer. Sua conclusão é a que deve ter sido encomendada pelo pauteiro: as centrais são ''despreparadas'', ''enferrujadas'', ''atreladas ao governo Lula'' ...e ganham dinheiro demais.
Por Bernardo Joffily

A manchete da 'Folha': desperdício


Os dois acadêmicos entrevistados – Ricardo Antunes e Wilson Amorim – são estudiosos reconhecidos do movimento sindical brasileiro. E as repórteres ouviram diligentemente os presidentes de cada uma das centrais sindicais. Como então o resultado saiu tão pobre e distante dos dramas reais que acometem o sindicalismo?Um tema visto com binóculos ao contrárioPossivelmente é a redação da Folha que está ''enferrujada'' em sua cobertura do movimento sindical. Décadas de menosprezo pelo tema agravaram uma falta de intimidade com o tema que sempre existiu. O resultado é uma reportagem que não cumpre o que promete na manchete: ''Crise revela''. O tema parece estar sendo visto através de binóculos ao contrário, em que mal se consegue distinguir os personagens e muito menos o cenário. As declarações entre aspas parecem escolhidas a dedo para expressar, não a essência do que pensa o entrevistado, mas as teses preconcebidas pela pauta.Temas candentes ignoradosPor exemplo: o tema ''crise do movimento sindical'' povoa há décadas o debate entre as organizações de trabalhadores. Provocado por uma síndrome que inclui mudanças no processo produtivo e em todo o mundo do trabalho, um novo perfil da classe trabalhadora, a derrota da experiência socialista soviética e a ofensiva neoliberal, ele tem dado o que falar tanto no Brasil como no mundo inteiro. Na matéria da Folha, porém, não merece uma palavra.Tampouco há menção ao fato – historicamente provado por incontáveis crises do capitalismo aqui e alhures – de que a crise é um cenário desfavorável para as lutas e organizações dos trabalhadores, roubando suas energias através do mecanismo perverso dos desemprego. A matéria repassa uma visão ingênua de que, se o trabalhador está se dando mal, as lutas não pipocam por uma questão de ''despreparo''. A matéria é honesta o bastante para registrar que ''as centrais, assim como as empresas, foram pegas de surpresa'' pela atual crise mundial capitalista – a idéia parece ser de Antunes. Mas a honestidade não chega a ponto de completar a lista dos surpreendidos, agregando, por exemplo, os economistas, a mídia em geral e a Folha de S.Paulo em particular.


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