quinta-feira, 15 de maio de 2008

Debate na Câmara sobre Raposa/Serra do Sol

Audiência acaba em baixaria

Em audiência pública na Câmara marcada por tensão, bate-boca e tumulto, o ministro da Justiça, Tarso Genro, condenou "atitudes terroristas" de arrozeiros que se recusam a deixar a reserva indígena Raposa Serra do Sol, em Roraima, e afirmou que as forças policiais instaladas na região vão reprimir a ação de grupos armados. A sessão terminou em confusão, quando o líder indígena Jecinaldo Sateré Maué, presidente da Coordenação das Organizações Indígenas da Amazônia Brasileira (Coiab), tentou jogar um copo de água no deputado Jair Bolsonaro (PP-RJ). "É que eu não tinha uma flecha naquela hora", lamentou o índio, ao comentar o incidente, antes de deixar a Câmara. Em vários momentos, durante mais de três horas de audiência, Bolsonaro e Genro discutiram. O deputado chamou o ministro de "terrorista mentiroso". "A mim, não impressionam gritos e olhos arregalados", reagiu Genro. Sob protestos de vários deputados, que exigiam do ministro a retirada do termo "terrorismo", Genro não voltou atrás e disse que a maioria dos não-índios "está lá de boa fé", mas que na região há também "grileiros, traficantes e grupos violentos que estão lá para cometer ilegalidades". Genro defendeu a ação da Polícia Federal e da Força Nacional de Segurança que, na semana passada, resultou na prisão do líder arrozeiro Paulo César Quartiero, depois de confronto entre índios e funcionários da fazenda do rizicultor. O ministro afirmou que a fazenda de Quartiero, que fica dentro da reserva, é uma "posse precária, sem titularidade". O ministro considerou "fetiche" a idéia de que a demarcação contínua da reserva em área de fronteira tira a soberania nacional. Genro garantiu que as Forças Armadas têm total autonomia para agir nas terras indígenas e reiterou que o Ministério da Defesa apresentará em breve um plano de ocupação das fronteiras da Amazônia, com instalação de novos postos de vigilância e segurança. Na mesma audiência pública, realizada pelas comissões de Relações Exteriores e Defesa Nacional e da Amazônia, o governador de Roraima, José de Anchieta Junior (PSDB), que tenta no Supremo Tribunal Federal (STF) a anulação do decreto do presidente Luiz Inácio Lula da Silva de demarcação contínua da reserva, disse que a Polícia Federal não estava preparada para iniciar, no início do mês passado, a operação de retirada dos arrozeiros da reserva. A operação foi suspensa por determinação do STF, que atendeu a um pedido do governador. "Eu evitei uma tragédia. O presidente Lula tem que me agradecer por isso. Salvamos centenas de vidas. Morreriam índios, mas também muitos policiais federais. Seria uma tragédia", disse Anchieta aos deputados. A maioria governista na audiência pública impediu o deputado Antonio Carlos Pannunzio (PSDB-SP) de exibir um vídeo de pouco mais de sete minutos com imagens da visita de Genro à reserva, logo depois do conflito da semana passada, e de militares da Força Nacional em ação para reprimir manifestação dos defensores de Quartiero. O vídeo mostrava também a prisão do arrozeiro e tinha as cenas intercaladas com trechos de declarações de Genro feitas na região. Questionado sobre os custos da operação policial na Raposa Serra do Sol, o ministro informou que a União já gastou pelo menos R$ 200 mil. "Gastos bem inferiores à multa do Ibama pela devastação na região", acrescentou o ministro, referindo-se à multa de R$ 30,6 milhões aplicada pelo Instituto de Meio Ambiente e Recursos Naturais Renováveis (Ibama) por danos ambientais na fazenda Depósito, de propriedade de Quartiero. No fim da audiência, Genro informou aos parlamentares que o valor da multa vai diminuir "se ficar provado que o agente cometeu algum excesso". Pouco antes, o deputado Urzeni Rocha (PSDB-RR) tinha questionado o ministro, que é gaúcho, os motivos de a punição ao líder arrozeiro ter sido aplicada "só agora" e de "nenhum produtor do Rio Grande do Sul ter recebido R$ 30 milhões de multa." O tucano foi um dos deputados que protestaram por Genro ter falado em terrorismo na reserva. "Não admito chamar o povo de Roraima de terrorista. Lá não tem bandido", bradou Urzeni, para quem "o Ibama é a arma, o braço do governo federal contra Roraima". "Nunca chamei o povo de terrorista", respondeu o ministro. "Os senhores viram pessoas encapuzadas atacando indígenas e atirando bombas. O laudo apontou que havia explosivos na casa do senhor Quartiero. Ele foi preso em flagrante", lembrou o ministro. Nova audiência sobre a reserva indígena está marcada para o próximo dia 28, com a presença de Genro e de dois ministros que faltaram ao compromisso ontem, o da Defesa, Nelson Jobim, e o de Assuntos Estratégicos, Mangabeira Unger.

Veja reportagem do "Jornal da Globo" sobre o assunto:

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